Acórdão nº 485/23 de Tribunal Constitucional (Port, 07 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelCons. Mariana Canotilho
Data da Resolução07 de Julho de 2023
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 485/2023

Processo n.º 200/2023

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Mariana Canotilho

Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça (STJ), a Decisão Sumária n.º 284/2023 deste Tribunal Constitucional não admitiu o recurso de constitucionalidade interposto pelo recorrente A., com base no artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, adiante designada por LTC).

A Decisão Sumária ora reclamada concluiu que o inconformismo do recorrente, tal como apresentado no requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade, não consubstanciava objeto passível de fiscalização nesta sede por não integrar um critério normativo idóneo, disputando, na verdade, o sentido subsuntivo e a melhor interpretação do direito infraconstitucional aplicável ao caso. Com isso, entendeu-se estar-se perante a sindicância da própria decisão recorrida.

Os fundamentos da Decisão Sumária em causa aqui relevantes foram os seguintes:

3. Compulsados os autos, verifica-se que com a sua primeira questão formulada, o recorrente indaga sobre o sentido infraconstitucional do modo de operacionalização da renúncia ao direito de recurso, com efeitos para a interpretação da LTC e a respetiva natureza definitiva da decisão recorrida de que fala o artigo 70.º, n.ºs 2 e 4.

Vejamos.

Conforme transcrito e destacado supra, o recorrente afirma que, perante a não apresentação de reclamação para a conferência do STJ e da interposição de outro recurso, «a renúncia a tal direito - pelo comportamento realizado - não gera obrigatoriedade de realizar paralela ou antecipadamente declaração expressa» e, por isso, discorda do acórdão do STJ, de 6 de dezembro de 2022. Por outras palavras, o recorrente entende que basta uma renúncia tácita e, tendo o STJ concluído de forma devidamente fundamentada na jurisprudência do Tribunal Constitucional, discorda a decisão tomada pelo tribunal a quo.

Eis a Questão 1.

Como facilmente se depreende, tal invocação não consubstancia objeto idóneo do presente recurso, dado que a irresignação do recorrente se centra na contestação da aplicação do direito infraconstitucional levada a cabo na decisão recorrida, relativamente ao modo adequado de se materializar a renúncia ao exercício de uma faculdade processual. Na verdade, recorrente intenta sindicar a operação subsuntiva feita pelo tribunal a quo, sustentando que deve aceitar-se o seu comportamento passivo (isto é, a omissão de apresentação de reclamação para a conferência ou de renúncia expressa a essa possibilidade), como substituído pela opção por um recurso diferente (o de inconstitucionalidade), implicando esse gesto, automaticamente, uma vontade explícita que dispensaria qualquer manifestação expressa de renúncia a outros expedientes.

Ora, a opção pela melhor interpretação do direito infraconstitucional é uma matéria de direito comum, para a qual são competentes os tribunais comuns. À jurisdição constitucional compete antes o controlo da conformidade constitucional de normas, excluindo a apreciação de decisões judiciais, sob pena de inadmissibilidade. A este Tribunal cabe o escrutínio da constitucionalidade de normas e não de quaisquer outras operações, designadamente o modo como o tribunal recorrido interpretou ou aplicou o direito infraconstitucional.

Assim, eivada do vício de ausência de objeto normativo, a Questão 1 não é admissível.

4. Relativamente à Questão 2, o recorrente reage contra a forma de contagem do prazo de interposição de recurso, nos termos do artigo 638.º, n.º 1 do CPC, e argumenta que, se se considerar que o seu termo inicial remete para a notificação, no caso destes autos, do acórdão do Tribunal da Relação, configurar-se-ia uma inconstitucionalidade à luz da tutela jurisdicional efetiva, do processo justo e do princípio da igualdade.

Todavia, também nesta questão o recorrente falha no pressuposto de normatividade – isto é, da verificação da natureza normativa do objeto do recurso - exigido em sede de fiscalização concreta de constitucionalidade. Como se verifica pela leitura das peças relevantes, o recorrente entende que o despacho de 28 de maio de 2022, do Tribunal da Relação do Porto, e a decisão singular de 21 de setembro de 2022, do Supremo Tribunal de Justiça, incorreram em erro ao não censurar a interpretação do artigo 615.º, n.º 4, conjugado com os artigos 672.º, n.º 1, alíneas a), b) e c), 638.º, 616.º, n.ºs 2 e 3 e 617.º, n.º 6, todos do CPC, que levou à determinação da extemporaneidade do recurso de revista excecional então interposto.

Com efeito, com esta aparente questão de constitucionalidade o recorrente pretende disputar a forma de contagem do prazo que lhe interessa, com o intuito de conseguir alterar os efeitos subsequentes de recorribilidade no seu contencioso. Reiterem-se as suas próprias palavras: «devem as decisões proferidas pela Veneranda Relação do Porto a 10.01.22 e 21.03.22 ser consideradas um único comando material para efeitos de impugnação e procedente contagem/inicio do respetivo prazo processual», de modo que se problematiza «não existir cisão temporal entre o requerimento de arguição de nulidades da decisão proferida pela Relação do Porto e o requerimento de interposição de recurso de revista». Dessa construção recursal não emerge uma verdadeira questão normativa que possa ser apreciada pelo Tribunal Constitucional; mas tão-somente...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT