Acórdão nº 02205/22.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Abril de 2023
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
Data da Resolução | 21 de Abril de 2023 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO EMP01..., Unipessoal, Lda., pessoa colectiva n° ..., com sede na Avenida ..., ... ..., instaurou acção administrativa urgente de contencioso pré-contratual contra o Município ..., com sede na Praça ..., ..., formulando os seguintes pedidos: “..., deve a presente ação administrativa urgente de contencioso pré-contratual ser julgada procedente, por provada, devendo ser invalidados (declarados nulos ou, pelo menos, anulados): (i) o ato de adjudicação à 1ª Contrainteressada e conexamente, o ato de não exclusão (ou seja, de admissão) da proposta da 1ª Contrainteressada, (ii) o ato de não exclusão da proposta da 2ª Contrainteressada, (iii) o contrato celebrado, a 25.10.2022, entre o Demandado e a 1ª Contrainteressada.
Devendo, com a recomposição da ordenação final, a adjudicação recair sobre a proposta da Autora, com consequente celebração do contrato entre o Demandado e a Autora.” Indicou, na qualidade de 1ª e 2ª Contrainteressadas, respectivamente, EMP02..., S.A., com sede na Avenida ..., ... ... e EMP03... Unipessoal, Lda, com sede na Avenida ..., ... ....
Por Sentença proferida pelo TAF do Porto foi decidido assim: Termos em que, pelos fundamentos supra expostos, julgo a presente acção de contencioso pré-contratual parcialmente procedente e, em consequência: a) Anulo o acto de adjudicação em causa nos autos, mais determinando a exclusão da proposta apresentada pela EMP02..., S.A.; b) Consequentemente, anulo o contrato relativo ao procedimento em causa, entretanto celebrado; c) Anulo o acto de admissão da proposta apresentada pela EMP03... Unipessoal, Ida, mais determinando a exclusão da sua proposta; d) Absolvo a entidade demandada quanto ao pedido de condenação na adjudicação à proposta da Autora.
Desta vem interposto recurso pelo Réu/Município.
Alegando, formulou as seguintes conclusões: 1ª A Recorrida imputou ao acto impugnado três ilegalidades, tendo duas delas sido julgadas improcedentes e uma procedente, concretamente por violação do disposto nos artigos 1º-A/nº 2 e 70º/nº 2 f) do CCP e, por apresentação de preço anormalmente baixo, quanto à 1ª CI, e quanto à 2ª CI por violação do disposto nos artigos 1º-A/nº 2 e 70º/nº 2 f) do CCP.
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Em relação à proposta da 1ª CI a sentença recorrida conclui que a remuneração do trabalho nocturno e do trabalho em dia feriado a pagar pela 1ª CI aos seus trabalhadores não cumpre com a regras laborais, nem cumpre com as contribuições para os fundos de compensação do trabalho e para alcançar estas conclusões o Tribunal “a quo” procedeu a uma verdadeira análise (parcial) da proposta.
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No presente procedimento está em causa a aquisição de serviços de vigilância pelo período de 549 dias consecutivos, que totalizam 6079 horas (fls. 23 e 24 do PA) e, como consta do ponto 9 do programa de concurso (fls.40), os concorrentes tinham de apresentar as suas propostas de preço seguindo um modelo previamente definido (fls. 29 e 30 do PA), o qual tem por referência a apresentação de preços globais mensais, baseados em preços unitários a indicar pelos concorrentes.
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A 1ª CI adjudicatária cumpriu o imposto pelo programa de concurso, apresentando o seu preço global e preços parcelares, não tendo o Recorrente conseguido retirar da proposta apresentada a violação de normas legais (o exercício efectuado na sentença recorrida, como é parcial e não abrange toda a proposta, é necessariamente falível).
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A matéria respeitante aos serviços de segurança privada tem sido amplamente analisada pela jurisprudência e no sentido defendido pelo Recorrente (veja-se, a título de exemplo, os acórdãos do TCAN de 06.12.2013 proferido no proc. nº 02363/12, do STA de 28.01.2016 proferido no proc. nº 01255/15 e do TCAN de 04.10.2017 proferido no proc. nº 00259/17.4BEBRG), ou seja, não cabe ao Recorrente obrigar os concorrentes a revelarem o que constitui segredo comercial.
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A totalidade da informação constante da proposta da 1ª CI não permite ao Recorrente retirar a conclusão sólida e inabalável que não são cumpridas regras legais, motivo pelo qual ao decidir como decidiu a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento de Direito, concretamente quantos aos artigos 1º-A/nº 2 e 70º/nº 2 f) do CCP.
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Face ao facto provado 6, não é possível ao Tribunal “a quo” decidir que a proposta da 1ª CI apresenta um preço anormalmente baixo, sendo que este juízo traduz, ainda, uma violação do princípio constitucional da separação de poderes, pois se a entidade adjudicante não fixou critério para a determinação de preço anormalmente baixo, não pode o Tribunal vir agora fazê-lo.
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A sentença recorrida violou o princípio constitucional da separação de poderes, consagrado no artigo 2º e 111º/nº 1 da CRP.
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Quanto à proposta da 2ª CI a sentença recorrida aponta o mesmo tipo de invalidade que apontou à 1ª CI, pelo que a argumentação jurídica que se apresentou aplica-se, mutatis mutandis, à 2ª CI, concluindo-se que ao decidir como decidiu incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento de Direito, concretamente quanto aos artigos 1º-A/nº 2 e 70º/nº 2 f), ambos do CC.
TERMOS EM QUE deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a douta sentença recorrida e substituindo-a por outra que julgue a acção improcedente.
A Autora apresentou contra-alegações, sem conclusões, finalizando assim: Termos em que, Com o suprimento, deve o presente recurso ser julgado totalmente improcedente, e a Sentença recorrida mantida nos segmentos impugnados pelo Recorrente.
O MP, notificado ao abrigo do disposto no artigo 146º/1 do CPTA, não emitiu parecer.
Cumpre apreciar e decidir.
FUNDAMENTOS DE FACTO Na sentença foi fixada a seguinte factualidade: 1) Através de anúncio de procedimento n° ...22, publicado no Diário da República, 2ª Série, n° 155, de 11.08.2022, foi publicitada a abertura de concurso público, lançado pelo Réu, para celebração do contrato de “Aquisição de serviços de vigilância para o Centro Coordenador de Transportes de ...”, pelo preço base de € 66.869,00 e com um prazo de execução de 17 meses – págs. 54 e 55 do p.a. junto, doc. n° ...04 do SITAF; 2) Do Programa do Procedimento do referido concurso constam, além do mais, os seguintes artigos: “ (...) 9. Documentos que constituem a proposta a) Declaração elaborada conforme o modelo constante do Anexo I do presente programa de concurso; b) Proposta com indicação do preço hora diurno e do preço hora noturno, o preço hora diurno fim de semana, preço de hora noturno fim de semana, e preço total da proposta, de acordo com as quantidades de horas estimadas, conforme Anexo III, o qual deverá ser indicado em algarismos e por extenso, referindo expressamente que não inclui o IVA; c) Alvará para o exercício dos serviços prestados na alínea a), do nº 1, do artigo 3º, da Lei nº 46/19, de 8 de julho (altera o regime do exercício da atividade de segurança e portais complementares aquele novo regime, bem como outros documentos de habilitação, legalmente exigidos para a prestação de serviços em apreço).” (...) 19. Critério de adjudicação 1. A adjudicação será feita de acordo com o critério da proposta economicamente mais vantajosa, determinada através da modalidade: a) Monofator, nos termos da alínea b) do n° 1 do artigo 74° do CCP, de acordo com o qual o critério de adjudicação é densificado por um fator correspondente a um único aspeto da execução do contrato a celebrar, neste caso o preço como único aspeto da execução do contrato a celebrar.
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Para efeitos do número anterior, será considerada mais vantajosa a proposta que apresente o menor preço total. (...)” – págs. 34 a 42 do p.a. junto, doc. nº ...04 do SITAF; 3) O Anexo III ao Programa do Procedimento tem o seguinte teor:[imagem que aqui se dá por reproduzida] - - - págs. 29 e 30 do p.a. junto, doc. nº ...04 do SITAF; 4) Do Caderno de Encargos da aquisição de serviços em questão, constam, além do mais, os seguintes artigos: “(...) 2. Prazo do contrato 1. O contrato mantém-se em vigor até 31 de dezembro de 2023, ou durante este período, até à prestação integral dos serviços, sem prejuízo das obrigações acessórias que devam perdurar para além da cessação do contrato, salvo se se verificarem casos de força maior que impeçam a execução do contrato, podendo, neste caso, a entidade adjudicante prorrogar o prazo de validade do contrato.
(...) 4. Preço contratual 1. Pelo objeto do contrato, bem como pelo cumprimento das demais obrigações constantes do presente caderno de encargos, a entidade adjudicante deve pagar ao adjudicatário o preço constante da proposta adjudicada, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, se este for legalmente devido.
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O preço referido no número anterior, não pode, em qualquer caso, ser superior a 66.869,00 € (valor sem IVA).
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O preço referido no número 1 inclui todos os custos, encargos e despesas cuja responsabilidade não esteja expressamente atribuída a entidade adjudicante, incluindo, ou nomeadamente as despesas de alojamento, alimentação e deslocação de meios humanos, bem como quaisquer encargos decorrentes da utilização de marcas registadas, patentes ou licenças.
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O preço a que se refere o nº 2 é dividido pelo nº de horas consumidas, multiplicado pelo preço unitário por hora da proposta vencedora, definidos na cláusula das especificações técnicas do presente caderno de encargos. (...)” – págs. 23 a 28 do p.a. junto, doc. nº ...04 do SITAF; 5) Decorre das especificações técnicas do Caderno de Encargos (Parte II – Cláusulas Especiais), o seguinte:[imagem que aqui se dá por reproduzida] “ (...) (…) - pág. 23 do p.a. junto, doc. nº ...04 do SITAF; 6) Não consta do Programa do Procedimento do concurso em questão, nem de qualquer outra peça do procedimento, a fixação de um critério de identificação de preço anormalmente baixo – facto não controvertido; 7) Com data de 05.08.2022 foi elaborada pela técnica superior, AA, informação relativa ao procedimento em causa...
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