Acórdão nº 1669/17.2T8SNT-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelANA PAULA LOBO
Data da Resolução16 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recorrente: AA, executada, embargante Recorrido: Novo Banco, S.A., exequente * I – Relatório I.1 – Questões a decidir AA veio, por apenso à execução que lhe foi movida por Novo Banco, S.A., deduzir oposição à execução e à penhora, mediante embargos de executado, invocando, entre outros fundamentos, a não aplicabilidade da perda do benefício do prazo aos fiadores.

Foi proferida sentença que julgou os embargos parcialmente procedentes e determinou o prosseguimento da execução quanto à executada-embargante pela quantia correspondente às prestações vencidas e não pagas e respectivos juros de mora, à data da propositura da execução.

A sentença foi revogada pelo acórdão recorrido que julgou improcedentes, por não provados, os embargos de executado, determinando o normal prosseguimento da execução para pagamento integral da dívida exequenda reclamada na acção executiva principal.

A executada embargante pede revista desta decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa com apresentação de alegações de recurso que culminam com as seguintes conclusões: 1.

O Novo Banco, S.A. deu à execução a escritura pública denominada “COMPRA E VENDA, MÚTUO COM HIPOTECA E FIANÇA” (acompanhada do respetivo documento complementar), outorgada em 30.05.2001 por BB (1.ª outorgante), na qualidade de vendedora; CC, na qualidade de comprador e mutuário (2.º outorgante); DD, em representação BANCO INTERNACIONAL DE CRÉDITO, S.A., na qualidade de mutuante (3.º outorgante); EE e AA (ora opoente), na qualidade de fiadores (4.ºoutorgantes).

  1. O empréstimo seria reembolsado em 360 prestações mensais e sucessivas, a primeira com vencimento um mês após esta data e as restantes em igual dia dos meses seguintes; 3.

    Para garantia de todas as responsabilidades assumidas nos termos do referido contrato, juros e todas as despesas inerentes, o mutuário constituiu hipoteca, a favor do BIC, sobre o imóvel adquirido (fração “O”).

  2. Pelos quartos outorgantes (sendo um deles a executada/opoente AA) foi dito “que em seu nome pessoal se constituem fiadores e principais pagadores por tudo quanto a venha a ser devido ao Banco Internacional de Crédito, S.A., em consequência do empréstimo que o mutuário contraiu junto do mesmo e aqui titulado, com expressa renúncia ao benefício da excussão prévia, dando já o seu acordo a quaisquer modificações da taxa de juro e alterações de prazo, bem como a mudança de Regime de Crédito, que venham a ser convencionadas entre o Banco credor e o devedor. “ 5.

    Resulta do documento complementar que “a execução, arresto, penhora ou qualquer outra forma de oneração ou alienação do bem ora hipotecado, assim como a falta de pagamento nos respetivos vencimentos, de qualquer das responsabilidades agora garantidas, importarão a imediata exigibilidade de todas as responsabilidades garantidas e, consequentemente, a imediata exequibilidade desta escritura.” (cf. cláusula vigésima quarta) 6.

    Perscrutando a matéria factual apurada os referidos documentos – escritura e documento complementar – foram elaborados sem prévia negociação individual com os fiadores, não tendo, estes, influenciado os respetivos teores. (Cfr. ponto 6 matéria provada) 7.

    Ora, se o conteúdo da escritura e do documento complementar, foram elaborados, sem que a fiadora, enquanto destinatária do contrato, pudesse influenciar o seu teor, nunca aquela teve a faculdade, dentro do quadro da liberdade de estipulação, afastar a regra da interpelação prévia, para a exigibilidade das prestações vencidas e vincendas, ínsita no art. 781.º do C.C.

  3. Aliás, a exequente, embora em vão, batalhou incansavelmente com a demonstração da validade da interpelação dos fiadores, quer em sede de contestação fls…quer em sede de recurso, fls… 9.

    Em tempo algum a exequente afirmou/invocou que tivesse havido renúncia ao benefício do prazo.

  4. Também, a exequente no titulo executivo fls…esclarece que: “No documento complementar da mencionada escritura de hipoteca estabeleceu-se que as importâncias em dívida cujo pagamento seja obrigação emergente daquele contrato, tornar-se-iam imediatamente exigíveis em caso de arresto, penhora, alienação ou arrendamento do bem hipotecado, assim como em caso de incumprimento por parte do mutuário de qualquer das obrigações dele decorrentes.” (negrito nosso) 11.

    Portanto, repete-se, não tendo a fiadora participado nas negociações contratuais, não estamos perante a existência de qualquer liberdade de estipulação, vigorando, portanto, o regime do art.º 782º, do CC.

  5. Vigorando o regime do art.º 782.º do Código Civil, e não tendo a exequente demonstrado a validade da interpelação da fiadora em conformidade com o supra descrito (“em termos precisos”), terá de se concluir, inevitavelmente como concluiu a 1ª instância, ou seja, que, a recorrente apenas responderá, pela quantia correspondente às prestações vencidas e não pagas e respetivos juros de mora, à data da propositura da execução.

  6. A recorrente dá perfeito acolhimento à declaração de voto da Exma. Sra. Desembargadora FF que “Julgaria improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida, por entender que a citação não permite ao fiador a oportunidade de pagar as prestações vencidas, evitando a exigibilidade das vincendas, como defendido pelo tribunal recorrido, o que determina, neste caso, a necessidade de interpelação extrajudicial do fiador por parte do credor.” 14.

    Na verdade, pretende-se, assim, evitar que o fiador seja responsável para além da medida do risco que assumiu e evitar a sua ruína, pela acumulação da dívida, derivada designadamente de quotas de amortização de capital pagável com juros, comissões e outras despesas, ruína que inevitavelmente poderá vir a suceder nos presentes autos, pois a recorrente é uma pessoa com quase 70 anos de idade, viúva, séria, honrada, cumpridora dos seus compromissos e que nunca se viu demandada em tribunal por qualquer dívida ou outra razão de natureza civil ou criminal.

  7. Pelo que, sempre com o devido respeito que é muito, o douto Acórdão recorrido não fez uma correta interpretação da lei, nomeadamente do disposto nos artigos 781.º, 782.º e 805.º, todos do Código Civil.

    Nestes termos, nos melhores de Direito, e com o sempre mui douto suprimento de V. Exas. deverá o presente recurso ser julgado procedente, devendo o Acórdão recorrido ser revogado, mantendo-se na íntegra a decisão do Tribunal de 1.ª instância, nos seus precisos termos, respondendo a recorrente apenas, pela quantia correspondente às prestações vencidas e não pagas e respetivos juros de mora, à data da propositura da execução.

    O recorrido apresentou contra-alegações defendendo a confirmação do acórdão recorrido com a formulação das seguintes conclusões: 1.

    Ao decidir como decidiu o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu Acórdão, fez uma correta apreciação dos factos trazidos a juízo e adequada aplicação do direito, não merecendo, no que respeita à parte objecto do presente recurso, qualquer censura ou reparo.

  8. A Recorrente AA interpôs o presente recurso de Revista do Acórdão da Relação de Lisboa que decidiu “julgar a apelação procedente por provada, julgando revogar a sentença recorrida que assim é substituída pela decisão de julgarmos improcedentes por não provados os embargos de executado, determinando o normal prosseguimento da execução para pagamento integral da dívida exequenda reclamada na ação executiva principal.” 3.

    Escudando a sua argumentação no voto vencido proferido no acórdão de que recorre e que pugna pelo indeferimento da Apelação “confirmando a decisão recorrida, por entender que a citação não permite ao fiador a oportunidade de pagar as prestações vencidas, evitando a exigibilidade das vincendas, como defendido pelo tribunal recorrido, o que determina, neste caso, a necessidade de interpelação extrajudicial do fiador por parte do credor.

  9. Contudo, na esteira do que entendeu o Tribunal da Relação de Lisboa, não poderá colher o entendimento da Recorrente.

  10. É a seguinte a factualidade processual, julgada por provada e mencionada pelo Acórdão da Relação, com pertinência para o presente recurso e que infra se transcreve: 6.

    “1. O Novo Banco, S.A. deu à execução a escritura pública denominada “Compra e Venda, Mútuo com Hipoteca e Fiança” (acompanhada do respetivo documento complementar), outorgada em 30.05.2001 por BB(1.ª outorgante), na qualidade de vendedora; CC, na qualidade de comprador e mutuário (2.º outorgante); DD, em representação Banco Internacional de Crédito, S.A., na qualidade de mutuante (3.º outorgante); EE e AA (embargante), na qualidade de fiadores...

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