Acórdão nº 0308/22.4BECBR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Julho de 2023

Magistrado ResponsávelNUNO BASTOS
Data da Resolução05 de Julho de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. O REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA interpôs o presente recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra que julgou procedente a reclamação do despacho proferido pelo Chefe de Divisão da Direção de Finanças de Coimbra, com poderes delegados do Diretor de Finanças de Coimbra, em 08-06-2022, que rejeitou liminarmente o pedido de anulação de venda por si apresentado no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...36 e apensos, em que é Excetuado AA, NIF ..., casado com BB, NIF ....

Reclamação que tinha sido deduzida por CC, NIF ..., com morada na Rua ..., ... ....

Com o requerimento de interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…) I. A presente reclamação dos actos do órgão de Execução Fiscal foi apresentada do despacho proferido, em 08/06/2022, pelo Chefe de Divisão da Direcção de Finanças de Coimbra, que rejeitou liminarmente o pedido de anulação de venda do prédio rústico inscrito na matriz predial da freguesia ..., concelho de Miranda do Corvo, sob o art.º ...21.º, apresentado pelo reclamante no âmbito do processo de execução fiscal n.º ...36 e apensos, em que é Executado AA, NIF ..., casado com BB, NIF ..., resultante de convolação de acção administrativa especial intentada no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra contra a Autoridade Tributária e Aduaneira, a Conservatória dos Registos e do Notariado e o executado e mulher, com o número de processo n.º 679/14.6BECBR [cfr. Pontos 20) e 21) da matéria de facto provada].

  1. Pedindo este, a final, que seja «declarada a nulidade da venda» e que lhe seja «restituído/pago ao Requerente/Reclamante tudo o que este tiver prestado/pago - saber: - o preço da compra, ou seja, 6.400,00€ (seis mil e quatrocentos euros); - o imposto de selo, no valor de € 10,00€ (dez euros); - o preço do ato notarial de compra e venda, no valor de € 272,40 (duzentos e setenta e dois euros e quarenta cêntimos); - o valor despedido no IMI, isto é, € 320,00 (trezentos e vinte euros); - e o valor gasto com as emissões dos documentos anexos ao requerimento inicial, no valor de 169,00€ (cento e sessenta e nove euros), - tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a data de notificação até integral e efetivo pagamento».

  2. A Mma. Juíza do Tribunal a quo, considerou que, apesar do pedido formulado pelo Reclamante, o objeto da açcão era o despacho de indeferimento liminar, e consequentemente, era sobre a legalidade desse despacho – de rejeição liminar do pedido do Reclamante – que o Tribunal se iria pronunciar, limitando-se anular ou a confirmar o mesmo, em função do juízo de ilegalidade ou legalidade que sobre ele recaísse.

  3. Bem como, que o Tribunal não poderia substituir-se à Administração e anular a venda em causa, mas tão-só decidir sobre o acerto ou não da rejeição liminar do pedido efetuado pelo Reclamante.

  4. Decidindo a Mma. Juíza, quanto à identificada questão da legalidade do despacho de rejeição liminar do pedido de anulação da venda, que para a venda fique sem efeito, quando o bem pertença a outrem, é necessário que a coisa seja reivindicada pelo dono, pelo que, por essa razão, e não havendo uma reclamação do bem por parte do alegado dono, tal norma não poderá aplicar-se e o Reclamante não poderia obter anulação da venda com base na nulidade do negócio por venda de coisa alheia, face ao disposto no art.º 839.º, n.º 1 , al. ) do CPC.

  5. Decidindo, no entanto, também, que a alegação do Reclamante, na PI da acção administrativa especial, que deu origem, por convolação ao incidente/requerimento dirigido ao órgão competente, pode ser igualmente enquadrada na al. a) do n.º 1 do artigo 257.º do CPPT e 838.º, n.º 1 do CPC , pois o primeiro artigo deve ser lido em consonância com o segundo, em que se estabelece que a possibilidade de anulação pode ter por base algum ónus ou limitação não considerada pelo comprador e que exceda os limites normais dos direitos da mesma categoria.

  6. Entendendo, conforme defende JORGE LOPES DE SOUSA, no seu Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, que «os ónus ou limitações relevantes são os que não caducam com a venda em execução como resulta da alínea a) do n.º 1 deste artigo», ou seja, serão «limitações relevantes todos os direitos que se imponham ao adquirente, mesmo de carácter obrigacional», e até obrigações, e que eram desconhecidos para o comprador no momento da compra, sendo ainda «indiferente, para se verificarem os pressupostos da anulação que o comprador tenha culpa na ocorrência do erro pois a desculpabilidade ou escusabilidade do erro não foi prevista como requisito da relevância deste».

  7. E, face a tal, que o alegado pelo Reclamante – existência de uma dupla descrição predial do mesmo artigo matricial, desconhecendo-se, assim, a titularidade do direito material associado ao registo de aquisição e as inerentes dificuldades no registo de aquisição do bem em causa e respectiva venda – cabe, no conceito de limitações relevantes que se impõem ao adquirente do bem e que afectam a sua vontade na celebração do negócio.

  8. E que, se o comprador – perante a tomada de conhecimento de tais limitações – quiser anular a venda, poderá fazê-lo tendo por base aquela a al a) do n.º 1 do artigo 257.º do CPPT e 838.º, n.º 1 do CPC, não ficando, assim, num caso como o dos autos, dependente da apresentação de uma acção de reivindicação, por parte do suposto dono, ou até da instauração de uma acção judicial com vista ao reconhecimento do direito de propriedade por parte do adquirente, pois tais acções importam, custos em que as partes podem, legitimamente, não querer incorrer, pelo que bastará que o comprador alegue e prove que a existência de tal limitação – no caso a duplicação das descrições prediais, com as limitações que daí decorrem em termos de exercício...

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