Acórdão nº 1841/19.0T8STR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09 de Fevereiro de 2023

Magistrado ResponsávelISABEL DE MATOS PEIXOTO IMAGINÁRIO
Data da Resolução09 de Fevereiro de 2023
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Autora: (…) Recorrida / Ré: (…) e Filhos, Lda.

A presente ação tem em vista a anulação de deliberações sociais tendo sido formulados os seguintes pedidos:

  1. Que se reconheça e declare ilícita a recusa da R de prestar a informação solicitada pela A conforme alegado nos arts. 5.º a 10.º, 23.º a 30.º e 35.º a 45.º da petição inicial; b) Que se declarem ineficazes, nulas ou, pelo menos, anularem-se as deliberações da R tomadas na Assembleia-Geral de 03/06/2019; c) Que se declare ineficaz ou, pelo menos nula, a deliberação de aumento de capital da Ré tomada na Assembleia Geral de 30/09/2017; d) Condenação da R a reconhecer a ineficácia, nulidade ou anulação dessas deliberações; e) Que se ordene o cancelamento ou anulação, na Conservatória do Registo Comercial, de todas as inscrições feitas ou que venham a fazer-se resultantes das referidas deliberações.

    A A alegou ser titular de uma quota da R no valor nominal de €400 e que, na sequência da convocatória para a assembleia a realizar em 03/06/2019, cujos termos alusivos aos assuntos a tratar não eram claros e elucidativos, solicitou à R informações, ao que esta não respondeu em momento prévio ou sequer na própria assembleia, o que implicou o seu voto contra as deliberações. Mais alegou que, nessa assembleia, foi aprovada deliberação insuscetível de renovação relativamente a deliberação aprovada na assembleia que reuniu a 30/09/2017.

    A R apresentou-se a contestar a ação. Em sede de exceção, invocou a caducidade no que respeita à deliberação de 30/09/2017, e por impugnação alegou que a A não compareceu à referida assembleia e que, em abuso de direito, pretende contornar a deliberação de aumento de capital aí tomada atacando a renovação dessa deliberação. Relativamente à assembleia de 03/06/2019, sustenta que foram prestadas à A todas as informações necessárias ou já esta as tinha na sua posse. Pugnou, assim, pela improcedência da ação.

    II– O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida sentença julgando a ação conforme segue: «1) Julgo procedente, por provada, a exceção perentória de caducidade para a propositura da ação de anulação da deliberação social do dia 30/06/2017 e, consequentemente, absolvo a ré desse pedido de anulação; 2) No mais, julgo a presente ação totalmente improcedente, por não provada e, em consequência, absolvo a ré dos pedidos.» Inconformada, a A apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que conceda provimento às pretensões deduzidas na petição inicial. Concluiu a alegação de recurso nos seguintes termos: «1. Os Recorrentes não se conformam com a douta decisão recorrida, quer quanto ao julgamento da matéria de facto, requerendo a reapreciação da prova gravada, quer quanto à interpretação e aplicação do direito.

    1. O Tribunal a quo deu como provados factos que deveriam ter sido considerados não provados, e vice-versa: I. Julgou como provados o facto n.º AA), desvalorizando por completo os documentos juntos aos autos e as declarações prestadas pelas testemunhas: na resposta apresentada pela Recorrente por carta datada de 17/05/2019 não há qualquer esclarecimento prestado, havendo antes uma transcrição integral do teor da convocatória da Assembleia Geral, donde não resultam quaisquer informações claras e elucidativas. Não foram, assim, prestadas quaisquer informações e esclarecimentos.

      1. Julgou como provado o facto n.º X) quando, ao invés, das declarações prestadas quer pela Autora, quer pelas testemunhas, não é possível inferir quais as sessões de julgamento das ações interpostas pelo sócio (...) em que a Recorrente esteve presente; por outro lado, a circunstância de constar na certidão permanente o pedido formulado nas ações não é suficiente para se perceber o estado em que se encontram, quais as concretas questões ali discutidas e quais os fundamentos subjacentes a tais ações.

      2. Julgou como não provado o facto n.º 1 olvidando tratar-se de um facto cuja prova é manifestamente impossível – a Autora não consegue provar não ter recebido as atas, nem conseguiria provar, porquanto jamais as recebeu.

      3. Julgou como não provados os factos n.os 2 e 3, contudo, face à falta de informação na esfera da Autora, jamais era possível concluir que esta se encontrava em condições de votar as deliberações tomadas na Assembleia Geral, dada a essencialidade dessa informação para formar um sentido de voto; por outro lado, a circunstância de terem sido fornecidos na Assembleia Geral os documentos contabilísticos da Recorrida não é suficiente para que a Recorrente forme uma convicção séria e razoável sobre a sua correção.

      4. Tudo assim que uma análise atenta e conjugada de toda a matéria factual nos termos expostos impõe que sejam dados como não provados o factos n.os X), AA) e como provados os factos n. os 1, 2 e 3.

    2. Da conjugação das normas constantes na alínea b) do artigo 21.º, do n.º 1 do artigo 214.º e do n.º 1 do artigo 290.º (aplicável ex vi n.º 7 do artigo 214.º) todos do CSC, resulta o direito do sócio em obter informações (por escrito, se assim for solicitado) claras, verdadeiras e elucidativas.

    3. O Tribunal a quo entendeu que as deliberações sociais não eram anuláveis por terem sido dadas à Recorrente todas as informações necessárias para esta exercer o seu direito de voto, olvidando que nenhum documento lhe foi entregue, nem quaisquer informações lhe foram prestadas (para além do relatório de contas apresentado durante a realização da Assembleia Geral).

    4. O entendimento vertido na decisão recorrida encontra-se em manifesta contradição com o depoimento prestado pelas testemunhas, e sempre a Recorrente poderia pedir tais informações por escrito, exercendo uma faculdade concedida expressamente na lei – vide n.º 1 do artigo 214.º do CSC e n.º 3 do artigo 289.º do CSC.

    5. A apresentação do relatório de contas durante a realização da Assembleia Geral não permitiu à Recorrente aferir da sua completude, conformidade e correção, que sempre não se verifica, pois os imóveis da sociedade são usados a título gratuito por outras sociedades.

    6. Não se vislumbra qualquer fundamento jurídico ou legal, nem tão-pouco quaisquer evidências ou provas que levem a crer que a Recorrente pediu os documentos para outros fins, conforme concluiu o tribunal a quo.

    7. A Recorrente exerceu um direito que é seu, não tendo peticionado nada que não lhe seja devido ou para o qual não tem legitimidade.

    8. A transmissão da quota do sócio (...) não assume qualquer relevância para os presentes autos pois o que fere as deliberações tomadas de anulabilidade é o facto de não terem sido prestadas quaisquer informações à Recorrente o que contendeu com o exercício do seu direito de voto.

    9. As deliberações cujo aviso convocatório não mencione claramente o assunto sobre o qual a deliberação será tomada são anuláveis (alíneas a) e c) do n.º 1 do artigo 58.º CSC, e n.º 8 do artigo 377.º todos do CSC), tendo o Tribunal a quo entendido – a nosso ver erroneamente – que os assuntos a tratar se encontravam devidamente explicitados, sendo claros os temas sobre que versavam.

    10. Na convocatória há apenas uma referência genérica a deliberações objeto de renovação ou ratificação, ações judiciais de impugnação que teriam por objeto tais deliberações, não se identificado os pedidos formulados ou vícios contidos nas deliberações; da mesma forma não se identificam as ações judiciais intentadas pelo sócio (…) e os fundamentos da pretendida exoneração; por fim nenhuma razão é indicada sobre o motivo pelo qual não foi possível registar a deliberação tomada na Assembleia Geral de 30/09/2017.

    11. Há, assim, uma violação ao dever de fornecimento ao sócio de elementos mínimos para participar na Assembleia Geral.

    12. Considerando o teor do aviso convocatório, a circunstância de à Recorrida não terem sido fornecidas quaisquer informações / esclarecimentos, nem entregues quaisquer documentos, sendo injustificada a recusa na prestação de informações pela Recorrida por não se tratar de informação sigilosa ou para fins estranhos à sociedade, impõe-se concluir que as deliberações tomadas na Assembleia Geral de 30/09/2017 são anuláveis.

    13. O Tribunal a quo, desconsiderando o princípio do pedido, julgou verificada a exceção de caducidade para a propositura da presente ação quanto à deliberação de 30/09/2017, quando a Autora, ora Recorrente, havia requerido que fosse declarada a sua nulidade ou ineficácia, e não a sua anulabilidade, não se encontrando assim ultrapassado qualquer prazo.

    14. Quanto à deliberação de aumento de capital tomada na Assembleia Geral de 30/09/2017, o Tribunal recorrido entendeu não se encontrar verificada qualquer causa de ineficácia ou nulidade (por não se integrar em qualquer das situações previstas nos artigos 55.º e 56.º do CSC), olvidando que esta não cumpre as exigências dos normativos legais e imperativos constantes nos artigos 87.º e 88.º do CSC sendo, por isso, nula nos termos da alínea d) do artigo 56.º do CSC.

    15. A nulidade da deliberação social de aumento de capital tomada na Assembleia Geral de 30/09/2017 impõe a realização de nova deliberação cujo conteúdo expurgue o vício da anterior, o que torna impossível a sua renovação na Assembleia Geral de 03/06/2019 – Cfr. n.º 1 do artigo 62.º do CPC.

    16. A douta Sentença recorrida deve ser revogada, substituindo-se por outra que declare a nulidade da deliberação de aumento de capital social tomada na Assembleia Geral 30/09/2017 sendo, consequentemente, insuscetível de renovação na Assembleia Geral de 03/06/2019.

    17. O Tribunal a quo considerou que a deliberação tomada na Assembleia Geral de 03/06/2019 – ponto 6 – é uma deliberação renovatória da deliberação tomada na Assembleia Geral 30/09/2017. Contudo, não só não é possível renovar tal deliberação, como é manifesto que estamos antes perante uma deliberação confirmatória que pretende conferir à anterior a validade e a existência que...

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