Acórdão nº 01285/22.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 24 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO I..., Lda., com NIF ... e sede no Largo ..., ... ..., instaurou processo cautelar contra 1. Município ..., com NIF ... e sede na Avenida ..., ... ..., 2. Banco 1..., S.A. (doravante Banco 1...), com NIF ... e sede na Avenida ..., ... ..., e 3. Banco 2..., S.A. (doravante Banco 2...), com NIF ... e sede na Rua ..., ... ..., formulando o seguinte pedido: “Nestes termos, e nos demais de Direito aplicáveis, requer a V.

Ex.ª que: A) seja ordenado à Primeira Requerida que se abstenha de prosseguir com o pedido de pagamento do montante de 21.714,02 (vinte e um mil, setecentos e catorze euros e dois cêntimos) por via do acionamento das garantias supra identificadas pelos Requeridos Bancos, até à decisão com trânsito em julgado da ação que a Requerente irá instaurar contra a Primeira Requerida e o Requerido Banco; B) seja ordenado aos Bancos Requeridos que se abstenham de pagar o montante em virtude do acionamento de quaisquer garantias ou cauções; e C) seja ordenada a anulação de quaisquer ordens emitidas ou que venham entretanto a ser emitidas por quaisquer dos Requeridos em execução das referidas garantias ou cauções, bem como dos consequentes atos e operações materiais, se necessário for com a devolução de todos os montantes pagos na sequência da daquela execução; D) atento o risco sério para o fim e para a eficácia da providência, se defira presente pedido sem citação nem audição da Primeira Requerida e da Segunda e Terceira Requeridas; E) em alternativa, caso venha o Douto Tribunal a decidir pela improcedência do atrás requerido (o que, sem se conceder, só academicamente e por mera hipótese de raciocínio se admite), seja ordenado à Segunda e Terceira Requeridas para procederem ao depósito da quantia em causa à ordem desse Tribunal, não a entregando à Primeira Requerida até à decisão com trânsito em julgado da ação principal a intentar pela Requerente, seguindo-se os demais termos até final.

” Por decisão proferida pelo TAF do Porto foi indeferida a providência cautelar.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, a Requerente formulou as seguintes conclusões: A. Foi proposta providencia cautelar inominada contra o Município ..., com NIF ... e sede na Avenida ..., ... ..., 2. Banco 1..., S.A. (doravante Banco 1...), com NIF ... e sede na Avenida ..., ... ..., e 3. Banco 2..., S.A. (doravante Banco 2...), com NIF ... e sede na Rua ..., ... ..., doravante 1.º e 2.º e 3º Requeridos, respetivamente.

B. Essa providência cautelar tem como objetivo travar o acionamento de garantia bancária, que apenas foi acionada e visa a qual visa um objetivo manifestamente ilegal, através de mecanismos legais que se traduzem num claro abuso de direito, Veja-se que, C. Em 16.01.2008 foi proferido despacho pelo Governador Civil do Distrito de ... para efectivação da posse administrativa do contrato “Centro de Noite e apoio Social de ...”, designando para o efeito o dia 24.01.2008 D. Através do ofício n.º DOSO-OM-Of_74/2022, de 19.05.2022, o Requerido Município notificou a Requerente de que, nessa data, foram por si accionadas as garantias bancárias, bem como a retenção de cauções a seu favor relativas à obra “Centro de Noite e Apoio Social de Felgueiras”, para pagamento do prejuízo sofrido pelo Município, no valor de EUR 45.126,61, mais informando que “a somatória das garantias bancárias e da retenção da caução é de 22.920,06€, valor a reverter para os cofres do Município, devendo no entanto essa empresa voluntariamente proceder ao pagamento do restante prejuízo no valor de 22.206,55€”.

A Requerente respondeu ao ofício referido no ponto anterior em 25.05.2022, por E. Ora, no nosso entendimento, tal lapso de tempo 2008-2022 revela que o atual accionamento das garantias sem qualquer demonstração ou fundamento é claramente desproporcional.

F. Pretendendo a 1.º Requerido, como esta muito bem assume, fazer-se pagar com aquelas quantias que abusivamente se locupletou.

G. O Tribunal a quo decidiu no sentido de indeferir liminarmente a providencia cautelar proposta, com fundamento de que “senão a de que não se encontram minimamente alegados, de forma concreta e circunstanciada, os factos que entende consubstanciarem o receio da constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação. Atente-se que a Requerente alude genericamente ao facto de o accionamento das garantias e seu consequente pagamento ao Município ... pelos Bancos Requeridos lhe causar um “enorme prejuízo”, sem o quantificar, sem mencionar as razões para que tal suceda, uma vez que não explica qual a sua situação financeira actual, quais os compromissos que tem assumidos e que se verá impossibilitada de cumprir, qual o seu activo e passivo, tudo no sentido de aferir da sua situação financeira, pois que a caracteriza de “frágil”. Ademais, o mero accionamento das garantias e o seu consequente pagamento ao Município pelos Bancos Requeridos não traduzem, de imediato e sem mais, um prejuízo na esfera da Requerente, pois que quem irá proceder, no imediato, ao pagamento do valor garantido – que, assinale-se, não se cifra numa quantia manifestamente elevada, tendo em consideração o valor da empreitada e o capital social da Requerente constante da sua certidão permanente, que juntou aos autos com o seu requerimento inicial como documento n.º ...1 – são os Bancos, pelo que a decisão do Município de accionar as garantias bancárias prestadas pela Requerente em 2006 não traduzem, per se, uma situação de constituição de facto consumado, nem tampouco, em face da parca, singela e conclusiva alegação da Requerente, a produção de prejuízos de difícil reparação.

H. Assim, nada mais resta ao Tribunal senão do que dar como não verificado, in casu, o requisito do periculum in mora (art.º 120º, n.º 1, primeira parte do CPTA)..” (sublinhado nosso) I. Em primeiro lugar, a Requerente, aqui Recorrente, aduziu de forma clara tanto (a) as razões pelas quais se pode concluir pela existência de prejuízos graves e dificilmente reparáveis.

J. Como pediu ao Tribunal a quo que (b) fossem tomadas medidas que visassem acautelar o efeito útil da ação que venha a ser proposta.

K. Pois veja-se que por Prejuízo Abstrato se tem “o valor apurado, reduzido a uma expressão pecuniária, de avaliação dos danos quando não seja possível proceder à reparação em substância e tem cabimento a reparação em valor” Galvão Telles, Dir. Obrigações, 5.ª ed.-349 L. E por Prejuízo Concreto “o dano real, o dano como se apresenta in natura, consistente na privação ou diminuição do gozo dos bens, materiais ou espirituais, ou na sujeição de encargos ou na frustração da aquisição ou acréscimo de valores” Galvão Telles, Dir. Obrigações, 5.ª ed.-347 M. Ao que podemos concluir que as razões aduzidas demonstram estar em causa tanto um Prejuízo Concreto – Probabilidade séria de locupletação dos valores da garantia N. Como um Prejuízo Abstrato – Impossibilidade de pagar a trabalhadores e fornecedores; Mas, também, aqui se reporta a Danos Previsíveis e Certos, nomeadamente (a) a Possibilidade do(s) Banco(s) virem a não emitir garantias bancárias, por perda de confiança; (b) Perda de possibilidade crédito, assim como (c) alterações de condições de crédito; e por fim, (d) perda de negócios por (d.1) impossibilidade de crédito ou impossibilidade de aceitação de condições mais “pesadas” de crédito ou até pela não emissão de garantias bancárias por parte do(s) Banco(s).

O. Os quais por serem previsíveis e estarem ao alcance do “homem médio”, não carecem de prova – Até porque esta se demonstra impossível.

P. Neste sentido o Acórdão da Relação do Porto, Proc. n.° 248/19.4T8PNF.P1, disponível em http://www.dgsi.pt/jtrp.nsf/56a6e7121657f91e80257cda00381fdf/ba8e88417 28165ad80258603003a92f5?OpenDocument : Q. A Requerente / Recorrente, para além de ter feito prova de claro abuso e fraude por parte da 1.ª Requerida - elencou os prejuízos que o acionamento da garantia iriam acarretar nomeadamente o facto de o acionamento desta garantia para além (1) de condicionar o acesso ao crédito e (2) novas garantias bancárias (3) também atenta quanto à credibilidade e ao prestígio da Requerente R. Pois veja-se que a Requerente / Recorrente é “obrigada” a prestar garantias na generalidade das obras de média e grande dimensão, nomeadamente no acesso concursos públicos.

S. Ao que sobrevive por conta das garantias prestadas pelos bancos, as quais para além de lhe poderem vir a ser negadas, poderão levar a uma perda de confiança que implicará o pagamento de maiores taxas de juro.

T. Tendo, igualmente, como se depreende, efeito direto no acesso da Requerente ao crédito.

U. Ao que, mui respeitosamente se refere que, para além de (a) os danos mencionados serem de difícil / impossível reparação; (b) Os prejuízos que o acionamento da garantia poderiam acarretar, são muito superiores ao do não acionamento da garantia (que são inexistentes).

V. Neste sentido veja-se o Acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul, Proc. n.° 12490/15, disponível em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/170589492546a7fb802575c3004c6d7d/360458050539b81b80257ef300373378?OpenDocument: W. Sendo patente os danos, consideráveis como Danos Previsíveis, pois são passiveis de conjeturar, prognosticar a sua produção, pelo homem médio (medianamente prudente e avisado).

X. Termos em que estão preenchidos tanto os pressupostos de “Fumus Boni Iuris”, como “Periculum in mora” - Entendendo-se “Fumus Boni Iuris” pela probabilidade séria de existência de um direito – Que não foi discutido no Despacho / Sentença proferido Y. E por “Periculum in mora” o fundado receio de que a demora na obtenção de decisão no processo principal cause danos de difícil ou impossível reparação aos interesses perseguidos que justificam esta tutela urgente.

Z. Podendo a aqui Requerente fazer-se valer dos meios legalmente admissíveis, nomeadamente prova testemunhal e documental – Neste...

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