Acórdão nº 01245/17.0BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – Relatório AA, melhor sinalizada nos autos, vem, nos termos dos n.ºs 1 e 2 do artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), na redacção introduzida pela Lei n.º 118/2019, de 17 de Setembro, interpor recurso de uniformização de jurisprudência para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, datado de 30/06/2022, que decidiu negar provimento ao recurso por si interposto da sentença exarada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgara totalmente improcedente a impugnação judicial da liquidação de IRS do ano de 2013, no montante de € 18.140,75, invocando contradição com o Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito do Processo n.º 06525/13, em 14/04/2015, que se indica como fundamento.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente AA, as seguintes conclusões: 1) O Recurso foi interposto com fundamento em contradição de Acórdãos, servindo de Acórdão Fundamento o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, 2º Juízo, datado de 14-04-2015, Processo N° 06525/13, Acto tributário e facto tributário. Noção. IVA. Mecanismo de dedução do IVA, artigo 19°, n° 4 do CIVA - Princípio do direito à dedução do IVA, publicado em www.dgci.pt.

2) A contradição de Acórdãos resulta da existência de soluções opostas relativamente à mesma questão de direito, ou seja, sobre direito à dedução do IVA, ónus da prova e faturas falsas.

3) Enquanto no Acórdão recorrido considerou-se que era à impugnante, ora recorrente, quem tinha de provar que as faturas em causa não eram falsas e que à Autoridade Tributária e Aduaneira basta alegar indícios.

4) No Acórdão fundamento, pelo contrário, é afirmado que a Autoridade Tributária e Aduaneira tem de fazer a prova cabal e absoluta de que o recorrente, ou seja, “o sujeito passivo sabia ou devia saber que, com a sua aquisição, participava numa fraude ao I.V.A.”.

5) Contudo, no Acórdão recorrido considerou-se que: “Fica assim claro que, para afastar a presunção de veracidade das declarações e elementos contabilísticos do sujeito passivo, basta a prova indireta, assente em factos indiciantes sérios, objetivos e consistentes que traduzam uma probabilidade elevada de que as faturas não titulam operações reais, não sendo, por conseguinte, exigida uma prova cabal e inequivocamente rigorosa da inexistência de tais transações, nem a existência de simulação.” (Página 89 do Acórdão recorrido).

6) Ora, segundo o Acórdão Fundamento, o art°.19, n°.4, do C.I.V.A., exige que o sujeito passivo adquirente tenha conhecimento da intenção fraudatória do fornecedor, de não entrega nos cofres do Estado do imposto.

7) Mais, o princípio da neutralidade do I.V.A. impõe a salvaguarda do direito à dedução quando inexistam elementos objectivos que demonstrem que o sujeito passivo sabia ou devia saber que, com a sua aquisição, participava numa fraude ao I.V.A., matéria cujo ónus da prova compete à A. Fiscal (cfr.art°.74, n°. 1, da L.G.T.).

8) E segundo o Acórdão fundamento,” O TJUE tem entendido que não é compatível com o regime do direito à dedução previsto na Directiva I.V.A. recusar esse direito a um sujeito passivo que não sabia, não lhe sendo exigível que soubesse, que a operação em causa fazia parte de uma fraude, ou que outra operação na cadeia de fornecimento, anterior ou posterior à realizada pelo sujeito passivo, era constitutiva de uma fraude ao I.V.A.” 9) Pelo que, no Acórdão recorrido, é patente a insuficiência de fundamentação no que se refere ao alegado conhecimento, por parte do sujeito passivo, da falta de estrutura empresarial dos seus fornecedores, vício que equivale a falta de fundamentação, pelo que deverão ser anulados os actos tributários objecto do presente processo.

10) Reiterando o Acórdão fundamento: “Era a A. Fiscal que tinha o ónus da prova dos pressupostos das correcções em sede de regime de dedução de I.V.A. por si propostas e que fundamentaram as liquidações objecto do presente processo (cfr. artº. 74, n°.1, da L.G.T.), assim não abalando a presunção de verdade e boa fé das declarações periódicas apresentadas pelo impugnante (cfr. artº. 75, n°.1, da L.G.T).”  11) Por último, sempre se dirá que o Acórdão recorrido efectuou uma errada interpretação e aplicação dos art°s. 19, n°.3 e 4, do C.I.V.A., e artigo 74°, 75° e 77° da L.G.T.

12) Em suma, entre o Acórdão recorrido e o Acórdão Fundamento afirma-se a existência da identidade da questão de Direito e da situação de facto e nas duas decisões judiciais em apreço, tais decisões são expressamente opostas sobre a mesma questão fundamental.

Nestes termos, nos melhores de Direito, existindo, assim, identidade da questão de direito e de facto, reafirma-se que têm as decisões proferidas no Acórdão recorrido e no Acórdão Fundamento sentidos opostos, pelo que existe a referida contradição de Acórdãos, que deverá ser superiormente decidida, a bem da JUSTIÇA! Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de não se mostrarem reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência, por não serem idênticas as situações de facto e a matéria de direito apreciadas em cada um dos arestos em confronto, pelo que se impõe o seu não conhecimento, com a seguinte fundamentação: AA vem interpor recurso para uniformização de jurisprudência, ao abrigo do disposto no artigo 284º, nº 1, do CPPT (redacção da Lei nº 118/2019, de 17 de Setembro), do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte (TCAN), supra id., datado de 30 de Junho de 2022, que negou provimento ao recurso, por si interposto, da sentença do TAF de Aveiro.

Por alegada contradição com a interpretação perfilhada no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul (TCAS), datado de 14/4/2015, proferido no processo nº 06525/13, que indica como fundamento.

Entendendo que tal contradição “resulta da existência de soluções opostas relativamente à mesma questão de direito, ou seja, sobre IVA, facturas falsa e ónus de prova (articulado nº2 das conclusões, que aqui se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais).

Existindo a violação dos artigos 19 º nº3 e 4 do CIVA e 74º,75 e 77º da LGT.

ADMISSIBILIDADE/ PROSSEGUIMENTO DO RECURSO Nos termos do referido art. 284.º do CPPT (tal como no art. 152.º do Código de Processo dos Tribunais Administrativos), os requisitos de admissibilidade do recurso para o Supremo Tribunal Administrativo para uniformização de jurisprudência são os seguintes (v. entre outros o Ac. do Pleno da Secção do CT do STA no processo 240/12.0BEFUN, de 30/6/2021, in www.dgsi.pt): “ i) que exista, relativamente à mesma questão fundamental de direito, contradição entre o acórdão recorrido e um outro acórdão proferido por algum dos tribunais centrais administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo, relativamente à mesma questão fundamental de direito, ii) que a orientação perfilhada pelo acórdão impugnado não esteja de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

No que ao primeiro requisito respeita, de acordo com os critérios firmados por este Supremo Tribunal, exige-se para a sua verificação: i) que haja identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que pressupõe uma identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais; ii) que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica, a qual se verifica sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica; iii) que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta e esta oposição decorra de decisões expressas, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores das decisões finais ou a invocação de decisões implícitas ou a pronúncia implícita ou consideração colateral tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.” Acresce que quanto à caracterização da questão fundamental de direito, é exigível a identidade da questão de direito sobre a qual incidiu a decisão arbitral em oposição, que tem como pressuposto que as situações fácticas em ambas as decisões sejam substancialmente idênticas, entendendo-se, como tal, para este efeito, as que sejam subsumidas às mesmas normas legais.

Estando em causa a questão de direito, tal pressupõe que em ambas as decisões se considere fixada e assente a base factual, não sendo admissíveis valorações probatórias.

*Segundo a recorrente, o acórdão do TCAN (acórdão recorrido), proferido no processo 1245/17.0BEAVR “considerou que era impugnante, ora recorrente, quem tinha de provar que as facturas em causa não eram falsas e que à AT bastava alegra indícios.” Ao invés, no acórdão fundamento, pelo contrário é afirmado que a AT tem de fazer a prova cabal e absoluta de que o recorrente, ou seja” o sujeito passivo sabia ou devia saber que, com a sua aquisição, participava numa fraude ao I.V.A.” “ Contudo no acórdão recorrido considerou-se que: “ Fica assim claro que, para afastar a presunção de veracidade das declarações e elementos contabilísticos do sujeito passivo, basta a prova indirecta, assente em factos indiciantes sérios, objectivos e consistentes que traduzem a possibilidade elevada de que as facturas não titulam operações reais, não sendo, por conseguinte, exigida uma prova cabal e inequivocamente rigorosa da inexistência de tais transacções, nem a existência de simulação” Página 89 do Acórdão recorrido).

“ Ora segundo o acórdão fundamento, o artigo 19º nº4 do CIVA exige que o sujeito passivo adquirente tenha conhecimento da intenção fraudatória do fornecedor, de não entrega nos cofres do Estado...

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