Acórdão nº 0677/20.0BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Junho de 2023
Magistrado Responsável | ANABELA RUSSO |
Data da Resolução | 07 de Junho de 2023 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACÓRDÃO 1. RELATÓRIO 1.1.
A Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformada com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A..., S.A., da liquidação de IMT no valor de € 8.313,67, acrescida de juros compensatórios no montante de € 1.985,26, emitida na sequência da caducidade da isenção de que beneficiou a aquisição do prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia ... sob o artigo ...95..., por não ter sido revendido no prazo de 3 anos, interpôs recurso para este Supremo Tribunal Administrativo.
1.2.
Tendo alegado, passamos a reproduzir as conclusões com que encerra as suas alegações: «A.
A Fazenda Pública vem recorrer da douta sentença que julgou procedente a impugnação apresentada pela Impugnante e aqui recorrida A..., S.A., por considerar que a mesma padece de erro na interpretação e aplicação do direito aos factos apurados.
B.
Nos autos em referência, a Impugnante insurge-se contra a liquidação oficiosa de IMT, emitida na sequência da caducidade da isenção, por não ter revendido o imóvel adquirido no prazo de três anos, consagrado no art.º 11º n.º 5 do CIMT.
C.
A decisão do tribunal a quo julgou pela procedência da impugnação apresentada, por falta de audição prévia da Impugnante aquando da liquidação.
D.
Ora, com todo o devido respeito que temos pelo Tribunal a quo, que é sempre muito, não nos poderemos conformar com o sentido do decisório.
E.
No caso em apreço, uma vez que a Impugnante não revendeu o imóvel no prazo de três anos concedidos nos termos do art.º 7º do CIMT, verificou-se a caducidade da isenção e a consequente liquidação de imposto.
F.
Insurge-se a Impugnante contra essa liquidação, alegando que caso tivesse sido concedido o direito de audição prévia, poderia ter demonstrado que, contrariamente ao declarado na modelo 1 de IMT, afetou imediatamente o imóvel às suas instalações, pelo que teria sido possível invocar a caducidade do direito à liquidação.
Quanto ao não cumprimento do direito de participação G.
Ora, entende a Fazenda Pública que a douta sentença do Tribunal a quo incorre em erro na subsunção do direito aos factos apurados, quando refere que “No caso sub judice, não se pode considerar que a liquidação oficiosa de IMT foi efetuada com base na declaração (modelo 1 do IMT) apresentada aquando da aquisição do prédio, já que desta declaração resultava uma isenção de imposto, pelo que ao decidir-se em sentido divergente daquele que constava da referida declaração, fazendo um diferente enquadramento jurídico da questão, não podia dispensar-se a audição da Impugnante antes da liquidação.” H.
Contrariamente ao doutamente decidido, e com todo o devido respeito, que é sempre muito, entende a Fazenda Pública que no caso em apreço, não era exigida a participação do interessado.
I.
A esse propósito, consagra o n.º 2 do art. 60º da LGT que é dispensada a audição do sujeito passivo sempre que “a liquidação se efetuar com base na declaração do contribuinte”.
J.
Ora, no caso em apreço, a AT procedeu à liquidação do imposto devido com base exclusivamente e nos precisos termos constantes da declaração modelo 1, apresentada pela Impugnante.
K.
A factualidade em causa não se alterou, nem foi efetuado, salvo melhor opinião, qualquer enquadramento jurídico diferente, entre a data da aquisição do imóvel e a data da liquidação.
L.
Pelo que, entende a Fazenda Pública, sempre com todo o devido respeito, que a douta sentença aqui em apreciação errou ao considerar que a AT não estava dispensada do exercício do direito de audição do interessado.
Prosseguindo, mas sem conceder Quanto ao Princípio do Aproveitamento dos Atos Administrativos M.
Considera a Fazenda Pública que a sentença incorreu numa incorreta interpretação e aplicação das normas legais aplicáveis ao caso, violando o princípio do aproveitamento dos atos, consagrado no art. 163º n.º 5 do CPA (ex vi art. 2º al. c) da LGT).
N.
Considerou a sentença recorrida que “não se afigura que a preterição do direito de audição seja absolutamente irrelevante para o ato de liquidação em crise, já que não é de afastar a possibilidade dessa audição permitir à Impugnante influenciar a liquidação oficiosa de IMT, tanto mais que foi alegado nesta sede (e podia também sê-lo no procedimento tributário) que a caducidade da isenção de IMT teria ocorrido em momento anterior (aquando da afetação do prédio a fim diferente da revenda), com consequências ao nível da caducidade do direito à liquidação do imposto.” O.
Contudo, como a seguir melhor veremos, a audição da Impugnante nunca poderia ter influenciado o ato impugnado.
P.
Isto porque, entendemos nós que, contrariamente ao que foi decidido na sentença aqui em apreciação, ainda que a Impugnante tivesse exercido o direito de pronúncia, e aí invocado a caducidade da liquidação, a mesma nunca poderia ter sido reconhecida, face às normas legais em vigor, o que seria facilmente alcançável, face aos elementos disponíveis nos autos.
Q.
Pelo que, a eventual audição da Recorrida nunca teria a potencialidade de alterar a decisão final.
R.
Desde logo porque, conforme se extrai do Acórdão do TCA Sul proferido em 31/10/2019, no processo 2425/09.7BELRS (embora respeitante a SISA), se a AT não teve conhecimento da alteração de destino, a condição resolutiva da isenção deveria então operar não com a alteração do destino do imóvel, mas sim com o não cumprimento do prazo de três anos para a revenda.
S.
Nos termos do referido Acórdão, o cômputo inicial do prazo de caducidade do direito à liquidação do imposto só se inicia a partir da verificação do não cumprimento da condição resolutiva de revenda no prazo de três anos, uma vez que só a partir dessa data aquele direito de liquidar pode ser exercido pela Administração Tributária.
T.
Mas ainda que não fosse esse o entendimento perfilhado na sentença recorrida, uma vez que o imóvel foi adquirido (e alegadamente imediatamente utilizado como instalações), em 08/03/2012, nunca poderia ter decorrido o prazo de caducidade até à liquidação.
U.
Isto porque, não estando em causa uma liquidação adicional, o prazo de caducidade do direito à liquidação do IMT é, nos termos do artº 35º, nº 1, do CIMT, de oito anos contados da data de transmissão ou daquela em que a isenção ficou sem efeito.
V.
Ora, se atentarmos à data da apresentação da presente impugnação (03/03/2020), nem sequer tinha decorrido esse prazo de oito anos.
W.
Pelo que não se vislumbra, como refere a sentença recorrida, nem resulta da aplicação e interpretação das normas legais, de que forma a audição do sujeito passivo poderia ter influenciado a liquidação de imposto.
X.
Assim sendo, a formalidade essencial de audição do interessado, não sendo apta, como resultou da argumentação expendida em sede de impugnação, a influenciar o sentido da decisão final de liquidação, deteriora-se em formalidade não essencial, em defesa do princípio do aproveitamento dos atos processuais, não afetando o procedimento de liquidação no seu todo.
Y.
Não tendo, por conseguinte, a alegada falta de audição prévia, no entender da Fazenda Pública, a consequência invalidante que lhe foi atribuída pela douta sentença recorrida.
Z.
Sobre a obrigatoriedade de audição prévia, tem-se pronunciado a jurisprudência, de forma reiterada, tomando-se como referência o Acórdão proferido pelo STA no processo 0208/04.0BEPRT, cujo sumário refere que “em certos casos, a lei dispensa o seu cumprimento (vd. nºs 2 e 3 do art.º 60.º da LGT) e, noutros, a mesma pode degradar-se em formalidade não essencial e, portanto, ser omitida sem que daí resulte ilegalidade determinante da anulação do acto.” AA.
Assim será, “nos casos em que, estando em causa uma atividade vinculada [como é o caso da contagem do prazo de caducidade], o Tribunal concluir que a decisão não poderá ser outra que não a decisão efetivamente tomada, que seja manifesto que esta só podia, em abstrato, ter o conteúdo que teve em concreto e que, por isso se impunha, o seu aproveitamento pela aplicação do princípio geral do aproveitamento do ato administrativo.
” BB.
Pelo que se impunha ao Tribunal a quo, como se retira daquele Acórdão, “a análise das circunstâncias particulares e concretas” do caso, “com vista a aferir se se está ou não perante uma situação de absoluta impossibilidade de a decisão do procedimento ser influenciada pela audição da requerente.
” CC.
Ora, face à argumentação apresentada em sede de impugnação (que apela à caducidade do imposto), facilmente teria sido possível concluir que a decisão de liquidação do imposto nunca poderia ter sido outra, verificando-se assim uma impossibilidade absoluta de a decisão ter sido influenciada pela audição da Impugnante.
DD.
Pelo que se deverá concluir, em sentido divergente da douta sentença recorrida, pela legalidade do ato impugnado.
1.3.
A Recorrida, defendendo a manutenção do julgado, contra-alegou, concluído nos seguintes termos: «A - Atento o disposto no artº 18º do CIMT, relativo à aplicação temporal das taxas e, no que se refere à caducidade da isenção, também do valor base a considerar nas liquidações, fica prejudicada a pretendida identidade de pressupostos de liquidação entre os dados constantes da modelo 1 apresentada pelo impugnante e os elementos que, face àquela disposição legal, têm que ser observados no momento em que caduca a isenção e haverá que reportar a liquidação a efetuar.
B - De facto, com base na modelo 1, a liquidação teria que respeitar o valor, sendo que, no caso do preço de venda declarado ser inferior ao valor patrimonial que constava da matriz predial nessa data, iria prevalecer tal valor patrimonial, bem como, a taxa que, então, se encontrava em vigor.
C - Caso a isenção viesse a caducar, em razão da alteração do destino dado ao imóvel, como aconteceu, ou por via do decurso do prazo de três anos, a liquidação teria que seguir o valor patrimonial, eventualmente, e a taxa que se encontrassem em vigor à data em que tal caducidade se viesse a...
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