Acórdão nº 4332/04.0TDPRT.P4-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 13 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelLOPES DA MOTA
Data da Resolução13 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na 3.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: 1.

AA, arguido nos autos em referência, apresenta requerimento com pedido de recusa da Senhora Juíza Desembargadora BB, em exercício de funções no Tribunal da Relação do Porto, relatora no recurso, por si interposto, do acórdão proferido nesses autos pelo Juízo Central Criminal ... (Juiz ...), nos termos e com os seguintes fundamentos: «1 - Corre termos no Tribunal da Relação do Porto, ... Secção ..., o recurso em processo crime com o número 4332/04.0TDPRT.P4, em que o ora requerente é arguido/recorrente.

2 - Vem o presente pedido de recusa de juiz assente na verificação de motivos sérios e graves, adequados a gerar fundada desconfiança sobre a imparcialidade da Sra. Juiz Desembargadora-relatora Dra. BB.

3 - Diga-se antes do mais que o presente pedido não assenta na mera discordância das decisões proferidas e/ou relatada pela M.ma Juiz Desembargadora visada, mas sim da sucessão variada de erros de interpretação, de lapsos de não ver partes das peças processuais do requerente, de deturpação incompreensível de "classificação" de peças processuais do requerente, de violação inequívoca de dispositivo legais, com o elemento comum de serem todos em desfavor do arguido e de influirem de forma determinante nas decisões proferidas, com flagrante violação de direitos vários do arguido, obrigando o recurso a este incidente para garantir uma decisão isenta e livre de qualquer suspeita para qualquer pessoa que analise os autos.

4 - Mais para balizar e orientar a explanação factual e a fundamentação jurídica deste pedido, transcrevem-se excertos pertinentes de alguns Acórdãos, TODOS deste Supremo Tribunal de Justiça, com negritos e sublinhados ora apostos: A - Ac. de 13.08.2021, Proc.1420/11.0T3AVR.G1-Z.S1 O facto de o arguido discordar das decisões proferidas no processo não permite fundamentar o incidente de recusa que deduziu. Da análise dos autos verifica-se, não só, que não foi negado ao requerente qualquer direito fundamental como não foi agravada a sua situação. Acresce que, dos elementos constantes dos autos, não se vislumbra qualquer facto que indicie que o requerido não tivesse imparcial ou que tivesse injustificadamente prejudicado o arguido.

II - A seriedade e gravidade do motivo ou motivos causadores do sentimento de desconfiança sobre a imparcialidade do juiz só são suscetíveis de conduzir à recusa ou escusa do juiz quando objetivamente consideradas, sendo a partir do senso e experiência comuns que tais ircunstâncias deverão ser ajuizadas. Entre o «motivo» e a «desconfiança» terá de existir uma situação relacional e lógica que justifique o juízo de imparcialidade, de forma clara e nítida, baseado na seriedade e gravidade do motivo subjacente.

II - Na determinação de uma suspeição que justifique o afastamento do juiz do processo por recurso à cláusula geral enunciada no n.º 1 do art. 43.º do CPP deve atender-se a que esta revela que a preocupação central que anima o regime legal é prevenir o perigo de a i ntervenção do juiz ser encarada com desconfiança e suspeita pela comunidade III - Na interpretação e preenchimento da cláusula geral de suspeição, a jurisprudência deste Tribunal tem adotado um critério particularmente exigente, pois que, estando em causa o princípio do juiz natural, deve tratar-se de uma suspeição fundada em motivo sério e grave, a avaliar em função das circunstâncias objetivas do caso, “a partir do senso e experiência comuns, conforme juízo do cidadão de formação média da comunidade do julgador” (art. 43.º, n.º 1, do CPP).

B - Ac. de 28.11.2019, Processo: 186/17.5GCTVD.L1-A.S1 III - O motivo, sério e grave, gerador da desconfiança para que aponta aquele dispositivo legal, tem de ser concreto e concretizado face à matéria da causa e não ser aferido a partir de generalidades e abstracções.

C - 28.11.2019, Proc. 3795/13.8TDLSB.L1-A.S1 I - Nos termos do art. 43.º, n.º 3, do CPP, o Ministério Público pode pedir ao tribunal imediatamente superior (cf. art. 45.º, n.º 1, al. a), do CPP) que não admita determinado juiz a intervir num certo processo “quando ocorrer o risco de [a sua intervenção] ser considerada suspeita, por existir motivo, sério e grave, adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade” (art. 43.º, n.º 1).

II - A recusa de um juiz deverá ter por fundamento a existência de um motivo sério e grave que gere desconfiança sobre a sua imparcialidade para a decisão daquele concreto caso.

III - No caso, verifica-se que no pedido formulado não é indicada qualquer razão concreta que permita analisar da imparcialidade ou parcialidade para o juiz decidir aquele caso concreto. São apresentadas razões de caráter geral e abstrato pretendendo demonstrar que, existem motivos sérios e graves que impedem que o Senhor Juiz Desembargador possa decidir qualquer processo.

D - 17.04.2008, Processo: 08P1208 VII - A lei não define nem caracteriza a seriedade e a gravidade dos motivos, pelo que será a partir do senso e da experiência comuns que tais circunstâncias deverão ser ajuizadas. Em todo o caso, o art. 43.º, n.º 1, do CPP não se contenta com um «qualquer motivo», ao invés, exige que o motivo seja duplamente qualificado, o que não pode deixar de significar que a suspeição só se deve ter por verificada perante circunstâncias concretas e precisas, consistentes, tidas por sérias e graves, irrefutavelmente reveladoras de que o juiz deixou de oferecer garantias de imparcialidade e isenção.

5 - Após esta abordagem de algumas decisões deste Supremo Tribunal, temos nos autos em causa vários dados factuais objectivos.

6 - A Sra Juiz Desembargadora recusanda proferiu três decisões e elaborou e subscreveu um Acórdão.

7 - Começando pelas decisões menos relevantes, temos os despachos de 23.02.2023 e de 30.05.2023, que indeferiram pedido de prorrogação de prazo e pedido de dispensa/redução de multa processual, respectivamente.

8 - Se no indeferimento do pedido de prorrogação de prazo nada de grava haverá a censurar, pese embora haver várias decisões de sentido diverso nos Tribunais Superiores, já o despacho que indefere o pedido de dispensa/redução da multa denota imparcialidade, com desrespeito por dispositivos legais e violação de direitos legalmente consagrados do arguido.

9 - Assim, este despacho de 30.05.2023, diz: "Por outro lado, o acto não foi praticado pelo arguido, mas sim pelo seu mandatário o qual alega a complexidade do acto, superior à do recurso, mas não densifica e nem concretiza essa complexidade." 10 - Ora, independentemente do que se pretenda dizer com "não densifica", a complexidade estava mais que concretizada em toda a peça na qual foi feito o pedido de dispensa/redução da multa.

11 - Esta complexidade, e mesmo gravidade, resulta patente de toda a Arguição de Nulidade e Reforma, que, diga-se de passagem, só se tornou necessária devido ao facto de o Acórdão elaborado e subscrito pela recusanda conter diversos erros e violações legais graves, como se verá de seguida.

12 - Mas este despacho contém ainda duas violações legais limitativas dos direitos do arguido, pois decidiu: "Assim, e porque não se verificam os pressupostos previstos no artigo 139º, nº 8, do CPC, impõe-se, concluir pela improcedência/indeferimento do requerido pelo arguido, devendo este ser notificado para proceder ao pagamento, IMEDIATO , da multa respetiva, acrescida da PENALIZAÇÃO de 25% , nos termos do artigo 139.º, n.º 6 do CPC, ex vi do artigo 107º-A, do CPP." 13 - É direito do arguido pagar a multa processual espontaneamente, sem acréscimo, como também é seu direito pedir a dispensa/redução da multa.

14 - Assim, indeferidos os pedidos de dispensa/redução da multa, impunha-se que fosse permitido ao arguido proceder ao pagamento imediato mas da multa "em singelo".

15 - Contudo, no despacho logo se fez questão de mencionar que a multa seria paga com o acréscimo de 25%.

16 - Para completar, além de ter sido vedada a possibilidade do pagamento da multa sem o acréscimo, teve-se a situação como se de uma simples omissão de pagamento de multa se tratasse e ordenou-se a notificação para pagamento com acréscimo, mas decidiu-se ainda "notificado para proceder ao pagamento, imediato, da multa, acrescida da penalização".

17 - Se por um lado se violou o direito ao pagamento da multa em singelo, o despacho ignorou o disposto no nº 6 do art. 139.º do CPC, aplicável por remissão expressa do art. 107.ºA do CPP e que diz assim: "6 - Praticado o ato em qualquer dos três dias úteis seguintes sem ter sido paga imediatamente a multa devida, logo que a falta seja verificada, a secretaria, independentemente de despacho, notifica o interessado para pagar a multa, acrescida de uma penalização de 25 % do valor da multa, desde que se trate de ato praticado por mandatário." 18 - Ora, na falta de fixação legal de prazo, aplica-se a regra geral contida no art. 149.ºdo CPC: Regra geral sobre o prazo 1 - Na falta de disposição especial, é de 10 dias o prazo para as partes requererem qualquer ato ou diligência, arguirem nulidades, deduzirem incidentes ou exercerem qualquer outro poder processual; e também é de 10 dias o prazo para a parte responder ao que for deduzido pela parte contrária.

19 - Assim, determinando a lei que o arguido dispunha de um prazo de 10 dias para proceder ao pagamento, o despacho elimina o direito a este prazo e impõe um pagamento imediato da multa, acrescida da penalidade… 20 - Analisando agora uma decisão muito mais relevante e reveladora da falta de rigor e de isenção, vejamos a Decisão Sumária de rejeição do recurso, de 07.02.2023.

21 - Conforme se invocou logo após esta decisão, a mesma foi proferida sem respeito pelo princípio do contraditório.

22 - Conforme se invocou em 16.02.2023 na arguição da irregularidade decorrente daquela omissão, decidiu este Supremo Tribunal em 27.04.2022, Proc. 353/13.0PCPDL.L1.S1: II - A prolação de acórdão em conferência, ao invés de uma decisão sumária, em nada fere o princípio do contraditório, mas antes é ditado pela...

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