Acórdão nº 052/22.2BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 24 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelISABEL MARQUES DA SILVA
Data da Resolução24 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: - Relatório - 1 – A Autoridade Tributária e Aduaneira, não se conformando com a decisão arbitral proferida em 21 de fevereiro de 2022 no processo arbitral n.º 201/2021-T dela vem interpor recurso para uniformização de jurisprudência, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, nos termos dos artigos 25º nºs 2, 3 e 4 e art. 26º do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), art. 152º do CPTA e 27º, nº 1, al. b) do ETAF, alegando que a decisão arbitral recorrida ao ter decidido pela anulação total das liquidações adicionais de imposto e respectivos juros, por erro acerca dos pressupostos de facto e de direito, faz uma interpretação oposta à feita na Decisão do CAAD de 18 de dezembro de 2017, proferida no âmbito do processo nº 20/2017-T.

A recorrente conclui as suas alegações de recurso nos seguintes termos: 1) Entre o douto Acórdão e a decisão arbitral ora recorrida, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente, sendo a questão, a saber, se a aplicação da isenção do artigo 14.º do CIVA depende ou não da sua comprovação através dos documentos alfandegários apropriados.

2) Verifica-se a identidade de situações de facto, porquanto, quer no Acórdão fundamento quer na decisão recorrida estão em causa situações em que as liquidações de imposto decorreram da falta de documentos alfandegários apropriados a comprovar as exportações.

3) E entre a emissão do Acórdão fundamento e da decisão arbitral recorrida, não ocorreu qualquer alteração legislativa susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida.

4) E que se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que a mesma situação de facto e a mesma questão de direito, foi entendida e decidida de forma diferente quanto ao direito.

5) Face o exposto em supra, está demonstrado o requisito de identidade de facto – em virtude de se tratarem de situações em que o fundamento das liquidações era o mesmo, vejamos; 6) Na Decisão fundamento concluiu-se que: “No primeiro caso das "exportações", sempre que haja intervenção dos serviços aduaneiros (o n.º 8 do art. 29.º do CIVA não distingue entre serviços do Estado de exportação e serviços do Estado de saída dos bens para fora da União, apontando a ratio legis para a consideração destes últimos no caso das "exportações indiretas"), as transmissões de bens isentas "devem ser comprovadas através dos documentos alfandegários apropriados" (no caso, o Documento Administrativo Único - DAU). Apenas quando tal intervenção não seja legalmente obrigatória é que a normativo legal permite o recurso a declarações emitidas pelo adquirente dos bens (...), indicando o destino que lhes irá ser dado. Donde os deveres de colaboração e de diligência do sujeito passivo na obtenção e apresentação do DAU sejam especialmente intensos neste caso. No caso das transmissões e aquisições intracomunitárias a situação é bem distinta, pela existência de formas de cooperação administrativa entre os Estados-membros que melhoram as possibilidades de controlo. Daí que as obrigações acessórias que impendem sobre os sujeitos sejam aligeiradas de forma a permitir maior fluidez comercial. Assim se compreende que, sendo obrigatória a prova do transporte, esta possa, segundo a própria AT, ser efetuada por qualquer meio de prova admitido em direito.

Em suma, nas operações de “exportação” estamos perante uma restrição na admissibilidade dos meios de prova, fundada num quadro legal de maior exigência quanto à idoneidade dos meios probatórios.

Isto, na medida que a saída dos bens do espaço comunitário não pode ser equiparada à livre circulação de mercadorias entre os territórios dos diversos Estados-membros. O que forçosamente conduz à diferenciação entre os diversos meios de prova aptos a comprovar a efetiva saída dos bens.

No caso em apreço a Requerida ou não apresentou os DAU ou apresentou-os sem a validade da autoridade alfandegária do porto de saída dos bens.

Acresce que a Requerida também não apresentou a documentação alfandegária de entrada dos bens no território dos países terceiros, nos quais se localizariam os parques eólicos a que se destinavam os bens. Limitou-se a exibir declarações de receção dos bens nos países de destino, as quais foram emitidas por sociedades pertencentes ao mesmo grupo económico. Como diz de forma expressiva a Professora Clotilde Celorico Palma (“introdução ao imposto acrescentado”, IDEFF, 2011, pag. 278) A concessão da isenção depende da prova, que deverá ser efetivada através do exemplar do documento administrativo único [conhecido pela sigla DU] certificado pelos serviços alfandegários do Estado membro de saída da EU.” (nossos destaques) 7) Tendo concluído nesta parte, pela improcedência do pedido.

8) Contrariamente concluiu, por seu turno, a Decisão arbitral recorrida que “Assim, não bastava à Autoridade Tributária alegar que o documento apresentado não é aquele que a legislação aduaneira impõe que o sujeito passiva tenha para efeitos de exportação, mas teria de alegar e demonstrar que os documentos apresentados não provam materialmente as exportações, o que a Autoridade Tributária não fez.

Ao basear a recusa da isenção no não cumprimento, por parte da Requerente, de uma obrigação formal, que é a apresentação do documento de “certificação de saída” emitido pela estância aduaneira competente, nos termos da legislação aduaneira em vigor, a Autoridade Tributária impôs àquela uma condição não conforme com o artigo 29º, nº 8 do CIVA, ferindo os atos tributários de ilegalidade por erro sobre os pressupostos de direito.” (destaque nosso).” 9) Pelo que se justifica o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.

10) Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado na Decisão arbitral fundamento, dado que a Decisão arbitral recorrida, ao ter considerado que assiste à Recorrida o direito à isenção, mesmo que não se mostre cumprido o previsto no n.º 8 do artigo 28.º do CIVA, incorreu numa errada aplicação da Lei; 11) Sobre esta mesma questão e, no mesmo sentido que a Recorrente e a Decisão fundamento, já se pronunciou o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 13-05-2021, no processo n.º 02691/18.7BEPRT, disponível para consulta em dgsi.pt.

12) Neste Acórdão, entendeu o Tribunal que: “4.4. Nas conclusões XXI a XXIV alega que a sentença recorrida, no que alude às liquidações referentes ao ano de 2014, incorreu em erro de julgamento quando refere que tendo em conta o caráter formalista do IVA, a necessidade do documento alfandegário reveste formalidade ad substantiam e não ad probationem insuscetível de substituição por qualquer outro meio. Sendo certo que o entendimento que vem sendo perfilhado pelos tribunais superiores vai no sentido oposto, ou seja, de privilegiar a verificação dos requisitos materiais, de fundo, do direito à isenção do IVA, na aceção do artigo 146.º da diretiva Comunitária.

E que na falta desses documentos de acompanhamento/certificados, nos termos do artigo 115.º do CPPT, são admitidos os meios gerais de prova.

Entende que os documentos por si apresentados bem como o facto de ter sido dado como provado que a mercadoria foi entregue ao destinatário, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para aplicação da isenção prevista.

Alega que, a ausência de documentos oficiais emitidos pelas autoridades aduaneiras, só por si, não é fundamento para rejeitar a prova alternativa apresentada, constituindo uma exigência forma que, por si só, não põe em causa o direito do fornecedor à isenção do IVA, e que os documentos por si apresentados, seriam suficientes para comprovar as operações efetuadas e a verificação dos pressupostos para a aplicação da isenção prevista.

E que tal, dita o princípio da neutralidade fiscal que exige que a isenção do IVA deve ser concedida se as condições materiais estiverem preenchidas, mesmo que o contribuinte não tenha cumprido certas formalidades.

Vejamos: Do Relatório de inspeção que está na génese das liquidações impugnadas extrai-se que no exercício de 2014 a Impugnante contabilizou duas faturas de venda de mercadorias, sem liquidação de IVA, dado se referirem a exportações (operações isentas nos termos do art.º 14.º do CIVA), por si emitidas, para o cliente “S., SARL”, com sede em ..., no total de € 319.500,00 (fatura/recibo n.º ...97 de 04/09/2014, no valor de € 184.600,00 e fatura/recibo n.º ...63, no valor de € 134.900,00).

Para efeitos de comprovação de isenção de IVA, nos termos do n.º 8 do art.º 29.º do CIVA, os SIT solicitaram à Recorrente a apresentação dos documentos aduaneiros comprovativos da saída das mercadorias do território aduaneiro da União Europeia que se materializa no documento intitulado “certificação de saída para o expedidor/exportador” e o contribuinte informou que o despacho aduaneiro tinha sido efetuado pela empresa espanhola “G.”, com o NIF (…), na estância aduaneira de ..., tendo apresentado os certificados: n.º ...70 – associado à fatura n.º ...97 e ..., associado à fatura ...63.

Atendendo a que a estância aduaneira não se localizava no território nacional, os SIT efetuaram um pedido de assistência mútua a ..., a fim de confirmar a veracidade dos despachos...

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