Acórdão nº 0147/20.7BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 15 de Junho de 2023

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução15 de Junho de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: 1.

Relatório 1.1.

AA, Procuradora da República, vem propor AÇÃO ADMINISTRATIVA, ao abrigo do art. 37º CPTA e art. 24º, nº 1, a), IX, do ETAF contra o CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO (CSMP), impugnando a deliberação do Plenário de 15 de Setembro de 2020, que lhe atribuiu a classificação de “BOM COM DISTINÇÃO”, indeferindo a sua reclamação e confirmando a Deliberação de ..., da Secção de Classificação do CSMP, pedindo (i) a sua anulação e a (ii) condenação da entidade demandada a emitir nova classificação de serviço de Muito Bom, com fundamento em: “

  1. Ilegalidade por erro nos pressupostos de facto.

  2. Ilegalidade por Violação de lei - art.º 139º do EMP aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27 de Agosto, Violação do art.º 21º do Regulamento n.º 17/2002.

  3. Ilegalidade por violação dos princípios gerais da proporcionalidade, da igualdade e da justiça, consagrados nos artºs 6º 7º e 8º do CPA e no art.º 266º da Constituição da República.” 1.2. Para tal, invoca nomeadamente, o seguinte: - A A., procuradora da república junto do Juízo de Família e Menores ..., desde 04.09.2017, após a sua colocação, como auxiliar, na Comarca .../..., Família e Menores, foi sujeita a inspeção ordinária, que teve por objeto o período compreendido entre 8.07.2015 e 7.07.2019 [de 8.07.2015 a 30.08.2017 relativamente à atividade exercida nos Juízos de Família e Menores ... e entre 4.09.2017 a 7.07.2019, de ...; - Durante a sua carreira de 32 anos nas várias jurisdições, o seu trabalho foi objeto de 3 inspeções – em 22.04.1988 (classificação “BOM”), 23.01.2003 (classificação “BOM”) e 17.03.2009 (classificação “BOM COM DISTINÇÃO”), pelo que mediou 10 anos entre a última inspecção e a inspeção sub judice, período durante o qual foi promovida a procuradora da República (em 12.7.2013); - A inspecção ordinária ao trabalho da A. culminou com o acórdão de … da Secção para Apreciação do Mérito Profissional do CSMP, que - com 2 votos contra – concluiu que “(...) Estamos, sem sombra de dúvidas, perante uma magistrada de mérito, cujo exercício do cargo transcende o normal, mas que não revelou ainda, de modo consistente e reiterado, no exercício das suas funções, um nível excepcional, especiais qualidades de iniciativa, inovação e criatividade, em síntese, o brilhantismo e a excecionalidade, enquanto elementos diferenciado e condições indispensáveis para obter a classificação de Muito Bom (art.ºs 20º e 21º do RIMP).”(...)” e lhe atribuiu a classificação “BOM COM DISTINÇÃO”. (Doc.... anexo Contestação) - A A. reclamou dessa deliberação, nos termos do art. 34º, nº 8 do Estatuto do Ministério Público (invocando “os vícios A) Preterição de formalidade de notificação (violação do nº 2 do art.º 17º do Regulamento das Inspecções do Ministério Público (RIMP)).B) Erro sobre os pressupostos de facto:- Erro na contagem dos processos movimentados; Erro na contagem e apreciação dos processos inspeccionados, por terem sido considerados processos de outros magistrados, consequente erro na classificação da qualidade do trabalho por este não ser da autoria da inspeccionada; Erro na contagem e valorização nas acções de formação e C) Erro na classificação.”) para o Plenário do Conselho Superior do Ministério Público, que, por acórdão de 15.09.2020, manteve a decisão reclamada, com a seguinte fundamentação: “a) A formalidade prevista no artº 17º nº 1 do RIMP foi desvalorizada por não afectar a validade do acto praticado, dado ser considerada não essencial.

  4. Considerado irrelevante o erro sobre as contagens e estatística processual e a confusão de serviço entre o que foi prestado pela avaliada e a colega que lhe sucedeu, sendo justificadas as imprecisões e inexatidões por motivos de mau funcionamento informático, (...) reconhecendo-se que existiu intenso labor da Senhora Magistrada (...)”, sendo o volume de trabalho apenas um dos aspectos a considerar na avaliação. c) Não houve erro na avaliação, porque, não obstante se estar perante uma magistrada de mérito, cujo exercício do cargo transcendeu o normal exercício de funções, não revelou de modo consistente, especiais qualidades ou brilhantismo como elemento diferenciador e condição indispensável para obter a classificação de Muito Bom. (Mantendo a decisão e fundamentos da Secção)”.

    - O procedimento de inspeção e os critérios classificativos estão definidos de forma vinculada (art.s 139º e 140º EMMP e art.s12º a 14º e 20º e 21º RIMP).

    - A A. contesta a fundamentação do acórdão recorrido, no que respeita à afirmação de que as matérias com que teve de lidar “não são especialmente complexas, tendo a mesma tido um desempenho adequado sem erros a assinalar, dando resposta célere mas sem especial brilhantismo”, pois “para além da multiplicidade de áreas, a Jurisdição de Família e Menores é multifacetada e complexa na mesma medida em que se exige a presença e intervenção do Mº Pº.

    Na Jurisdição de Família e Menores o M° P° assegura: -a tramitação dos processos da secção e suas diligências, -os PA, as autorizações do DL 272/02, -o controlo das decisões das CRC, -a coadjuvação e controlo dos processos das CPCJ, -a instauração das ações de RRP, -alimentos e -incumprimentos, -investigações e impugnações de paternidade, -os PPP, -os PTE, -o atendimento ao público, -preside obrigatoriamente às inquirições dos menores nos PTE.” - Afirma a A. que tendo sido inicialmente desconsiderado um acréscimo de trabalho, foi posteriormente corrigido o erro, mas não foi ponderado, tal como outro trabalho significativo desenvolvido, e o relatório de inspecção afirma tratar-se de magistrada expedita e célere, evidenciando boa capacidade de resposta, tendo os atrasos, compreensíveis face ao volume de trabalho, registados.

    - O ato recorrido desvalorizou o regime de acumulação de funções, considerado irrelevante, por ter uma duração reduzida, mas uma vez que movimentou 321 processos, sendo a movimentação processual um dos critérios da classificação, o ato está eivado do vício de erro sobre esse pressuposto, gerador da sua invalidade.

    - O CSMP deliberou que o trabalho da A. mereceu a classificação de mérito mas não chegou ao Muito Bom por falta de excepcionalidade e brilhantismo (conceitos vagos e abertos).

    - O relatório da inspeção faz apelo a várias qualificações da A. no desempenho das suas funções, que sustentam o caráter excecional do trabalho, o que vai ao encontro da declaração de voto de vencida constante do acórdão recorrido.

    - Mesmo que se considerasse que a Administração detém alguma margem de livre apreciação, o ato seria ilegal por violação dos princípios gerais da atividade administrativa consagrados no artº 266º nº2 da CRP e nos artºs 3 e sgs do CPA.

    1.3 O Conselho Superior do Ministério Público contestou pugnando pela improcedência da acção, alegando: - Resulta do Relatório da Inspecção e do acórdão recorrido, que foi reconhecido à A. a grande quantidade e qualidade do trabalho desenvolvido, a experiência, o empenho e eficácia que ia para além do exigível, que os recursos jurisdicionais que interpôs tiveram sempre provimento, “explanando de forma consistente os seus pontos de vista, tendo evidenciado boa capacidade de argumentação”.

    - Foram-lhe apontadas falhas nos pareceres no âmbito do exercício do poder paternal, por serem sintéticos e tabelares tal como no tocante às alegações respeitantes ao art. 114º da Lei de proteção de crianças e jovens em perigo.

    - O relatório da inspeção concluiu que a A.

    “demonstrou uma prestação que ultrapassa a quantidade e a qualidade do serviço desenvolvido pela senhora magistrada nas diversas perspetivas da sua prestação funcional, a experiência que já leva nesta jurisdição, o empenho e a eficácia que colocou no seu exercício e as demais qualidades profissionais que apresentou, justificam e fundamentam a afirmação que demonstrou uma prestação que ultrapassa o cumprimento cabal e efetivo das suas funções.” - O acórdão da Secção de Classificação entendeu que as peças recursivas não apresentavam cuidada e organizada, limitando-se, por regra a aderir aos fundamentos das decisões recorridas.

    - Foi considerada e ponderada a totalidade e a quantidade de serviço prestado, incluindo os processos inicialmente e indevidamente atribuídos, por lapso, a outra magistrada, reconhecendo o seu papel significativo na redução da pendência processual, inexistindo qualquer falta de rigor, pelo que não houve qualquer ilegalidade ou violação de lei.

    - Concluiu o acórdão recorrido que a A. não apresentava “especiais qualidades de investigação, inovação, organização, produtividade e eficiência invulgares”.

    - O processo de inspeção iniciou-se e completou-se no domínio do EMP revogado, tendo sido aplicadas essas regras então em vigor, apesar da deliberação impugnada ter sido proferida já na vigência do actual EMP.

    - Não se verifica erro sobre os pressupostos de facto ou de direito, na fundamentação do ato, não houve violação dos princípios nomeadamente da justiça, da proporcionalidade (art.s 266º CRP e 7º CPA) e da igualdade (art.s 13º, nº 2 CRP e 6º CPA) e não se baseou em erro grosseiro.

    - O CSMP, embora vinculado ao dever de justiça, dispõe de uma margem de liberdade quando elege os parâmetros classificativos em vigor e na efetiva valoração do desempenho.

    - No respeitante ao pedido de condenação do CSMP a atribuir-lhe a classificação de Muito Bom, escapa ao poder jurisdicional, dada a classificação se situar no âmbito de um poder discricionário, insindicável pelo Tribunal, com exceção de erro manifesto ou grosseiro, o que não é o caso. “ Concluindo que: “. Só por erro clamoroso ou grosseiro sobre os pressupostos da deliberação impugnada, seria possível ordenar ao CSMP a sua anulação e modificação, o que, como demonstrado, não sucede in casu (vejam Acs. do STA de 03.11.2004, processo n.º 0329/04, de 17.04.2013, recurso 1197/12, de 29.01.2014, recurso n.º 181/12, de 06.03.2014, recurso 290/12, de 24/03/2010, no proc. n.º 0511/06...

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