Acórdão nº 0169/22.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelNUNO BASTOS
Data da Resolução21 de Junho de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1. Relatório A..., SGPS, S.A., com o número de identificação fiscal ..., com sede na Rua ..., ..., ..., piso 3, ... ..., veio, ao abrigo do disposto nos artigos 25.º e 26.º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro [doravante “RJAT”], e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo do acórdão arbitral proferido em 14 de outubro de 2022 no processo n.º 91/2022-T do Centro de Arbitragem Administrativa, que julgou improcedente o pedido de pronúncia arbitral apresentado pela ora Recorrente, com vista à obtenção da declaração de ilegalidade da decisão de indeferimento do recurso hierárquico n.º ...19, interposto do indeferimento do pedido de revisão oficiosa n.º ...53, sobre a autoliquidação do imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (“IRC”) referente ao período de tributação de 2011.

Com a interposição do recurso apresentou alegações e formulou as seguintes conclusões: «(…) i.

A questão de Direito em que, no entender da Recorrente, existe oposição de julgamento entre a decisão recorrida e a decisão fundamento, pode ser assim sumariada: No caso de uma autoliquidação que tenha sido aplicada pelo Contribuinte a metodologia da Circular n.º 7/2004 da DSIRC, o ónus de demonstrar que não há alternativa ao método presuntivo da Circular recai sobre a Administração Tributária (AT) ou sobre o Contribuinte? ii.

A esta questão respondeu o Tribunal Arbitral que: «Não se conformando o sujeito passivo com o método preconizado na circular n.º 7/2004, de 30 de março, para determinação dos encargos financeiros, suportados por uma SGPS, imputáveis à aquisição de participações sociais (os quais, de acordo com o que dispunha o art. 32º, nº 2, d o EBF não constituíam gastos fiscalmente dedutíveis), cabe -lhe o ónus da prova da concreta aplicação do capital alheio que originou encargos financeiros no exercício em causa, de forma a permitir concluir em que medida não foram utilizados na aquisição de participações sociais, ou seja, em que medida correspondem a gastos fiscalmente dedutíveis.».

iii.

Quanto a esta matéria, a decisão arbitral recorrida está em frontal oposição com a decisão dada processo n.º 465/2018-T do CAAD: «(ao contrário do alegado pela Requerida, o ónus da prova da impossibilidade de recurso a método directo impendida sobre si (AT) e não foi satisfeito, no caso em apreço, acabando por confirmar as autoliquidações fixadas com base no recurso aos métodos indiretos fixados na Circular n.º 7/2004.

iv.

Em ambos os casos a Requerente fez aplicação dos critérios da Circular n.º 7/2004 nas suas declarações de rendimentos; ulteriormente a presentou pedidos de revisão oficiosa dos atos tributários de autoliquidação; e perante o indeferimento dos referidos pedidos de revisão oficiosa, interpôs recurso hierárquico que veio a ser indeferido pela AT.

v.

Estão plenamente verificados os pressupostos processuais de admissibilidade do recurso, previstos no artigo 152.º do CPTA, subsidiariamente aplicável por remissão do artigo 25.º, n.º 3 do RJAT, no caso concreto, i) existe uma contradição de julgamento em decisões proferidas pelo CAAD; ii) tal contradição recai sobre a mesma questão fundamental de Direito e verifica -se a identidade substancial dos pressupostos de facto; iii) a decisão impugnada e a decisão fundamento transitaram em julgado; iv) não existe conformidade da orientação perfilhada na decisão impugnada com a jurisprudência mais recentemente consolidada no STA».

Concluiu pedindo fosse concedido provimento ao recurso admitido e fosse anulada a decisão recorrida.

O recurso foi admitido, com efeito suspensivo da decisão arbitral recorrida.

Foi cumprido o disposto no artigo 25.º, n.º 5, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária.

A Recorrida apresentou contra-alegações, que condensou nas seguintes conclusões: I.

Em causa no presente recurso está a decisão arbitral proferida no processo n.º 91/2022-T CAAD que julgou totalmente improcedente o pedido de anulação do ato de indeferimento do Recurso Hierárquico apresentado contra a decisão de indeferimento do pedido de Revisão Oficiosa, respeitantes à autoliquidação de IRC do período de tributação de 2011.

II.

O Recorrente defende que o acórdão arbitral recorrido entra em contradição, quanto à mesma questão fundamental de Direito, com «com diversa jurisprudência sobre a mesma temática – mormente a firmada no processo n.º 465/2018-T do CAAD».

III.

Constitui entendimento reiterado pela jurisprudência desse douto STA que, para que se tenha por verificada a oposição de acórdãos é necessário que (i) as situações de facto sejam substancialmente idênticas, (ii) haja identidade na questão fundamental de direito, (iii) se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta (iv) que a oposição decorra de decisões expressas e não implícitas e (v) que a orientação perfilhada na decisão recorrida não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.

IV.

O Tribunal a quo apreciou factualidade respeitante a contratos de financiamentos onerosos, que, alegadamente estariam na origem dos encargos financeiros suportados em 2011 e que se encontrariam associados à concessão de financiamento à acionista da Recorrente - o Grupo A... SGPS - e à aquisição de passivo do Grupo C....

V.

Tendo o douto Tribunal arbitral considerado, quanto à fundamentação da decisão da matéria de facto, o seguinte: «A prova destes factos resulta de documentação junta aos autos, em especial cópias de documentos que integram a contabilidade da Requerente (discriminados em notas de rodapé).

A correspondência à verdade da contabilidade da Requerente, bem com a fidelidade das cópias/transcrições por esta feitas não foi posta em causa pela Requerida.

A prova testemunhal, que se reconduziu a meras generalidades, não contribui para a formação da convicção do tribunal.» VI.

Prosseguindo no julgamento da matéria de facto, o Tribunal a quo indicou os factos não provados, de acordo com a análise pormenorizada da prova documental junta aos autos, referindo que «Este tribunal arbitral entende não ter sido feita prova suficiente destes factos, não podendo os mesmos ser considerados como provados por mera inferência lógica dos factos dados como provados».

VII.

O acórdão fundamento apreciou factos respeitantes à dedutibilidade de gastos de financiamento associados à realização de prestações suplementares ou acessórias e à cobertura de prejuízos por conversão de prestações acessórias ou suplementares, esclarecendo que: «O Tribunal não formula juízo probatório sobre a forma de aquisição das participações sociais detidas pela Requerida e encargos financeiros por ela eventualmente suportados com a sua aquisição, uma vez que, como melhor será analisado mais adiante, atenta a fundamentação que presidiu às decisões de indeferimento dos recursos hierárquicos, indeferimento do pedido de revisão oficiosa e da reclamação graciosa, a questão colocada é essencialmente de direito e deriva da errada aplicação pela Requerida da Circular n.º7/2004, segundo jurisprudência do STA, em especial no que concerne ao ónus da prova.».

VIII.

Assim, não sendo as situações de facto idênticas e sendo distintos quer os meios de prova produzidos, quer a valoração dos mesmos no julgamento da matéria de facto, não existe oposição entre as decisões recorrida e fundamento que deva analisada à luz do recurso para uniformização de jurisprudência.

IX.

O Tribunal a quo decidiu a questão submetida à sua apreciação aduzindo a seguinte fundamentação: «Em resumo, cabia à Requerente produzir prova da concreta aplicação do capital alheio que originou encargos financeiros no exercício em causa, de forma a permitir ao tribunal concluir em que valor tais recursos não tinham sido utilizados na aquisição de participações sociais, em que medida tais encargos financeiros correspondiam a gastos fiscalmente dedutíveis.

O ónus de tal prova incidia, indubitavelmente, sobre a Requerente, desde logo porquanto a AT, da decisão do recurso hierárquico, havia, fundadamente, estabelecido a dúvida sobre a concreta aplicação dos montantes obtidos através de mútuos por ter concluído – tal como este tribunal arbitral veio também a concluir – pela insuficiência da documentação apresentada.» (negrito nosso).

X.

A decisão arbitral fundamento considerou que «o ónus da prova da impossibilidade de recurso a método directo impendida sobre si (AT) e não foi satisfeito, no caso em apreço, acabando por confirmar as autoliquidações fixadas com base no recurso aos métodos indiretos fixados na Circular n.º 7/2004.» XI.

E no que respeita à alegada ilegalidade da metodologia prevista na Circular n.º7/2004, consignou o Tribunal arbitral, quanto aos atos de indeferimento da revisão oficiosa e do recurso hierárquico, que «as decisões administrativas aqui em causa (da revisão oficiosa e do recurso hierárquico) não se fundamentaram na vinculação da Requerente ao preconizado na circular em questão. Tão só concluíram que a utilização de outro método (que poderemos designar por imputação especificada) implicaria um ónus da prova que o contribuinte não teria logrado cumprir».

XII.

O acórdão fundamento, que apreciou decisões proferidas em procedimentos de revisão oficiosa e de reclamação graciosa, entendeu que «em todos os casos a AT se considerou obrigada a aplicar os critérios contidos na Circular.» XIII.

Pelo que, não foi apreciada a mesma questão fundamental de direito em idênticas situações de facto, inexistindo qualquer oposição de soluções jurídicas.

XIV.

O Tribunal a quo procedeu ao julgamento da matéria facto, de acordo com a pretensão das partes e a prova que as sustenta, não podendo obviamente prescindir da aplicação da regra sobre a repartição do ónus da prova, prevista no artigo 74.º da LGT.

XV.

E é esta decisão, de...

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