Acórdão nº 08/19.2BCPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelADRIANO CUNHA
Data da Resolução19 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – RELATÓRIO 1. AA, Autor na presente ação administrativa impugnatória, de ato punitivo disciplinar, que propôs contra o Réu “EXÉRCITO PORTUGUÊS”, peticionou, na sua p.i., «i) Ser declarada a nulidade do procedimento disciplinar (referente ao processo disciplinar nº …); e, subsidiariamente, ii) Ser anulado o ato punitivo (ato que o condenou na pena disciplinar de dois dias de proibição de saída — alínea c) do nº 1 do artigo 30º e artigo 33º, ambos do RDM aprovado pela Lei Orgânica nº 2/2009, de 22 de julho); iii) Ser o Réu condenado a retirar do registo biográfico qualquer referência disciplinar e à pena aplicada, relativamente ao Autor; “ou” iv) Ser o Réu “condenado a pronunciar-se sobre o recurso hierárquico apresentado pelo Autor, nos moldes supra alegados”».

  1. O Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), por Acórdão de 27/5/2022 (cfr. fls. 219 e segs. SITAF), decidindo em 1ª instância – nos termos do art. 6º da Lei nº 34/2007, de 13/8 - julgou: «a) Procedente a exceção da inimpugnabilidade do ato, de 04-02-2019, do Comandante da Unidade de Apoio do Comando do Pessoal do Exército Português, que aplicou ao Autor a pena disciplinar de dois dias de proibição de saída, e, consequentemente, absolvem o Exército Português da instância atinente aos identificados três primeiros pedidos, nos termos do artigo 89º, nºs 2 e 4, alínea i), do CPTA, e b) Improcedente a ação quanto ao pedido de condenação do Réu “a pronunciar-se sobre o recurso hierárquico apresentado pelo Autor, nos molde supra alegados”, e do mesmo vai o Réu absolvido».

  2. O Autor, inconformado com este julgamento do TCAN, dele vem interpor o presente recurso de apelação para este STA, concluindo do seguinte modo as suas alegações (cfr. fls. 244 e segs. SITAF): «1ª - O recorrente veio pedir que a presente Ação fosse julgada procedente por provada e por via dela fosse: “- declarada a nulidade do procedimento disciplinar.

    Caso assim não se entendesse, - fosse anulado o ato punitivo; - fosse o ora Recorrido condenado a retirar do registo biográfico qualquer referência disciplinar à pena aplicada, relativamente ao Recorrente, ou ser o Recorrido condenado a pronunciar-se sobre o mérito do recurso hierárquico apresentado pelo recorrente”.

    1. - O douto Tribunal a quo julgou procedente a exceção da inimpugnabilidade do ato, de 04-02- 2019, do Comandante da Unidade de Apoio do Comando do Pessoal do Exército Português, que aplicou ao Autor a pena disciplinar de dois dias de proibição de saída, e, consequentemente, absolveu o Exército Português da instância atinente aos identificados três primeiros pedidos, nos termos do artigo 89º, nºs 2 e 4, alínea i), do CPTA”, E julgou improcedente a ação quanto ao pedido de condenação do Réu “a pronunciar-se sobre o recurso hierárquico apresentado pelo Autor, nos molde supra alegados”, e do mesmo vai o Réu absolvido”.

    2. – O ora recorrente discorda da douta decisão em apreço.

    3. - Admitindo-se que o recorrente tenha ultrapassado os dez dias previstos pelo no art. 124 - nº 3 do RDM para a interposição do recurso hierárquico necessário, do mesmo modo, o nº 1 do art. 125 do mesmo diploma legal preceitua que “a decisão do recurso hierárquico é proferida ...no prazo de 30 dias, a contar da data do respetivo processo...”.

    4. - Conforme consta do processo instrutor e dos autos, a decisão do Senhor General Chefe do Estado Maior do Exército, de rejeição do recurso hierárquico necessário, foi exarada em 16 de Maio de 2019, e foi notificada ao recorrente em 17 de Junho seguinte.

      Ou seja, muito para além dos 30 dias prescritos no citado art. 125 do R. D. M.

    5. - O art. 196 do CPA preceitua no seu nº 1 que “O recurso deve ser rejeitado nos casos seguintes: c) quando o recurso haja sido interposto fora do prazo”.

    6. - O Recorrido devia ter notificado o ora recorrente da rejeição do recurso hierárquico, no prazo de trinta dias. Admitindo-se até a hipótese, teórica, do recorrido ter apreciado o recurso, mesmo extemporâneo ou de não ter razão, no que concerne ao motivo da rejeição, daria o direito ao recorrente de impugnar esta decisão da rejeição.

      Perante o silêncio do recorrido, perante a ausência de decisão ao recurso hierárquico, em tempo útil legalmente previsto, recorreu ao Tribunal.

    7. - Pelo que a eventual extemporaneidade da interposição do recurso hierárquico necessário foi suprida pela ausência de decisão em tempo útil.

    8. - É que, face à extemporaneidade do recurso, não se trata, agora, do Recorrido ter ou não o dever legal de decidir acerca do mérito do recurso hierárquico.

      Trata-se, sim, do dever de informar o recorrente de que o recurso hierárquico tinha entrado fora de prazo.

    9. - Mas mais, o recorrido, aquando da notificação da decisão punitiva, apenas disse que o recorrente “podia deduzir recurso hierárquico”, mas não o informou das consequências da interposição do recurso fora de prazo.

      Estamos aqui perante um abuso do direito, o qual deve ser suprido com a admissão da impugnabilidade do ato punitivo, ou a concessão de um novo prazo para interpor novamente o recurso hierárquico necessário.

    10. - O Recorrente arguiu, na sua p.i., nulidades existentes no procedimento disciplinar que conduziu ao ato punitivo que motivou a presente lide.

    11. - O douto Acórdão de que se recorre não apreciou as nulidades arguidas, atendendo à extemporaneidade do prévio recurso hierárquico necessário.

    12. - O recorrente discorda de tal entendimento.

    13. - Com efeito, o que se firma na ordem jurídica seriam os vícios geradores de anulabilidade de que eventualmente o processo disciplinar padecesse.

      Mas as nulidades são invocáveis a todo o tempo por qualquer interessado e podem, também a todo o tempo, ...ser declaradas pelos tribunais administrativos....”.

      Ou melhor, nada obsta que as arguidas nulidades sejam conhecidas pelo Tribunal.

      Nestes termos e nos melhores de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença, serem declaradas as nulidades arguidas na p. i., existentes no procedimento disciplinar, conducentes ao ato punitivo.

      Caso assim não se entenda, deve ser admitida a impugnabilidade do ato punitivo, - anulando-se o mesmo; - ser o Recorrido condenado a retirar do registo biográfico qualquer referência disciplinar à pena aplicada, relativamente ao recorrente.

      Ou, subsidiariamente ser o Recorrido condenado a pronunciar-se sobre o mérito do recurso hierárquico apresentado pelo Recorrente, ou, ainda, subsidiariamente, a concessão de um novo prazo para interpor novamente o recurso hierárquico necessário, com as legais consequências, com o que V. Exªas, Venerandos Conselheiros, farão Justiça».

  3. O Réu/Recorrido “Exército Português”, notificado, não apresentou contra-alegações (cfr. fls. 256 SITAF): 5. O Ministério Público junto deste STA, conquanto notificado nos termos e para os efeitos do disposto no art. 146º nº 1 do CPTA, não emitiu parecer (cfr. fls. 271 SITAF).

  4. Colhidos os vistos, o processo vem submetido à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

    * II - DAS QUESTÕES A DECIDIR 7. Constitui objeto do presente recurso de apelação apreciar e decidir, no âmbito delimitado pelas alegações do Recorrente/Autor (designadamente, nas respetivas conclusões), e tendo em consideração os factos dados como provados, se o Acórdão do TCAN recorrido procedeu a um correto julgamento da ação impugnatória, intentada pelo Recorrida/Autor, ao julgar procedente a exceção da inimpugnabilidade do ato punitivo aplicado, em decorrência da instauração extemporânea do inerente recurso hierárquico necessário - retirando-se as devidas consequências da decisão que for tomada.

    * III - FUNDAMENTAÇÃO III. A – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO 8.

    O TCAN, atuando como tribunal de 1ª instância, considerou relevantemente provados os seguintes factos: «i) Com data de 04-02-2019, o Comandante da Unidade de Apoio do Comando do Pessoal do Exército Português proferiu despacho de aplicação ao Autor de uma pena disciplinar de dois dias de proibição de saída, no âmbito do processo disciplinar nº …; ii) O acto disciplinarmente punitivo foi notificado ao Autor no dia 08-02-2019; iii) Com data de 12-02-2019 (registo de entrada no serviço de destino em 14-02-2019), o Autor requereu ao Chefe do Estado-Maior do Exército a suspensão dos prazos, designadamente, para impugnação administrativa, invocando ter requerido ao Instituto da Segurança Social a nomeação de defensor oficioso para o patrocinar na ação disciplinar; iv) O recurso hierárquico necessário daquele ato punitivo foi interposto no dia 27-02-2019 e exibe assinatura manuscrita de «AA»; v) A presente ação...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT