Acórdão nº 00153/22.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2023
Magistrado Responsável | Maria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão |
Data da Resolução | 10 de Março de 2023 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO P..., S.A. instaurou acção administrativa contra o IAPMEI - AGÊNCIA PARA A COMPETITIVIDADE E INOVAÇÃO, I.P., ambos melhor identificados nos autos.
Pediu a declaração de nulidade ou anulação da Decisão de Encerramento do Projeto, aprovada em reunião da Comissão Diretiva do PO Norte, em 10.01.2019, notificada à Autora em 20.10.2021, que junta como doc. ... da p.i..
Por saneador sentença proferido pelo TAF do Porto foi julgada verificada a excepção dilatória de ilegitimidade passiva e absolvido da instância o Réu.
Deste vem interposto recurso.
Alegando, a Autora formulou as seguintes conclusões: I.
Vem a Autora (ora Recorrente) interpor recurso do saneador sentença proferido pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, através do qual aquela douta Instância julgou procedente a exceção dilatória de ilegitimidade passiva do Réu (ora Recorrido), nos termos do disposto na alínea e) do n.° 4 do artigo 89.° do CPTA e, em consequência, absolveu o Réu (ora Recorrido) da instância, à luz do preceituado no n.° 2 do mesmo artigo; II.
Em termos sintéticos, julgou o douto Tribunal a quo que, no caso em apreço, uma vez que o objeto dos presentes autos se reconduz à impugnação de uma decisão da Comissão Diretiva da Autoridade de Gestão do PO NORTE que configura um ato praticado por uma entidade administrativa independente, destituída de personalidade jurídica, deveria a presente ação ter sido intentada contra a pessoa coletiva Estado, nos termos do n.° 3 do artigo 10.° do CPTA, pelo facto de a entidade autora do ato impugnado não pertencer a mais nenhuma pessoa coletiva de Direito Público; III.
A 20.01.2022, a aqui Recorrente intentou, ao abrigo da alínea a) do n.° 1 do artigo 37.° do CPTA, uma ação administrativa com vista à impugnação de atos administrativos, concretamente da Decisão de Encerramento do Projeto, aprovada em reunião da Comissão Diretiva do PO Norte, em 10.01.2019, e notificado à Recorrente em 20.10.2021; IV.
Citado da entrada em juízo da ação vinda de aludir, o Recorrido apresentou, a 18.03.2022, a sua contestação face a tudo quanto foi alegado na petição inicial que deu origem aos presentes autos; V.
Nesse sentido, o Recorrido apresentou defesa por exceção e por impugnação, tendo invocado, desde logo, no que tange com o primeiro tipo de defesa, (i) a sua ilegitimidade passiva para a presente ação, porquanto o autor do ato administrativo impugnado é a Comissão Diretiva do PO Norte, entidade distinta daquela que foi demandada nos presentes autos; e (ii) a intempestividade da prática do ato processual de impugnação por estar em causa uma decisão datada de 10.01.2019, e desse modo, há muito ter decorrido o prazo de três meses para impugnar o ato, nos termos do artigo 58.°, n.°1, alínea b), do CPTA; VI.
Por sua vez, a Recorrente, uma vez notificada da contestação apresentada pelo Recorrido a 07.03.2022, veio, ao abrigo do disposto no artigo 85.°-A do CPTA, apresentar a sua competente réplica, através da qual se pronunciou sobre as exceções invocadas pelo Recorrido, pugnando pela sua manifesta improcedência; VII.
Sem prejuízo de tudo quanto ficou demonstrado pela Recorrente em sede de réplica, encerrada a fase dos articulados, e em sede de saneador sentença, prolatado ao abrigo do disposto na alínea a) do n. ° 1 do artigo 88.° do CPTA, foi o Réu absolvido da instância por ter sido julgada procedente, pelo douto Tribunal, a exceção dilatória da ilegitimidade passiva, nos termos do disposto no n.° 2 e na alínea e) do n.° 4 do artigo 89.° do CPTA; VIII.
Sucede que, tal como se irá demonstrar abaixo com suficiente e esclarecedora clareza, a sentença recorrida padece de flagrantes erros de julgamento de Direito, motivo pelo qual deverá ser revogada com todas as legais consequências; IX.
Tal como acima se referiu amiúde, e de forma detalhada, a Autora, confrontada com a alegação proferida pelo Réu no que diz respeito à sua própria ilegitimidade passiva, apresentou um conjunto de fundamentos que, devidamente analisados, conduziriam à constatação óbvia e indelével de que o erro da Recorrente na conformação subjetiva passiva da presente lide apresentava uma natureza iminentemente desculpável, algo que, como é lógico, não é de somenos importância; X.
Tal como abaixo se demonstrará, não só os fundamentos sobre o qual o douto Tribunal a quo se pronunciou no sentido de aferir sobre a desculpabilidade ou não do erro cometido pelo Recorrente não correspondem à totalidade daqueles que foram aduzidos por este último em sede de réplica, como a análise que faz sobre aqueles sobre os quais se pronuncia se encontra eivada de manifesta ilegalidade; XI.
Com efeito, começa o douto Tribunal a quo por afirmar que o facto de o ato referir expressamente que a sua autoria “(...) é da autoria da autoridade de gestão” afasta qualquer possibilidade de o erro na indicação da entidade demandada nos presentes autos se dever ter como desculpável; XII.
Acontece que, com o devido respeito, tal análise é profundamente lacónica e sumária, uma vez que não aborda o impacto que na análise de tal questão deve ter o facto de o ato administrativo praticado violar, de forma ostensiva, o disposto no artigo 144.° do CPA no que diz respeito ao conteúdo obrigatório das notificações dos atos administrativos e as consequências que tal inadimplemento tem na identificação da entidade autora do ato ora em crise; XIII.
Assim sendo, tendo em conta o disposto naquela norma, pela circunstância de estarmos perante um ato administrativo de conteúdo desfavorável à aqui Recorrente, a exceção subsumida no n.° 3 do artigo 114.° do CPA não encontra, no caso concreto, os seus pressupostos cumpridos para a sua aplicação, pelo que, diga-se, o ato deveria ser notificado na sua totalidade e não apenas parte da sua fundamentação, tal como aconteceu no caso vertente; XIV.
Com efeito, caso a notificação do ato administrativo ora em causa tivesse ocorrido em estrito cumprimento da disciplina prevista no n.° 3 do artigo 114.° do CPA, isto é, acompanhada da deliberação propriamente dita da Autoridade de Gestão em que se deliberou no sentido espelhado no ato administrativo impugnado, aí sim ficariam dissipadas todas e quaisquer dúvidas que a Recorrente pudesse eventualmente ter quanto à entidade a demandar nos presentes autos; XV.
Não tendo assim sido, pese embora do ato conste a indicação da sua autoria como pertencendo à Comissão Diretiva da Autoridade de Gestão, a verdade é que tal referência não é de molde a, só por si, tornar indesculpável o erro cometido pela Recorrente na conformação subjetiva passiva da presente lide, uma vez que a mesma não apaga o facto de o ato administrativo estar notificado ao arrepio das regras que disciplinam esta última operação material, designadamente o n.° 3 do artigo 114.° do CPA; XVI.
Em bom rigor, tal incumprimento até potencia o erro que a Recorrente acabou por cometer na estrita e indelével medida em que, sendo a notificação realizada num documento ao qual se encontrava aposto o papel timbrado do aqui Réu e não tendo a mesma sido acompanhada da efetiva deliberação adotada pela Comissão Diretiva da Autoridade de Gestão ora em causa, tais circunstâncias apenas levaram a Recorrente (como levariam qualquer destinatário na mesma posição) a crer que o autor do ato administrativo ora em crise seria o Réu, razão pela qual deveria ser aquele a entidade demandada nos presentes autos; XVII.
Ademais, se tal erro de julgamento de Direito é evidente tendo por base o incumprimento do disposto no n.° 3 do artigo 114.° do CPA, a verdade é que o mesmo não perde essa mesma qualidade quando em causa esteja a simultânea violação, pelo ato impugnado nos presentes autos, da disciplina ínsita no artigo 151.° do CPA; XVIII.
Note-se, desde logo, que o ato administrativo impugnado nos presentes autos não se encontra devidamente assinado por qualquer entidade, o que torna (no mínimo) pouco claro quem foi o seu autor; XIX.
Em boa verdade, pese embora a relação incindível entre o disposto no artigo 151.° do CPA e a circunstância de o ato administrativo impugnado nos presentes autos se encontrar espelhado num documento com o papel timbrado do Réu, relação essa que é inequivocamente sindicada pela mais conceituada Doutrina, a verdade é que o douto Tribunal a quo ignorou olimpicamente essa evidência, cometendo o evidente erro de julgamento de Direito de considerar que poderia analisar o impacto que tal facto teria na conformação subjetiva da presente lide sem analisar devidamente o incumprimento in casu da disciplina prevista no normativo vindo de analisar; XX.
A este respeito convém não perder de vista que tendo a Recorrente configurado o Réu como autor do ato por expressa falha na sua elaboração - atendendo à violação conjunta da disciplina prevista no n.° 3 do artigo 114.° e no artigo 151.° do CPA - essa falha não pode, como nunca poderia, ser encarada como imputável a si enquanto destinatária do ato; XXI.
Nessa medida, e atendendo às repercussões jurídicas que resultam de tal conduta, não pode se não a douta sentença recorrida ser revogada por este douto Tribunal ad quem e, nessa medida, ser a mesma substituída por uma outra que, sopesando as alegações da Recorrente em toda a sua extensão e efeitos, determine a desculpabilidade do erro da Recorrente na conformação da presente lide e determine o prosseguimento desta última contra o Estado, nos termos do disposto no n.° 3 do artigo 10.° do CPTA; XXII.
Para além de julgar, a nosso ver mal, a existência nos presentes autos de uma situação de ilegitimidade passiva do Recorrido apta a determinar, sem mais, a absolvição da instância do Recorrido, a douta sentença ora recorrida incorreu num novo julgamento de Direito corporizado na circunstância de ter considerado que a exceção de ilegitimidade passiva singular apresenta uma natureza insuprível e, como tal, tem que inexoravelmente conduzir àquele...
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