Acórdão nº 118/23 de Tribunal Constitucional (Port, 16 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelCons. Mariana Canotilho
Data da Resolução16 de Março de 2023
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 118/2023

Processo n.º 1154/22

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Mariana Canotilho

Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Évora, A. veio apresentar reclamação, nos termos do n.º 4 do artigo 76.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho proferido naquele Tribunal que, em 17 de outubro de 2022, não admitiu o recurso interposto para o Tribunal Constitucional (fls. 308-310).

2. A aqui reclamante interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Évora da decisão de primeira instância proferida pelo Tribunal Judicial da Comarca de Faro (Juízo Central Cível de Faro), que a condenou no pagamento de uma quantia de € 50.000,00 (acrescida de juros de mora) a título de compensação por danos não-patrimoniais (cf. fls. 105-138). Pelo acórdão de 28 de outubro de 2021, o Tribunal da Relação de Évora julgou parcialmente procedente o recurso, alterando o montante da condenação para € 45.000,00 (cf. fls. 162-191).

Notificada deste acórdão, interpôs recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, no qual suscitou a nulidade da decisão recorrida (cf. fls. 196-209). O Tribunal da Relação de Évora apreciou os invocados vícios de nulidade e julgou-os improcedentes, por acórdão de 13 de janeiro de 2022. Ordenada, então, a subida dos autos até ao Supremo Tribunal de Justiça, foi rejeitada a revista, por acórdão de 9 de março de 2022 (cf. fls. 244-250).

Notificada do acórdão, a aqui reclamante apresentou arguição de nulidade sobre o mesmo, com fundamento em omissão de pronúncia, que veio a ser indeferida por aquele Supremo Tribunal em 26 de abril de 2022 (cf. fls. 259-261). A aqui reclamante apresentou, ainda, um requerimento para correção de um lapso de escrita, o que levou à prolação de uma nova versão do aludido acórdão.

Recebendo o Tribunal da Relação de Évora os autos, proferiu despacho a ordenar a sua descida até à 1.ª instância (cf. fls. 279). Sobre este despacho a reclamante apresentou novo requerimento de suscitação de nulidade, por entender que aquele tribunal não cumpriu o decidido no aresto de 9 de março de 2022. Este requerimento foi indeferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, por decisão proferida em 15 de setembro de 2022 (cf. fls. 298-300).

3. Inconformada, veio a ora reclamante interpor recurso de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional (cf. fls. 314-317), ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b) da LTC, «em referência ao também douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 28 de outubro de 2021 «cujas vias recursórias se esgotaram com aquele», para apreciação da constitucionalidade das seguintes questões:

«(…) os artigos 186°, n.° 2, al. a), 552°, n° 1 al. d), do Código de Processo Civil, quando interpretados no sentido de que a alegação na Petição Inicial dos factos se conforma com alegações genéricas e abstractas, proclamatórias e de meros estados de alma, e não exige a alegação de factos concretos, objectivados em termos de tempo, lugar e modo, e os Artigos 70°, 80°, 483°, 1901°, do Código Civil, interpretados no sentido de admitirem a imposição ao cidadão da obrigação de comunicar a outrem factos da sua vida íntima atentatórios da sua liberdade sexual, como seja actos sexuais com outrem - que deveriam ter sido interpretados e aplicados de modo a não impor à R a sujeição a situações humilhantes e vexatórias, ofensivas da sua dignidade, intimidade e vida privada

Pelo despacho agora reclamado, o Tribunal da Relação de Évora não admitiu a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, com os seguintes fundamentos:

«(…)

Neste caso, aquilo que é absolutamente determinante é que o recurso interposto é extemporâneo e a decisão que era susceptível de impugnação por via recursal para o Tribunal Constitucional era o acórdão anteriormente prolatado pelo Supremo Tribunal de Justiça.

Vejamos:

O Tribunal de Primeira Instância condenou a Ré A. a pagar ao Autor B. a quantia de 50.000,00 €, acrescida de juros de mora desde a citação até integral pagamento, em vigor para os juros civis, absolvendo-a do demais peticionado.

Impugnada esta decisão por via recursal, em 28/10/2021, o Tribunal da Relação de Évora decidiu julgar parcialmente procedente o recurso interposto, concedendo-se ao Autor uma indemnização de 45.000,00 € (quarenta e cinco mil euros), acrescida de juros à taxa legal, contados desde a prolação da sentença recorrida, até integral e efectivo pagamento.

Foram alegadas nulidades do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de Évora e as mesmas foram oportunamente decididas por acórdão autónomo, em conferência, proferido em 13/01/2022.

Subidos os autos, foi rejeitada a revista excepcional por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 09/03/2022. Invocou então o recorrente a nulidade do acórdão da formação (24/03/2022) e foi designado para conferência o dia 26/04/2022. Em conferência, na formação do Supremo Tribunal de Justiça, nessa data, foi indeferida a reclamação.

Posteriormente, 09/05/2022, a recorrente assinalou a existência de um lapso de escrita e o Supremo Tribunal de Justiça, em 02/06/2022, por acórdão, procedeu à rectificação pretendida.

Por acórdão datado de 15/09/2022, o Tribunal da Relação de Évora tomou de novo posição sobre as nulidades suscitadas, dizendo que as mesmas já haviam sido conhecidas na decisão colectiva de 13/01/2022.

Assim, como já se afirmou, da mesma forma que se socorreu do pedido de rectificação para o efeito acima assinalado (quantificação do montante da condenação por parte do Supremo Tribunal de Justiça) a recorrente deveria ter utilizado o mesmo meio processual para corrigir a decisão inicial do relator Exm° Senhor Juiz Conselheiro - quando afirmou, por lapso, que o Tribunal da Relação de Évora não se tinha pronunciado sobre as nulidades invocadas.

Não existem segundas oportunidades para interpor recurso. Na verdade, a decisão de 15/09/2022 não se pronuncia autonomamente sobre a aferição da compatibilidade constitucional de qualquer norma e o acórdão do qual se poderia ter interposto recurso para o Tribunal Constitucional era o tomado pelo Supremo Tribunal de Justiça em conferência no dia 26/04/2022.

Deste modo, não se mostram preenchidos os requisitos habilitantes para a admissibilidade do recurso em termos de prazo de propositura do recurso.

*

Porém, mesmo que assim não fosse, a título meramente subsidiário, o recurso também não seria admissível em função do seu objecto, o que, certamente, não fora a questão da tempestividade, determinaria o seu não conhecimento.

(…)

Tal como consta do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional e do processado anterior sempre que foi invocada uma desconformidade constitucional por parte da agora recorrente, aquilo que a mesma pretende sindicar é o acto de julgamento, quando o Tribunal da Relação de Évora entendeu que existis um conflito de deveres e optou por solução discordante àquela que o recurso preconizava e ao entender que os elementos disponibilizados na petição inicial e no processo ao nível das circunstâncias de tempo, modo e lugar eram suficientes para perfectibilizar o exercício do direito de contestar.

Assim, caso não fosse extemporâneo, por não ser a decisão de 15/09/2022 que contém qualquer juízo de aferição de compatibilidade constitucional, a referida alegação de inconstitucionalidade estaria sujeita a determinados requisitos que, relativamente ao objecto, também não se mostram viáveis no caso concreto.»

4. Notificado deste despacho que não admite o recurso, o recorrente apresentou reclamação, nos termos do n.º 4 do artigo 76.º da LTC, tendo deduzido os seguintes fundamentos (cf. fls. 314-317):

«(…)

I

Extemporaneidade do Recurso

Vejamos os factos.

1 - Em 24 de Maio de 2021 foi proferida sentença pelo Tribunal Judicial da Comarca de Faro

(Juiz 2 do Juízo Central Cível);

2 — Em 5 de Julho de 2021 foi interposto Recurso de Apelação para o Tribunal da Relação de Évora;

3 - Em 28 de Outubro de 2021 foi proferida Acórdão pelo Tribunal da Relação de Évora (com provimento parcial);

4 - Em 1 de Dezembro de 2021 foi interposto Recurso de Revista Excepcional para o Supremo Tribunal de Justiça;

5 - Em 9 de Março de 2022 foi proferido Acórdão pela Formação do STJ, a rejeitar o Recurso de Revista Excepcional;

6 - Em 24 de Março de 2022 foram pela Recorrente arguidas nulidades do Acórdão da Formação referido no número anterior;

7 - Em 26 de Abril de 2022 foi proferido Acórdão pela Formação do STJ, que indeferiu a

invocação de nulidades referida no número anterior - mais determinando que, transitado o mesmo em julgado, "remetam-se os autos ao segundo grau para conhecimento das nulidades invocadas, nos termos do n° 5 do artigo 617° do CPCivil";

8 - Em 9 de Maio de 2022 foi requerida pela Recorrente a reparação de lapso do Acórdão anterior e invocado que, face ao ordenado na parte final do mesmo Acórdão, só após a notificação do Tribunal da Relação de Évora poderá recorrer para o Tribunal Constitucional;

9 - Em 2 de Junho de 2022 foi proferido Acórdão pela Formação do STJ, que, deferindo o

requerido, rectifica os Acórdão anteriores - e, face à invocação da parte sublinhada nos números anteriores, determina "...cumpra-se o anteriormente ordenado";

10 - Em 1 de Julho de 2022 foi pelo Exmo Relator da Relação de Évora proferido despacho do seguinte teor: "Visto. Desçam os autos à Primeira Instância";

11 - Em 8 de Julho de 2022 pela Recorrente foi arguida a nulidade desse despacho porquanto, tendo o despacho que não admitiu a Revista Excepcional determinado que. Transitado em julgado este Acórdão..., remetam-se os autos ao segundo grau para conhecimento das nulidades invocadas, nos termos do n° 5 do artigo 617° do...

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