Acórdão nº 02095/17.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * * I – RELATÓRIO O MINISTÉRIO DA DEFESA NACIONAL e AA, melhor identificados nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA por este intentados contra aquele e contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, vêm interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, que julgou parcialmente procedente a presente ação e, em consequência, condenou os Réus Ministérios da Defesa Nacional e das Finanças “(…) à prática de Despacho Conjunto, aplicável ao A., o qual deve estabelecer a equivalência entre o posto do Autor e as funções militares desempenhadas, com o dos Negócios Estrangeiros, com base no mesmo critério em uso para o pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no estrangeiro, incluindo os subsídios de instalação por ida e regresso de missão, nos mesmos termos em que ocorreria caso tivesse existido Despacho Conjunto, aplicando o regime do pessoal equiparável do Ministério dos Negócios Estrangeiros em serviço no Posto Consular/Embaixada de referência, incluindo os câmbios ao tempo de desempenho de funções do A., em igualdade de circunstâncias com os câmbios efetuados ao pessoal do Ministério dos Negócios Estrangeiros retroagindo à data de desempenho de funções, devendo ser pagas ao A. as quantias que lhe resultem devidas no período que decorreu entre 1 de outubro de 2002 e 1 de dezembro de 2004 face à prática de tal despacho (…)”, mais absolvendo os Réus “(…) do demais peticionado (…)”.

Alegando, o Recorrente Ministério da Defesa Nacional formulou as seguintes conclusões: “(…) A - Sobre o recebimento e notificação dos abonos Cumpre apreciar os factos referidos em 1.1 desta alegação. São factos instrumentais que contribuem para provar o momento e termos do recebimento dos abonos pecuniários pelo autor. Estes factos são relevantes para se determinar o momento da contagem do prazo prescricional aplicável ao direito de crédito invocado pelo autor.

Propõe-se que se decida esta matéria seguindo a mesma lógica de raciocínio que se seguiu no processo n.° 644/17.1BEALM, no processo 233/10.1BESNT, e no acórdão do Tribunal Constitucional no acórdão 379/2017, de 12.07.2017. Note-se que não são casos vagamente semelhantes com o aqui em análise. São todos casos em que o litígio é relativo a abonos pecuniários a receber por Militares portugueses no âmbito de funções públicas que desempenharam no estrangeiro.

Mesmo que se queira seguir a posição maioritária do STA de 05.05.1992 na questão de fundo, que se reconheça que esta questão dos efeitos da passagem do tempo - e da necessidade de aplicar o regime de prescrição - nunca foi apreciada no STA neste tipo de casos.

B - O Tribunal a quo omitiu pronúncia e decisão sobre a factualidade referida na conclusão A.

Trata-se de omissão ilegal, injustificada, que configura uma situação de denegação de justiça. Cumpre apreciar criticamente o momento e termos em que o autor foi recebedor e informado dos abonos pecuniários que recebeu.

Toda a factualidade foi alegada e instruída nos autos pelo réu MDN. De igual modo, é bem patente como o autor tentou fugir desse momento instrutório, bem sabendo que não é crível colocar em crise factualidade tão simples e evidente. Bem sabendo também que é insustentável para a viabilidade desta acção o tempo que passou entre o recebimento e notificação das quantias pecuniárias e o tempo em que decidiu iniciar este litígio judicial (passou todo o tempo que vai de 2004 a 2017).

Controvertido o facto, cabe ao Tribunal apreciar e decidir. O Tribunal a quo não decidiu, pelo que se solicita agora ao Tribunal de recurso que corrija a 1ª instância e aprecie está matéria controvertida e carecedora de apreciação e decisão de um Tribunal Público Português.

C - Momento e oportunidade de Alegações finais O Tribunal elaborou a sentença de 30.09.2022 sem antes notificar as partes para alegações finais. Foram feitas, no processo, diligências de instrução. Estão nos autos os requerimentos probatórios do réu MDN. Sobre a matéria probatória, o Tribunal além de nada apreciar ou decidir sobre a matéria na sentença, também não notificou sequer as partes para alegações escritas.

Além de uma grosseira e preocupante violação das regras do processo, esta conduta revela total desconsideração pela instrução dos autos feita pelo réu MDN. Por tudo isto, é ilegal a não notificação das partes para alegar por escrito, cabendo corrigir este ponto e dar as partes a oportunidade de que se cumpra o disposto no artigo 91.°-A do CPTA.

D - Sobre a existência e conhecimento do despacho conjunto de Ministério das Finanças e Ministério da Defesa Nacional n.° A-85/86-X, publicado em Diário da República em 15 de maio de 1986.

Cumpre reconhecer nos autos a existência e o concreto conteúdo do despacho conjunto de Ministério das Finanças e Ministério da Defesa Nacional n.° A-85/86-X, publicado em Diário da República em 15 de maio de 1986.

Trata-se de regulamento publicado em Diário da República, que o réu MDN referiu nas suas intervenções nestes autos, e que o Tribunal pode conhecer oficiosamente. É, de resto, elemento determinante no gerar da litigância analisada no acórdão do STA de 05.05.1992. Conhecer a existência e conteúdo deste diploma regulamentar é um dos caminhos possíveis para se perceber com clareza que a jurisprudência do STA de 2017 e posterior sobre esta temática não é aplicável a este caso concreto na parte em que considera que a paridade entre regimes de abonos tem de ser quantitativamente igual. Na decisão do STA de 05.05.1992 nunca se decidiu que a equiparação entre regimes de abonos tinha de ser numericamente igual. Nunca tal foi escrito no acórdão. O acórdão existe, está escrito, têm um início e um fim. Não era sequer possível em 05.05.1992 o STA decidir pela igualdade quantitativa de abonos pecuniários, pois que cada ministério tinha seu regulamento próprio. Assim, este facto é de toda a relevância pois é prova que o MDN, naquele tempo, tinha o seu próprio regulamento de abonos, pelo que não havia aplicação da regra de equiparação quantitativa para diploma de outro ministério. Isto é coerente com a circunstância de no acórdão do STA de 05.05.1992, no seu dispositivo, não existir qualquer referência a equiparação quantitativa. Isto é também coerente com o facto de o autor deste autos, diferentemente dos autores no processo que gerou a decisão de 05.05.1992, ter levado mais de 12 anos entre a “situação lesiva” dos seus direitos e a apresentação do caso perante um Tribunal.

E- Sobre o regime de prescrição aplicável Passando à questão do regime de prescrição aplicável, ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, cabe nestes autos aplicar a prescrição cível, de 5 anos, relativa a créditos decorrentes de obrigações periódicas. A invocação da prescrição foi feita pelo réu MDN logo na contestação, e depois referida em vários momentos posteriores do processo. É matéria de toda a relevância.

Esta questão foi apreciada ao mais alto nível no Tribunal Constitucional em 2017, no acórdão n.° 379/2017, de 12.07, sendo relator um Magistrado de carreira, da Ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que integrou os quadros no STA.

Note-se que o processo ali em litígio era em tudo semelhante a este, mais uma situação de Militar português a pedir - muito - fora de tempo a alteração do legal regime de abonos pecuniários que lhe foi aplicado. Consideramos que cabe seguir aquela linha interpretativa. Se não for seguida, terá o Tribunal de fundamentar por que não segue aquela linha interpretativa. A questão terá de ser uniformizada. Cumpre ao réu MDN fazer esta conclusão, peticionado que não se decida o regime prescricional a aplicar a este caso sem que se tome na devida conta o que se apreciou e decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017, de 12.07.

Sobre esta temática, o tribunal a quo, na sua decisão de 30.09.2022, não seguiu a interpretação fixada pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017, de 12.07; dessa decisão pode recorrer-se para o Tribunal Constitucional, nos termos do artigo 70.°, n.° 1, alínea i), parte final, da Lei 28/82, de 15.11. Isto dado ser possível recorrer para o Tribunal Constitucional de decisões que recusem aplicação de norma constante de acto legislativo quando a norma seja aplicada com sentido diferente do anteriormente decidido sobre a questão pelo Tribunal Constitucional.

Assim, peticiona o réu MDN que se decida a questão do regime prescricional, e o modo de início de contagem do prazo prescricional, como o decidiu o Tribunal Constitucional no Acórdão n.° 379/2017. Se se mantiver o conteúdo da decisão do TAF do Porto de 30.09.2022 quanto a esta temática, fica o réu MDN legitimado para, quando esgotado o campo impugnatório na Ordem dos Tribunais Administrativos e Fiscais sem que a decisão se altere, levar a questão à apreciação do Tribunal Constitucional. Cabe referir que naquela decisão que gerou o Acórdão n.° 379/2017 foram os autores nos autos a levar a questão ao Tribunal Constitucional, tendo perdido a questão que lá levaram a apreciação. O caso é, para o que está em causa nesta matéria, exatamente igual.

F- Sobre o modo de contar o prazo de prescrição Quanto ao momento da contagem do prazo prescricional, cabe começar a contagem desde a data do recebimento e notificação dos abonos. Neste sentido se decidiu no acórdão do Tribunal Constitucional n.° 379/2017, de 12.07. De igual modo, com esse critério jurídico se decidiu no Acórdão do TCA Sul de 18.10.2018, no processo que correu em 1.a instância com o número 233/10.1BESNT e no TCASul com o número 12789/15.

Ao tempo que o Militar aqui autor recebeu o abono pecuniário o regulamento de abonos era totalmente válido, ninguém o impugnou. Desde 10.12.2007 que está publicado em Diário da República o regime de abonos que o Militar aqui autor invoca ser-lhe aplicável.

Onde esteve o autor nestes autos em 2008, 2009, 2010...

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