Acórdão nº 2239/22.9T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 18 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelEVA ALMEIDA
Data da Resolução18 de Maio de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO AA veio requerer se procedesse a inventário para partilha dos bens comuns do seu dissolvido matrimónio com BB.

O requerido veio opor-se ao inventário, alegando que o mesmo não deve ter lugar uma vez que os ex-cônjuges celebraram entre si promessa de partilha que, aliás, foi já parcialmente cumprida.

A cabeça-de-casal em suma e para o que é relevante, alegou a nulidade do contrato promessa de partilha por violação da regra da metade.

Na sequência foi proferida a seguinte decisão: «(…) A única questão que se reconhece como pertinente e até de suma importância no que é concernente à validade do contrato-promessa de partilha de bens comuns é a relativa à repartição do valor que se atribui a cada um dos cônjuges.

Os cônjuges participam por metade no activo e no passivo da comunhão, sendo nula qualquer estipulação em sentido diverso, prescreve o art.º 1730.º, n.º 1 do C.Civil.

Estabelece-se, assim, a designada regra da metade.

Avança-se que ao impor a regra da metade a ambos os cônjuges, o legislador deve ter querido evitar que um deles tentasse obter do outro um acordo injusto no sentido de uma partilha desigual, usando algum ascendente psicológico sobre este.

Por outro lado, estes acordos desiguais parecem esconder doações que o cônjuge prejudicado faz ao outro. Se for assim, esses acordos podem ser acusados de pretender fazer doações de bens comuns, contra o preceituado no art.º 1764.°, n.º 1 do C.Civil, e também por isso serão nulos – cfr. PEREIRA COELHO e GUILHERME DE OLIVEIRA, ob. cit, pp. 489.

Revertendo ao caso em concreto e à factualidade que é lícito conhecer temos que: O valor do quinhão do activo atribuído ao ex-cônjuge mulher soma o valor €. 543500,59, e o quinhão do passivo soma o valor de €. 120691,99, pelo que leva valor líquido a quantia de €.: 422808,40.

O quinhão do activo atribuído ao ex-cônjuge marido soma o valor de €.543500,59 nada lhe tendo sido atribuído em passivo.

Claramente se vê que o ex-cônjuge mulher, entre o deve e o haver, recebe menos na partilha.

Face a estes factos é apodíctico que a regra da metade foi violada, porquanto o ex-cônjuge marido acordou em receber mais do que aquilo que tinha direito segundo a regra da metade e o ex-cônjuge mulher acordou em receber menos.

2 Sendo certo que acompanhamos o entendimento de que se o que está em causa é a divisão subjectiva dos bens e que essa divisão prejudicou um dos cônjuges – mas não de forma que se repercuta no valor dos mesmos, ou melhor, no montante que cada um receberá pela partilha – tal questão deverá ser resolvida no âmbito das regras relativas à falta e vícios da vontade, nos termos do disposto dos artigos 240.º e ss. do C.Civil.

A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal, prescreve o art.º 286.º do C.Civil.

Concatenando esta norma, com as considerações supra expendidas quanto à validade do contrato-promessa resulta à saciedade que o contrato que se as partes firmaram é nulo e, consequentemente, não pode produzir o efeito pretendido.

Em decorrência, nada impede o inventário, o que se decreta em conformidade.

Questão distinta é a dos efeitos da nulidade e bem assim se é possível, em sede própria, que não o inventário, responsabilizar um dos contraentes pela não celebração do contrato prometido.

Custas a cargo do requerido, fixando-se o valor da causa no do inventário - cfr. artigos 527.º e 304.º, n.º 1, ambos do C.P.Civil.»*Inconformado o Requerido interpôs o presente recurso, que instruiu com as pertinentes alegações, em que formula as seguintes conclusões: 1. Os presentes autos de inventário foram intentados pela requerente AA, peticionando esta no requerimento inicial “…que se proceda a inventário para partilha por divórcio dos bens adquiridos pela requerente e pelo requerido na pendência do seu casamento…” 2. Como fundamento dos seu pedido a requerente alegou que: • No Tribunal e Juízo “a quo”, no âmbito do processo 190/21...., foi decretado o divórcio entre ambos, • Existem bens por partilhar adquiridos na pendência do casamento, e • Não existe acordo entre requerente e requerido quanto à partilha dos bens comuns do dissolvido casal.

  1. O requerido e ora apelante veio nos termos e para os efeitos do disposto na alínea a) do artigo 1104º do Código de Processo Civil, apresentar oposição ao inventário, na qual alegou que: • Entre a requerente e requerido, já no estado de divorciados, foi celebrado o contrato de promessa de partilha, que juntou com o articulado de oposição, como doc. ....

    • O contrato promessa de partilha entre ambos firmado, já foi parcialmente executado ou cumprido nos termos acordados.

    • Na execução do acordado no contrato de promessa de partilha, a requerente já recebeu, por conta do valor das tonas acordadas, e que tem direito a receber e constante na alínea c) da cláusula III do contrato, a quantia de €20 000,00 (vinte mil euros), conforme comprovativos de depósito que juntou com o articulado de oposição, como docs. ... e ....

    • A requerente já entrou na posse efetiva dos imóveis, relacionados nas verbas nos 6, 7 e 8 do ativo, no contrato promessa, as quais, por força do acordado e estabelecido na alínea b) da cláusula III do contrato lhe estão adjudicadas.

    Praça ..., Sala ..., ... ...

    • A requerente desde data anterior à outorga do contrato promessa de partilha, que recebe e faz suas as rendas do prédio urbano identificado na verba nº 6, no valor mensal aproximado de € 2 700,00 (dois mil e setecentos euros), por o mesmo lhe estar adjudicado.

    • A requerente já publicitou, para arrendamento, junto de mediador imobiliário os imóveis relacionados nas verbas 7 e 8.

    • A requerente assumiu e efetua mensalmente o pagamento da prestação mensal para amortização da dívida ao Banco 1... S. A., identificada no contrato de promessa de partilha, na verba nº 1 do passivo; • A requerente, não obstante o acordado e se encontrar, por força do contrato promessa de partilha firmado/celebrado, investida na posse efetiva dos imóveis relacionados nas verbas nos 6, 7 e 8 do ativo, no contrato promessa e ter recebido do requerente a quantia de € 20 000,00 (vinte mil euros), por conta das tornas acordadas e a que tem direito, tem-se furtado a outorgar/a realizar a escritura de partilha.

    • O requerido convocou a requerente, para escritura de partilha, por carta registada com aviso de receção, conforme carta que juntou com a oposição, como doc. ....

    • A requerente não compareceu ou se fez representar, tendo a Senhora Notária CC, em cujo Cartório Notarial se encontrava agendada a escritura de partilha, lavrado/emitido o correspondente certificado, o qual se juntou com a oposição, como doc. nº ....

    • Encontram-se, assim, reunidas as condições para o exercício do direito à execução específica, previsto no artigo 830º do Código Civil, direito este que o requerido pretende e vai exercer, para ver assegurada e efectivada a realização da partilha, nos termos e modos acordados no contrato promessa.

  2. Concluiu o requerido e ora apelante que o contrato de promessa de partilha a que se vincularam requerente e requerido tem obrigatoriamente de se executar ou cumprir, através da celebração da escritura de partilha ou através da execução especifica, nos termos gerais, atenta a partilha já acordada, devendo em consequência o processo de inventário ser declarado extinto, por inadmissível, com as legais consequências.

  3. A requerente não obstante aceitar a celebração do contrato de promessa de partilha, veio alegar que o mesmo está ferido de nulidade porque viola a participação ideal de cada cônjuge no património comum, estabelecido no artigo 1730º do nº 1 do Código Civil, alegando ser manifestamente desproporcional o valor global das verbas que no referido contrato foram prometidas à requerente, mesmo prometendo este pagar à requerida a título de tornas a quantia global de 150.000,00€ (cento e cinquenta mil euros) face ao valor global das verbas prometidas à requerida em especial quando deduzidos os 120.691,99 € (cento e vinte mil seiscentos e noventa e um euros e noventa e nove cêntimos) de passivo, cuja obrigação de pagamento ficou a cargo desta.

  4. Através da douta sentença de que ora se...

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