Acórdão nº 8346/16.0T8STB.E1.S2-A de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelFERNANDO BAPTISTA
Data da Resolução16 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível I. RELATÓRIO AA (A.) instaurou ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra BB (l.

a R.), CC (2.° R.), Sinal Azul, Mediação Imobiliária, Ld.

a (3.

a R.), Sotheby,s International Realty Affiliates, LLC (4.

a R.), C..., Ld.

a (5.

a R.), V..., S.A. (6.

a R.), DD (7.° R.) e EE (8.° R.), alegando, no essencial, o seguinte: . O A., pretendendo adquirir casa em Portugal e não residindo na altura aqui, recorreu à R.

“Sotheby’s”, por ser uma empresa multinacional de grande reputação com provas dadas no mercado internacional da mediação imobiliária, tendo contactado a representante da mesma em Portugal, a R. Sinal Azul.

. Porém, na aquisição desse imóvel, o A. foi enganado pelos l.

a, 2.° e 3.

a RR., porquanto, como veio a verificar depois, a descrição do mesmo escondia afinal um importante factor: uma parte significativa do prédio não estava licenciada nem era passível de o ser.

. O referido imóvel apresentava defeitos que o A. desconhecia quando o adquiriu e que se viu obrigado a reparar em virtude de o 1 .

a e 2.° R.R. não o fazerem depois de lhe terem escondido tais defeitos.

. O A. confiou nos l.

a e 2.° RR quanto às dimensões da casa, mas foi enganado pelos mesmos, já que a casa tem aproximadamente 230m2 de área clandestina e não é passível de legalização; . O A. viu-se assim envolvido num esquema ardiloso montado pela l.

a e 2.° RR e pela R. Sinal Azul, só tendo verificado que existiam áreas construídas não licenciadas mais de um mês após habitar o imóvel, quando começou a verificar inúmeros defeitos que lhe tinham sido ocultados no momento da compra e venda do imóvel.

. O valor do imóvel ficou afectado pela existência de áreas não legalizadas, nunca tendo no mercado um valor superior a € 1.500.000,00; . A demolição das áreas clandestinas importa para o A. um prejuízo direto de € 400.000,00 de que pretende ser ressarcido, a que acrescem os restantes valores que teve que pagar a título de IMT e imposto de selo.

. Sem o dolo dos 1 .

a, 2.° e 3.

a RR, o A teria adquirido o imóvel, mas por preço inferior, sendo imputável a esses RR esta responsabilidade, dado os primeiros conhecerem a realidade, por terem construído o imóvel, e a 3.

a por ter promovido a sua venda, ocultando tal realidade ao A.

. A 4.

a R. teve também conhecimento de todos os problemas gerados, tendo sido informada pelo A., sem obter qualquer resposta, sendo aquela responsável pela criação duma aparência jurídica de se tratar duma só entidade, não podendo negar-se a responder pelas dividas da 3.

a R..

. A 5.

a R. C..., sociedade com capital social distribuído por duas quotas pertencentes aos l.

a R. e 2.° R., desde maio de 2004, é apenas uma sociedade destinada a encobrir o património destes RR., tendo eles simulado a cedência das quotas a terceiros quando tiveram conhecimento de um arresto e renunciado à gerência, continuando, no entanto, a ser os únicos e efetivos titulares das quotas e a gerir a empresa, sendo as cessões de quotas nulas, envolvendo uma objetiva diminuição da garantia patrimonial do crédito do A., pelo que as cessões de quotas constituem atos cuja impugnação o A. requer que seja reconhecida.

. Esse uso artificial da 5.

a R. para efeitos de ocultação patrimonial configura uma situação de confusão de patrimónios justificativa da desconsideração da personalidade jurídica daquela R., visto que só formalmente é que ela é titular do património social materialmente dos Ia e 2.° RR.

. Assim, a 5.

a R. é responsável por todos os prejuízos sofridos pelo A. com a compra do imóvel.

. A 6.

a R., V..., tendo celebrado um seguro de responsabilidade civil com a R. Sinal Azul, responde civilmente até ao valor de € 150.000,00 perante o A. por tudo quanto esta R. venha a ser condenada.

Pediu o A. que: a) – Fossem condenados, solidariamente, os l.

a a 5.

a R.R. a pagar-lhe a quantia de € 135.000,00, a título de encargos que teve com as reparações dos defeitos ocultos do imóvel, termos dos artigos 910.°, n.° 1, 913.° e 914.° ex vi artigo 913.°, in fine, do CC; b) – Subsidiariamente a esse pedido, fosse reduzido em € 135.000,00 o preço pago pelo A. aos l.

a a 5.

a R.R., no âmbito do contrato de compra e venda do imóvel, respondendo os restantes R.R., solidariamente, por esta obrigação de restituição dos l.

a e 2.° Réus, nos termos dos artigos 911.°, n.° 1, e 913.°do CC; c) – Fossem os l.

a a 5.

a R.R., solidariamente, condenados no pagamento de € 400.000,00, nos termos do art.° 911 ° do CC, a título de redução de preço em virtude 911.°, n.° 1, e 913.° do mesmo Código; d) – Fossem os l.

a a 5.

a R.R., solidariamente, condenados a pagar ao A. o montante de € 1.600,00 correspondente ao valor pago indevidamente, por ele a título de Imposto de Selo; e) – Fossem os l.

a a 5.

a R.R., solidariamente, condenados a pagar ao A. o montante de € 12.000,00 correspondente ao valor pago indevidamente por ele a título de IMT, calculado com base num preço do imóvel inadequado; f) – Fossem os l.

a a 5.

a R.R., solidariamente, condenados a pagar ao A juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento, juros esses calculados sobre os montantes acima referidos de (a) e (f); g) – Fosse a 6.

a R. condenada a pagar ao A., até ao montante de € 150.000,00 por conta do contrato de seguro celebrado com a R. Sinal Azul, na exata medida da condenação destas até ao referido montante; h) – Fossem as cessões de quotas operadas na 5.

a R. pelos l.

a e 2.° R.R. a favor dos 7.° e 8.° R.R. constantes do documento n° 2 da petição inicial reconhecidas como nulas nos termos dos artigos 240.° e ss., 280.°, n.° 2, e 281.° do CC ou, se tal nulidade não vier a ser declarada, sejam aquelas cessões tidas por impugnadas para efeitos do previsto dos artigos 610.° e ss. do CC.

  1. Os R.R. contestaram a ação a pugnar pela improcedência da ação, tendo, no que aqui mais releva, a 1.

    a R. BB deduzido reconvenção a pedir a condenação do A. no pagamento de € 20.587,86 referente aos montantes despendidos pela mesma R. na aquisição de mobiliário para o imóvel em causa, a pedido do A., e honorários devidos à R..

    Realizada a audiência final, foi proferida sentença fls. 1081-1211, a julgar: a) – A ação totalmente improcedente com a consequente absolvição dos R.R. do pedido; b) – A reconvenção procedente, condenando o A./Reconvindo a pagar à R./Reconvinte BB a quantia de € 19.829,45 acrescida de juros de mora vencidos até à apresentação da mesma, no montante de € 758,41, e vincendos até integral pagamento, calculados à taxa legal aplicável.

    Foi o A. ainda condenado, como litigante de má-fé, a pagar a multa de 10 UC e a indemnização de € 5.000,00 à R. Sinal Azul.

    Inconformado, o A. interpôs recurso para o Tribunal de apelação para a Relação de Évora, tendo sido proferido o acórdão de fls. 1498-1588, aprovado por unanimidade, a julgar parcialmente procedente a apelação, alterando a matéria de facto, mas confirmando no mais a sentença recorrida.

    * De novo inconformado, veio o A. interpor revista excepcional ao abrigo das alíneas a) e b) do n.° 1 do art.° 672.° do CPC, formulando as seguintes conclusões: 1.” – Pede-se a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça para a correia e adequada apreciação jurídica da posição processual do Recorrente.

  2. ” – Com interesse direto para o recurso, em referência ao imóvel objeto dos autos, tem de se determinar a influência no negócio realizado e as consequências da existência de áreas não licenciadas e da sua impossibilidade de licenciamento por se exceder o limite máximo de construção para o lote em causa.

  3. ” – Em simultâneo e interligado ao problema, a necessidade de reapreciar a condenação do A. como litigante de má-fé.

  4. ” – Assim, ao estar em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito e quando são questionados interesses de particular relevância social, o Recorrente invoca a excecionalidade do recurso de revista que interpõe.

  5. ” – No caso em apreço, a divergência de áreas de construção existentes em divergência com as licenciadas não é uma questão que se cinja em exclusivo às partes.

  6. ” – Não estamos confrontados com uma simples formalidade que se pode revelar numa invalidade formal do contrato.

  7. ”- A necessidade duma licença de utilização visa acautelar e proteger interesses de ordem pública fundamentais, tutelados pelo direito do urbanismo.

  8. ” – Em causa está a defesa da vida e da saúde, a par de outros direitos pessoais e coletivos, não só dos interessados diretos dos prédios urbanos, mas no seu fim último do território e de todos os seus habitantes.

  9. ” – Qualquer decisão judicial sobre estas matérias não pode ser proferida de ânimo unicamente dirigido aos interessados diretos na quezília civil, mas à sociedade em geral.

  10. ” – A presente ação judicial nasce assente na complexidade deste negócio conduzido pelo A., cidadão estrangeiro em Portugal que procurou auxílio junto duma empresa de referência mundial no setor imobiliário, a Sotheby ‘s Internacional.

  11. ” – Com o auxílio da R. SINAL AZUL, detentora de licença da licença AMI n.° ...44, emitida pelo Instituto da Construção e do Imobiliário a 15-06-2007, que assegurava a representação em Portugal da Sothebys International, começou o A. a localizar imóveis que estivessem à venda.

  12. ” – O interesse do A. foi despertado pelo anúncio promovido pela Recorrida SINAL AZUL que estipulava o seguinte: 13.”- “..., Quinta do ..., Moradia 5 quartos: 5 quartos, 5 casas de banho, 3 garagens. Excelente moradia de arquitetura moderna composta por 4 suites, 3 das quais com closet, escritório, sala de estar, sala de jantar, sala de TV, sala de cinema, cozinha equipada Smeg com copa e lavandaria, zona de estendal, lavabo social, terraço com vista para o lago e uma excelente garagem para 3 carros. No exterior temos um bonito jardim com piscina com vista soberba para o lago e toda a natureza que a rodeia. Inserida num condomínio com segurança...

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