Acórdão nº 1328/19.1T8CTB-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 16 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelVÍTOR AMARAL
Data da Resolução16 de Maio de 2023
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra: *** I – RELATÓRIO Por apenso aos autos de execução de sentença ([1]) a correr nos próprios autos, que AA, BB e CC, com os sinais dos autos, intentaram contra DD, também com os sinais dos autos, veio esta Executada deduzir oposição, mediante embargos de executado, pedindo a sua absolvição do pedido e, caso assim não se entendesse, que fosse ordenada a suspensão da execução, pelo menos, até à efetiva celebração da compra e venda do prédio em causa, o qual já foi prometido vender, e ainda, caso assim não fosse entendido, fosse ordenada a suspensão da execução, com a cominação de Exequentes e/ou Executada terem de intentar ação judicial destinada a declarar a nulidade da partilha outorgada em 07/05/2012, com vista ao cancelamento de todos os registos efetuados com base nessa partilha, incluindo aquisição a favor dos Exequentes relativamente ao prédio urbano que identifica, sendo declarado nulo o contrato de comodato celebrado em 07/05/2012, por simulação concertada entre Exequentes e Executada.

Para tanto, alegou, e em síntese ([2]), que: - a Embargante, não obstante a transação celebrada, em 08/09/2020, nos autos principais, tem carências económicas e falta de meios para proceder a obras de reparação no prédio que lhe foi adjudicado, sendo que desconhecia o estado em que se encontrava esse prédio e que não tinha condições de habitabilidade, incorrendo, por isso, em erro na declaração; - acresce que não tem dinheiro para custear a colocação de novas instalações elétricas e quadro elétrico, sendo que os Embargados ainda não procederam à colocação de elevadores, tal como consta do ponto 4 da transação homologada por sentença, tratando-se de casa de r/c, 1.º e 2.º andares; - ocorreram dificuldades registrais e na emissão/correção de certidão judicial para justificar o facto do registo dos direitos adquiridos na transação ainda não se encontrarem elaborados.

Contestaram os Embargados, impugnando diversa factualidade alegada pela contraparte e pugnando pela total improcedência dos embargos, para o que invocaram, designadamente (quanto ao que importa ao recurso): - a obrigação de instalação de cadeira elevatória pelos Embargados (ponto 4 da transação homologada por sentença) não tem qualquer relação de dependência com aquilo a que se obrigou a Embargante (ponto 5 da mesma transação); - a não instalação dessa cadeira elevatória é imputável à própria Embargante, posto os Embargados não poderem contratar a respetiva colocação num prédio sem eletricidade, o que foi notificado àquela, termos em que inexiste incumprimento pelos Embargados; - a não obtenção do registo dos direitos adquiridos na transação resulta da inação/inércia da Embargante, que nem sequer provou a liquidação do imposto devido pela transmissão, facto essencial para proceder ao registo.

Tendo os autos prosseguido, com prolação de despacho saneador, definição do objeto de litígio e dos temas da prova, procedeu-se depois à audiência final, com produção de provas, a que se seguiu a sentença, datada de 09/12/2022, julgando procedentes os embargos, com a consequente extinção da execução ([3]).

Inconformados, os Embargados/Exequentes recorrem da sentença, apresentando alegação, onde formulam as seguintes Conclusões ([4]): «

  1. Os Recorrentes não se conformam com a sentença proferida pelo tribunal a quo em 09/12/2022, que julgou procedentes os embargos apresentados.

  2. Os Recorrente não se conformam com o erro na interpretação do acordo homologado por sentença, no sentido de que existe uma relação sinalagmática entre a desocupação do imóvel (melhor identifica em 2 na sentença homologatória – título executivo dado à execução) e a colocação da cadeira elevatória (no prédio melhor identificado em 1 na sentença homologatória – título executivo dado à execução).

  3. Inexiste sinalagma nas obrigações assumidas e a interpretação dada pelo tribunal a quo em sentido contrário não encontra qualquer correspondência na letra da transação.

  4. No acordo não se estabelece qualquer correlação entre a obrigação de abandonar o prédio e de instalar a cadeira.

  5. As partes, quando quiseram estabelecer obrigações sinalagmáticas referiram-no expressamente na transação (cfr. ponto 1 e 2).

  6. Quando as partes não quiseram estabelecer prestações sinalagmáticas, omitiram-no expressamente por não corresponder à vontade.

  7. Ainda que se entendesse que o abandono do prédio em causa estaria dependente da colocação da cadeira elevatória no outro prédio (o que admitimos por cautela de patrocínio), o tribunal a quo errou quando não imputou o incumprimento da obrigação de colocação da cadeira à Embargante.

  8. Andou mal o tribunal de primeira instância quando não deu a devida relevância probatória à tentativa dos Embargados/Recorrentes cumprirem a obrigação constante do ponto 4 da transação.

  9. Os Embargados/Recorrentes recolheram um orçamento e acertaram os termos para a instalação da cadeira com o fornecedor.

  10. Como devidamente alegado, para instalação da cadeira e colocação em funcionamento, o prestador do serviço necessitava ter eletricidade no imóvel.

  11. Consequentemente, teria que ser a Embargante (legítima possuidora e única proprietária do prédio em questão) que teria que contratar energia elétrica que permitisse a realização dos trabalhos de colocação da cadeira.

  12. A Embargante não o fez e resulta provado que [cfr. matéria de facto dada como provada em 31] foi instada a fazê-lo, sob pena de lhe ser imputável o incumprimento (artigo 790.º n.º 1 do Código Civil).

  13. Não assiste o direito ao tribunal a quo quando aceita que alegados constrangimentos registrais sejam considerados para efeitos de legitimação do incumprimento.

  14. A Embargante podia e devia ter registado o prédio em causa em seu nome.

  15. Não o fez alegando questões registrais que só por culpa própria não ultrapassou, relacionadas com a incorreta apresentação a registo junto da conservatória, pela não liquidação dos impostos devidos e por falta de pagamento dos emolumentos devidos.

  16. Além disso, como é consabido, o registo predial de transmissão de propriedade não é constitutivo de direitos no nosso ordenamento jurídico.

  17. A Embargante tinha em seu poder um documento idóneo que provava junto de qualquer entidade de fornecimento de energia que era proprietária do imóvel (sentença homologatória).

  18. A Embargante tinha ainda a predisposição expressa dos Embargados/Recorrentes para ultrapassar qualquer constrangimento junto de empresas de fornecimento de energia [cfr. ponto 31) da matéria de facto dada como provada].

  19. Não pode, assim, o tribunal de primeira instância sustentar que existe uma impossibilidade de incumprimento por causa não inimputável à Embargante.

  20. A Embargante tinha um documento idóneo para comprovar a sua propriedade junto de empresas de fornecimento de energia elétrica e apenas não procedeu à sua instalação porque não quis e porque pretendia invocar tal impossibilidade para enganar o julgador e gerar a convicção que não lhe era imputável o incumprimento.

  21. Note-se que nem por determinação do tribunal a Embargante logrou (ou tentou, pelo menos) comprovar a alegada impossibilidade (cfr. despacho de 15/07/2022, ref.ª 34834853, e despacho de 12/10/2022, ref.ª 35052558).

  22. Andou mal o tribunal a quo quando entendeu que a Embargante (i) munida de uma sentença translativa da propriedade (várias vezes corrigida para se adaptar a alegados constrangimentos registrais), (ii) que não consegue provar nos autos qualquer recusa do registo da propriedade transacionada (exceto a que tentou efetuar em vésperas da audiência de julgamento, recusado em 10/11/2022 por falta de pagamento do emolumento devido- AP. 2374 de 2022/10/17) e (iii) que, intimada para o efeito, não conseguiu provar qualquer tentativa / rejeição de contratação de energia elétrica, lhe reconheceu uma impossibilidade objetiva que não lhe pode ser imputável (!).

  23. Até o próprio empreiteiro que orçamentou as alegadas reparações de que o prédio necessitava, Sr. EE, referiu expressamente nas suas declarações que a simples colocação de um quadro elétrico possibilitaria a realização de todas as obras de remodelação.

  24. Não existe assim sustentação de facto ou direito para julgar inexigível a obrigação exequenda.

    Em suma, Y) As obrigações assumidas não são sinalagmáticas porque as partes não pretenderam (expressamente) relacioná-las dessa forma.

  25. O incumprimento da obrigação dos Embargados/Recorrente não lhes é imputável, na medida em que diligenciaram no sentido de colocar a cadeira elevatória.

    A

  26. Os Embargados/Recorrente não conseguiram colocar a cadeira elevatória porque a Embargante (de forma ardilosa e com o intuito de perverter a realidade dos factos e enganar o tribunal) não diligenciou pela colocação de eletricidade no prédio, mesmo tendo sido (comprovadamente) notificada para o efeito com cominação da imputação do não cumprimento.

    BB) Existe uma impossibilidade objetiva absoluta dos Embargados/Recorrentes cumprirem a sua obrigação, por facto imputável à Embargada, o que determina a extinção da prestação por impossibilidade objetiva, nos termos do artigo 790.º n.º 1 do Código Civil.

    Pelo alegado, provado e em face do direito aplicável, deverá o recurso de apelação ser julgado procedente e revogada a sentença proferida, fazendo-se assim a desejada justiça.

    ».

    Juntaram dois documentos com a sua peça recursiva.

    Não se mostra junta contra-alegação de recurso.

    *** O recurso foi admitido como de apelação, com subida nos próprios autos e efeito meramente devolutivo.

    Ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, foram mantidos o regime e o efeito fixados.

    Nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito da apelação, cumpre apreciar e decidir.

    *** II – ÂMBITO DO RECURSO Perante o teor das conclusões formuladas pela parte apelante – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([5]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos...

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