Acórdão nº 02860/17.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução24 de Março de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * * I – RELATÓRIO A..., S.A., melhor identificada nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA nos quais é Autora Z... LIMITED – SUCURSAL EM PORTUGAL, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, que, em 14.07.2022, julgou a presente ação procedente e, em consequência, condenou “(…) a A... Grande Porto a pagar à Autora a quantia de €11.623,02 (onze mil seiscentos e vinte e três euros e dois cêntimos), acrescida de juros de mora à taxa legal, desde a data de citação nos presentes autos até efetivo e integral pagamento, a título de indemnização pelos danos resultantes do acidente de viação ocorrido na A...2 (…)”.

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões:“(…) I. A conclusão que se pode tirar do argumentário resultante da sentença do T. A. F. de Penafiel, e salvo, naturalmente, o devido respeito, é que, sem que se perceba porquê, esta R. foi condenada nestes autos com base em duas ideias principais (ainda que não expressamente assumidas, diga-se assim), ou seja, numa ideia de omnipresença/ubiquidade a que supostamente estaria “obrigada” e também numa lógica (ideia) de responsabilidade objetiva que sobre si alegadamente impenderia; II.

Com efeito, isso resulta absolutamente inequívoco de afirmações/fundamentos como p. ex. a putativa obrigação de demonstração dos “(...) meios por si utilizados para assegurar o cumprimento de tais deveres (...) ” (e quais, já agora? E/ou então com que base legal se pode “exigir” isso?) e/ou então aqueloutra de que alegadamente “(...) a rede instalada seja idónea a bloquear animais dessa índole (…)”; III. No entanto, nenhuma dessas ideias/afirmações/fundamentos tem consagração legal, sendo que também não se conhece (e também não se vê como podia ser isso possível) qualquer “histórico” jurisprudencial que defenda, “preto no branco”, que as concessionárias devem ser omnipresentes, por um lado, e que a sua responsabilidade é objetiva, por outro; IV. E pior ainda, salvo, evidentemente, o devido respeito, é a circunstância de se persistir de forma completamente infundada numa linha que se pode resumir, em traços gerais, na ideia errada (legalmente insustentável) de que alegadamente a R. teria de provar que não teve culpa no sinistro (e nas suas várias “variantes” mais ou menos imaginativas, como p. ex. aquela de ter de provar por onde ingressou o animal na via); V.

Ora, em relação à questão das vedações, e para lá dos documentos juntos pelo IMT, IP e pela IP e da prova testemunhal inequívoca nesse sentido (que conduziu, p. ex., a que não sobrasse outra solução que não fosse a de dar como provado o consta dos pontos n°s. 21 a 23 dos factos provados), este raciocínio é, ademais, frontal e visivelmente contrariado pelo disposto, entre outras, nas Bases XXX, n° 4, alínea a) e XXXVIII do DL n° 189/2002, de 28.08, na redação aplicável do DL n° 110/2015, de 18.06; VI. Depois, e agora quanto à crítica que a sentença claramente contém a propósito da extensão de verificação de vedações (e seria certamente curioso, não perdendo de vista o argumentário da sentença, refletir sobre qual seria o respectivo posicionamento se neste caso - embora isso não faça qualquer sentido, desde logo do ponto de vista prático - toda a vedação tivesse sido verificada na sequência do sinistro dos autos), apesar de ter sido esta mesma sentença que, como dito, deu como provado - e bem - os pontos n°s. 21 e 23 dos factos provados e de não se poder também esquecer o que consta da alínea b) do documento com origem no IMT, IP (pág. 215 do SITAF), a conclusão única a tirar é que a R. até fez neste caso e a esse respeito mais do que estava obrigada (legalmente) a fazer (cfr., além disso, o ac. deste TCAN, de 12.07.2018, igualmente no que respeita a essa questão); VII.

Segue-se que, e agora no que concerne à alegada irrelevância dos patrulhamentos (ao arrepio, curiosamente, do ponto n° 17 dos factos provados decididos pela mesma sentença que assim o concluiu e também p. ex. do documento do IMT, IP a que já se aludiu), se impõe a constatação, aliás, demasiado óbvia, que a última patrulha a vigiar o local do sinistro, naturalmente, antes deste ter eclodido, fê-lo inequivocamente dentro do intervalo temporal a que a R. estava obrigada, pelo que aquela afirmação é nitidamente violadora, entre outros, do disposto na Base L, n° 4, al. c); VIII. Acresce ainda recordar o que é (ou devia ser) indiscutível, ou seja, que a circunstância de estar (legalmente) previsto um intervalo de patrulhamento (que, evidentemente, tem de ser visto e analisado “por comparação” com a hora do sinistro) não significa de maneira nenhuma que possa ocorrer violação (que para a sentença é certamente inevitável, atento o uso, sem qualquer razão, do adjetivo irrelevante) da Base XLV, n° 1 ou da Base LIII, n° 2, o mesmo é dizer p. ex. do advérbio de modo “permanentemente” ou do adjetivo “permanente”, porque não há dúvida - como, aliás, o ponto 17 dos factos provados o demonstra - isso não aconteceu. Pelo contrário, de resto (só assim não seria se se entendesse que a concessionária é/deve ser omnipresente, o que nem sequer se pode cogitar - cfr. também, a este propósito, o ac. do TCAN antes citado e também o ac. deste TCAN de 24.09.21, proferido no âmbito do proc. n° 3024/17.5BEPRT e também consultável em www.dgsi.pt); IX. Mais: no que diz respeito à questão da configuração dos nós, ligada ou não com outras, não pode senão concluir-se que, face aos pontos n°s. 16 e 18 designadamente, sendo um deles (o n° 16), de resto, um facto público notório, as observações/“objecções” da sentença também não fazem, salvo o respeito devido, nenhum sentido, até porque será de (re)lembrar que a esse nível (como a outros) a concessionária não “inventa” (nem pode) nada; X. E, no que se refere aos famosos “meios” (não “especificados” na sentença, porque, pura e simplesmente, não há maneira de o fazer), mais uma vez é o diploma legal relevante (e que - é bom recordar - constitui legislação especial que “suplanta”, sem dúvida ou hesitação, a lei geral) que, ressalvando o respeito devido, “desmente” de forma nítida a “quimera argumentativa” prosseguida pela sentença; XI. Discorda ainda e frontalmente a R. do argumento, por assim dizer, “económico-financeiro” utilizado pela sentença (ainda que o faça apenas ao de leve) e relacionado com o facto de os utilizadores da AE deverem pagar uma taxa de portagem, na medida em que esse argumento - que - concede-se - até pode “angariar adeptos” em termos de senso (sentimento) comum, diga-se assim - foi clara e inegavelmente ultrapassado (e há muito tempo, de resto) pela “realidade” (pense-se só quando as AE, como esta foi, até 2010, uma AE designada por SCUT, sem cobrança ao utilizador) e até pela simples questão de que, se assim fosse, não seria certamente nesta jurisdição administrativa que este processo correria os seus termos.

Posto isto, XII. A sentença não valorizou devidamente (e como se impunha) a matéria de facto e particularmente aquela que a R., ora recorrente, logrou provar, ou seja, os pontos 16 a 23 dos factos provados, decisão essa que devia ter sido norteada designadamente pelo disposto na Base LXXIII do diploma legal relevante; XIII. Com efeito, em vez de o fazer optou por “embarcar” numa linha de argumentação “redonda” e inconsistente, argumentação essa não concreta, não concretizável e sobretudo irrazoável que, além do mais, não tem o mínimo apoio legal, mormente na legislação especial relevante (e, desde logo, a do Decreto-Lei n° 189/2002, de 28.08, na redação em vigor à data do sinistro); XIV. Na verdade, quando se chama à colação para servir de fundamentação, nomeadamente aquela mencionada nas antecedentes conclusões V a XI (e que se foi contrariando ao longo destas linhas, sempre com base na lei aplicável), isso é o mesmo que dizer nada, sobretudo se nos lembrarmos que, p. ex., tanto a questão da vedação da(s) auto-estrada(s) e a oportunidade da sua verificação (vide designadamente a alínea a) do n° 4 da Base XXX e os documentos juntos por IMT, IP e por IP), como aqueloutra igualmente relevante dos patrulhamentos (e a sua periodicidade - cfr. alínea e) do n° 4 da Base L), têm previsão legal no citado diploma legal; XV. De forma que não é certamente ao “sabor das conveniências argumentativas” ou da ideia (do “achismo”) que se possa ter sobre o que será eventualmente correto e/ou justo que nos temos de movimentar em matéria de fundamentação de direito, mas é antes atendo-nos ao direito (positivo) que, no caso, é constituído nomeadamente pelo disposto no Decreto-Lei n° 189/2002, de 28.08, na redação aplicável; XVI. Ora, e para o que aqui interessa, a sua Base LXXIII (bem como a Base LIV-A que diz praticamente a mesma “coisa”) prevê claramente uma exclusão de responsabilidade da concessionária caso sejam observados os critérios definidos no seu n° 2, ou seja, se a concessionária mostrar que cumpriu o contrato de concessão, bem como o disposto no plano de controlo de qualidade e no manual de operação de manutenção (e a verdade é que não há a mínima dúvida que o fez, de resto); XVII. De modo que, considerando que se trata de avaliar, neste como em qualquer outro acidente ocorrido numa auto-estrada concessionada, nomeadamente em que consistem (e qual será, por assim dizer, o respectivo conteúdo) as obrigações de segurança cuja demonstração de cumprimento cabe à concessionária/R., esta Base LXXIII, porque claramente define e “enforma” essas obrigações de segurança em sede de labor interpretativo e constitui, ademais, lei especial, é a única que pode contribuir para uma avaliação/interpretação necessariamente mais correta e mais conforme à lei, o mesmo é dizer ao “preenchimento do conteúdo e dos limites” do que são as obrigações de segurança previstas no artigo 12° n° 1 da Lei n° 24/2007, de 18 de julho...

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