Acórdão nº 176/22.6T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Abril de 2023
Magistrado Responsável | FELIZARDO PAIVA |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2023 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Apelação 176/22.6T8LRA.C1 Relator: Felizardo Paiva.
Adjuntos: Paula Roberto.
Mário Rodrigues da Silva *************** Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Coimbra: I - AA, instaurou a presente acção declarativa sob a forma comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra A..., UNIPESSOAL, LDA pedindo a final, na respectiva procedência a condenação desta no pagamento de diversas quantias a título de proporcionais do subsídio de natal e de férias de 2017, complemento salarial e cláusula 61ª dos anos de 2019 a 2021, e diuturnidades a partir de Novembro de 2020, no montante total de € 17.323,64. acrescida dos juros moratórios à taxa legal, a contar de 01.01.2022 até integral pagamento.
Alegou ser motorista de transportes de mercadorias do nacional e que a ré, sua empregadora, lhe deve as quantias que peticiona.
+ Frustrada a conciliação em sede de audiência de partes, contestou a Ré invocando, entre o mais, que o autor não é motorista de pesados do transporte nacional mas motorista interno, dado conduzir veículos pesados apenas dentro do concelho ..., não existindo a penosidade que normalmente se assume existir quanto aos motoristas do nacional.
Que o autor cumpre um horário de 8 horas e todos os dias vai dormir a casa ao contrário dos motoristas do transporte nacional.
+ Foi elaborado despacho saneador e dispensou-se a fixação da base instrutória/enunciação dos temas da prova.
*** II – Realizado o julgamento, veio, a final, a ser proferida sentença de cuja parte dispositiva consta o seguinte: “Pelo exposto julgo a acção parcialmente procedente pelo que condeno a ré A..., Unipessoal, Lda a pagar ao autor AA, a título de complemento salarial e diuturnidades, a quantia total de 584,12, acrescida dos juros de mora à taxa legal de 4% a contar de 01.01.2022 e até efectivo e integral pagamento.
No mais vai a ré absolvida” *** III – Inconformado veio o autor apelar, alegando e concluindo: 1. O A. na petição inicial veio requerer o pagamento de diuturnidades, complemento salarial, diferenças salariais e retribuição da Clª 61 mensalmente e nas férias e subsídio de férias.
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A douta sentença recorrida condenou a R. a pagar ao A. 548,12€ de complemento salarial e diuturnidades.
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A douta sentença não condenou no pagamento da Clª 61º mensalmente e nas férias e subsídios de férias.
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A questão a decidir por V. Excªs Venerandos Desembargadores é se ao autor, atendendo às funções que desempenha, é aplicável na íntegra o regime remuneratório previsto no CCTV dos transportes rodoviários para os motoristas do transporte nacional, nomeadamente para efeitos de pagamento da prestação pecuniária prevista na Cláusula 61ª.
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Resulta da factualidade dada como provada e da douta sentença que faz uma exaustiva descrição do que é a categoria profissional de motorista de pesados, que as funções que o autor desempenha integram a categoria profissional de motorista de pesados.
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Aplicando-se as sucessivas CCTV celebradas entre a Antram e a Festru/Fectrans.
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O autor veio peticionar valores, como motorista de pesados, que lhe são devidos a título de cláusula 61ª dos CCTV de 2018 (a calcular desde 01.10.2018) e cláusula 61ª do CCTV de 2019 (a calcular deste 01.01.2020), relativo aos anos de 2019 a 2021.
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O Tribunal a quo decidiu que o A. como motorista de pesados, não tinha direito à retribuição da Clª 61, invocando razões de elementos lógicos, de ordem sistemática, histórica e racional ou teleológica, por efectuar serviços a curta distância e por ter o serviço organizado por turnos.
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O sentido das novas CCTV de 2018 e 2019 nunca foi o de compensar os esforços e riscos acrescidos de quem conduz veículos pesados no estrangeiro, com a eventual necessidade de passar dias inteiros em viagem e de aí pernoitar.
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O sentido foi acabar com o pagamento das horas extra para TODOS os motoristas de pesados.
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Esqueceu a douta sentença recorrida a ACTA INTERPRETATIVA celebrada entre a ANTRAN e a FECTRANS do CCTV celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS publicado o BTE nº 34 de 15-09-2018.
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Acta interpretativa de 9 de Janeiro de 2019, que se juntou e se deu aqui por integralmente reproduzida – doc. 1 12 13. Esta Acta interpretativa teve o objectivo de uniformizar o entendimento da aplicação de algumas cláusulas do CCTV durante o processo negocial de revisão global. No ponto 13) Cláusula 61º nº 1 e 3 (Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados) refere: “A presente cláusula, apesar de ter como epigrafe “Regime de trabalho para os trabalhadores deslocados”, não é por esta que resulta o seu âmbito de aplicação; efectivamente tal é fixado pelo disposto no seu nº 1. A opção por esta redacção, no que à epígrafe diz respeito, visou apenas tornar mais claro que esta cláusula visa substituir a anterior cláusula 74 /7 do anterior CCTV – embora com algumas alterações - adoptando-se por isso parte da epígrafe desta última. Assim, todo e qualquer trabalhador com a categoria de motorista de pesados e ligeiros – com excepção dos motoristas ligeiros afectos ao transporte nacional -, têm direito a receber estas prestações pecuniárias, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estão afectos. Em suma para a aplicação desta cláusula é indiferente se a distância percorrida pelo veículo que o trabalhador está afecto, é de 2km, 10 km, 20 km ou mais.
” 14. A justificação do Tribunal a quo para a não atribuição da clª 61cai por terra – da distância percorrida pelo A. que consta da factualidade provada e da organização dos serviços em turnos, que são irrelevantes para a atribuição da clª 61 da CCTV.
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A única interpretação permitida pelo Douto Tribunal a quo seria a da acta interpretativa.
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A interpretação que as partes lhe quiseram dar.
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Ao contrário da justificação da fundamentação da douta sentença, o espírito dos Outorgantes foi atribuir o pagamento da clª 61º a TODOS os motoristas de pesados e a alguns de veículos ligeiros.
Venerandos Desembargadores 18. A Acta Interpretativa veio esclarecer todas as eventuais dúvidas, em 9-01- 2019, dúvidas que parecem ser as da douta sentença, que para inclusive ter sido efetuada para esta acção.
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O A. /recorrente com a categoria de motorista de pesados tem direito a receber esta prestação pecuniária da clª 61ª, sendo irrelevante qual a distância realizada pelos veículos cuja condução estava afecto, ou o tipo de organização do trabalho, que compete às entidades empregadoras.
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Não há qualquer violação do princípio de “salário igual para trabalho igual”, porque os motoristas de pesados que estejam deslocados recebem um acréscimo que o A. não recebe, por estarem deslocados, nomeadamente as diárias para alimentação e valores de refeição, que chegam a 36,40€ por cada dia, completamente diferentes dos do A., que recebe o subsídio de refeição igual para todos os restantes trabalhadores.
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Haverá violação do princípio do “salário igual para trabalho igual, se o A. com a categoria de motorista de pesados no serviço nacional (não permitindo a CCTV subdivisões na classificação das categorias profissionais) não recebesse as mesmas componentes retributivas dos outros motoristas de pesados do serviço nacional.
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Ao não decidir assim, é que viola a douta sentença o disposto no artº 59º nº 1 al.c) da Constituição da República Portuguesa.
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Consequentemente tem o A. direito a receber as retribuições da Clª 61 mensalmente e também nas férias e subsídio de férias, no valor reclamado na p.i.
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Mais, na sequência da comunicação da ACT de Leiria enviada ao Sindicato dos Motoristas SIMM, terá a R./recorrida regularizado os pagamentos em falta que constam do documento, junto dos motoristas, porém, nada pagou ao A. recorrente.
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Ao não decidir assim, violou a douta sentença todos os normativos legais e doutrinais e jurisprudenciais em que se baseou e, em especial a clª 61ª da CCTV, o artº 59º nº 1 al.c) da CRP. Nestes termos e nos mais de Direito e com o douto suprimento de V. Exas., Venerandos Desembargadores, deve ser dado provimento ao presente recurso e em consequência, alterar-se a douta sentença de acordo com as conclusões anteriores.
+ Contra alegou a ré concluindo em síntese: (…).
+ O Exmº PGA emitiu parecer no sentido da confirmação do julgado.
*** IV – Da 1ª instância vem dada como provada a seguinte factualidade: 1- A ré é uma sociedade comercial que se dedica ao transporte público ocasional de mercadorias e transporte público internacional rodoviário de mercadorias e logística; comércio de vidros, utilidades, porcelanas, esmaltes e análogos.
2- Para o exercício da sua actividade comercial a ré tem cerca de 50 motoristas ao seu serviço.
3- O autor exerce a função de motorista por conta, sob a autoridade e direcção da ré, conduzindo veículos pesados de mercadorias até 44 toneladas.
4- No exercício da sua actividade profissional, o autor efectua transportes de vidro entre a fábrica “B...”, sita em Rua ..., em ... e os dois armazéns...
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