Acórdão nº 0576/16.0BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Abril de 2023

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução12 de Abril de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 576/16.0BEAVR 1.1 A sociedade acima identificada, inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 20 de Outubro de 2022 – que negou provimento ao recurso por ela interposto da sentença por que o Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação de contribuições para a Segurança Social –, dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, ao artigo do disposto no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), com conclusões do seguinte teor: «A. Considerando a matéria de facto provado importa agora decidir se a interpretação e aplicação efetuadas pelo Acórdão Recorrido das normas de incidência contributiva previstas no artigo 46.º e 47.º do Código Contributivo, são ou não as corretas.

  1. Mais precisamente saber se este tipo de prémios, isto é, prémios cuja atribuição está associada ao desempenho corporativo da empresa e do grupo, e cujo quantum depende da avaliação de desempenho individual devem ser enquadrados no disposto no artigo 46.º, n.º 2 alínea d) do Código Contributivo como alega a Segurança Social, e conforme decidido na Sentença e no Acórdão do TCNorte, ou se esses prémios devem ser enquadrados no disposto no artigo 46.º, n.º 2, alínea aa) do Código Contributivo como alega a Recorrente.

  2. Subsidiariamente, e caso de conclua pela aplicação do disposto no artigo 46.º, n.º 2, alínea d) do Código Contributivo, importa analisar se os prémios, face aos factos considerados como provados, podem ser considerados como prestações regulares, tendo em conta o disposto no artigo 47.º do Código Contributivo.

  3. E tal como fica aqui demonstrado e provado encontra-se preenchidos os pressupostos de que dependente a admissibilidade do presente Recurso de Revista.

  4. Desde logo, trata-se de uma questão com relevância jurídica fundamental na medida em que o artigo 46.º do Código Contributivo estabelece regras de incidência contributiva diferentes para os prémios associados ao desempenho da empresa (alínea aa) do n.º 2) das que são aplicáveis para os prémios associados ao desempenho dos trabalhadores (alínea d) do n.º 2).

  5. Contudo, a lei não é clara relativamente à forma como os mesmos devem ser distinguidos e enquadrados, sobretudo quando a decisão de atribuição dos prémios depende do desempenho da empresa e das demais empresas do Grupo, mas o seu montante é determinado por referência à avaliação de desempenho individual do trabalhador.

  6. Nestas situações os prémios devem ser enquadrados no disposto na alínea d) ou no disposto na alínea aa)? H. O preenchimento destes conceitos – prémio de produtividade e prémio associados ao desempenho da empresa – para efeitos de aplicação das supra referidas normas, é absolutamente fundamental, tanto mais que o disposto no artigo 4.º, n.º 3 do Código Contributivo, na redacção dada pelo artigo 69.º da Lei 55-A/2010, de 31/12 adiou a entrada em vigor do disposto na alínea aa) do n.º 2 do artigo 46.º, para o momento da sua regulamentação.

    I. Ou seja, até que seja publicada a respectiva regulamentação, os prémios de desempenho associados à empresa, não podem integrar a base de incidência contributiva por a norma ainda não estar em vigor.

  7. Por outro lado, a matéria em apreço é ainda de relevância social fundamental na medida em que extravasa os limites do caso concreto, podendo vir a constituir uma orientação para apreciação de outros casos.

  8. Com efeito, em grande parte do tecido empresarial Português os “prémios” são desenhados para constituírem uma forma das empresas partilharem com os seus colaboradores parte do seu sucesso económico, ou do sucesso económico do Grupo em que se inserem, sendo que o “quantum” a atribuir especificamente a cada um dos trabalhadores irá, naturalmente, depender da sua avaliação de desempenho.

    L. Tratando-se de uma situação muito comum é absolutamente fundamental clarificar se a interpretação e aplicação da lei feita pelo Acórdão Recorrido, não só em relação ao disposto na alínea d) e aa) do n.º 2 do artigo 46.º, mas também no que concerne ao conceito de regularidade ínsito no artigo 47.º do Código Contributivo, é a correcta, na medida em que a mesma facilmente poderá ser extravasada para outros casos semelhantes, com consequências tributárias muito relevantes para as empresas e para os trabalhadores.

  9. Uma empresa quando toma uma decisão de pagar um prémio aos seus colaboradores tem de estar segura relativamente aos custos que estão associados à atribuição desses prémios, designadamente os custos relativos às contribuições para a segurança social, pois só assim é que poderá tomar uma decisão devidamente esclarecida relativamente à sua capacidade económico-financeira de pagar tais prémios, evitando-se ainda possíveis avultadas liquidações oficiosas e respectivas coimas, que podem levar a empresa a uma situação de insolvência e a despedimento de trabalhadores.

  10. A clareza da lei nestas matérias é também muito relevante do ponto de vista dos trabalhadores, na medida em que tem um considerável impacto nos valores que recebem, bem como impacto na sua carreira contributiva e nas eventualidades associadas.

  11. Por último, sempre se dirá que existe uma clara necessidade do presente recurso para uma melhor aplicação do direito, não só devido à indefinição legislativa e dos conceitos, já referida, mas também porque a jurisprudência não tem aplicado uniformemente o conceito de regularidade. Veja-se a este propósito o Ac. do STA n.º 02342/12.3BELRS, que numa situação em tudo semelhante à aqui em apreço, e em que o conceito de regularidade foi interpretado e aplicado de forma distinta.

  12. Por último, a revista é ainda necessária para melhor aplicação do direito porquanto o Acórdão Recorrido tratou a matéria aqui em causa de forma ostensivamente errada.

  13. O primeiro erro grave do Acórdão Recorrido foi considerar que os prémios aqui em causa constituem um prémio de produtividade enquadrável no disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 46.º do Código Contributivo, o que claramente não tem correspondência com a matéria dada como provada, nem com aquele que deve ser o conceito de prémio de produtividade abrangido pelo disposto nesse preceito legal.

  14. Com efeito, se atentarmos à matéria dada como provada concluímos que os prémios estão associados ao desempenho da Recorrente, bem como das demais empresas do grupo, sendo uma forma do grupo partilhar com os trabalhadores os bons resultados, e que a avaliação do desempenho de cada trabalhador apenas é tida em consideração na definição do quantum a pagar a cada um desses trabalhadores.

  15. O facto de ser feita uma avaliação de desempenho para apurar o quantum do prémio a pagar a cada trabalhador, não transforma o prémio num prémio de produtividade.

  16. Essa distinção deverá ser feita tendo em conta os factores, ou os critérios que estão na génese da atribuição do prémio. E no caso em apreço esses factores ou critérios são, claramente, o desempenho da Recorrente, bem como o das demais empresas do Grupo.

  17. O Acórdão Recorrido entende que o objectivo do prémio é recompensar o desempenho do trabalhador, pois se o desempenho da empresa e os objectivos corporativos foram atingidos foi porque o trabalhador teve um bom desempenho, isto é, foi porque o trabalhador atingiu os seus objectivos individuais.

    V. Ora, a interpretação efectuada pelo Acórdão Recorrido tem como efeito esvaziar de sentido a distinção normativa feita pelo legislador entre os prémios associados à produtividade do trabalhador e os prémios associados ao desempenho da empresa.

  18. Pois em última instância, e seguindo a posição do Acórdão Recorrido, o desempenho da empresa resultará sempre do desempenho dos trabalhadores, pelo que um prémio relacionado com o desempenho da empresa, na “essência” terá sempre o propósito de premiar o bom desempenho do trabalhador, o que como é fácil de perceber não faz qualquer sentido, nem tem correspondência com a lei.

    X. Do disposto nas alíneas d) e aa) do n.º 2 do artigo 46.º do Código Contributivo resulta de forma clara a intenção do legislador em regular de forma diferente os prémios associados ao desempenho do trabalhador, dos prémios associados ao desempenho da empresa.

  19. O que significa que são realidades distintas, com propósitos distintos que justificam que que cada um desse tipo de prémios, tenham também pressupostos de incidência contributiva distintos.

  20. Uma empresa é uma realidade complexa, sendo que a sua boa performance depende de...

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