Acórdão nº 00014/11.5BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 11 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Aparício Duarte Brandão
Data da Resolução11 de Abril de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO MOCRA..., FMGF..., PDFC... e MRSF... instauraram acção administrativa comum, com processo ordinário contra a Figueira Grande Turismo EM, Companhia de Seguros A... Portugal, SA, Pirotecnia X... SL, Mafre, Empresas SA e RNC..., tendo sido habilitados por óbito deste, CAOFC... e MGFC..., todos já melhor identificados nos autos, pedindo o seguinte: -a procedência da acção e a condenação solidária dos RR na pretensão dos AA. concretizada no ponto VIII da p.i, acrescida dos juros vincendos; -a condenação solidária dos RR. no pagamento dos valores que vierem a ser pedidos pelo SNS ao 4º A. pelas intervenções cirúrgicas de que foi alvo.

Por sentença proferida pelo TAF de Coimbra foi julgado assim: a)Absolvo da instância os RR. Pirotecnia X... SL; M... Empresa SA e CAOFC... e MGFC... e Companhia de Seguros A... Portugal, SA; b)Julgo parcialmente procedente a acção e condeno a R. Figueira Grande Turismo EM a pagar aos AA., em termos de indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, os seguintes montantes, acrescidos de juros legais desde a citação: A)MOCRA…: € 22 776,00; B)FMGF...: € 19 567, 38; C)PMFC…: € 10 494,00; D)MRRF…: € 19 313, 32.

Fica ainda esta Ré condenada no pagamento das cirurgias a que foi submetido o quarto Autor e resultantes do acidente em causa nos autos.

Desta decisão vem interposto recurso pela Ré Figueira Grande Turismo E.M..

Em alegação formulou as seguintes conclusões: 1. O lançamento de fogo de artifício é considerada uma actividade perigosa; 2. A responsabilidade da Recorrente pelos danos provocados no desempenho destas actividades é analisada de acordo com o preceituado no art. 8.º do Decreto-lei n.º 48051, por ser o diploma vigente aquando da ocorrência dos danos; 3. Nesse art. 8.º não está em causa uma responsabilidade objectiva ou pelo risco, ao contrário do entendimento seguido pela douta decisão recorrida; 4. Estamos, sim, em pleno domínio da responsabilidade civil extracontratual baseada na culpa; 5. Este artigo estabelece, contudo, uma inversão do ónus da prova, presumindo-se a culpa por parte de quem exerce uma actividade perigosa; 6. De acordo com o mesmo, essa presunção será ilidida se se provar que os danos foram causados por “força maior”, por um “terceiro” ou pelo “próprio lesado”, desde que tenham sido empregadas todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de os prevenir”; 7. Pela matéria de facto assente, comprovou-se que a Recorrente empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos sofridos pelos Recorridos; 8. Os danos foram ocasionados pelo rebentamento de uma das granadas no interior de um tubo de lançamento; 9. Não obstante não se descortinar quem, por acção ou omissão, provocou este rebentamento, forçoso é concluir que este acto causador dos danos não foi provocado pela Recorrente, mas sim por quem produziu o foguete ou pelo fogueteiro; 10. Havendo danos e tendo a Recorrente empregado todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos sofridos pelos Recorridos, obrigatoriamente eles têm de ter sido provocados por um dos sujeitos supramencionados, o mesmo será dizer por “terceiros”; 11. Assim, o requisito do art. 8º do Decreto-lei n.º 48051, segundo o qual “salvo se, nos termos gerais, se provar que (...) houve culpa de terceiro”, está, no caso sub judice, preenchido; 12. Por conseguinte, está ilidida a presunção de culpa prevista nesse preceituado; 13. Não se demonstrando o requisito culpa preenchido, a Recorrente não pode nunca ser responsabilizada pelos danos que os Recorridos sofreram, sob pena de violação crassa do preceituado no art. 8.º do Decreto-lei n.º 48051, que apresenta um regime idêntico ao previsto no art. 493.º, n.º2, do CC.

Nestes termos e nos melhores de direito, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, com base em todo o supramencionado, revogando-se a decisão a quo, absolvendo-se, por consequência, a Recorrente do pedido, só assim se fazendo JUSTIÇA.

Não foram oferecidas contra-alegações.

O MP, notificado ao abrigo do disposto no artº 146º/1 do CPTA, não emitiu qualquer parecer.

Cumpre apreciar e decidir.

FUNDAMENTOS DE FACTO Na decisão foi fixada a seguinte factualidade: 1. No dia 3 de Maio de 2005, entre a Empresa Municipal Figueira Grande Turismo-EM e RNC... foi assinado documento denominado por “ Contrato de Prestação de Serviços” (alínea A) da matéria de facto dada como assente); 2. O documento assinado entre Empresa Municipal Figueira Grande Turismo-EM e RNC..., denominado por “Contrato de Prestação de Serviços” contém uma denominada “Cláusula 1.ª” que refere que “ … o presente contrato tem por objecto o fornecimento de fogo-de-artifício para S. JOÃO 2005…” (alínea B) da matéria de facto dada como assente); 3. O documento assinado entre Empresa Municipal Figueira Grande Turismo-EM e RNC..., denominado por “Contrato de Prestação de Serviços” contém uma denominada “Cláusula 2.ª” que refere que “ … o fornecimento dos serviços a prestar (…) será executado (…) pelo RN..., e este obriga-se a executar todos os trabalhos que constituem o seu objecto, observando as regras fundamentais de segurança exigidos…” (alínea C) da matéria de facto dada como assente); 4. O documento assinado entre Empresa Municipal Figueira Grande Turismo-EM e RNC..., denominado por “Contrato de Prestação de Serviços” contém uma denominada “Cláusula 7.ª” que refere que “ …Quaisquer danos causados a terceiros e provenientes do transporte e execução dos trabalhos, agindo dolosa ou culposamente serão da responsabilidade do segundo outorgante, mesmo que praticados pelos seus funcionários…”(alínea D) da matéria de facto dada como assente); 5. Por força de um atraso, o fogo-de-artifício acabou por ter lugar já no dia 24 de Junho de 2005, à 01h 25 na praia da claridade na Figueira da Foz (alínea E) da matéria de facto dada como assente); 6. A Autora MOA... foi internada de urgência no Serviço de Cirurgia do Hospital Distrital da Figueira da Foz, em 24 de Junho de 2005 (alínea F) da matéria de facto dada como assente); 7. Por ferida perfurante da região peitoral provocada por estilhaços de pirotecnia que provocou queimadura dos bordos da ferida (alínea G) da matéria de facto dada como assente); 8. A Autora MOA... teve alta médica em 3 de Julho de 2005, passando ao regime ambulatório (alínea H) da matéria de facto dada como assente); 9. Declaração, a fls. 112 e 113 dos autos, com timbre de “MRC..., Hospitais da Universidade de Coimbra, Dermatologista”, onde se declara que “…tendo observado em consulta de dermatologia a Sr.ª D.ª MOA... desde 2-9-05 queimaduras (…) tendo sido efectuados tratamentos tópicos nomeadamente anticépticos, antibióticos, emoliente e fotoprotectores…”(alínea I) da matéria de facto dada como assente); 10. Em 7 de Dezembro de 2007, foi subscrito documento por perito médico Dr.ª RS..., assistente de medicina legal, denominado por “Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil”, onde consta na epígrafe “Dados Documentais” que o Autor FMGF... esteve internado no serviço de cirurgia do Hospital Distrital de Figueira da Foz “…em 24 de Junho de 2005 por queimadura do 2.º e 3.º grau do hemitórax direito e região lombar com área de 5%...” (alínea J) da matéria de facto dada como assente); 11. E que “…fez pensos e teve alta em 04-07-2005, passando a regime ambulatório…” (alínea L) da matéria de facto dada como assente); 12. Em 30 de Outubro de 2007, foi subscrito documento por perito médico Dr.ª RS..., assistente de medicina legal, denominado por “Perícia de Avaliação do Dano Corporal em Direito Civil”, onde consta na epígrafe “Dados Documentais” que o Autor PDFC... foi internado no serviço de cirurgia do Hospital Distrital de Figueira da Foz “…em 24 de Junho de 2005 por queimadura do 2.º e 3.º grau do hemitórax direito e região lombar com área de 5%...” (alínea M) da matéria de facto dada como assente); 13. E que “…fez pensos e teve alta em 04-07-2005, passando a regime ambulatório…” (alínea N) da matéria de facto dada como assente); 14. No dia 24 de Junho de 2005, pelas 03h45, no serviço de urgência do Hospital Distrital da Figueira da Foz, foi o Autor MRRF... observado com “… queimadura de 3.º grau perfurante na região maxilar esquerda por estilhaço de fogo de artifício…”(alínea O) da matéria de facto dada como assente); 15. O Autor MRRF... teve alta no mesmo dia 24 de Junho de 2005 (alínea P) da matéria de facto dada como assente); 16. No dia 26 de Outubro de 2005, a enfermeira F... subscreve documento, denominado de “HUC – Cirurgia Maxilo-Facial. Pequena Cirurgia/Cirurgia Ambulatória”, onde refere que o Autor MRRF... foi submetido a “…Exérese de tatuagem palpebral inferior esquerda… “ (alínea Q) da matéria de facto dada como assente); 17. No dia 5 de Julho de 2006, a médica MICOA..., subscreve documento timbrado dos Hospitais da Universidade de Coimbra, denominado de “Relatório Médico”, onde refere que o Autor MRRF...

“ …apresentava drenagem purulenta da região palpebral inferior e à palpação identificava-se corpo estranho dessa mesma região.

Foi então enviado ao serviço de cirurgia maxilo-facial para tratamento complementar, tendo sido submetido a terapêutica cirúrgica em 20-09-2005 – Extracção de corpo estranho …” e “… Em 26/10/2005, sob anestesia local, exérese de tatuagem palpebral inferior esquerda (…) e em 18/04/2006 fez exérese de pequeno corpo estranho também na região palpebral inferior esquerda…” (alínea R) da matéria de facto dada como assente); 18. As granadas utilizadas no fogo-de-artifício foram adquiridas à empresa Pirotecnia X... SL (alínea S) da matéria de facto dada como assente); 19. Em 17 de Junho de 2005, entre a Figueira Grande Turismo-EM e a Companhia de Seguros A... Portugal SA foi assinado documento denominado por “A... RC Foguetes – Apólice (...)” (fls. 226 – 239 dos autos que aqui se dão...

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