Acórdão nº 397/23 de Tribunal Constitucional (Port, 14 de Junho de 2023

Data14 Junho 2023
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 397/2023

Processo n.º 149/2023

3ª Secção

Relatora: Conselheira Joana Fernandes Costa

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (doravante, «LTC»), do acórdão proferido por aquele Tribunal, datado de 23 de janeiro de 2023, que declarou nulo e de nenhum efeito o despacho proferido no âmbito do processo com o n.º 1420/11.0T3AVRL.G1, do Tribunal Judicial da Comarca de Bragança - Juízo Central e Criminal de Bragança - Juiz 4, bem como o recurso que desse despacho foi interposto e a decisão que o admitiu.

2. Através da Decisão Sumária n.º 131/2023, decidiu-se, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78.º-A, n.º 1 da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso.

Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«3. Admitido o recurso, cumpre apurar, antes de mais, se é possível conhecer o seu objeto, uma vez que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal Constitucional (artigo 76.º, n.º 3, da LTC). Um recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC deve preencher desde logo os seguintes pressupostos: além de ter esgotado as vias de recurso ordinário admitidas, um recorrente deverá ter suscitado, durante o processo e de forma adequada, uma questão de constitucionalidade que corresponda ao objeto do recurso e incida sobre normas jurídicas que tenham constituído ratio decidendi da decisão recorrida. Compulsados os autos, verifica-se que o objeto do presente recurso não pode ser conhecido.

4. Para além de a pretensão recursiva não ostentar o necessário teor normativo, mas de se reportar antes à decisão recorrida em si mesma considerada – sendo a inconstitucionalidade imputada, não a autênticas normas, mas ao próprio tribunal recorrido, por exemplo quando ali se alude à «inconstitucionalidade cometida pelo Tribunal da Relação», não se afigura satisfeito o pressuposto de as questões de constitucionalidade terem sido suscitadas de modo prévio perante o tribunal a quo em termos de ele ficar vinculado a conhecê-las.

O próprio recorrente admite que as questões de constitucionalidade que integram no seu recurso não foram colocadas ao tribunal a quo anteriormente à prolação daquele que aqui constitui o acórdão recorrido. A inobservância deste pressuposto comporta a ilegitimidade para a ulterior interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos do disposto no artigo 72.º, n.º 1, alínea b), e n.º 2, da LTC.

O recorrente argumenta que se tratou de uma «decisão surpresa», o que o dispensaria de ter observado aquele pressuposto processual. No entanto, não mobiliza argumentos para demonstrar a objetiva imprevisibilidade da aplicação do enunciado indicado no recurso de constitucionalidade. A interpretação reiterada deste Tribunal Constitucional quanto ao pressuposto da suscitação prévia e adequada – que se configura, note-se, como um ónus processual que a LTC faz impender sobre os recorrentes – é a de a sua observância poder ser dispensada apenas em casos de imprevisibilidade objetiva: crucial é, não que um dado recorrente (e, porventura, outros sujeitos ou intervenientes processuais) tenha(m) logrado antecipar a aplicação das normas em causa na decisão a proferir e em face dos específicos autos em questão, mas que não fosse possível a qualquer recorrente, nessas circunstâncias, antecipá-la. O que bem se compreende, pois de outra forma a legitimidade para recorrer para este Tribunal ficaria dependente de uma avaliação insustentavelmente subjetiva da capacidade e diligência de cada interveniente processual para antecipar a aplicação de determinada norma pelo tribunal recorrido; além de que beneficiaria tanto mais um recorrente quanto menor fosse essa sua diligência.

Da configuração deste pressuposto como ónus processual decorre que é ao próprio recorrente que incumbe demostrar – v.g., por referência à doutrina ou a jurisprudência prolatada em casos semelhantes – que não lhe era objetivamente possível antecipar tal aplicação, o que não acontece no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade aqui em apreço».

3. Inconformado com tal decisão, o recorrente reclamou para a conferência, invocando para o efeito os seguintes fundamentos:

«[…] A., arguido e recorrente nos presentes autos e nos mesmos devidamente identificado,

Notificado no dia 1 de Março de 2023 da Decisão Sumária n.º 131/ 2023, não se conformando com a mesma, vem dela apresentar RECLAMAÇÃO À CONFERÊNCIA nos termos previstos no art.º 78.º n.º 3 da Lei do Tribunal Constitucional (L.T.C.), apresentando, para o efeito, os seguintes fundamentos:

QUESTÃO PRÉVIA – A questão do Juiz Relator Conselheiro Dr. Lino Rodrigues Ribeiro

Os Juízes do Tribunal Constitucional são designados por um período de 9 anos, nos termos do n.º 1 do art.º 21.º da L.T.C., sendo esse mandato não renovável nos termos do n.º 2 do mesmo art.º 21.º da mesma lei.

Sucede que, o Sr. Dr. Juiz Lino Rodrigues Ribeiro cessou funções, nos termos da lei, ao ter completado 9 anos após a sua tomada de posse que ocorreu em 20 de Junho de 2013.

É certo que o Governo e demais organismos responsáveis por eleger novo Juiz para substituição daquele que tenha atingido os 9 anos de funções ainda não ocorreu, e que esta situação abrange o atual Conselheiro bem como o Sr. Presidente do Tribunal Constitucional, Dr. Pedro Machete.

E que, ainda que a lei diga, no final do n.º 1 do art.º 21.º da L.T.C., que o período máximo de funções é de 9 anos, e que cessa funções com a posse do juiz designado para ocupar o respetivo lugar, a verdade é que, no período que intermedeia os 9 anos completos até à nomeação do novo juiz, toda e qualquer decisão proferida por esse mesmo juiz é ilegal pois o seu mandado encontra-se caducado.

Ultrapassados que estejam os 9 anos de mandato, cumpridos desde a tomada de posse até completar os referidos 9 anos não renováveis, toda e qualquer decisão proferida por aquele juiz para além do prazo do mandato é uma decisão nula, porque inexistente juridicamente – o que deve ser declarado.

Pelo que, por elementar cautela, invoca-se desde já a seguinte INCONSTITUCIONALIDADE:

O art.º 21.º n.ºs 1 e 2 da Lei do Tribunal Constitucional , na interpretação segundo a qual , um juiz do Tribunal Constitucional que tenha completado os 9 anos do seu mandato desde a sua tomada de posse e que não é renovável, pode continuar a proferir decisões nos vários processos que chegam ao T.C. na qualidade de juiz relator do Tribunal Constitucional para além dos referidos 9 anos de lei porque ainda não foi designado juiz para ocupar tal lugar é inconstitucional por violação do princípio da legalidade ínsito no art.º 3.º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa.

Não se pode aceitar que se abram exceções desta magnitude.

O mandato de 9 anos é não renovável, pelo que, a partir do momento em que estes já se completaram, qualquer tolerância para a nomeação de novo juiz não poderá exceder os meros 30 dias, ao contrário do que aqui sucede que já se arrasta ad eternum, não servindo de justificação para o não cumprimento da lei as entidades responsáveis não terem designado novo juiz.

Aceitar-se isto, é aceitar-se um regime totalitarista, em que de facilitismo em facilitismo, justifica-se o não cumprimento do preceituado na lei, invocando-se desculpas governamentais para o não cumprimento das leis em vigor.

Quando o Legislador designou a caducidade dos mandatos aos 9 anos de funções, quis precisamente que não fosse possível que um Juiz, ultrapassado o tempo estipulado por lei, continuasse a proferir decisões.

E no presente caso, o Exmo. Sr. Juiz Conselheiro não tem poderes constitucionais, porque caducados, para emitir decisões em nome do Tribunal Constitucional, desde Junho de 2022 – o que se invoca – padecendo a Decisão Sumária de nulidade porque emitida, com o devido respeito, por quem, à data da emissão da mesma, já não terá poderes para tanto, sob pena de se interpretar e de se aceitar que, então o Exmo. Sr. Juiz encontra-se com mandato renovado por comissões de 6 meses, sucessivas, até vir a ser nomeado um qual quer outro juiz que ocupe o seu lugar.

O n.º 2 do art.º 21.º da L.T.C. é taxativo quando diz que “o mandato dos juízes do Tribunal Constitucional não é renovável.”

Não sendo renovável, completados os 9 anos cessou imediatamente as suas funções como juiz ativo, aguardando apenas a nova nomeação.

Sob pena de ser entendido que as entidades que são responsáveis por nomear novos juízes, ainda não o fizeram porque isso lhes agrada ou é por qualquer forma conveniente, arrastando, portanto, no tempo nova nomeação.

Situação que não se pode aceitar. Completados que estejam os 9 anos estipulados, nenhum Sr. Juiz poderá continuar a proferir decisões sumárias ou outras de outra natureza na qualidade de Relator, pois caducou o seu mandato, sendo intolerável e inaceitável que o continue a fazer, eternizando-se a sua estadia no Tribunal Constitucional, quando a lei proíbe a renovação, e a partir do momento em que completou os 9 anos, todo o período de tempo que ali permaneça, é apenas comparável às comissões de serviço de três meses que se vão renovando e renovando sucessivamente, ad et ernum.

Sobejam as justificações para as ilegalidades que estão constantemente a ser perpetradas pelos organismos e até pelo Estado, seja com as...

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