Acórdão nº 01100/21.9BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 08 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução08 de Fevereiro de 2023
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XAA, com os demais sinais dos autos, deduziu recurso de revista, além do mais, ao abrigo do artº.285, do C.P.P.T., dirigido a este Tribunal e tendo por objecto acórdão do T.C.A. Sul, datado de 15/09/2022, constante a fls. 174 a 190 do processo físico, o qual concedeu provimento ao recurso interposto pelo Representante da Fazenda Pública da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, mais julgando, a reclamação pelo ora apelante deduzida, totalmente improcedente e mantendo na ordem jurídica o despacho reclamado que determinou a penhora da pensão.

XO recorrente termina as alegações do recurso de revista (cfr.fls.197 a 205 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: 1-O presente recurso é admissível, porquanto tem subjacente duas decisões contraditórias proferidas pela 1ª Instância e pelo Tribunal de Recurso (TCA Sul), o que significa que o Recurso para o STA, por não existir dupla conforme, é sempre admissível nos termos do art. 671º, nº 3 do CPC aplicado ex vi art 281º do CPPT.

2-O TCA Sul baseou a sua conclusão explanada no Acórdão aqui sub judice numa realidade normativa não aplicável ao caso, existindo consequentemente uma aplicação errada da lei e, conforme se pode comprovar pela mera análise do Doc. 6 junto como a reclamação, Certidão do Proc. 945/04.9TYLSB exarada pelo Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, Juízo de Comércio de Lisboa, Juiz 7, a legislação aplicável no processo de falência foi o CPEREF e não o CIRE.

3-Ora, o douto Acórdão recorrido, para julgar a interpretação a dar à norma constante do art. 180º, nº 5 do CPPT, socorreu-se do CIRE e não do CPEREF como ao caso se impunha por força de um princípio régio que se consubstancia na aplicação da lei no tempo (art. 12º do CC).

4-Ainda que assim não se entendesse, o recurso seria sempre admissível, porquanto tal análise que aplicou erradamente a lei que ao caso cabia, com efeitos indeléveis na sorte da acção, resulta numa situação desconforme e desviante consubstanciada na decisão que acabou por admitir que a penhora efectuada era legal concedendo provimento ao recurso.

5-O que determina que está em causa uma questão de direito cuja aplicação pela relevância jurídica determina a sua análise em ordem a uma melhor aplicação do direito, uma vez que se trata de analisar esta decisão à luz do caso julgado, a saber sentença do processo de falência e despacho de encerramento o qual declarou que os créditos reclamados no processo de falência (onde se enquadra o processo fiscal sub judice que deu origem à penhora) eram incobráveis.

6-A atribuição legal ao presente recurso de efeito suspensivo da decisão do TCA Sul, mantendo a decisão da primeira instância, tem por base o reconhecimento de que, ponderados os interesses em jogo, se pretende continuar a garantir a exequibilidade da decisão da primeira instância enquanto o caso não se encontrar definitivamente julgado, evitando a causar danos ao Recorrente que apenas dispõe como rendimento da pensão de reforma de velhice.

7-A sentença a quo é clara na sua decisão: “anulo o acto que determinou a penhora do reclamante”, que impõe à Fazenda Pública e em concreto ao SF - no âmbito do presente processo e seus apensos - que não pode continuar a penhorar a pensão do reclamante ou a reter o seu valor seja a que título for.

8-A questão central do Recurso, como bem qualificou o Tribunal a quo passa pela aplicação e interpretação do art. 180º, nº 5 do CPPT, que aqui se transcreve, “Se a empresa, o insolvente ou os responsáveis subsidiários vierem a adquirir bens em qualquer altura, o processo de execução fiscal prossegue para cobrança do que se mostre em dívida à Fazenda Pública, sem prejuízo das obrigações contraídas por esta no âmbito do processo de recuperação, bem como sem prejuízo da prescrição”, 9-Resulta do probatório que: a pensão de reforma era auferida antes da declaração de falência, e que a legislação aplicável pelo então Tribunal de Comércio de Lisboa, actualmente denominado Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, foi o CPEREF; consequentemente, não é o art. 46º do CIRE que se aplica, como defende o douto Acórdão, o mas o art. 154º, nº 3 do CPEREF que ao caso cabe como bem refere a sentença da primeira instância “aplicável à data dos factos em questão” – como resulta igualmente da sentença de declaração de falência prova junta aos autos que o Acórdão a quo ignorou, Refere o nº 3 do citado art. 154º do CPEREF: “A declaração de falência obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer acção executiva contra o falido; porém, se houver outros executados, a execução prossegue contra estes.” 10-Ou seja, o artigo determina que a declaração de falência tem como efeito obstar ao prosseguimento de qualquer acção executiva contra o falido.

11-Analisadas as duas normas e sobre a interpretação a dar o Conselheiro JORGE LOPES DE SOUSA, considera que devem ser harmonizadas e interpretadas do seguinte modo: “pelo que “(...) a interpretação razoável daquele n.º 6, que se compagina com a unidade do sistema jurídico, que é o elemento primacial da interpretação jurídica (artigo 9.º, n.º 1 do Código Civil), é a de que só será viável o prosseguimento dos processos de execução fiscal por créditos vencidos após a declaração de falência ou insolvência ou do despacho de prosseguimento da acção de recuperação da empresa se forem penhorados bens não apreendidos naqueles processos de falência ou recuperação ou insolvência.”.

12-Resulta assim que, a contrario do que dispõe o nº 6 do art. 180º do CPPT, tratando-se de processos de execução fiscal para cobrança de créditos tributários vencidos anteriormente à declaração de falência - como foi o caso -, deverá a execução fiscal ser imediatamente sustada e avocada pelo tribunal judicial para apensação àquele processo (artigos 180º, nºs 1 e 2 do CPPT e 154º, nº 3 do CPEREF), como foi o caso.

13-Assim, como refere a sentença da primeira instância: “duvidas não restam de que, encontrando-se vencida a dívida no ano de 2002, data da instauração do processo fiscal em causa, e tendo o Reclamante sido declarado falido no ano de 2016, a dívida em causa se venceu antes da declaração de falência do Reclamante.” “na verdade tendo o processo de execução fiscal sido instaurado no ano de 2002 e a sentença que decretou a insolvência do Reclamante ter sido proferida no ano de 2016, daqui resulta que o crédito em questão se venceu antes da declaração de falência do Reclamante, aplicando-se por isso os termos do art. 154º do CPEREF supra citado”.

14-Ou seja, tendo em consideração a declaração de falência do Reclamante (al G) dos factos provados na sentença), a Fazenda Pública só o podia fazer em relação a bens adquiridos ulteriormente pelo falido, ou seja, bens adquiridos após a declaração de falência e, por isso mesmo que não façam parte do acervo da massa falida (artigo 180º, nº 5 do CPPT).

15-Pelo que se torna fundamental analisar a data em que o único rendimento do falido - pensão de reforma - foi adquirido, verificando-se conforme factos F) e H) ter sido em 2015, pelo que já existia antes da declaração de insolvência.

16-Assim, conclui-se que a penhora em causa efectuada pelo SF em 27 Novembro de 2020 (probatórios I e J) não cumpre os requisitos essenciais constantes do citado art. 185º, nº 5 do CPPT, que impõe que a execução pode prosseguir após declaração de insolvência, mas apenas perante bens que vierem a ser adquiridos posteriormente à mesma.

Neste sentido, o Ac. STA de 20/02/2019, proc. nº 0216/14.2BEBRG 0134/18, que se acompanha, sumariou: “(...) II - Se a Fazenda Pública não tiver logrado o pagamento dos seus créditos exequendos provenientes de dívidas tributárias pela massa insolvente da sociedade originária devedora, a lei admite a prossecução da execução fiscal em ordem a conseguir esse pagamento pelo património dos responsáveis subsidiários (cf. art. 24º da LGT), ao abrigo do disposto nos arts. 180º, nº 4 e 153º, nº 2, do CPPT.

III - A essa reversão não obsta o facto de o chamado como responsável subsidiário ter sido também ele declarado insolvente mas, nesse caso, após a reversão, a execução fiscal deve ser imediatamente remetida à insolvência; cessado esse processo, se o crédito aí não logrou integral pagamento, a execução fiscal pode prosseguir contra o revertido, mas com a referida restrição prevista no nº 5 do art. 180º do CPPT.

17-Em suma, a jurisprudência do STA é pacífica quanto à vaexata questio do nº 5 do art. 180º do CPPT, a pensão de reforma era auferida antes da prolação da sentença, não é um rendimento novo passível de ser apreendido, o legislador foi bem claro ao excluir esses bens de penhora.

18-Como de resto a sentença e o...

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