Acórdão nº 1208/21.0T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelANABELA LUNA DE CARVALHO
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Apelação 1208/21.0T8STR.E1 2ª Secção Acordam no Tribunal da Relação de Évora: I Em 07/05/2021 (…) veio apresentar-se à insolvência com pedido de exoneração do passivo restante.

Colhe-se dos autos: 1 - Por sentença de 19/05/2021 foi declarada a sua insolvência, que teve em conta a seguinte factualidade: “1. (…) nasceu em 03-01-1967 e é natural da freguesia de (…), concelho de Salvaterra de Magos.

  1. A requerente é divorciada, sendo o agregado composto por si.

  2. A requerente aufere o Salário Mínimo Nacional, sendo que atualmente se encontra de baixa médica.

  3. A requerente não é proprietária de qualquer bem imóvel.

  4. A requerente assume ser devedora de créditos no montante de € 75.818,28.” Mais se consignou que: “IV – Do Incidente de Qualificação da Insolvência Na medida em que os autos não dispõem de elementos que justifiquem a abertura deste incidente, com carácter pleno ou limitado, designadamente com vista à formulação de um juízo de culpabilidade da apresentante na situação de insolvência, nada há a ordenar nos termos do artigo 36.º, alínea i), do CIRE.” 2 - Em 25/06/2021 foi apresentado Relatório pelo Administrador da Insolvência, do qual consta: “II. Das causas da insolvência.

    A insolvente e o então marido contraíram empréstimos imobiliários, junto da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de (…).

    Estes empréstimos destinaram-se à aquisição do prédio descrito na CRP de Benavente sob o n.º (…), freguesia de Benavente, artigo (…), urbano.

    Os empréstimos foram incumpridos e o prédio acabou por ser vendido a terceiros no âmbito do processo n.º 1750/08.9TBBNV, que correu termos no juízo de execução do Entroncamento.

    A venda não foi suficiente para o pagamento das responsabilidades pelo que foi penhorado parte do vencimento da devedora.

    Foram efetuadas buscas, mas não foram encontrados quaisquer bens, com registo a favor da insolvente.

    A devedora, não possuí bens suscetíveis de apreensão, para a cobertura de custas e demais despesas do processo.

    Assim deve o processo encerrar, nos termos e para os efeitos do disposto artigos 232.º e seguintes do CIRE, sem prejuízo da apreciação do pedido de exoneração do passivo restante.

    (…) A insolvente trabalha por conta de outrem auferindo o vencimento base de € 675,00.

    Vive sozinha em casa arrendada, cujo valor da renda mensal é € 300,00.

    (…) Não se conhecendo nenhum motivo que possa conduzir ao indeferimento liminar, entende o Administrador da insolvência que deve ser proferido despacho inicial de exoneração do passivo restante.

    Face à situação pessoal e patrimonial da devedora, nomeadamente a idade, os rendimentos auferidos e as despesas normais a suportar, é razoável fixar para o seu sustento, o valor de um salário mínimo nacional.

    A parte que exceda este montante, será objeto de cessão e entregue a fiduciário.

    (…) Perante a inexistência de bens ou direitos suscetíveis de apreensão, propõe-se o encerramento do processo, nos termos dos artigos 232.º e seguintes do CIRE, sem prejuízo da apreciação do pedido de exoneração do passivo restante.” 3 - Notificada do Relatório veio a credora reclamante Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de (…), CRL, pronunciar-se, em 08/07/2021, informando que: Vota desfavoravelmente a proposta de encerramento do processo, porquanto, existe um direito de 1/3 de um imóvel (artigo …, Secção …, da freguesia de …), que foi transmitido em 17 de Maio de 2018 por doação, a favor dos filhos da Devedora Insolvente e que será objeto de impugnação pauliana por parte da reclamante, em ação futura que se encontra a preparar, “ainda que o ato de transmissão de propriedade objeto daquela, não possa ser resolvido em benefício da massa insolvente, porquanto encontram-se esgotados os prazos previstos no disposto no artigo 120.º e seguintes do CIRE”.

    Requerendo por isso a apreensão da expectativa de aquisição do direito sobre o prédio em causa, para ulteriores termos de liquidação.

    E, quanto à exoneração do passivo restante pronuncia-se, por ora, pela rejeição liminar do pedido de exoneração do passivo restante deduzido pela devedora até que esteja concluída a investigação patrimonial do estado do património identificado no documento que juntou, podendo vir a concluir-se ter havido deliberada atuação de dissipação, em proveito próprio, com o fito de prejudicar os credores.

    4 - O documento que refere, junto em 08/07/2021, emitido pela Alta Autoridade Tributária e Aduaneira, atribui ao imóvel em questão o valor patrimonial atual de € 54,89.

    5 - Em 12/07/2021 a credora Caixa de Crédito veio comprovar ter intentado a referida ação.

    6 - Foi de novo ouvido o Senhor administrador da Insolvência, que assim expôs: “A doação foi efetuada em 17/05/2018.

    O processo de insolvência teve início em 7/05/2021, pelo que está ultrapassado o prazo mencionado no n.º 1 do artigo 120.º do CIRE, não sendo assim possível de tal ser atacada pela resolução.

    Citando o Ac. STJ de 17/12/2019, proc. n.º 1542/13.3TBMGR: “1. Dado que a procedência da impugnação pauliana não tem como consequência a extinção do efeito translativo da venda, o credor impugnante executa os bens, alvo da impugnação, no património do terceiro adquirente.

  5. Assim, não regressando os bens vendidos ao património do alienante, posteriormente declarado insolvente, a impugnação pauliana da respetiva venda não aproveita aos demais credores do insolvente. Por isso, o artigo 127.º do CIRE determina que aquela ação de impugnação pauliana não é apensa aos autos da insolvência do devedor alienante.

  6. Tratando-se, assim, de bens de terceiro, não pode o administrador da insolvência (que não procedeu à resolução em benefício da massa) apreender esses bens para a massa insolvente”.

    A procedência da impugnação pauliana intentada pela Caixa de Crédito Agrícola, não tem como consequência a extinção da doação celebrada em 17/05/2018.

    A procedência da impugnação pauliana não tem como consequência, o retorno do direito doado à esfera patrimonial da insolvente.

    Então tal direito (1/3 indiviso do prédio rústico descrito na Conservatória do Registo Predial de Salvaterra de Magos sob o n.º … (freguesia de …) e na matriz artigo (…), secção n.º … (parte)) não pode ser objeto de apreensão no processo de insolvência.

    Dessa forma mantém-se a situação descrita no relatório a que alude o artigo 155.º do CIRE, i.e. o encerramento do processo por insuficiência da massa insolvente (artigo 232.º, n.º 2, do CIRE e artigo 230.º, n.º 1, d), do CIRE).” 7 – Por sentença de 04/01/2022 foi pela Mmª Juíza decidido: “Concorda-se na íntegra com o explanado pelo Sr. AI.

    Com efeito, atenta a data do negócio jurídico em causa, já decorreram os prazos legalmente previstos para resolução de tal negócio, única forma de poder fazer reverter o bem doado para a massa insolvente, uma vez que, a ação de impugnação pauliana intentada pela referida credora não terá tal efeito jurídico, conforme se pode ler no já citado ac. do STJ de 17-12-2019, proc. n.º 1542/13.3TBMGR.

    Acresce que, não foram apreendidos quaisquer bens para a massa insolvente.

    Pelo exposto, nos termos dos artigos 230.º, n.º 1, alínea d) e 232.º, n.º 2, ambos do CIRE, declaro encerrado por insuficiência da massa insolvente o presente processo.

    O encerramento do processo, tendo em conta a exoneração do passivo restante, tem o efeito previsto no artigo 233.º, n.º 1, alínea b), do CIRE, de fazer cessar as atribuições do Sr. Administrador da Insolvência.

    Em conformidade com o disposto no artigo 233.º, n.º 6, do CIRE, qualifico como fortuita a insolvência.” 8 - Foi interposto recurso desta sentença, tendo este Tribunal da Relação confirmado a mesma, assim mantendo a qualificação da insolvência como fortuita.

    9 – Notificada a insolvente para, querendo, se pronunciar quanto ao requerimento da credora Caixa de Crédito Agrícola Mútuo de (…), CRL, na parte em que esta credora requereu o indeferimento liminar da exoneração do passivo restante, veio esta, por requerimento de 16/03/2022 alegar, em suma: “1. O pedido de exoneração do passivo restante só deve ser objeto de indeferimento liminar se forem verificadas as condições predispostas nas alíneas do artigo 238.º do CIRE; 2. O que, no caso concreto, não se verifica; 3. A Insolvente preenche todos os requisitos legalmente necessários para que lhe seja concedida a exoneração, tendo já, em sede de Petição Inicial declarado que se dispõe a observar todas as condições legalmente exigidas para a concessão efetiva da dita exoneração; 4. Atentos os elementos enviados aos autos, bem como todas as razões já invocadas nos Requerimentos antecedentes, salvo melhor entendimento, a Insolvente é merecedora de ter uma nova oportunidade; 5. Em nenhum dos elementos trazidos aos presentes autos se pode considerar que a Insolvente tenha agido de forma ilícita, desonesta e de má-fé no que respeita à sua situação económica; 6. Não consideramos que exista no processo elementos que indiciem com toda a probabilidade a existência e culpa da Insolvente na criação ou agravamento da situação de insolvência; 7. Salvo o devido respeito, outra conclusão não pode restar da chamada investigação patrimonial do estado do património da Insolvente que não seja a de que a Insolvente não agiu de má-fé nem tão pouco dissipou o seu património, em proveito próprio, com o intuito de prejudicar os credores; 8. Mais uma vez se refere que tendo a doação do imóvel em questão sido efetuada a 17.05.2018 e tendo o processo de insolvência início em 07.05.2021, está ultrapassado o prazo mencionado no n.º 1 do artigo 120.º do CIRE, não sendo possível a resolução deste negócio jurídico; 9. Pelo que, não existe forma de fazer reverter o bem doado para a massa insolvente; 10. Atento o exposto, o deferimento do pedido de exoneração do passivo restante – tendo como finalidade libertar o devedor do pagamento do passivo restante que não seja pago no âmbito do processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste – segue exatamente aquilo que é espectável e transparente face ao comportamento da Insolvente.

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