Acórdão nº 2959/20.2T8BCL-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 04 de Maio de 2023

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução04 de Maio de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório AA, instaurou procedimento cautelar de arresto contra BB e CC, pedindo o arresto do prédio urbano composto por casa de um pavimento, melhor descrito no requerimento inicial.

Alega, para o efeito, em síntese: requerente e requeridos celebraram um contrato de compra e venda, através do qual estes venderam ao primeiro o prédio urbano composto por casa de cave, rés do chão com logradouro, destinado a habitação, melhor descrito na petição inicial; sucede que no referido prédio surgiram vários defeitos cuja obrigação de reparação incumbe aos requeridos, na qualidade de vendedores de coisa defeituosa, tendo estes já sido instados para proceder à sua reparação, que recusaram, levando a que o requerente intentasse ação judicial contra os requeridos, a qual correu termos sob o n.º 2959/20...., no Juízo Local Cível ... - Juiz ... - na qual foi já proferida sentença, entretanto revogada por acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 02 de março de 2023 que decidiu julgar procedente a ação, condenando os aqui requeridos a reparar ou eliminar os vícios, defeitos, anomalias e patologias existentes no prédio objeto da presente ação, no prazo ali fixado, bem como em sanção pecuniária compulsória no valor de 100 €, por cada dia de atraso ou, em alternativa, a pagar ao autor a quantia de 44.102,88€, a fim deste poder proceder à sua respetiva correção dos defeitos, através de terceiros; já após a instauração da referida ação, foi tentada a obtenção de um acordo de resolução do diferendo, mas os requeridos recusam responsabilizar-se pelo pagamento do valor da reparação, alegando não terem dinheiro; o requerente teve conhecimento que os requeridos não têm as condições económicas que outrora tiveram, vivendo atualmente com dificuldades financeiras; tendo sido obrigados a vender a casa de morada de família onde residiam por precisarem de dinheiro com vista a pagar aos seus credores; os requeridos possuem uma situação financeira delicada e já venderam e dissiparam património devido às dívidas que sobre si impendiam; desde a data da venda os requeridos residem numa segunda casa, mais modesta, alegadamente construída pelos próprios, sendo este o único bem que se encontra registado em nome dos requeridos; tendo o requerente conhecimento de que os requeridos já iniciaram diligências no sentido da venda do referido imóvel de que são proprietários, o que claramente demostra que estes pretendem dissipar o seu património, tendo o requerente sérias razões para ficar preocupado, pois enquanto não decorrer o prazo concedido aos requeridos para reparar os defeitos (de 180 dias), estes podem dissipar todo o seu património, colocando assim em causa a garantia patrimonial do crédito que o requerente detém sobre aqueles: concluem que existe justo receio de perda da garantia patrimonial do requerente, em virtude da conduta atual e passada dos requeridos, da sua débil situação económica que não lhes permite pagar o valor necessário à reparação dos defeitos na moradia vendida ao requerente.

De seguida foi proferido despacho, indeferindo liminarmente o procedimento cautelar por considerar, em suma, que face aos factos alegados, importava concluir no sentido de que, não obstante a verificação do primeiro requisito necessário para o decretamento da providência, sendo suficiente a alegação no que à existência do crédito do requerente respeita (a probabilidade da existência do crédito), já o mesmo não se podia fazer no tocante ao segundo requisito, concluindo que os factos alegados não são bastantes para se concluir pela existência de sério receio de perda da garantia patrimonial.

Nessa decisão consignou-se, além do mais, o seguinte: «(…) Pese embora o crédito alegado não seja desde já certo e exigível, quer porque não transitou ainda em julgado o referido Acórdão, quer porque se trata de uma condenação em alternativa, nos termos sobreditos, considerando que o decretamento da providência se basta com a prova sumária da probabilidade séria da existência do crédito, temos de concluir que a respetiva alegação da existência do crédito se faz em termos suficientes.

Aqui chegados, importa, então, apurar se está minimamente alegada a existência de sério receio de perda da garantia patrimonial - o segundo requisito aludido supra -, sendo certo que o justificado receio de perda da garantia patrimonial - para efeitos de decretar o arresto de bens do devedor - tem que ser aferido com base em critérios objetivos e, portanto, terá que assentar em factos concretos que revelem ou indiciem uma real situação de perigo de insatisfação do crédito decorrente da inexistência de bens que por ele possam responder.

A este respeito, alega o requerente o seguinte: - resultou da instrução da causa principal, concretamente do depoimento da testemunha DD, prestado em 24/01/2022, que os aí réus, aqui requeridos, venderam a casa em causa nos autos principais ao autor, aqui requerente, por estarem a passar por dificuldades financeiras, ou seja, que os requeridos foram obrigados a vender a casa de morada de família onde residiam por precisarem de dinheiro com vista a pagar aos seus credores; - daí retira que os requeridos possuem uma situação financeira atual delicada, tendo já vendido e dissipado património devido às dívidas que sobre si impendiam, sendo certo que, desde a data da venda ao autor - 19/12/2018 - os requeridos residem numa segunda casa, mais modesta, alegadamente construída pelos próprios, sendo este o único bem que se encontra registado em seu nome; - os requeridos já iniciaram diligências no sentido da venda do referido imóvel de que são proprietários, o que claramente demostra que pretendem dissipar o seu património.

Considerando os ditos factos alegados, conclui-se que os mesmos não são bastantes para se concluir pela existência de sério receio de perda da garantia patrimonial.

Com efeito, nada foi alegado nos autos que indicie uma situação económico-financeira atual difícil dos requeridos, que justifique temer uma próxima insolvência do devedor ou uma sonegação, dissipação ou ocultação que impossibilite ou dificulte a realização coativa do crédito.

É que a situação dos requeridos alegada pelo requerente sustenta-se no depoimento da testemunha indicada que se reporta aos motivos da venda do prédio objeto dos autos principais pelos requeridos ao requerente, venda essa que ocorreu há mais de 4 anos atrás. Na verdade, o requerente retira daquele depoimento a alegação de que os requeridos têm atualmente uma situação económica difícil, mas não alega nada de concreto e atual quanto a tal. Não alega a existência atual de outros credores ou dívidas dos requeridos, limitando-se a alegar, de forma absolutamente genérica, vaga e imprecisa que os requeridos já iniciaram diligências no sentido da venda do referido imóvel de que são proprietários, sem concretizar quais os atos por este praticados, no tempo atual, que indiciem dissipação do único bem imóvel de que são titulares.

Ademais, não é alegado qualquer facto objetivo do qual se retire que os requeridos não tenham intenção de pagar ao requerente (apenas se alegou que antes e no decurso da ação, os requeridos não quiseram assumir qualquer responsabilidade pelas reparações exigidas, que é coisa diferente de não terem intenção de cumprir um pagamento judicialmente determinado) e que, por causa desta intenção de não pagar, estes sonegarão, dissiparão ou ocultarão os seus bens de modo a impossibilitar ou dificultar a realização coativa do crédito do requerente.

Ademais, sublinha-se, não se alega, sequer indiciariamente, nos autos qualquer situação de insolvência próxima dos devedores que faça temer pela perda da garantia patrimonial do requerente, sendo certo que a mera inexistência de mais património imobiliário não significa, direta e necessariamente, que os requeridos não tenham dinheiro ou outros bens que possa responder perante o requerente.

Em suma, entendemos que não resulta da alegação do requerente qualquer atitude dos requeridos que inculque a suspeita séria de que estes pretendem subtrair os seus bens à ação do requerente, seu credor.

A este respeito, não será despiciendo referir que, sendo o Acórdão do T.R.G. que atribui ao requerente o aludido crédito sobre os requeridos datado de 02/03/2023, tendo o presente procedimento cautelar entrado em juízo em 16/03/2023, e não tendo o requerente, durante toda a ação principal (entrada em juízo em 29/12/2020) alegado qualquer situação de perigo de insatisfação do crédito peticionado, impunha-se ao requerente que alegasse quais os atos concretos praticados pelos requeridos desde a data do reconhecimento do crédito pelo referido Acórdão – 02/03/2023 - que permitam concluir, à luz das regras da experiência, que estes pretendem subtrair os seus bens à ação do requerente, seu credor, e, por conseguinte, que existe o perigo de, não sendo decretada a providência, se tornar difícil ou mesmo impossível a cobrança do crédito.

Assim sendo e em conclusão, devendo o requerente alegar factos concretos - “ocorrências concretas, e não juízos de valor, induções ou conclusões a extrair dessas ocorrências” (ALBERTO DOS REIS, CPC Anotado, III, pág. 215) - que levem o tribunal a concluir pela verificação do justo receio de perder a garantia patrimonial do seu crédito (segundo pressuposto necessário ao decretamento do arresto), e não o tendo feito, nos termos expostos, com os fundamentos expendidos, indefiro liminarmente o presente procedimento cautelar de arresto».

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