Acórdão nº 2903/20.7T8VLG.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA OLINDA GARCIA
Data da Resolução01 de Março de 2023
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.2903/20.7T8VLG.P1.S1 Recorrente: “Condomínio ...” Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1. A sociedade “I..., Ldª” propôs três ações declarativas de condenação contra o “Condomínio ...”, pedindo a condenação do réu a: 1.1. Quanto à primeira ação: a) reconhecer a existência do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes; b) reconhecer o incumprimento da denúncia do contrato e, em consequência, reconhecer a resolução do contrato por revogação unilateral; c) a pagar à autora a quantia global de € 34.581,14, conforme peticionado nos artigos 14.º, 15.º e 17.º da PI.

d) a pagar à autora juros de mora contados à taxa máxima desde o seu vencimento e até efetivo e integral pagamento dos valores supracitados, totalizando até à presente data um montante global de € 3.113,27.

1.2.

Quanto à segunda ação: a) reconhecer a existência do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes; b) reconhecer o incumprimento da denúncia do contrato e, em consequência, reconhecer a resolução do contrato por revogação unilateral; c) a pagar à autora a quantia global de € 28.956,82, conforme peticionado nos artigos 17.º, 18.º e 20.º da PI.

d) a pagar à autora juros de mora contados à taxa máxima desde o seu vencimento e até efetivo e integral pagamento dos valores supracitados, totalizando até à presente data um montante global de € 2.618,50.

1.3. Quanto à terceira ação: a) reconhecer a existência do contrato de prestação de serviços celebrado entre as partes; b) reconhecer o incumprimento da denúncia do contrato e, em consequência, reconhecer a resolução do contrato por revogação unilateral; c) a pagar à autora a quantia global de € 26.813,15, conforme peticionado nos artigos 17.º, 18.º e 20.º da petição inicial.

d) a pagar à autora juros de mora contados à taxa máxima desde o seu vencimento e até efetivo e integral pagamento dos valores supracitados, totalizando até à presente data um montante global de € 2.414,45.

  1. O réu contestou as referidas ações, invocando a anulabilidade dos contratos (nos termos do art.261º do CC), pelo facto de a sociedade administradora do Condomínio e a sociedade prestadora de serviços terem sido representadas pelo mesmo gerente. Alegou ainda, além do mais, que a autora não poderia exigir simultaneamente o cumprimento do contrato e o pagamento da cláusula penal.

  2. Por despacho de 21.12.2021, as referidas ações foram apensadas [passando a existir os apensos A e B dos presentes autos], tendo sido ouvidas as partes, que se pronunciaram nesse sentido, por serem as partes as mesmas e estarem em discussão, essencialmente, as mesmas questões.

  3. A primeira instância, por sentença de 20.05.2022, veio a proferir a seguinte decisão: «julgar as ações parcialmente procedentes por provadas e, em consequência: I – Condena o réu a reconhecer os contratos aludidos em 2, 22 e 38 dos factos provados; II – Condena o réu a pagar à autora a quantia de € 1.750,00 (mil setecentos e cinquenta euros), acrescida de juros vencidos e vincendos desde a data do vencimento das faturas elencadas em 13 dos factos provados até efetivo pagamento e sobre o respetivo capital, no âmbito do processo principal; III – Condena o réu a pagar à autora a quantia de € 1.075,00 (mil e setenta e cinco euros), acrescida de juros vencidos e vincendos desde a data do vencimento das faturas elencadas em 32 dos factos provados até efetivo pagamento e sobre o respetivo capital, no âmbito do processo principal; IV – Condena o réu a pagar à autora a quantia de € 994,74 (novecentos e noventa e quatro euros e setenta e quatro cêntimos), acrescida de juros vencidos e vincendos desde a data do vencimento das faturas elencadas em 48 dos factos provados até efetivo pagamento e sobre o respetivo capital, no âmbito do processo principal; V – Absolve o réu do demais peticionado nestes autos e nos apensos A e B.» 5. Inconformada com essa decisão a autora interpôs recurso de apelação, tendo o TRP, por acórdão de 27.10.2022, decidido nos seguintes termos: «julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência: 1- revogar a decisão recorrida no segmento em que absolveu o réu do pedido de condenação no pagamento das facturas: -A19/483 de 12-07-2019 e vencida a 15-07-2019, no valor de € 20.000,00; - A19/485 de 12-07-2019 e vencida a 15-07-2019, no valor de € 20.000,00; - A19/487 de 12-07-2019 e vencida a 15-07-2019, no valor de € 16.800,00; 2. Condenar o réu a pagar à autora o valor total de € 56.800,00, acrescido de juros de mora, vencidos desde a data de vencimento das respectivas facturas e, vincendos, até integral pagamento, às sucessivas taxas de juro vigentes para as obrigações comerciais.» 6.

    Contra essa decisão, o reu interpôs o presente recurso de revista, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões: «I.

    A Autora apresentou recurso para o Tribunal da Relação do Porto que decidiu “julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência, 1. revogar a decisão recorrida no segmento em que absolveu o réu do pedido de condenação no pagamento das facturas: - ...3 de 12-07-2019 e vencida a 15-07-2019, no valor de € 20 000,00; - ...5 de 12-07-2019 e vencida a 15-07-2019, no valor de € 20 000,00; - ...7 de 12-07-2019 e vencida a 15-07-2019, no valor de € 16 800,00; 2. condenar o réu a pagar à autora valor total de € 56.800,00, acrescido de juros de mora, vencidos desde a data de vencimento das respectivas facturas e, vincendos, até integral pagamento, às sucessivas taxas de juro vigentes para as obrigações comerciais.”; II. Naturalmente, o Recorrente – aqui réu – não se conforma com a douta decisão e pede aos Veneráveis Conselheiros a anulação da decisão; III. as questões de direito que fundamentam o presente recurso de revista são: união de contratos de prestação de serviços no âmbito da administração de condomínio, da resolução do contrato e da cláusula leonina; IV. A perspectiva tradicional da mera verificação dos elementos essenciais para a qualificação limita-se à análise singular do contrato.

    V. No entanto, a realidade actual revela que os contratos estabelecem relações uns com os outros, em virtude da complexidade económica e financeira em que as sociedades modernas se transformaram; VI. O réu é um condomínio cujos condóminos decidiram em 2015 reeleger uma sociedade comercial para gerir as partes comuns dos prédios.

    VII. De acordo com a lei civil, o administrador do condomínio tem como função, entre outras, realizar actos conservatórios dos direitos relativos aos bens comuns; VIII. Deste modo, o Sr. AA que era o legal representante da sociedade “C..., Lda.”, que tinha sido reeleita para administrar o réu, assinou três contratos de prestação de serviços pelo prazo de 7 anos com a Autora, na qual o Sr. AA é o seu representante legal, uma vez que é sócio-gerente; IX. A questão que se coloca é saber se o contrato de prestação de serviços para gerir um condomínio está ou não unido/coligado com os restantes contratos de prestação de serviços de limpeza, jardinagem ou de manutenção aos edifícios, quando essas sociedades pertencem à pessoa que está a gerir o condomínio; X. Salvo melhor entendimento, entendemos que estamos perante contratos de prestação de serviços unidos/coligados, isto porque necessita desses contratos para cumprir as suas obrigações; XI. O contrato de prestação de serviços de gestão do condomínio e os contratos de prestação de serviços de limpeza, de jardinagem e manutenção do apoio aos edifícios configuram uma função unitária, na qual cada um fornece a razão de ser do outro.

    XII. No caso em apreço, temos – para além da ligação funcional - a ligação pessoal, em que a mesma pessoa representa três entidades distintas – Autora, Réu e a sociedade que gere o réu; XIII. As partes quiseram a pluralidade de contratos como um todo, como um conjunto económico, estabelecendo entre eles uma dependência; XIV. Na modesta opinião do Recorrente, o Tribunal a quo cometeu um erro quanto à metodologia de qualificação dos contratos aqui em apreço; XV. Não temos dúvidas em qualificar os mesmos como contratos de prestação de serviços distintos, mas unidos/coligados, pois existe uma ligação funcional entre os vários contratos assinados; XVI. Conforme consta na matéria de facto dada como provada pela primeira instância, os proprietários da fracções dos prédios reconheçam a prestação dos serviços, embora não soubessem precisar qual a empresa prestadora; XVII. A existência de uma coligação funcional entre dois ou mais negócios produz efeitos jurídicos relevantes, na medida em que, em virtude dessa dependência funcional, as vicissitudes de um acabam por se repercutir sobre o outro ou outros.

    XVIII. Aqui chegados importa aferir dos efeitos jurídicos num contrato de prestação de serviços para os restantes contratos coligados; XIX. O Tribunal a quo foi perentório ao afirmar que o recorrente inviabilizou o cumprimento das obrigações assumidas pela recorrida.

    XX. Na verdade, o réu apenas impediu as funcionárias da limpeza de acederem às áreas comuns do edificado; XXI. Não resulta dos autos, que o réu tivesse impedido os jardineiros de realizarem a manutenção dos espaços verdes ou tivesse impedido os técnicos da autora de realizarem uma substituição de uma lâmpada (aliás, nunca mais o réu ou os condóminos accionaram a autora para efectuar a manutenção do edifício); XXII. Os condóminos convocaram uma assembleia de condomínio extraordinária, que se realizou em Maio de 2019, com vista à exoneração do administrador do condomínio, uma vez que os mesmos não estavam satisfeitos com a forma como os serviços eram prestados; XXIII. Ao longo da fundamentação de facto da sentença, a primeira instância refere que as testemunhas não estavam satisfeitas com a qualidade do serviço prestado; XXIV. De referir ainda que o Sr. AA, na qualidade sócio-gerente da sociedade que geria o réu, não entregou a documentação do condomínio, onde deveriam constar os mencionados contratos, como se pode aferir pela parte final do mencionado...

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