Acórdão nº 3347/21.9T8GMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelMARIA LUÍSA RAMOS
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães AA intentou acção declarativa, com processo comum, contra R... Seguros, S.A., pedindo: a) seja declarado que o A. está afectado de invalidez total e permanente, com incapacidade de 72% e que preenche os requisitos do contrato de seguro com a apólice ...15, a que aderiu; b) seja declarado que o conceito de invalidez total e permanente constante das condições particulares se basta com o grau de incapacidade de 60%; c) sejam excluídas do contrato de seguro com a apólice ...15, a que aderiu o A., as limitações/exclusões de pagamento do capital, mantendo-se o mesmo válido e eficaz; d) seja a R. condenada a pagar ao A. o capital seguro de 50.000,00€, acrescido de juros legais contados desde 23/12/2020.

Alega, em síntese, que celebrou com a R. um seguro de vida, com início de vigência em 09/10/2018, titulado pela apólice ...15, sendo seu beneficiário em caso de invalidez; o risco coberto era o da morte, invalidez absoluta e definitiva e invalidez total e permanente do segurado, sendo o capital ou valor seguro de 50.000,00 €; desde 23 de Dezembro de 2020 que o A. apresenta uma incapacidade permanente global de 72% incapacidade, tendo solicitado à R. a liquidação do capital seguro, o que esta recusou; a R. apresentou ao A. um contrato pré-elaborado e o A. limitou-se a assiná-lo, sem que lhe tivessem sido entregues as condições gerais e especiais do contrato; a R. não explicou ao A. as cláusulas do contrato.

Contestou a R., excepcionando a incompetência territorial do Tribunal; impugnando os factos alegados pelo A. e invocando que o segurado prestou declarações no sentido de não ter qualquer problema de saúde o que determinou a aceitação e celebração do contrato de seguro; para accionar a cobertura por invalidez total e permanente é necessária a verificação cumulativa dos requisitos previstos na cláusula 2ª das condições especiais do contrato, cuja alegação e prova cabe ao A.; após a participação á Ré do sinistro, pelo Autor, foi solicitado relatório médico, ainda não entregue, ressalvando-se a Ré o direito de deduzir articulado superveniente caso se apurem factos que coloquem em causa a validade e eficácia do contrato de seguro.

O A. fez uma ampliação do pedido, por requerimento de 9 de Setembro de 2021, pedindo concretamente a exclusão da cláusula 2ª das condições especiais da apólice, mantendo-se o contrato válido e eficaz, sustentando que lhe foi comunicado que bastava uma declaração médica a atestar a sua incapacidade, desconhecendo a necessidade de verificação cumulativa dos requisitos previstos naquela cláusula.

Foi admitida a ampliação do pedido, ao abrigo do disposto no art. 265º, n.º 2, do CPC, tendo a Ré oferecido resposta.

Foi dispensada a realização da audiência prévia, foi julgada improcedente a excepção de incompetência territorial do Tribunal, foi proferido despacho a delimitar o objecto do litígio e a fixar os temas da prova.

Por requerimento de 6/4/2022 a Ré deduziu articulado superveniente, nos termos do artº 588º do CPC, e invocando que o segurado prestou falsas declarações e omitiu informações sobre o seu estado de saúde no momento em que preencheu a proposta de seguro, sendo que aquando da participação do sinistro também não facultou à R. documentos essenciais à análise e decisão da participação e invocando e arguindo a anulabilidade do contrato.

O autor foi admitido a oferecer resposta cfr. despacho exarado na Acta de Audiência de 7/4/2022, tendo deduzido impugnação.

Realizado o julgamento foi proferida sentença a julgar a acção improcedente, por não provada, absolvendo-se a Ré do pedido.

Inconformado veio o Autor interpor recurso de apelação da sentença proferida nos autos.

O recurso foi recebido como recurso de apelação, com subida nos autos e efeito meramente devolutivo.

Nas alegações de recurso que apresenta, o apelante formula as seguintes Conclusões: DO ERRO NA APRECIAÇÃO DA PROVA E NA DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO

  1. Os FACTOS PROVADOS sob a alínea K), bem como os FACTOS NÃO PROVADOS os números 5, 6 e 7, foram erradamente apreciados, face à prova produzida em audiência de julgamento (tanto pela conjugação dos depoimentos testemunhais prestados, como pela conjugação dos documentos juntos pelas partes).

  2. O Tribunal à quo presumiu que as clausulas contratuais gerais e especiais foram entregues ao A., por esse ser o procedimento habitual da Ré, quando a Ré nem sequer provou a comunicação das referidas cláusulas, muito menos provou que as leu e explicou ao A., bem como não provou a comunicação, leitura e explicação das clausulas particulares, conforme impõem os artigos 342.º, n.º 2 do Código Civil e 5.º do Regime Jurídico das Cláusulas Contratuais Gerais (que determinam que impende sobre a seguradora o ónus de prova da exclusão e da comunicação das mesmas ao A. – o que não aconteceu no presente caso).

  3. Acresce que, a Ré nem sequer fez da comunicação, leitura e explicação das clausulas gerais, especiais e particulares da apólice contratada em 2018, muito menos o alegado procedimento habitual da Ré poderá levar à conclusão de que o teor das clausulas foi comunicado, lido e explicado ao A. (não é a conclusão que leva ao facto).

  4. Por outro lado, não podia o Tribunal considerar apenas como credível o depoimento de testemunhas (da Ré) que dão as supostas respostas assertivas apenas quando pressionadas, em detrimento de outras (do A.) que respondem de uma forma espontânea, simples, sem qualquer conhecimento ou formação na área dos seguros e sem qualquer conhecimento de direito ou das implicâncias da explicação da razão de ciência do seu depoimento.

  5. O Depoimento da testemunha BB), que o Tribunal entendeu ser credível e espontâneo, é completamente contraditório e inconsistente, desde logo porque afirmava conforme a sugestão.

  6. Afirmando e infirmando conforme lhe era sugerido. Ou seja, o seu depoimento sucumbe à sugestão prévia. Mesmo contra factos notórios, o mesmo alega ter explicado o teor contrato, o contrato e ter entregue as condições gerais e especiais e de seguida nega categoricamente que as entregou ao A. porque foram enviadas por email, quando refere que o A. não tem email e que afinal terão sido enviadas pela Ré.

  7. Era impossível ao Tribunal harmonizar este depoimento com a versão da Ré, porque não é credível, é inconsistente, não tem razão de ciência, não tem nenhum percurso motivacional congruente, manifestando-se ilógico e pouco racional.

  8. Pelo que, não poderia o Tribunal dar-lhe qualquer credibilidade em detrimento do depoimento da esposa do A. (que vivenciou e relatou com pormenor o sucedido, relatando os episódios vivenciados. A mesma esclareceu devidamente o Tribunal sobre as limitações do A. sobre a utilização meios informáticos e sobre a dificuldade de leitura e interpretação, já que o mesmo apenas tem a 4.ª classe).

  9. Quanto à testemunha CC, a mesma apenas soube explicar o procedimento habitual da Ré, mas nada em concreto. Pois nada percecionou, nada fez, nada presenciou, ou seja, a mesma não é detentora de nenhuma fonte de conhecimento. De facto, o seu depoimento é indireto (fala sempre nos procedimentos habituais), não tendo captado qualquer facto por intermédio dos seus sentidos. Nada presenciou ou vivenciou. Não viveu a realidade, não ouviu conversas, não solicitou qualquer informação ao A.. Na verdade, trata-se de uma testemunha que não oferece segurança e confiança ao Tribunal, pelo que o seu depoimento não pode ser valorado da forma que o Tribuna valorou, devendo apenas relevá-lo pela sua ineficácia, falta de razão de ciência e consequentemente de credibilidade.

  10. Impõe-se, assim, a alteração da matéria de facto, conforme supra exposto.

  11. Devem os pontos supra mencionados da matéria de facto (provada e não provada) ser alterados e passarem a ter a seguinte redação.

    Devendo dar-se como PROVADO que: 5- Não lhe tendo sido entregues as condições gerais e as condições particulares.

    6- O A. respondeu aos mediadores/colaboradores com verdade.

    7- O A. prestou as informações à R. com base nos seus conhecimentos e da melhor forma que sabia.

    E como NÃO PROVADO que: K) A R. entregou ao A. as Condições Gerais e Especiais aplicáveis.

  12. Da factualidade apurada resulta que entre a autora e a ré foi celebrado um contrato de seguro do ramo vida, com vigência em 09/10/2018, celebrado com recurso a cláusulas padronizadas, previamente elaboradas pela seguradora, que o segurado se limitou a aceitar, o qual se encontrava pré-clausulado, tendo sido totalmente preenchido pelos referidos mediadores/colaboradores da Ré.

  13. O A. nada preencheu pelo seu punho, apenas assinou as folhas que lhe foram colocadas “à frente” e não lhe foi facultada qualquer proposta de seguro antes do preenchimento levado a cabo pelos mediadores/colaboradores da Ré.

  14. O A. prestou todas as informações que lhe foram solicitadas e entregou os documentos que lhe foram pedidos, e jamais considerou que as informações alegadamente omitidas pudessem influenciar a contratação. Por outro lado, o A. não prestou falsas declarações, não tendo sequer consciência da sua existência.

  15. O A. desconhece exclusões constantes da apólice de seguro que lhe foi proposta, porque nunca lhe foram comunicadas, lidas ou explicadas. Nem a Ré fez prova da comunicação efetiva das mesma, limitando-se a referir eventuais emails ou envio cartas simples (sempre invocando alegados procedimentos habituais).

  16. Nunca foi comunicado à A., por qualquer forma, qualquer cláusula limitativa dos seus direitos, nunca a mesma lhe foi explicada, sendo que a 5.º do DL 446/85 de 25 de outubro exige a comunicação adequada e efetiva das clausulas que integram o contrato, sendo a prova de tal adequada e efetiva comunicação ónus da Ré.

  17. A Ré apresentou um texto que, materialmente, equivale a um questionário pré-preenchido em que as respostas são pré-elaboradas sem que os aderentes possam alterar a mesma ou dar-lhe outra redação.

  18. O A. prestou toda a informação da melhor maneira que sabia e conhecia e esteve sempre de...

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