Acórdão nº 05/23.3BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução26 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA interpôs recurso, para uniformização de jurisprudência, dirigido ao Pleno da Secção de Contencioso Tributário do S.T.A., visando o aresto arbitral proferido no âmbito do processo nº.221/2022-T, datado de 28/11/2022, o qual, além do mais, julgou procedente o pedido de pronúncia arbitral, deduzido pela sociedade ora recorrida e visando o acto de liquidação adicional de I.R.C., relativo ao ano de 2015 e no valor a pagar de € 218.862,53 (cfr.cópia junta a fls.18 a 29 do processo físico).

O recorrente invoca oposição entre o acórdão arbitral recorrido e o aresto arbitral fundamento, já transitado em julgado, proferido no âmbito do processo 87/2014-T, que correu termos no CAAD, sendo datado de 09/12/2014 (cfr.cópia junta a fls.30 a 45 do processo físico).

XPara sustentar a oposição entre a decisão arbitral recorrida e o aresto fundamento, a entidade recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.4 a 17 do processo físico), formulando as seguintes Conclusões: 1-Entre as doutas decisões em causa, a fundamento e a recorrida, existe oposição susceptível de servir de fundamento ao recurso vertente, uma vez que a questão de direito decorrente dos efeitos que a fusão tem na sociedade incorporante e se os gastos com juros suportados anteriormente pela aquisição das incorporadas continua a poder ser deduzido fiscalmente na esfera da incorporante à luz do art. 23º do CIRC, foi decidida diferentemente no Acórdão recorrido e no Acórdão fundamento.

2-Verifica-se a identidade de situações de facto, e tendo presente que a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais, porquanto: 3-Ambas as requerentes intervieram num processo de fusão e de reorganização empresarial, por via do qual foram as sociedades incorporantes.

4-Em ambos os casos subjacentes às decisões, recorrida e fundamento, as requerentes passaram a assumir os encargos com as dívidas resultantes de uma operação anterior por via da qual foram contraídos empréstimos para aquisição das incorporadas.

5-Em ambas as situações as empresas requerentes viriam a ser alvo de procedimento inspetivo tendo em vista analisar se os gastos contraídos anteriormente com os financiamentos e que passaram a ser suportados pelas requerentes passavam o crivo do art. 23º do CIRC.

6-Verifica-se a identidade da questão de direito, uma vez que, ambos os acórdãos recorrido e fundamento analisaram a questão de saber se os encargos financeiros deduzidos fiscalmente pela Requerente relativos a financiamento incorrido para a aquisição das participações sociais, devem ser considerados como comprovadamente indispensáveis nos termos do art. 23.º do ClRC.

7-E, deste modo, ambos os Acórdãos, recorrido e fundamento, analisaram a questão de direito relativa ao regime da dedutibilidade de juros à luz do art. 23º do CIRC face à operação de fusão realizada.

8-Contudo, Acórdão fundamento e Acórdão arbitral recorrido decidiram diferentemente quanto à questão de direito enunciada.

9-Assim, enquanto que o Ac. recorrido decidiu que: [IMAGEM] 10-Já o Acórdão Arbitral fundamento decidiu que: “Decorre do que se acaba de expor que o facto de os financiamentos com os encargos e as responsabilidades correspondentes terem sido objecto de transmissão no âmbito de fusão por incorporação (vd. o facto constante do nº XIII) não implica que o seu tratamento fiscal na sociedade incorporante tenha que ser, sem mais, o exato espelho do que ocorria na sociedade incorporada.

(…) Em suma, a dedução fiscal dos encargos financeiros incorridos no ano de 2009 tem que ser aferida no contexto empresarial próprio da Requerente, em atenção aos critérios normativos resultantes do nº 1 do art. 23.º do CIRC, que é, efectivamente o quadro legal decisivo em função do qual se tem de resolver a matéria dos autos.”.

11-Acresce ainda que, entre a emissão do Acórdão recorrido e do fundamento, a alteração legislativa ocorrida não é susceptível de interferir na resolução da vertente questão de direito controvertida.

12-E que se entende que se justifica, no caso, o presente recurso para uniformização de jurisprudência, pela existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, no sentido de que a mesma foi entendida e decidida de forma diferente, sendo certo, igualmente, que a orientação perfilhada na decisão impugnada não está de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

13-Encontra-se, pois, preenchido o condicionalismo previsto nos arts. 152º nº 1 do CPTA e 27º nº 1 al. b) do ETAF.

14-Por outro lado, o presente conflito de jurisprudência deve ser resolvido de acordo com o deliberado no Acórdão fundamento, dado que a decisão arbitral recorrida, fez uma incorreta interpretação e aplicação do art. 23º do CIRC, aos factos.

15-A dedutibilidade dos gastos depende de um juízo quanto à sua afetação ao interesse societário que se circunscreve no propósito de obtenção de rendimentos ou ganhos sujeitos a imposto. Trata-se, no fundo, de assegurar a tributação pelo rendimento real, sendo este o crivo geral do artigo 23.º do CIRC.

16-Como reconhece o Supremo Tribunal Administrativo no acórdão proferido a 29/03/2006, processo n.º 01236/05, “a Administração só pode excluir gastos não diretamente afastados pela lei debaixo de uma forte motivação que convença de que eles foram incorridos para além do objetivo social, ou seja, na prossecução de outro interesse que não o empresarial, ou, ao menos, com nítido excesso, desviante, face às necessidades e capacidades objetivas da empresa.”.

17-No caso concreto entende-se que não sendo a Requerente uma SGPS, nem tendo no seu objeto social a atividade de compra e venda de participações sociais, os encargos financeiros por si suportados decorrentes do empréstimo para a aquisição das participações financeiras das empresas, as quais subsequentemente incorporou por fusão, não podem considerar-se como gasto para efeitos de dedutibilidade em sede de IRC ao abrigo do disposto no artigo 23.º do CIRC por serem alheios ao exercício da sua atividade.

18-Ou seja, o empréstimo em causa não foi aplicado na própria empresa, mas sim na aquisição de outras empresas, na prossecução de outros interesses alheios, degradando a base tributável da estrutura empresarial existente, e assim diminuindo os rendimentos sujeitos a tributação (IRC).

19-O que se verificou com as operações de fusão foi que, em consequência da extinção das partes sociais detidas pela Requerente, a atividade à qual o empréstimo se encontrava associado (compra de participações sociais) não teve continuidade.

20-Inicialmente, antes da fusão, pela ausência de estrutura física, recursos humanos, materiais, técnicos e financeiros, os únicos rendimentos da Requerente derivados do negócio estão exclusivamente relacionados com mais (valias) de uma eventual alienação da sua participação ou então com os potenciais lucros (na sua esfera tributável sob a forma de dividendos) gerados pelas empresas participadas, que estão conexos com os gastos de financiamento, pois o empréstimo foi integralmente canalizado para a aquisição das suas participações sociais.

21-O que subsistiu após a fusão foi apenas a atividade operacional desenvolvida pelas sociedades que tinham pertencido ao inicial grupo A... e consequentemente sem alterações na «unidade geradora de rendimentos», em cuja exploração não foram aplicados os fundos obtidos com aquele financiamento que apenas serviram para remunerar aos seus proprietários o preço das participações sociais detidas.

22-Aceitar-se a dedutibilidade dos encargos financeiros associados ao financiamento da aquisição das participações sociais das sociedades, cujas actividades geram os rendimentos e ganhos independentemente daqueles, seria negar o princípio do balanceamento entre gastos e rendimentos que se encontra ínsito no n.º 1 do art. 23.º do Código do IRC.

23-In casu, os juros suportados com o empréstimo não estão relacionados com a atividade empresarial da ora recorrida (Fabricação de embalagens de plástico) e, embora inscritos na sua contabilidade, não beneficiam a sua atividade nem o respetivo interesse empresarial, mas antes aproveitam a uma entidade terceira (B... International BV) não devendo ser aceites também para efeitos do cálculo do resultado fiscal, nos termos da alínea c) do n.º 2 do artigo 23.º do Código do IRC.

24-Conforme se deliberou no Acórdão fundamento, «ainda recentemente entendeu o Tribunal Constitucional no seu acórdão nº 42/2014, nº 16; os juros que remuneram capitais alheios, mormente por operações de crédito, integram o conceito de encargos financeiros, de acordo com a exemplificação constante do artigo 23.º, n.º 1, al. c) do CIRC. Mas, de igual jeito, tais encargos não se afastam dos princípios gerais que regem a imputação de custos dedutíveis, mormente o princípio da especialização de exercícios (artigo 18.º do CIRC) e o princípio da homogeneidade entre custos dedutíveis e os rendimentos ou proventos sujeitos a imposto a que estejam ligados, de forma a que não seja atribuído um tratamento à causa (custo) e outro ao efeito (rendimento ou proveito), mormente no plano do âmbito de aplicação temporal do regime pertinente. Conclui-se, pois, que o facto de certos encargos financeiros serem fiscalmente dedutíveis anteriormente no âmbito da determinação da matéria colectável de uma certa sociedade não significa, só por si, que o sejam necessariamente nos mesmos termos no âmbito da sociedade que, por fusão, incorporou aquela.».

25-Concluindo-se que: «independentemente da assunção do empréstimo em causa pela Requerente ter resultado de uma operação de fusão, impõe-se declarar que os custos contabilizados pela Requerente no exercício em causa com os encargos financeiros respeitantes a tal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT