Acórdão nº 936/20.2T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Maio de 2023
Magistrado Responsável | JOSÉ LÚCIO |
Data da Resolução | 11 de Maio de 2023 |
Emissor | Tribunal da Relação de Évora |
ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: 1 – RELATÓRIO O autor, AA, instaurou a presente acção de condenação com processo comum contra a ré, BB, pedindo que a ré seja condenada a restituir ao autor a quantia de € 110.000,00 (cento e dez mil euros), montante que considera corresponder ao empobrecimento do património do autor e consequente enriquecimento da ré, acrescido de juros de mora desde a data do trânsito em julgado da sentença até efectivo e integral pagamento do quantitativo da restituição.
Alegou o autor, em resumo, o seguinte: Autor e ré casaram civilmente em 15 de Agosto de 2008, sob o regime da separação de bens, pelo qual optaram em virtude de o autor ter, à data, o ordenado penhorado em virtude de uma dívida antiga.
Em data que o autor não pode precisar, a ré celebrou contrato de compra e venda referente a uma fracção autónoma sita na Praceta ..., em Santarém, tendo o imóvel sido comprado pelo preço de € 80.000,00 tendo esses €80.000,00 sido suportados pelo Autor e pela Ré, na proporção de €75.000,00 pelo Autor e €5.000,00 pela Ré.
Foi possível ao autor despender tal soma por ter recebido em 15 de Setembro de 2009 uma indemnização por acidente.
No dia 23 de Junho de 2010, a ré celebrou escritura na qual permutou o imóvel atrás mencionado pelo prédio urbano sito em ..., lote ..., Santarém, que mais tarde viria a tornar-se a casa de morada de família do autor e da ré.
A referida permuta envolveu ainda o pagamento da quantia de €150.000,00 (cento e cinquenta mil euros), a título de diferença de valores dos bens permutados, tendo a Ré celebrado, para este efeito, com o Banco Comercial Português, S.A., empréstimo bancário no montante de €115.000,00 (cento e quinze mil euros) e tendo o autor despendido, dos seus capitais próprios, a importância de €35.000,00 (trinta e cinco mil euros).
Uma vez que não era da conveniência do casal que o A. figurasse como proprietário, apenas a R. assinou ambas as escrituras; não obstante, A. e R. contribuíram, em semelhante proporção, para a aquisição do imóvel que viria a tornar-se casa de morada de família, visto que, para o valor total do negócio - €230.000,00 – o Autor despendeu o montante de €110.000,00 e a Ré a quantia de €120.000,00.
O autor foi, ao longo dos seus anos de vida em comum com a ré, alicerçando a sua convicção de que estaria a construir um património comum com a mesma, não obstante o regime estabelecido em convenção antenupcial, acreditando que usufruiria da casa por toda a sua vida.
Contudo a relação foi-se deteriorando, culminando com o divórcio entre autor e ré em 27/6/2019, sem que haja lugar a partilha, dado o regime de bens do casamento.
Com estes fundamentos, o autor peticionou a restituição das quantias que despendeu no pressuposto da manutenção da relação conjugal, montantes esses que a ré se recusa a restituir apesar de instada para o efeito.
A ré contestou, impugnando parte da factualidade alegada pelo autor e concluindo pela improcedência do pedido, peticionando a final a sua absolvição.
Proferido despacho saneador, enunciado o objecto do litígio e selecionados os temas de prova, não houve qualquer reclamação.
Finalmente, realizou-se audiência de discussão e julgamento e veio a ser proferida sentença, que decidiu pela absolvição da ré.
* 2 – DA APELAÇÃO Em face do decidido, veio o autor interpor o presente recurso de apelação, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões: “
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Deste modo, o Recorrente vem impugnar a decisão proferida considerando-a, em primeira análise, nula: a) - por falta de exposição do exame crítico das provas nos termos dos artigos 607º nº 4 e 195º do CPC., b) - por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão nos termos da alínea b) do nº1 do art. 615º do CPC.
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por alguns dos fundamentos estarem em oposição com a decisão, ou ocorrerem ambiguidades ou obscuridade que torna a decisão ininteligível, nos termos da alínea c) do nº1 do art. 615º do CPC.
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por o Juiz ter deixado de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar, nos termos da alínea d) do nº1 do art. 615º do CPC.
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Caso não seja esse o entendimento de V. Exªs. e contrariamente ao entendimento preconizado pelo douto Tribunal a quo, deverá a decisão de que ora se recorre ser substituída por outra que conceda provimento ao pedido formulado pelo Autor.
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Assim, a douta sentença recorrida é nula por manifesta falta de fundamentação, nos termos do disposto no art.615º nº1, al. b), c) e d) do CPC, NULIDADE QUE DESDE JÁ SE INVOCA, porquanto: a) - limita-se a enumerar os factos provados por referência aos documentos, e não concretiza qualquer razão alusiva à sua decisão; b) - quanto aos factos não provados apenas se lhes refere genérica e abstratamente sem concretizar os concretos meios que influíram na decisão; c) - logo, não satisfaz a exigência legal de fundamentação, podendo concluir-se que a omissão das razões que determinaram a decisão da causa, constitui circunstância relevante que manifestamente influi no exame e decisão da mesma para efeitos do art. 195º nº1 do CPC.
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Consequentemente deverá o douto Tribunal ad quem proceder nos termos e para os efeitos previstos no art. 662º nºs. 1 e 2 do CPC.
NO ENTANTO, E SE ASSIM NÃO SE ENTENDER, DEVERÁ A DOUTA SENTENÇA PROFERIDA SER ALTERADA CONCLUÍNDO PELA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
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O confronto entre os depoimentos transcritos com menção expressa ao minuto exacto constante da gravação áudio, e que primam pela isenção e rigor no sentido de que é humanamente impossível alguém recordar 10 ou 12 anos depois, trechos de conversas que à data seriam correntes e atinentes à vida privada do Autor. As referidas testemunhas são credíveis e os seus depoimentos demonstram veracidade e coerência, e não um ensaio programado contendo todos os elementos de facto que interessariam à discussão da causa, e que reverteriam a favor do Autor.
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Quanto aos factos considerados provados e elencados nos nºs 10, 11 e 12 da douta sentença recorrida, não podem os documentos juntos com a contestação, atentos os documentos juntos pelo Autor por requerimento datado de 12 de Fevereiro de 2021, ser suficientes para justificar que os valores neles refletidos sejam considerados pagos única e exclusivamente pela Ré, pelo que estes factos deveriam ser considerados NÃO PROVADOS, porquanto.
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Os documentos juntos aos autos pelo Autor por requerimento datado de 12 de Fevereiro de 2021 provam que: - a conta bancária com o NIB ...05 era titulada pelo Autor (doc. nº1); - Os documentos 2 a 12, ainda que algumas das faturas se encontrem em nome da Ré, provam que os pagamentos eram efectuados por débito directo da conta do Autor supra referida, e referem-se a despesas comuns do casal; - os documentos 13 a 22 provam que o Autor pagava mensalidades do colégio frequentado pela filha, entre outras despesas que a esta respeitavam.
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Bastariam estes documentos, conjugados com a prova testemunhal produzida e devidamente transcrita, as declarações de parte do Autor também supra transcritas, e a apreciação crítica das provas à luz de critérios de razoabilidade, para que os factos 10, 11 e 12 dados como provados, e que faziam parte da contestação apresentada pela Ré, devessem ser dados como NÃO PROVADOS, o que se pretende.
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OS FACTOS NÃO PROVADOS constantes da douta sentença E QUE RESPEITAM À CONTRIBUIÇÃO DO AUTOR COM A QUANTIA DE €110.000,00 PARA AQUISIÇÃO DA CASA DE MORADA DE FAMILIA, deverão ser ADITADOS AOS FACTOS PROVADOS considerando os mesmos meios de prova (referidos em 21, 22 e 23 do corpo do presente recurso) os quais se revelam suficientes para provar a utilização de parte do dinheiro recebido pelo Autor a título indemnizatório, na aquisição do imóvel que foi casa de morada de família do casal.
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As declarações de parte do Autor contextualizam de forma coerente a aquisição do dinheiro, o depósito em conta aberta para o efeito, as transferências para a conta da Ré dos montantes exactos para a realização do negócio, conforme contrato promessa e escritura de permuta e empréstimo (docs. 21 e 22 juntos com a contestação).
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Os extratos bancários da conta nº ...45 (juntos pela Ré em 23-02-2021), titulada pela Ré mas movimentada apenas pelo Autor, e onde foi depositada a quantia de €206.960,18 correspondente à indemnização recebida pelo último (cfr. doc nº 7 junto à contestação) nomeadamente o extrato 2010/004 provam sem qualquer margem para dúvidas a transferência de €75.000,00 em 21 de Junho e de €35.000,00 em 23 de Junho para a conta da Ré, em momento coincidente com a realização da escritura de permuta e empréstimo efectuada por esta última.
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Ainda, os documentos supra referidos e as declarações de parte do Autor transcritas, são coincidentes com os depoimentos supra indicados de CC, DD e EE, pelo que também estes atestam a comparticipação do Autor nas despesas comuns do casal e a transferência de €110.000,00 para a conta da Ré em momento exactamente anterior à aquisição do imóvel que foi casa de morada de família do ex casal, e que é propriedade da Ré.
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A douta sentença...
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