Acórdão nº 7815/18.1T8CBR-C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelJOSÉ AVELINO GONÇALVES
Data da Resolução27 de Junho de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Processo n.º 7815/18.1T8CBR-C1 (Juízo Central Cível de Coimbra - Juiz ...

) Acordam os Juízes da 1.ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra: 1. Relatório AA, portuguesa, divorciada, titular do Cartão de Cidadão nº ..., NIF sob o nº ..., residente à Avenida ..., ..., Distrito ..., deduziu em 18-10-2018 accão declarativa em processo comum de responsabilidade civil contra A... – Companhia de Seguros, S.A., NIPC ..., Avenida ..., ..., ..., ..., pedindo que: i) seja excluída ou declarada nula cláusula do contrato de seguro que fixa a cessação da cobertura do seguro em situações de invalidez absoluta e definitiva aos 60 anos, mantendo todo o restante válido; ii) e nessa decorrência seja condenada a ressarcir a autora dos prémios por esta pagos desde a data do acidente (16 de dezembro de 2015) no valor total de 8.432,39€ (oito mil e quatrocentos e trinta e dois euros e trinta e nove cêntimos) até à presente data, montante que deverá ser atualizado com juros até o término do processo; iii) e a ré condenada ao pagamento do crédito à habitação remanescente no valor de 42.709,02 € (quarenta e dois mil e setecentos e nove euros e dois cêntimos) à presente data, valor este que deverá ser atualizado à data do término do processo; iv) quantias acrescidas de juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento, pretendendo a cobertura de contrato de seguro vida, relativamente a acidente profissional que lhe causou, alegadamente, um estado de invalidez absoluta e definitiva, o reconhecimento da validade do contrato e o pagamento do crédito à habitação – na sequência de sinistro sofrido pela mesma e que a apólice devia cobrir, sendo que o acidente ocorreu em 16/12/2015 e a abertura do processo de sinistro foi realizada na data de 10 de Abril de 2018 e a resposta negativa proferida em Maio de 2018, alegando para tanto: a) no dia 16 de Dezembro de 2015, enquanto trabalhava como assistente operacional da Escola Básica e Secundária ... – ..., foi vítima de um grave acidente de trabalho, quando se deslocava no interior da escola, em passeio destinado à circulação de peões, consubstanciado em atropelamento por um veículo ligeiro de mercadorias que, ao fazer marcha atrás, veio embater na parte posterior do seu corpo, provocando a queda no solo e graves traumatismos no membro superior direito e no membro inferior esquerdo, entre outras lesões; de seguida, foi assistida no local por uma equipa de emergência médica, que a transportou ao Serviço de Emergência do Centro Hospitalar e Universitário de ... e já sob cuidados médicos, foi detetada fratura exposta dos ossos da perna esquerda e fratura do úmero direito, motivo pelo qual foram necessárias duas intervenções cirúrgicas e o internamento; posteriormente, foi transferida para o Centro de Reabilitação ..., onde esteve internada até 14 de Março de 2016, deslocando-se ainda com recurso a uma cadeira de rodas, foi reencaminhada para a Casa de Repouso ..., a fim de dar continuidade ao seu tratamento pós-cirúrgico; em meados de Abril de 2016, teve alta da consulta de Ortopedia, do Centro Hospitalar e Universitário ... mas somente em Maio de 2016 pôde deixar de utilizar andarilho e passar a andar com o auxílio de uma canadiana do lado esquerdo, dado que não podia apoiar- se com o membro superior direito; ; conforme Relatório Final de Avaliação de Dano Corporal, de 20 de Abril de 2017, o estado atual da autora, segundo o exame objetivo realizado, em termos técnicos, era: “Duas cicatrizes cirúrgicas no ombro direito. Limitação de antepulsão e abdução do ombro direito a 60º, com perda total dos movimentos de rotação. Amiotrofia deltoideia à direita. Alguns vestígios cicatriciais na perna esquerda. Cicatriz acastanhada, cirúrgica, na região maleolar interna do tornozelo esquerdo. Anquilose da articulação tibiotársica esquerda.”; acresce “necessidade ocasional de canadiana para equilíbrio da marcha; tratamentos médicos regulares: três programas anuais de fisioterapia ao membro superior direito e ao tornozelo esquerdo, cada um deles constituídos por 10 sessões e, ainda, necessidade de ajuda complementar de terceira pessoa: para assegurar as limpezas no domicílio, a confeção das refeições e o banho pessoal”; irá precisar para o resto da sua vida de uma terceira pessoa – a ser contratada – para a auxiliar nas tarefas mais básicas do dia-a-dia, como por exemplo, na sua higiene pessoal; b) acresce a ausência de apoio familiar com que a autora lida, visto que além de a mesma ser divorciada, a sua filha não reside na referida habitação, nem mesmo em ..., sendo a única a custear as próprias despesas; c) encontra-se impossibilitada de exercer permanentemente, a profissão que exercia há data do contrato de seguro e com base na qual o mesmo foi celebrado, devendo considerar-se que a mesma se encontrava, há data do acidente, coberta pelo contrato de seguro; d) ademais, somente a 23 de Janeiro de 2018, a Caixa Geral de Aposentações comunicou o resultado da Junta Médica à Autora, fixando, de forma definitiva, as lesões desta, estabelecendo uma incapacidade permanente absoluta para o exercício das suas funções e uma incapacidade permanente parcial de 48%; e) o referido seguro visava garantir o pagamento do crédito à habitação, caso ocorresse algum facto que impedisse a autora de garantir a sua capacidade de remuneração, especificamente, falecimento – cobertura principal – e invalidez absoluta e definitiva ou invalidez total e permanente – cobertura complementar; e no que toca à cobertura complementar do contrato de seguro, houve fixação de condições especiais que constam da apólice, procedendo-se no artigo 2º à distinção entre Invalidez Absoluta e Definitiva e Invalidez Total e Permanente: a pessoa segura encontra-se num estado desta última natureza quando, “em consequência de doença ou acidente, se encontrar definitivamente incapacitada de exercer a sua profissão ou qualquer outra actividade lucrativa”; e “a Pessoa Segura será considerada no estado de Invalidez Absoluta e Definitiva quando se encontrar totalmente incapaz para o exercício de qualquer actividade lucrativa e necessite de recurso à assistência sistemática e definitiva de uma terceira pessoa para os actos ordinários da vida humana” - no caso em apreço, é este tipo de invalidez que está em causa, pelo que a autora deixou de poder auferir rendimentos que lhe permitam pagar as prestações mensais do contrato de seguro outorgado.

  1. Participada a situação à ré, esta declinou a sua responsabilidade e enviou, no dia 14 de Maio de 2018, uma comunicação afirmando que não daria prosseguimento à pretensão da autora – pagamento do capital seguro –, uma vez que à data do acidente a autora tinha especificamente 60 anos e “conforme informações pré-contratuais da apólice, a garantia de invalidez cessa aos 60 anos de idade da pessoa segura”.

  2. Na sequência de tal comunicação, considerando que o documento onde constavam as informações pré-contratuais não foi assinado, nem rubricado pela autora, desconhecendo a mesma quaisquer informações relativas à cessação das garantias seguras e exclusão da cobertura do contrato de seguro, foi solicitada, a 14 de Junho de 2018, a comprovação da tomada de conhecimento por parte da Autora – com aposição de assinatura – das referidas informações pré-contratuais; h) além de não ter atendido a tal pedido, após o e-mail enviado pelo seu Mandatário, no dia 5 de Julho de 2018, alegou a ré que a apólice assinada pela Autora só cobria o risco de invalidez absoluta e definitiva até aos 60 anos e ainda que por lapso dos serviços técnicos, tal limitação da cobertura de invalidez à idade de 60 anos não foi transposta para as condições da Apólice nº ...43 que formalizou a suprarreferida proposta de seguro, invocando estar a declaração negocial eivada de erro, defendendo, assim, ser esta nula e sem qualquer efeito; i) como se depreende das cláusulas contratuais da apólice do seguro, não foi de todo especificado quando ou, in casu, a que idade da tomadora do seguro cessaria a cobertura complementar por invalidez absoluta e definitiva ou total e permanente; j) deve a ré ser condenada a indemnizar a autora mediante pagamento do crédito à habitação e ser ressarcida das parcelas mensais cobradas indevidamente à mesma pela Seguradora, desde a data do acidente – 16 de dezembro de 2015 –, as quais já somam um valor de 8.432,39€ (oito mil, quatrocentos e trinta e dois euros e trinta e nove cêntimos).

A ré contesta por excepção, invocando a nulidade parcial do contrato de seguro, e consequente absolvição do pedido; e subsidiariamente, por impugnando os fundamentos fácticos da pretensão, pugna pela sua improcedência. Assim, argumenta: --- na proposta de seguro denominada «Seguro Plano de Protecção ao Crédito à Habitação – Proposta de Subscrição», subscrita e assinada pela Autora em 30 de Dezembro de 2009, declarou a mesma na alínea a) do campo «Condições de Subscrição»: “Mais declara ter recebido as INFORMAÇÕES PRÉ-CONTRATUAIS da Apólice de Seguro, parte integrante desta Proposta de Subscrição”. – cf. Doc. 1 da contestação; --- por seu turno, no campo «Quando cessam as garantias seguras» das INFORMAÇÕES PRÉ-CONTRATUAIS do PLANO DE PROTECÇÃO AO CRÉDITO À HABITAÇÃO entregues nessa data à Sra. D. AA, estabelece-se: “Relativamente à cobertura de INVALIDEZ ABSOLUTA E DEFINITIVA, esta cessa, relativamente a cada uma das Pessoas Seguras, aos 60 anos”. - Cfr. Doc. 5 junto à petição inicial.

--- os artigos 18º a 23º da Lei do Contrato de Seguro prevêem obrigatoriedade de prestar ao segurado as informações aí elencadas, mas não obrigam a seguradora a recolher do segurado um exemplar das informações pré-contratuais assinadas por este; estabelece sim o artigo 21º que “A proposta de seguro deve conter uma menção comprovativa de que as informações que o segurador tem de prestar foram dadas conhecer ao tomador do seguro antes de este se vincular”, e esta menção constava da proposta de seguro que foi subscrita e assinada...

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