Acórdão nº 0681/10.7BEPNF 0682/14 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 11 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução11 de Maio de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – O Município de Marco de Canaveses, com os sinais dos autos, recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo do acórdão do TCA Norte, de 29.04.2022, que manteve a decisão do Tribunal Arbitral [TA ad hoc] de 30.12.2004, constituído ao abrigo da cláusula 100.ª do contrato de concessão da exploração e gestão dos serviços públicos de distribuição de água e de drenagem de águas residuais de Marco de Canaveses, celebrado com A..., SA.

A decisão do TA ad hoc dispunha o seguinte “[…] i. Não reconhecer o pedido de indemnização, formulado pelo Município do Marco de Canaveses, por alegados prejuízos causados pela concessionária - A..., SA - à população do concelho; ii. Julgar procedente o pedido da concessionária - A..., SA - de ver reconhecido o direito ao reequilíbrio económico-financeiro da concessão, determinando a atribuição, pelo Município de Marco de Canaveses, de uma compensação financeira no valor de 16 milhões de euros; iii. Julgar procedente o pedido de reconhecimento de um crédito a favor da concessionária - A..., SA -, sobre o Município de Marco de Canaveses, no valor de 892.976,52€, relativo à faturação global da taxa variável de saneamento (entre o início da concessão e 31 de dezembro de 2007), acrescido dos juros de mora vencidos; iv. Que a renda anual estabelecida na modificação unilateral do contrato de concessão, que ficará a cargo da concessionária - A..., SA - relativa às infraestruturas a construir pelo concedente, só será devida na proporção em que as referidas infraestruturas sejam disponibilizadas para entrada em serviço; v. Julgar improcedente o pedido alternativo da concessionária - A..., SA - de ver reconhecido o direito de rescindir unilateralmente o contrato de concessão com base em violação do mesmo contrato e o concomitante direito a indemnização».

[…]».

2 – O Supremo Tribunal Administrativo, por acórdão de 20.10.2022, a admitiu o recurso de revista.

5 – O Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] [O objeto do recurso] A. Por Acórdão do Tribunal Arbitral de 20.07.2010, foram julgados procedentes: i) o pedido da concessionária A..., SA de ver reconhecido o direito ao reequilíbrio económico-financeiro da concessão, determinando a atribuição, pelo Município de Marco de Canaveses, de uma compensação financeira no valor de 16 milhões de euros, e ii) o pedido de reconhecimento de um crédito a favor da concessionária A..., SA, sobre o Município de Marco de Canaveses, no valor de 892.976,52€, relativo à faturação global da taxa variável de saneamento (entre o início da concessão e 31 de dezembro de 2007), acrescido dos juros de mora vencidos.

B. O Recorrente interpôs recurso para os tribunais administrativos e fiscais do Acórdão proferido pelo Tribunal Arbitral de 20.07.2010 alegando, em síntese, que: i) o Acórdão é nulo por ter incorrido em erros de julgamento, mais concretamente, quanto aos factos que deu por assentes nos Pontos 4.º, 16.º, 22.º, 24.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º e 44.º do Acórdão Arbitral e, ainda, os quesitos 2.º, 3.º, 4.º e 5.º da Base Instrutória; ii) o Acórdão é nulo por erro de julgamento de direito pelo facto de ter considerado que o contrato de concessão que baseia a fixação do montante indemnizatório a título de reposição do equilíbrio financeiro a atribuir à Recorrida era válido quando, no seu entender, o mesmo é nulo.

C. O Recorrente alegou que a nulidade do contrato de concessão em crise nos autos decorre da violação do procedimento pré-contratual imposto pelos artigos 10.º, 13.º e 17.º do Decreto-lei n.º 379/93 e dos artigos 56.º e 58.º do Decreto-lei n.º 197/99, por ausência do parecer prévio do IRAR e da aprovação da Assembleia Municipal e, bem assim, pelo facto de o contrato comportar alterações substanciais das cláusulas gerais dispostas no Caderno de Encargos (CE), nas regras do Programa do Concurso (PC) e da própria proposta à qual o concorrente (posterior adjudicatário) se vinculou aumentando, inclusivamente, as suas receitas em mais de 50% e configurando um contrato que não tem qualquer correspondência com o procedimento pré-contratual que o conformou.

D. Nas suas alegações o Recorrente alegou, ainda, que o contrato seria inválido, pelo facto de o Recorrente ter incorrido em erro quanto à declaração de vontade no momento da sua celebração.

E. Por Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte de 02.05.2022 de que agora se recorre, o TCAN decidiu que não iria conhecer a questão suscitada quanto à impugnação da matéria de facto assente nos Pontos 4.º, 16.º, 22.º, 24.º, 39.º, 40.º, 41.º, 42.º e 44.º do Acórdão Arbitral e, ainda, os quesitos 2.º, 3.º, 4.º e 5.º da Base Instrutória pelo facto de o Recorrente, nas suas conclusões de recurso, não ter cumprido o disposto no artigo 640.º n.º 1 alínea a) do CPC.

F. O TCAN decidiu que não iria conhecer da questão da nulidade do contrato de concessão invocada com base na violação do procedimento pré-contratual porque, por um lado, o Recorrente não teria invocado essa nulidade no âmbito das suas conclusões de recurso (restringindo o seu objeto) e, por outro lado, porque no entender do Tribunal, o artigo 180.º n.º 1 alínea a) do CPTA na versão anterior ao ano de 2015, excluía as questões relacionadas com “invalidades derivadas” dos contratos do âmbito de competência do Tribunal Arbitral e, por conseguinte, esta matéria estaria fora do poder de cognição do TCA no presente recurso daquela decisão arbitral.

G. O TCAN considerou que embora o contrato de concessão celebrado comporte alterações substanciais das cláusulas gerais dispostas no Caderno de Encargos (CE), das regras do Programa do Concurso (PC) e da própria proposta à qual o concorrente (posterior adjudicatário) se vinculou, o mesmo não estaria ferido de nulidade mas apenas do vício de anulabilidade, tendo caducado o direito de ação por parte do Recorrente por incumprimento do prazo de 6 meses contemplado no artigo 41.º n.º 2 do CPTA (na versão aplicável aos autos).

H. O TCAN decidiu que não ficou provada a ocorrência de um erro na declaração de vontade do Recorrente aquando da celebração do contrato mas, mesmo que tivesse existido esse erro, o prazo para interpor a ação de anulação do contrato decorrente desse vício (6 meses ao abrigo da referida versão do artigo 41.º n.º 2 do CPTA) já estaria ultrapassado ao tempo dos presentes autos.

I. O Recorrente, não se conformando com o Acórdão do TCAN, suscita no presente recurso que o STA se pronuncie sobre se o Tribunal a quo (TCA Norte) incorreu em erro de julgamento ao ter rejeitado conhecer do recurso quanto à impugnação da matéria de facto dada como assente pelo Acórdão Arbitral com base numa alegada violação do disposto no artigo 640.º n.º 1 alínea a) do CPC.

J. Ora, o tribunal a quo interpretou e aplicou de forma errada o disposto no artigo 640.º, n.º 1, alínea a) do CPC, ex vi artigo 1.º do CPTA, uma vez que a referida tarefa deveria ter sido realizada em consonância com o princípio da tutela jurisdicional efetiva - que encontra consagração legal e constitucional no artigo 2.º do CPTA e artigo 268.º, n.º 4 da CRP, respetivamente -, e com o princípio pro actione consagrada no artigo 7.º do CPTA, pelo que se vislumbra desde logo uma errada interpretação e aplicação de todas as normas jurídicas enunciadas; K. No caso em concreto, tendo o Tribunal Arbitral conhecido o pedido do Recorrente quanto à arguição da nulidade do Contrato de Concessão por força de invalidades insanáveis do respetivo procedimento pré-contratual, o TCA Norte incorreu em erro de julgamento por omissão de pronúncia quando decidiu que não deveria conhecer essa parte da decisão arbitral pelo facto de o artigo 180.º n.º 1 alínea

  1. CPTA (na redação aplicável ao presente diferendo) excluir essa matéria do âmbito dos poderes cognitivos do Tribunal Arbitral e, bem assim, por entender que o referido pedido não foi expresso nas conclusões das Alegações de Recurso (delimitando o objeto a decidir). O tribunal a quo incorreu assim numa errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 180.º, n.º 1, alínea a) CPTA (na redação aplicável ao presente diferendo).

    L. O Acórdão do TCA Norte sob sindicância enferma de erro de julgamento sobre a matéria de direito ao não ter considerado nulo o Contrato de Concessão celebrado entre a Recorrente e a Recorrida quando, de acordo com a matéria de facto dada como assente nos presentes autos, o mesmo comporta alterações substanciais das cláusulas gerais dispostas no Caderno de Encargos (CE) e violação das regras do Programa do Concurso (PC), modificações a que correspondem alterações substantivas da proposta económica da então adjudicatária (Recorrida nos presentes autos), aumentando nomeadamente as suas receitas em 122 milhões de euros e os seus lucros em mais de 50%, bem como das próprias taxas internas de rentabilidade (TIR) dos acionistas futuros da concessionária (cfr. dado como matéria de facto assente nos presentes autos).

    M. O Recorrente entende que o TCAN não poderia ter considerado que o contrato era apenas anulável, uma vez que os vícios contratuais dados como provados pelo próprio TCAN conduzem, necessariamente, à declaração da nulidade do contrato pelo mesmo carecer em absoluto de forma legal, fazendo assim uma errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 133.º, n.º 2, alínea f) do CPA na versão aplicável à presente demanda, N. O presente recurso para o STA deverá ser admitido na medida em que se verifica o preenchimento dos pressupostos fixados no n.º 1 do artigo 150.º do CPTA, ou seja, está em causa a apreciação de uma questão jurídica que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental, ou a admissão do recurso ser claramente necessária para uma melhor aplicação do Direito.

    O. Estes pressupostos verificam-se no caso em concreto, tanto por força do impacto económico e social que os contratos de concessão...

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