Acórdão nº 1377/18.7T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Março de 2023
Magistrado Responsável | RIJO FERREIRA |
Data da Resolução | 16 de Março de 2023 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA NO RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NOS AUTOS DE ACÇÃO DECLARATIVA ENTRE CREDIFÉRIAS – INVESTIMENTOS TURÍSTICOS, SA 1º Autor / Apelante / Recorrente CREDIGOLF – INVESTIMENTOS TURÍSTICOS Ldª 2º Autor / Apelante / Recorrente AA e consorte BB 3º Autor / Apelante / Recorrente CC 4º Autor / Apelante / Recorrente (aqui patrocinados por ..., adv.) CONTRA FUNDO DE GESTÃO DE PATRIMÓNIO IMOBILIÁRIOS – F... BES NOVO BANCO [administrado por GN... - ..., SA] (aqui patrocinado por ..., adv.) 1º Réu / Apelado / Recorrido NOVO BANCO, SA(aqui patrocinado por ..., adv.) 2º Réu / Apelado / Recorrido EM QUE INTERVEM PORTICENTRO- SOCIEDADE DE CONSTRUÇÃO, GESTÃO E TURISMO, Ldª(aqui patrocinada por ..., adv.) Interveniente Principal / Apelante / Recorrente I – Relatório Os Autores intentaram acção declarativa contra os Réus formulando o seguinte pedido: Termos em que deverá:
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Declarar-se a nulidade do contrato de cessão de quotas titulado por escritura pública de 5/11/2007 em que, pelo preço de € 4.932.000,00, o 1º R. cedeu à 1ª A.-Crediférias - a quota do valor nominal de € 269.350,86 e, pelo preço de €1.918.000,00, o 1º R. cedeu à 2ª A. - Credigolf - a quota do valor nominal de € 104.747,56 e, em consequência: a.1) Ordenar-se a restituição ao 1º R. da titularidade das quotas que constituem o seu objecto; a.2) Condenar-se o 1º R. a devolver às 1ª e 2ª AA. os preços por elas pagos nos montantes, respectivamente, de € 4.932.000,00 e € 1.918.000,00.
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Declarar-se a nulidade do Contrato de Financiamento com o n.º ...7 celebrado em 6/11/2007 entre a 1ª A. e o BES (cuja posição contratual foi assumida pelo 2º R.) através do qual este lhe emprestou a quantia de €5.480.000,00 e, em consequência: b.1) Ordenar-se a devolução, pela 1ª A. ao 2º R., do capital mutuado no montante de € 5.480.000,00; b.2) Condenar-se o 2º R. a restituir à 1ª A. os juros, comissões e demais encargos pagos por esta desde 6/11/2007 até hoje, no montante global de €1.824.675,98.
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Declarar-se a nulidade (e consequente extinção) das garantias constituídas para assegurar o cumprimento das obrigações decorrentes deste Financiamento FE004...2/07, nomeadamente: c.1) constituição de hipotecas voluntárias sobre os já referidos e identificados oito prédios urbanos; c.2) contrato de penhor das quotas representativas do capital social da Porticentro; c.3) Avales pessoais dados pelos 3ºs e 4º AA. E em consequência, Condenar-se o 2º R. a restituir aos 3ºs e 4º AA. a quantia de €73.404,77 (setenta e três mil quatrocentos e quatro euros e setenta e sete cêntimos) que, ao abrigo de tais avales, indevidamente lhes retirou das respectivas contas de depósitos à ordem.
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Declarar-se a nulidade do acto de utilização de € 2.105.000,00 feita pela 1ª A. ao abrigo do contrato de Financiamento com o nº ECO002...8/07 (posteriormente substituído pelo nºECO000...2/11) celebrado entre ela e o BES (cuja posição contratual foi assumida pelo 2º R.) e em consequência: d.1) Ordenar-se a devolução, pela 1ª A. ao 2º R., do capital mutuado no montante de € 2.105.000,00 d.2) Condenar-se o 2º R. a restituir à 1ª A. os juros, comissões e demais encargos pagos por esta desde 6/11/2007 até hoje, no montante global de €511.076,11.
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Declarar-se a nulidade dos avales pessoais dados pelos 3ºs e 4ºAA. para garantia do bom e pontual pagamento da quantia de € 2.105.000,00 utilizada ao abrigo do referido contrato de empréstimo nº ECO002...8/07 (posteriormente substituído pelo nº ECO000...2/11) e, em consequência, condenar-se o 2º R. a restituir aos 3ºs AA. a quantia de €2.052.550,10, correspondente ao valor da totalidade da carteira de instrumentos financeiros empenhada em garantia deste financiamento.
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Declarar-se a nulidade dos avales pessoais dados pelos 3ºs e 4 AA. no âmbito dos seguintes contratos de financiamento celebrados entre o BES e a Porticentro: f.1) O Contrato de Financiamento nº ...9 celebrado em 22/4/2009, através do qual o BES emprestou à Porticentro a quantia de € 1.000.000,00; f.2) O Contrato de Financiamento nº ...0 celebrado em 17/9/2010, através do qual o BES emprestou à Porticentro a quantia de € 350.000,00; f.3) O Contrato de Financiamento nº ...1 celebrado em 27/2/2012, através do qual o BES emprestou à Porticentro a quantia de € 1.100.000,00.
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Declarar-se a nulidade do penhor de 350 unidades de participação denominadas “Espírito Santo Reconversão Urbana II – Fundo de Investimento Imobiliário Fechado” pertencentes ao 3º A. marido constituído para garantia do Contrato de Financiamento nº ...0, através do qual o BES emprestou à Porticentro a quantia de € 350.000,00 e, em consequência, condenar-se o 2º R. na restituição aos 3ºs AA da quantia de € 350.000,00 correspondente ao valor destas 350 unidades de participação.
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Condenar-se o 1º R. a pagar às 1ª e 2ª AA. a quantia de € 14.138.882,85 a título de enriquecimento sem causa e na proporção de, respectivamente, 72% e 28% para cada uma.» Para fundamentar tal pedido alegaram, em síntese: Que os Autores singulares, clientes do “private banking” do antigo BES, confiaram a esta instituição a gestão dos valores aí depositados, tendo nesse contexto sido abordados por um quadro deste banco, que lhe apresentou um negócio envolvendo a venda de uns lotes de terreno para construção na zona urbana de ..., o que lhes foi apresentado como um excelente negócio. Esses lotes de terreno pertenciam à sociedade “Porticentro – Sociedade de Construção, Gestão e Turismo, Lda.”, cujas quotas eram, à data, totalmente tituladas pelo ora 1º Réu (então designado por “F... BES” e gerido pela “G..., S.A.”, posteriormente “F..., S.A”). Na reunião em que este negócio foi apresentado à família CC, o representante do BES e da Porticentro manifestou o interesse do BES em vender os prédios, tendo referido, de passagem, que o alvará de loteamento que havia criado os respectivos lotes para construção urbana havia caducado, por causa de pequenas obras de infra-estruturas que não foram efectuadas pelo então promotor, mas que seria relativamente fácil reactivá-lo, não tendo, contudo, feito qualquer referência à data em que essa caducidade do alvará tinha sido declarada. Na sequência desta reunião, o Autor CC consultou no arquivo camarário o processo de loteamento dos terrenos, tendo verificado que os lotes tinham uma capacidade construtiva de cerca de 90.000 m2, o que era excelente. Por iniciativa dos Réus, a compra dos terrenos pelos Autores concretizou-se através da venda da própria Porticentro, proprietária dos terrenos, sendo estes os únicos activos da sociedade; o que veio a acontecer, pelo valor de € 6.850.000,00, na escritura pública de cessão de quotas outorgada em 05.11.2007, associada a um contrato de financiamento com o próprio BES, garantido por hipotecas sobre todos e cada um dos oito lotes de terreno objecto da transacção, livrança subscrita pela Autora “Crediférias” a avaliada pelos seus administradores, ora co-Autores, e ainda o penhor das duas quotas dos valores nominais representativas do capital social da Porticentro. A parte restante do preço foi liquidada através dos fundos disponibilizados pelo contrato de empréstimo sob a forma de conta-corrente caucionada que a 1ª Autora havia celebrado com o BES. Posteriormente, tentando reactivar o processo de loteamento, os Autores vieram a saber que o alvará não podia ser reactivado, sendo esta uma informação de que os Réus dispunham antes da realização da escritura e deliberadamente não a transmitiram aos Autores, no que se revelou um choque para a família CC. Face à irreversível caducidade do alvará de loteamento ...0, as áreas de terreno dos agora inexistentes 8 lotes para construção urbana reintegraram-se na área do “prédio-mãe” de onde haviam saído, pelo que a Porticentro propôs à Câmara Municipal ... a elaboração de um Plano de Pormenor para toda esta área, diferente e melhor do que o que existira e desaparecera, plano esse que foi efectivamente elaborado e ficou conhecido como Plano de Pormenor de Estruturação Urbanística da H... (PPH...), o qual veio a ser aprovado pela Assembleia Municipal e publicado no Diário da República de 30.03.2011. Desde Novembro de 2007 que a 1ª Autora concentrou toda a sua actividade no desenvolvimento deste projecto imobiliário, nele tendo investido todos os seus recursos e ainda aqueles dos accionistas. Foram ainda, posteriormente, celebrados com o BES outros contratos de financiamento, avalizados pelos 3º e 4º Autores, o que nunca teria acontecido se a 1ª e 2ª Autoras não tivessem adquirido as quotas representativas da totalidade do capital social da Porticentro. Com o PPH..., entretanto, aprovado, a área disponível de construção aumentou significativamente, o que determinou uma enorme valorização dos terrenos e o consequente aumento do valor de mercado dos respectivos direitos de construção. Porém, para desenvolver e implementar este plano de pormenor, era indispensável garantir ao município ... a execução das necessárias e projectadas infra-estruturas, hipotecando-lhe um dos seis novos lotes, e era indispensável obter o financiamento necessário à execução das mesmas, o que só seria exequível com a constituição de hipoteca sobre um outro desses novos lotes; porém, o BES (e depois o ora 2º Réu) recusou as propostas dos Autores de cancelamento das hipotecas sobre os lotes agora inexistentes e substituição por novas hipotecas constituídas sobre os novos lotes, o que impediu o registo do novo PPH... e assim impossibilitou a execução deste plano de pormenor. Com o que causaram danos irreparáveis a todos os Autores, já que, quando foram apresentados e indirectamente vendidos os terrenos com o respectivo alvará de loteamento caducado, há muito que esses lotes não existiam, sendo legalmente impossíveis e, portanto, também insusceptíveis de serem objecto de qualquer acto jurídico, seja ele compra e venda, hipoteca ou penhora, como os Réus sabiam, anos antes do negócio com os Autores.
Ambos os Réus contestaram, contrariando a versão dos...
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