Acórdão nº 2513/19.1T8GMR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelANIZABEL SOUSA PEREIRA
Data da Resolução27 de Abril de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES: *I- RELATÓRIO: 1. O exequente deduziu execução para pagamento de quantia certa contra os executados, peticionando o pagamento da quantia de € 138.447, decorrente da soma das somas das quantias devidas conforme escritura pública realizada entre as partes, e da qual consta, além do mais, um mútuo ao executado em dinheiro pelo prazo de 16 anos, hipoteca e fiança a prestar pela segunda executada; mútuo esse a ser reembolsado mensal e sucessivamente e não tendo sido pagas algumas das mensalidades, o exequente fez apelo ao art. 781º do CC e pretendeu a exigibilidade de toda a dívida.

*2. O executado veio, por apenso à execução, deduzir embargos de executado, os quais foram contestados e conforme ata datada de 17-02-2020 as partes chegaram a acordo, homologado por sentença, nos seguintes termos: “1. O Executado AA desiste dos embargos de executado que deram origem ao presente apenso.

  1. Desistência essa que os Exequentes aceitam.

  2. Com a extinção do presente apenso, as custas são a suportar em partes iguais pelos Exequentes e Executado, sem prejuízo da protecção jurídica de que este beneficia.

  3. Exequentes e Executados acordam que o pagamento do valor em dívida (correspondente ao valor mutuado, deduzido das prestações pagas até à presente data) será efectuado em prestações mensais, iguais e sucessivas de € 600,00 (seiscentos euros), pelo menos, reiniciando-se o pagamento das mesmas no dia 10 de Março de 2020 e as restantes até igual dia dos meses subsequentes, ficando, desta forma, concretizado o 3º parágrafo da escritura de confissão de dívida, hipoteca e fiança celebrada em 20 de Abril de 2017.

  4. Exequentes e Executados acordam que os Exequentes apenas poderão considerar incumprida a obrigação de pagamento, no caso de ser incumprido o pagamento de 2 prestações consecutivas, nos termos ora acordados.

  5. Exequentes e Executados acordam em excluir (da cláusula que constitui o 3º parágrafo da escritura de confissão de dívida, hipoteca e fiança celebrada em 20 de Abril de 2017) a possibilidade de ser alterado o valor da prestação mensal a pagar, consoante o valor dos rendimentos do devedor.

  6. Exequentes e Executados acordam que, a partir de Janeiro de 2020, a taxa de juro aplicável será de 4%.

  7. No demais, mantém-se o teor da escritura de confissão de dívida, hipoteca e fiança celebrada em 20 de Abril de 2017, designadamente o prazo de pagamento do montante total da dívida e juros em 16 anos.

  8. Com a presente transacção, requer-se a extinção dos autos principais (Execução) e do presente apenso A (Embargos de Executado).

  9. As despesas e honorários de Agente de Execução (a existirem) ficam a cargo dos Exequentes, bem como as despesas e custas (a existirem) relativas aos autos principais.”*Em 05-03-2020, a agente de execução fez consignar na execução o seguinte: “ Extingue-se a presente execução tendo em consideração que: - A quantia exequenda está a ser liquidada por acordo de pagamento entre as partes nos termos do art.º806 n.º2 do CPC, conforme sentença proferida a 17-02-202”.

    *Em 12-03-2021, os exequentes apresentaram requerimento junto da agente de execução, dando conta do incumprimento pelos executados de algumas prestações devidas e pretendiam o prosseguimento dos autos.

    Nesse mesmo dia, o executado apresentou requerimento junto da agente de execução sustentando o indeferimento daquele pedido.

    Em 18-03-2021, foram os autos enviados ao juiz a quo para efeitos de apreciação nos termos do art. 850º do CPC.

    Em 22-03-2021 foi proferido despacho a ordenar a audição das partes quanto à apreciação nos termos do art. 850º do CPC e ambas voltaram a pronunciar-se conforme: -requerimentos datados de 31-03-2021 ( o executado)- sustentou e juntou documentos a demonstrar 3 pagamentos em 08-03-2021 e em 21-03-2021 e 31-03-2021, considerando assim que deveria ser indeferido o requerido; - e requerimento datado de 16.04.2021 ( os exequentes)- reiterando o pedido já formulado de renovação da execução.

    Designada data para as partes, querendo, produzirem prova, o executado requereu a prestação de declarações de parte, tendo o tribunal procedido à audição do mesmo e nesta sequência foi proferido despacho datado de 15-01-2023, nos termos do qual se declarou “ a renovação da execução, nos termos do disposto no artigo 850º, nº 4, do CPC.

    Custas pelo executado, que se fixam no mínimo legal.

    Notifique..”*É desta decisão que vem interposto recurso pelo executado, o qual terminou o seu recurso formulando as seguintes conclusões ( que se transcrevem): “1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho proferido a fls. dos autos que declarou a renovação da execução, nos termos do disposto no artigo 850º n.º 4, do CPC.

  10. Tal despacho constitui uma verdadeira sentença, tendo procedido à avaliação e julgamento do pedido de renovação da execução requerida pelos Exequentes.

  11. Com o devido respeito que o Tribunal a quo merece, a decisão recorrida violou o disposto nos artigos 850 n.º 4 do CPC e 334 do Código Civil, tendo incorrido em erro de julgamento, quer da matéria de facto, quer da matéria de direito, tendo ignorado as circunstâncias do caso concreto, que caso tivessem sido devidamente ponderadas teriam ditado uma decisão diferente.

  12. A matéria de facto dada como provada nos pontos 11 e 13 e no parágrafo único dos factos não provados, assenta em erro na apreciação da prova.

  13. Não é correto afirmar-se, como consta do ponto 11 dos factos dados como provados que “O executado não pagou as restantes prestações vencidas até à data referida em 10º dentro dos prazos combinados.” 6. O que sucedeu efetivamente, é que em 10 de Março de 2021 (data de vencimento da prestação de Março de 2021) estavam vencidas as prestações de Fevereiro e Março de 2021, cujas circunstâncias o Tribunal a quo ignorou e valorizou incorretamente, sendo certo que, até à presente data, o Executado vem pagamento, escrupulosamente as prestações mensais.

  14. Pelo exposto, o ponto 11 dos factos provados carece de alteração, passando a ter a seguinte redação: “11º - O executado não pagou as prestações vencidas em 10 de Fevereiro e 10 de Março de 2021 dentro do prazo.” 8. Quanto ao ponto 13 dos factos provados, não se descortina, com franqueza, qual a motivação do Tribunal (para além da alegação desacompanhada de qualquer prova dos Exequentes) de que a quantia mutuada visou liquidar um outro contrato de empréstimo.

  15. A quantia que os Exequentes mutuaram destinou-se, precisamente, à aquisição do imóvel sobre o qual foi constituída hipoteca a favor dos Exequentes, para garantia do bom cumprimento das obrigações decorrentes da dívida.

  16. Com efeito, o Tribunal a quo não podia dar como provada, sem mais, a matéria de facto constante do ponto 13, porque tal matéria não foi aceite nem por qualquer forma provada.

  17. Quanto ao parágrafo único dos factos não provados, como é facto público e notório, o nosso país foi assolado por uma pandemia (Covid-19) que determinou que a 16 de março de 2020, o Governo decretasse o "Estado de Alerta" que obrigou ao encerramento de escolas, bares, discotecas, restaurantes e restringiu a circulação de pessoas.

  18. O Executado AA é profissional liberal/comissionista (vendedor “porta a porta”) com rendimento altamente instável tendo, nesse período, visto os seus rendimentos gravemente afetados pelas medidas de contenção adotadas, que não só limitaram a liberdade de circulação, como também levaram ao encerramento de muitos estabelecimentos a quem fornecia.

  19. Sendo facto público e notório a situação de pandemia mundial, parece assim claro que o Tribunal a quo devia ter ponderado tal circunstância e, de acordo com as regras da experiência, dar como provado que o executado, em virtude da sua profissão especialmente afetada pelas limitações impostas, viu os seus rendimentos gravemente afetados.

  20. Atenta a relação de confiança entre Exequentes e Executados e tal como o Executado afirmou nas suas declarações, o atraso no pagamento das prestações foi telefonicamente comunicado à Exequente mulher, como, de resto, é habitual nestas situações.

  21. Tendo o Tribunal a quo ignorado, inexplicavelmente, tais declarações.

  22. A matéria de facto dada como não provada, deverá ser antes dada como provada, em ponto a incluir na matéria de facto provada, com a seguinte redação: Novo ponto: “O atraso no pagamento foi oportunamente comunicado aos Exequentes e deveu-se ao facto de o Executado ter atravessado dificuldades financeiras graves naquele período, atento o facto de a sua atividade ter estado praticamente paralisada devido às limitações inerentes à pandemia Covid-19.” 17. O Tribunal incorreu em erro no julgamento de direito, tendo errado na ponderação sobre a aplicação do instituto do abuso de direito.

  23. Independentemente da requerida modificação da matéria de facto dada como provada e não provada, entende o Executado/Recorrente que o Tribunal a quo podia e devia ter configurado a pretensão dos Exequentes em requererem a renovação da execução como abusiva.

  24. Após a transação realizada nos autos, o pagamento das prestações reiniciou-se no dia 10 de Março de 2020.

  25. Da análise dos pagamentos realizados pelo Executado (constantes do requerimento dos exequentes de 12/03/2021) verifica-se que o Executado “saltou” a prestação de Abril de 2020, período coincidente com o pico de casos da pandemia Covid-19.

  26. Com efeito, a partir de Maio de 2020 foi pagando sempre a prestação com o atraso de 1 mês.

  27. Em nenhum momento, até ao Requerimento de renovação da execução apresentado em 12/03/2021, os Exequentes comunicaram ao Executado a falta do pagamento da referida prestação em atraso.

  28. O Executado em virtude das dificuldades económicas que atravessou e devido a alguma confusão entretanto gerada com o reinício do pagamento das prestações, não estava, nem foi, alertado para tal falha no pagamento.

  29. Alerta esse que, até pela confiança que depositava nos Exequentes, esperava.

  30. Logo que o Executado se apercebeu que estaria em falta (o que...

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