Acórdão nº 638/17.7IDPRT.P3 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 01 de Março de 2023

Magistrado ResponsávelLILIANA DE PÁRIS DIAS
Data da Resolução01 de Março de 2023
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 638/17.7IDPRT.P3 Recurso Penal Juízo Local Criminal do Porto – Juiz 8 Acordam, em audiência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto.

  1. Relatório No âmbito do processo comum singular que, sob o nº 638/17.7IDPRT, corre termos pelo Juízo Local Criminal do Porto, na sequência do acórdão proferido por este Tribunal da Relação, que determinou a nulidade da sentença inicialmente proferida, foi proferida nova sentença, datada de 16 de setembro de 2022, com o seguinte dispositivo: “Nestes termos e face ao exposto: Julgo a acusação pública de fls. 309 e ss. parcialmente procedente por provada e, em consequência: ABSOLVO O ARGUIDO AA DA PRÁTICA, COMO COAUTOR MATERIAL, DE UM CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL, PREVISTO E PUNIDO PELOS ARTS. 6º e 105º, n.ºs 1, 2, 4 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), com referência aos arts. 19º a 26º, 27º, 29º e 41º do Código do IVA.

CONDENO O ARGUIDO BB PELA PRÁTICA, COMO AUTOR MATERIAL, DE UM CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL, PREVISTO E PUNIDO PELOS ARTS. 6º e 105º, n.ºs 1, 2, 4 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), com referência aos arts. 19º a 26º, 27º, 29º e 41º do Código do IVA, NA PENA DE 1 (UM) ANO DE PRISÃO, SUSPENSA NA SUA EXECUÇÃO POR 5 (CINCO) ANOS, COM A CONDIÇÃO DE PAGAR AO ESTADO O MONTANTE DE €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) E ACRÉSCIMOS LEGAIS.

CONDENO A SOCIEDADE ARGUIDA “A..., LDA.” PELA PRÁTICA, por força do disposto no art. 7º, n.º 1 do RGIT, de UM CRIME DE ABUSO DE CONFIANÇA FISCAL, previsto e punido pelo art. 105º, n.ºs 1, 2, 4 e 7, do RGIT, com referência aos arts. 19º a 26º, 27º, 29º e 41º do Código, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à taxa diária de €6,00 (seis euros), no montante global de €1.800,00 (mil e oitocentos euros).

Julgo procedente o pedido de declaração de perda de vantagens a favor do Estado efetuado pelo Ministério Público e, em consequência: CONDENO O ARGUIDO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ART. 110º, N.ºS 2, 3 E 4 DO CP, AO PAGAMENTO AO ESTADO DO MONTANTE DE €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos).

*CUSTAS CRIME: custas a cargo dos arguidos, sendo a taxa de justiça fixada em 2 (duas) UC´s (art. 8º, n.º 5 e Tabela III, do RCP). […]”.

Inconformado com a decisão condenatória, dela interpôs novo recurso o arguido BB para este Tribunal da Relação, com os fundamentos descritos na respetiva motivação e contidos nas seguintes “conclusões”, que se transcrevem [1]: “1. O presente recurso tem como objeto a matéria de direito da sentença proferida nos autos, a qual condenou o arguido BB, pela prática, como autor material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 6º e 105º, nºs. 1, 2, 4 e 7 do Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT), com referência aos art.ºs 19º a 26º , 27º, 29º e 41º do Código do IVA, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução por 5 (cinco) anos, com a condição de pagar ao Estado o montante de €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) e acréscimos legais.

  1. Nos presentes autos de processo comum, o Ministério Público deduziu acusação, em 16-05-2018, contra o Arguido BB, imputando-lhe a prática, à data de 15-05-2017, em coautoria material, de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 6º e 105º, nº 1, 2, 4 e 7 do RGIT, com referências aos artigos 19º a 26º, 27º, 29º e 41º do Código do IVA.

  2. Pelo que, atendendo aos factos dados como provados (vide ponto 4 da matéria recursiva), o Tribunal a quo condenou o Arguido, ora Recorrente, pela prática, como autor material, de um crime de abuso de confiança fiscal na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução por igual período, tendo obtido provimento.

  3. O Requerente não se conformando com a douta sentença proferida nos autos, dela veio a interpor recurso, bem como, recorreu também o Ministério Público da sentença supramencionada.

    Sucede que, e neste sentido, 5. O Tribunal a quo veio a proferir nova sentença na qual condenou o ora Requerente, pela prática, como autor material, de um crime de abuso de confiança fiscal, na pena de 1 (um) ano de prisão, suspensa na sua execução por 5 (cinco) anos, com a condição de pagar ao Estado o montante de €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) e acréscimos legais.

  4. Atendendo ao supra descrito, considera o aqui Recorrente, na sua humilde opinião, ter sido injustamente condenado.

    Senão vejamos, 7. O crime de abuso de confiança fiscal está previsto e é punível nos termos da Lei n.º 15/2001, de 05 de Junho, com as recentes alterações previstas pela (Lei n.º 7/2021, de 26/02) – Regime Geral das Infrações Tributárias (RGIT) que estabelece no n.º1 do artigo 105º que “Quem não entregar à administração tributária, total ou parcialmente, prestação tributária de valor superior a (euro) 7500, deduzida nos termos da lei e que estava legalmente obrigado a entregar é punido com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias.” . E ainda, dispõe o n.º 1 do artigo 15º do mencionado diploma legal supra: “Cada dia de multa corresponde a uma quantia entre (euro) 1 e (euro) 500, tratando-se de pessoas singulares, e entre (euro) 5 e (euro) 5000, tratando-se de pessoas coletivas ou entidades equiparadas, que o tribunal fixa em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos.” 8. Nesta senda, o douto Tribunal optou pela escolha de uma pena de prisão, fundamentando a sua decisão em “(…) fortes necessidades de prevenção geral (…)”, e pelo facto do Arguido ter “(…) atualmente, antecedentes criminais, por crimes de idêntica natureza, já tendo sido condenado em penas de multa”.

    Mas mal andou o Tribunal, porque com todo o respeito, que é muito, 9. Segundo o Certificado de Registo Criminal (CRC) do ora Requerente, emitido em 2018-04-23 pode ler-se que “Nada consta acerca da pessoa identificada”. Sendo o elemento preponderante a data da prática dos factos, 15-05-2017, pelos quais vem o ora Requerente condenado.

  5. Até porque, em tal data não tinha o Recorrente praticado quaisquer ilícitos criminais, o que significa que à data era primário.

  6. Por outro lado, importa não olvidar que o Arguido confessou integralmente e sem reservas os factos que lhe são imputados na acusação de forma livre, integral e sem reservas.

  7. Pelo que, o Arguido, ora Recorrente, reconheceu a ilicitude da sua conduta e mostrou-se arrependido, o que prova a interiorização do desvalor da sua conduta.

  8. Assume a ilicitude dos seus atos independentemente das consequências que daí possam emergir. Veja-se ainda que, de acordo com o Relatório Social o Recorrente é descrito como “(…) ponderado, empreendedor e responsável (…)”.

  9. Neste sentido, conclui o Relatório Social que “O mesmo está consciente da sua situação jurídico-penal, manifestando ansiedade e preocupação, bem como receio pelas consequências do desenrolar do mesmo.” 15. Por outro lado, não nos podemos conformar com a sentença proferida pelo Tribunal a quo que fixou como condenação da suspensão o pagamento por parte do Recorrente da quantia de €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) e acréscimos legais.

  10. Note-se que o Relatório Social expressamente refere que o Recorrente vive com a mãe, e “(…) no presente não desenvolve atividade profissional (…) não auferindo qualquer valor regular (…)”. Pelo que “(…) é a progenitora que (…) faz face às despesas de subsistência e gastos com a manutenção da habitação.” 17. Assim, questionamos como pode o ora Recorrente pagar €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) e acréscimos legais, se o mesmo não recebe uma retribuição salarial fixa.

  11. Note-se que, não deve o Tribunal imputar ao Recorrente a falta de cumprimento da pena, na medida em que, o Arguido não cumpriu com a obrigação a que se encontrava adstrito por insuficiência económica e não por facto que lhe é imputável.

  12. Acresce-se ainda que, mesmo se o Recorrente consignar uma possibilidade de emprego, o valor a que está obrigado a liquidar é avultado.

  13. Pelo que, parcas são as soluções de rentabilidade do Recorrente, para pagar tais quantias, tendo que recorrer, uma vez mais, ao auxílio da sua mãe para que a mesma, eventualmente, liquide a quantia Recorrente condenado a pagar.

  14. Pois bem, mesmo que a progenitora possuísse tal quantia (que não tem, até porque suporta todas as despesas e encargos do Recorrente) estaria o Tribunal a quo a condenar indiretamente uma inocente a pagar pela liberdade do seu filho.

  15. Convenhamos que, muito honestamente, cobrar €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis euros e oitenta e quatro cêntimos) e acréscimos legais pela liberdade de um cidadão cujo crime do qual foi condenado por abuso de confiança fiscal não nos parece uma pena, de todo, ajustada ao crime em concreto.

    Até porque, 23. A pena deve fomentar a reinserção do Arguido na sociedade, tendo o processo penal o objetivo de punir, mas essencialmente, a medida da pena é tida como um meio de reflexão para que o Arguido reconheça o ilícito da sua conduta e, assim, através da escolha da medida coercitiva evitar que o Arguido cometa novos crimes.

  16. Assim, o Tribunal “a quo” com a douta sentença proferida está a agudizar e a incentivar a prática de novos crimes. Pelo que, salvo melhor entendimento, o Tribunal “a quo” deveria ter tido uma sensibilidade a condenar que não teve, uma vez que, sabia que o Recorrente se encontrava desempregado, razão pela qual não consegue fazer face às suas despesas.

  17. Neste sentido e atendendo ao aduzido supra, dúvidas não subsistem de que a qualificação de 1 (um) ano de pena de prisão suspensa por cinco anos na sua execução com a condição de pagar de €43.646,84 (quarenta e três mil, seiscentos e quarenta e seis...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT