Acórdão nº 00279/22.7BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 10 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução10 de Março de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO AA, portador do Cartão de Cidadão n.º ..., com o número de identificação fiscal ... e residência na Rua ..., ..., em ..., ..., requereu contra o Ministério da Administração Interna, com o número de identificação de pessoal colectiva ... e sede na Rua ..., em Lisboa, providência cautelar de suspensão da eficácia de acto administrativo, tendo como objecto o despacho do Ministro da Administração Interna de 16.08.2022, que, no âmbito do Processo Disciplinar n.º ...20, lhe aplicou a pena disciplinar de suspensão simples por noventa dias.

Indicou, como contra-interessada, a Polícia de Segurança Pública, com o NIPC ... e sede no Largo Penha de França, em Lisboa.

Formulou o seguinte pedido: (…) Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exa. doutamente suprirá, considerado provado e procedente o presente requerimento, deve a Decisão de Sua Excelência o Ministro da Administração Interna, no âmbito do processo disciplinar ...20, ser suspensa ou adoptar-se outra providência cautelar que o Tribunal considere mais adequada, tudo com as devidas e legais consequências, voltando o Requerente a ser reintegrado no seu trabalho, até ser proferida decisão no âmbito da acção principal de impugnação da decisão proferida em sede de processo disciplinar.

Por sentença proferida pelo TAF de Mirandela foi julgada procedente a providência.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Requerido formulou as seguintes conclusões: I-A douta sentença errou quando concedeu a providência cautelar requerida, visto que para tal acontecer era necessário que o Requerente preenchesse os dois pressupostos do artigo 120º, nº 1, do CPTA e, ainda, que lhe fosse favorável a ponderação de interesses abordada no nº 2 do mesmo artigo. Ora II- O Ministério Recorrente entende – e julga demonstrá-lo – que a situação do Autor não preenche o pressuposto relativo à previsibilidade de a pretensão da ora Requerente vir a ser julgada procedente no processo principal, previsto no artigo 120º, nº 1, do CPTA.

III- A douta sentença concluiu: “Daqui decorre que, a 18.02.2020, quando o Ministro da Administração Interna ordenou a instauração do processo disciplinar contra o Requerente, já o mesmo se encontrava prescrito”. Mas sem razão.

IV- O processo de Inquérito foi instaurado logo em 20 de outubro de 2018, imediatamente a seguir ao conhecimento sobre a primeira publicação, em plena vigência do RD/PSP aprovado pela Lei de 1990.

V- O RD/PSP não estabelece prazo perentório para a realização do inquérito. O artigo 111º é exuberante na indicação de que o “inquiridor” tem os mais amplos poderes para “a efetivação das diligências ordenadas”, bastando que disso informe “a entidade que tiver mandado instaurar o processo”.

VI- E O ED/PSP, que entrou em vigor em Julho de 2019, também não estabelece um termo perentório; crucial é que sejam “realizadas as investigações indispensáveis para atingir os objetivos do processo” (cf. artigo 118º, nº 3).

VII- Significa que, mesmo que o ED/PSP fosse aplicável ao caso após a sua entrada em vigor, não existe neste Estatuto norma com os efeitos preclusivos que são indicados na douta argumentação da sentença.

VIII- A douta sentença incorreu em erro de direito, pois ignorou que a lei não prevê a existência da prescrição do processo de inquérito, conforme se esclarece no nº 3 (ver ainda nº 4).

IX- A conduta reiterada do Autor manteve-se até 20 de julho de 2020 – data em que a publicação se mantinha (cf. pág. 16, nº 21) –, e portanto é essa data que constitui o termo inicial da contagem do prazo dos três meses a que se referem as normas do artigo 55º, nº 3, do RD/PSP e do artigo 48º, nº 3, do ED/PSP. Ora X- O processo disciplinar já fora instaurado, em 18 de fevereiro de 2020. Aliás, XI- O Ministro da Administração Interna, que determinou a instauração do processo disciplinar, só conheceu os factos em causa – com a sua relevância disciplinar – com a leitura do Despacho da Senhora Inspetora-Geral, de 7 de janeiro de 2020. Assim, XI- Pelas razões apresentadas, a douta sentença incorreu em erro de direito sobre a norma do artigo 120º, nº 1, do CPTA.

Termos em que, com o suprimento, deve o Tribunal Central Administrativo Norte admitir o presente recurso jurisdicional e julgá-lo procedente, anulando em consequência a douta sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, datada de 29 de dezembro de 2022.

O Requerente juntou contra-alegações e concluiu: 1- O recorrente, nas doutas alegações, utiliza argumentos e fundamentos descontextualizados para tentar fazer valer a sua tese de que não se encontram preenchidos todos os pressupostos para o decretamento da providência cautelar.

2- Ora, é necessário, contextualizar e enquadrar toda a situação não podendo o recorrente “escolher” os elementos que entende apropriados, de forma cirúrgica, para fazer valer a sua tese.

3- Acresce que o recorrente nas suas alegações e conclusões não determina o efeito prático e consequência das suas alegações, isto é, não identifica se considera existir nulidade da sentença ou outro vício.

4- O recorrente alega apenas existir “erro de direito”, mas não fundamenta cabalmente e de acordo com os requisitos legais esta sua tese.

5- De acordo com o preceituado na al. b), no número 1 do artigo 615.º do Código do Processo Civil (CPC) é nula a decisão quando o juiz «não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão». A nulidade prevista na referida disposição legal só se verifica quando “haja falta absoluta de justificação do julgado, e não quando ela seja incompleta ou deficiente” - cfr. Ac. do STJ, de 01.03.1990, BMJ, 395.º-479. Deste modo, uma fundamentação errada ou incompleta da sentença traduz apenas erro de julgamento. Por outro lado, apenas existe omissão de pronúncia quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não poderia tomar conhecimento, pelo que, a nulidade por omissão de pronúncia, prevista na al. d), do número 1 do artigo 615.º do CPC, está diretamente relacionada com o comando do nº 2 do artigo 608º do CPC, de cujos termos resulta que "o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras".

6- Conforme resulta do exposto, uma primeira observação que cumpre efetuar, é que a nulidade prevista na alínea b) do número 1 do art.º 615.º do C.P.C não se reconduz, nem se confunde com a nulidade decorrente de omissão de pronúncia.

7- Por outro lado, quer sob o prisma da falta de fundamentação, quer sob o prisma da omissão de pronúncia, a decisão recorrida não padece de nenhuma dessas nulidades.

8- Conforme vem espelhado na decisão recorrida, que aqui se dá por reproduzida, a mesma contém uma adequada e criteriosa fundamentação, quer de facto, quer de direito, e, nela o Juiz do Tribunal a quo cuidou de tratar e de considerar todos os factos relevantes para a prolação da decisão.

9- Na sentença vêm, pois, claramente, exaradas as razões pelas quais o tribunal a quo entendeu estarem reunidos os pressupostos para o decretamento da providência cautelar, sendo a mesma dotada da adequada fundamentação de facto e de uma abundante e esclarecedora fundamentação jurídica, de tal forma que, sem necessidade de mais considerações, só pode concluir-se pela total...

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