Acórdão nº 67/23.3T8MBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelEMÍDIO FRANCISCO SANTOS
Data da Resolução27 de Junho de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Relator: Emídio Francisco Santos 1.ª Adjunto: Paulo Correia 2.ª Adjunto: José Avelino Gonçalves Processo n.º 67/23.3T8MBR-B.C1 Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra AA, residente na Rua ..., ..., ..., ... requereu contra BB e seu marido, CC, residentes na Rua ..., ... ..., ..., a título de procedimento cautelar comum: a) Que os requeridos fossem condenados a colocar o caminho identificado no artigo 16.º do requerimento no estado em que se encontrava, alisando e compactando o seu leito de passagem e dele removendo as pedras que aí colocaram, de modo que pelo mesmo a requerente possa circular e aceder ao seu prédio com tractores, carrinhas e máquinas agrícolas; b) Que ambos fossem condenados a respeitar o direito da requerente, abstendo-se de praticar qualquer que impeça o dificulte a passagem da autora conforme descrito em a).

Para o efeito alegou: · Que os requeridos são proprietários do prédio rústico inscrito na matriz predial rústica da freguesia ... sob o artigo ...47 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n. º ...13 da freguesia ..., concelho ...; · Que este prédio está onerado com uma servidão de passagem, constituída por usucapião, a favor do seguinte prédio da requerente: prédio rústico composto de vinha, denominado ..., sito na freguesia ..., concelho ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ...48 e descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o n.º ...19; · Que, em Maio de 2022, os requeridos deram em atravessar pedras de xisto no leito do caminho, junto à estrema do prédio da autora, impedindo-a de entrar com tractores, carrinhas e máquinas agrícolas no seu prédio; · Que a requerente sempre que pretendia deslocar-se ao seu prédio com carrinhas ou tractores removia as ditas pedras e passava; · Que, em finais de Fevereiro de 2023, os requeridos colocaram um amontoado de pedras de grande dimensão no leito da servidão, pedras que, pelo seu peso, a requerente e os seus trabalhadores não conseguem remover e que, por isso, a impedem em absoluto de aceder ao seu prédio com carrinhas, tractores e máquinas agrícolas; · Que, igualmente por meio de máquinas, os requeridos, revirando terras e pedras, desfizeram a servidão numa extensão de cerca de 60 metros, contados do “Caminho ...”, em direcção ao interior do seu prédio, o que igualmente impede a circulação da requerente e dos seus trabalhadores; · Que a requerente ficou totalmente impedida de aceder ao seu prédio com carrinhas, tractores e máquinas agrícolas, sendo que mesmo a pé o acesso se tornou extremamente difícil; · Que o prédio da requerente foi reconvertido em patamares, mecanizado e replantado o ano passado (2022) e os milhares de videiras que aí se encontram precisam de cultivo, nomeadamente de limpeza de ervas infestantes, rega, adubação, corte de varas (…) actividades que exigem a utilização de máquinas e o transporte de adubos, fitofármacos e ferramentas; · Que é urgente restaurar o acesso ao prédio da requerente com tractores, carrinhas e maquinas agrícolas, pois é necessário prosseguir com as operações de cultivo, temendo a requerente que se assim não for as jovens plantas/videiras não sobrevivam e se perca a totalidade da plantação; · Que além disso, tendo a reconversão da exploração sido realizada com recurso a apoio financeiro sob alçada do IFAP o cultivo tem de ser mantido, tal como decorre do artigo 20.º da Portaria n.º 323/2017, de 26 de Outubro, sob pena de a requerente entrar em incumprimento do projecto, temendo ser obrigada a repor definitivamente ao IFAP o apoio recebido no montante de €17.07; · Que as chuvas do passado Inverno, associadas ao facto de solo do prédio da requerente ainda se não encontrar suficientemente compactado em virtude de ter sido surribado apenas no ano anterior, levaram à ocorrência de várias derrocadas nos patamares existentes no prédio da requerente e, além disso, à queda de um muro de grande dimensão, numa extensão de cerca de 10 metros, precisamente sobre o prédio dos requeridos; · Que dadas essas derrocadas muitas videiras ficaram desenterradas, outras soterradas, vários esteios tombaram e muitos arames ficaram sem suporte e por isso impedidos de desempenhar a sua normal função, sendo imperioso realizar urgentemente todas as reparações, temendo a requerente que se assim não for fique irremediavelmente comprometido o crescimento e o desenvolvimento das videiras afectadas.

No despacho liminar, o Meritíssimo juiz do tribunal a quo, considerando que se estava perante procedimento cautelar de restituição provisória da posse – concretamente de restituição provisória da posse de caminho de passagem – e que a notificação e audição dos requeridos colocaria em risco o êxito da providência, determinou que os autos prosseguissem com dispensa da audiência prévia dos requeridos.

Notificada, a requerente veio alegar que o procedimento cautelar era um procedimento cautelar comum, de acordo com o previsto no artigo 379.º do CPC, e não o procedimento cautelar de restituição provisória da posse. Sob a alegação de que não compreendia a referência que o despacho liminar havia feito ao artigo 378.º do CPC, requereu se esclarecesse se o procedimento havia sido distribuído como restituição provisória da posse e, em caso negativo, a razão de ser da referência ao artigo 378.º do CPC. O Meritíssimo juiz do tribunal a quo esclareceu que a denominação do procedimento como restituição provisória da posse decorreu do enquadramento jurídico atribuído pelo tribunal, tendo em conta que, do teor do articulado, sobressaíam todos os elementos factuais relativos ao procedimento de restituição provisória da posse, concretamente a posse, o esbulho e a violência. Mais esclareceu que o tribunal entendeu que seria esse o interesse da autora e não o de percorrer a via do procedimento cautelar comum, pois que, como se referia no artigo 379.º, tal via apenas era admissível no caso de não ocorrerem as circunstâncias previstas no artigo 377.º do CPC, o que não se verificava no caso. Por fim afirmou que, tendo presente todos os referidos elementos factuais alegados, não poderia o tribunal admitir a via cautelar comum, pois que, como se referia no artigo 379.º, tal via apenas era admissível no caso de não ocorrerem as circunstâncias previstas no artigo 377.º; o que não se verificava no presente caso.

Após a produção da prova indicada pela requerente, foi proferida decisão que, julgando procedente o procedimento cautelar, ordenou aos requeridos que colocassem o caminho identificado em 13.º do elenco dos factos provados, concretamente o caminho (situado no prédio dos requeridos) que permite a ligação entre o denominado “Caminho ...” e o prédio da requerente, com uma extensão de 100 metros e uma largura média de 3,5 metros, desenvolvendo-se em curva, de nascente para sul, até à estrema do prédio da requerente, junto à estrema deste com o prédio de DD, no estado em que se encontrava, alisando e compactando o seu leito de passagem e dele removendo as pedras e o muro que aí colocaram, de modo que pelo mesmo a requerente possa circular e aceder ao seu prédio com tractores, carrinhas e máquinas agrícolas e os condenou respeitar o direito da requerente, abstendo-se de praticar qualquer que impeça o dificulte a passagem da requerente pelo caminho referido anteriormente.

O recurso Notificados da decisão, os requeridos interpuseram recurso de apelação, pedindo a revogação da decisão ou, caso assim se não entendesse, a sua alteração no seguinte sentido: ordenar aos requeridos que colocassem o caminho identificado em 13º do elenco dos factos provados, concretamente o caminho [situado no prédio dos requeridos) que permite a ligação entre o denominado “Caminho ...” e o prédio da Requerente, com uma extensão de 100 metros e uma largura média de 3,5 metros, desenvolvendo-se em curva, de nascente para sul, até à estrema do prédio da requerente, junto à estrema deste com o prédio de DD, no estado em que se encontrava, alisando e compactando o seu leito de passagem e dele removendo as pedras e o muro que aí colocaram, de modo que pelo mesmo a requerente possa circular e aceder ao seu prédio com tractores, carrinhas e máquinas agrícolas entrando no seu prédio, transpondo a recorrida o prédio dos recorrentes para o seu prédio a pé, apeada apenas, ela e ou os seus trabalhadores nos termos e forma descritas nos factos dados como provados 16º, 17º e 18º supra”.

Os fundamentos do recurso expostos nas conclusões consistiram em síntese: Em primeiro lugar, na alegação de que não se verificava o principal requisito da restituição provisória da posse, concretamente a posse do direito de transposição do prédio dos recorrentes para o prédio da recorrida com tractores, carrinhas e máquinas agrícolas.

Na hipótese de não proceder a alegação anterior, imputou à sentença recorrida as causas de nulidade previstas nas alíneas c) e e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC; Na hipótese de não proceder a arguição de nulidade da sentença, alegou que não se verificavam os requisitos previstos nos artigos 377.º e 378.º, ambos do CPC.

Por último, para a hipótese de assim se não entender, a sentença era de substituir pela seguinte decisão: ordenar aos requeridos a colocar o caminho identificado em 13º do elenco dos factos provados, concretamente o caminho [situado no prédio dos requeridos) que permite a ligação entre o denominado “Caminho ...” e o prédio da requerente, com uma extensão de 100 metros e uma largura média de 3,5 metros, desenvolvendo-se em curva, de nascente para sul, até à estrema do prédio da requerente, junto à estrema deste com o prédio de DD, no estado em que se encontrava, alisando e compactando o seu leito de passagem e dele removendo as pedras e o muro que aí colocaram, de modo que pelo mesmo a requerente possa circular e aceder ao seu prédio com tractores, carrinhas e máquinas agrícolas entrando no seu prédio, transpondo a recorrida o prédio dos recorrentes para o seu prédio a pé, apeada apenas, ela e ou os seus...

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