Acórdão nº 01880/22.4BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 20 de Dezembro de 2022

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução20 de Dezembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: * * I – RELATÓRIO AA, melhor identificado nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA URGENTE SOB A FORMA DE INTIMAÇÃO PARA A PROTEÇÃO DE DIREITOS, LIBERDADES E GARANTIAS intentados contra o MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA – SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS, vem interpor o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos que, em 12.09.2022, julgou a presente ação totalmente improcedente, consequentemente, mantendo o despacho de 04.08.2022, do Diretor Nacional Adjunto do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras que, ao abrigo do disposto nas alíneas c, e) e h) do n.º 1, do artigo 19º, e no n.º 1 do art.º 20º, ambos da Lei n.º 27/08, de 30.06.

[Lei do Asilo], recusou o seu pedido de proteção internacional que havia formulado e, bem assim, o pedido de autorização de residência por proteção subsidiária.

Alegando, o Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) I) O douto Tribunal a quo entendeu que a motivação essencial e determinante do autor, ‘estão motivos pessoais e económicos' ‘já que o invocado receio do autor, em caso de regresso ao país, de ser preso pelas autoridades do país de origem' revela uma ‘natureza judicial' e, por conseguinte, o ato impugnado é legal ao julgar o pedido de asilo do autor infundado, em conformidade com o previsto no art.° 19°, n.° 1, als. c), e) e h) da Lei do Asilo.

II) Assim como entendeu infundado o pedido de proteção subsidiária (art.° 7° da Lei do Asilo) requerido pelo Recorrente/Autor, pelo facto "do relato do autor resulta uma vontade de permanecer em Portugal e um alegado receio de ser preso se regressar à Nigéria; contudo, atento o já exposto, não pode considerar-se que exista risco de, ao regressar ao seu país de origem, Nigéria, vir o requerente/autor a ser sujeito a uma ofensa grave na aceção da Lei do Asilo, particularmente, porque não se consideram credíveis as alegações de perseguição por parte das autoridades policiais, mas também porque não estão documentadas, na informação sobre o pais de origem, que subsista um clima disseminado de desrespeito pelos direitos humanos, que atinja a população em geral, assumindo um grau que se situa nesse patamar de gravidade".

III) Contudo, os factos relatados pelo Recorrente/Autor enquadram-se numa das situações contempladas no art. 7° da referida Lei do Asilo, - sistemática violação dos direitos humanos verificada no país da nacionalidade ou risco de que o Requerente sofrer ofensa grave - o que permite ao ora Recorrente/Autor obter uma autorização de residência por proteção subsidiária pelo facto de se sentir impossibilitado de regressar ao seu país de origem por se encontrar em risco de sofrer ofensa grave'.

IV) O próprio Serviço de Estrangeiros e Fronteiras reconhece, conforme o facto provado 6 da douta sentença, que "não é possível afirmar, face à informação Internacional disponível e às fontes informativas consultadas, que subsiste um clima disseminado de desrespeito pelos direitos humano' V) Acontece que o relato do Recorrente/Autor sobre as situações difíceis e desumanas que viveu quando foi deportado para a Nigéria, correspondem precisamente à descrição apresentada pelo SEF no relatório https://euaa.europa.eu/country-guidance-nigeria-2021.

VI) Nesse relatório, Vd. página 50, refere existem ‘abusos de autoridade pelas autoridades policiais, inclusivamente casos de corrupção'.

VII) Na página da Amnistia Internacional - https://www-amnesty- org.translate.goog/en/location/africa/west-and-central-africa/nigeria/report- nigeria/?xtrsl=en&xttl=pt&xtrhl=pt-PT&xtrpto=sc, refere que ‘Graves violações de direitos humanos e crimes sob o direito internacional - incluindo execuções extrajudiciais, desaparecimentos forçados, prisões arbitrárias e detenções incomunicáveis - foram registados durante a resposta das forças de segurança às ameaças do Boko Haram e do ISWAP.' VIII) A tortura e outros maus-tratos permanecem difundidos no sistema de justiça criminal. A polícia, os militares e o DSS continuam a submeter os detidos a tortura, bem como a outros tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.' IX) Contrariamente ao referido no despacho do SEF, caso regresse a território nigeriano, em caso de qualquer perseguição, não seria possível ao aqui Recorrente/Autor recorrer à proteção das autoridades nigerianas dada à sistemática violação dos direitos humanos que se vive no seu país de origem e que afeta o normal funcionamento do Estado.

X) É, pois, evidente o receio de perseguição e perigo de vida manifestado pelo Recorrente/Autor nas suas declarações.

XI) O n.° 1 do art.° 7° da Lei n.° 27/2008, de 30 de junho, estabelece que "É concedida autorização de residência aos estrangeiros (...) se sintam impossibilitados de regressar ao país da sua nacionalidade ou da sua residência habitual, quer atendendo à sistemática violação dos direitos humanos que aí se verifique, quer por correrem o risco de sofrerem ofensa grave".

XII) É do conhecimento geral que grupos armados e forças de segurança continuam a cometer crimes de acordo com o direito internacional e graves violações dos direitos humanos na Nigéria, não existindo, inclusivamente, o direito à liberdade de expressão e opinião, levando, inclusivamente, a União Europeia a assumir uma posição firme contra as ações do Governo nigeriano e a condenar veementemente a violência injustificada e criminosa perpetrada pelo Presidente Buhari, Vd. PROPOSTA DE RESOLUÇÃO B9-0522/2021, do Parlamento Europeu.

XIII) Apesar da existência da “Information Blackout” como protesto dos jornalistas contra a proposta de lei do Conselho Nacional de Imprensa Nigeriana, na sequência dos mesmos serem presos por exercerem o seu direito à liberdade de expressão, é do conhecimento geral que na Nigéria se continuam a cometer crimes por parte do Governo do Presidente Buhari, inclusivamente sequestro e mortes de crianças nas escolas.

XIV) No entanto, o entendimento do Sr. Diretor Adjunto Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras é de que "(...) os factos alegados pelo Recorrente não permitem demonstrar que aquele esteja impedido ou que se sinta impossibilitado de regressar à Nigéria por terem sido violados de forma sistemática os seus direitos humanos essenciais, ou por correr o risco de vir a sofrer uma ofensa grave, nomeadamente, pena de morte ou execução, tortura ou pena ou tratamento desumano ou degradante ou de a sua vida ou integridade física estar sob ameaça grave decorrente de uma violação generalizada e indiscriminada de direitos humanos.' XV) Posição esta corroborada pelo douto Tribunal a quo que conclui que " Cabe ao requerente do pedido de proteção internacional, o ónus da prova dos factos que alega, em conformidade com o previsto no artigo 15°, n° 1 e 2 da Lei do Asilo, no artigo 116°, n° 1 do CPA e no artigo 342°, n° 1 do Código Civil, exigindo-se, para tanto, um relato coerente, credível e suficientemente justificador da impossibilidade ou do sentimento de impossibilidade de regressar ao país de origem por parte do requerente do pedido de asilo/protecção subsidiária, sendo que os factos apurados, como referido, permitem concluir, de modo manifesto, não existir.".

XVI) Tais factos são do conhecimento geral, não carecendo, como tal, de prova nem de alegação nos termos do art.° 412.° do CPC, aplicável ex vi art.° 1° do CPTA.

XVII) O pedido de proteção internacional é infundado quando se verifique que "Ao apresentar o pedido e ao expor os factos, o requerente invoca apenas questões não pertinentes ou de relevância mínima para analisar o cumprimento das condições para ser considerado refugiado ou pessoa elegível para proteção subsidiária".

XVIII) Mas, in casu, o Recorrente/Autor apresentou um relato credível e detalhado da sua pessoa correr o risco de sofrer ofensa grave à sua integridade física e até risco de vida caso regresse ao seu país de origem, bem como às ameaças e perseguições a que estará, por certo, sujeito por aqueles que lhe extorquiram dinheiro em troca de o ajudarem a sair do país, único meio que encontrou para fugir à pena que foi condenado aquando a sua deportação da Republica Federal da Alemanha, em 10.05.2022, por cometimento dum crime do qual já cumpriu pena, e assim, fugir à violência, à miséria e salvaguardar a sua vida, pois o Requerente é pai de quatro filhas menores, que precisam dele, factos previstos no art. 5°, n° 2, als. a), b) c) e f) da Lei do Asilo.

XIX) Ainda que se entenda que o Recorrente/Autor não reúne as condições de elegibilidade para proteção internacional, existe o risco evidente de vir a sofrer uma ofensa grave à sua integridade física caso seja forçado a retomar à Nigéria, cuja violência das forças de segurança contra os cidadãos continua a existir - https://www.hrw.org/news/2022/05/09/nigeria-prioritize-justice-abuses-against-protesters.

XX) Posição esta corroborada pelo douto Tribunal a quo que conclui que "Não estão, pois, reunidas as condições para determinar que deva a entidade demandada prosseguir com a instrução do pedido de proteção internacional do Autor para o efeito de verificar se lhe deve ser atribuída uma autorização de residência, a título de proteção subsidiária, nos termos do artigo 7° da Lei do Asilo, pelo que, improcede o pedido'.

XXI) Face ao relato apresentado pelo Recorrente/Autor, plausível e não contraditório com a realidade do contexto social, político e judicial existente na Nigéria, quer à data em que de lá conseguiu fugir, quer à data de hoje, que evidencia factos que demonstram o direito de proteção a que se arroga, deve ser-lhe aplicado o Princípio do Benefício da Dúvida.

XXII) Destarte, o Tribunal de Bremen, reduziu para dois anos o período inicial de três anos, relativamente à proibição do Requerente entrar na República Federal da Alemanha quando foi deportado em 10.05.2022, relativa à decisão de deportação de 20.04.2021.

XXIII) Verificados que estão os...

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