Acórdão nº 00071/12.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 13 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelHelena Ribeiro
Data da Resolução13 de Junho de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

ACORDAM, EM CONFERÊNCIA, OS JUÍZES DA SECÇÃO ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO DO NORTE: I. RELATÓRIO AOS..., residente na Rua …, da freguesia de C…, do concelho de Barcelos, inconformado, interpôs recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, em 05.11.2013, que no âmbito da ação administrativa especial de pretensão conexa com atos administrativos que instaurou contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. [Centro Distrital de Braga], julgou verificada a exceção dilatória de caducidade do direito de ação, absolvendo o Réu da instância.

*O RECORRENTE apresentou as respetivas alegações de recurso, nas quais formulou as seguintes conclusões: 1. Não obstante o incomensurável respeito que a mesma lhe merece, não pode o Recorrente conformar-se com a mui douta decisão proferida pelo Tribunal a quo que julgou verificada a excepção dilatória de caducidade de direito de acção.

2. Com efeito, entende o ora recorrente que aquela decisão, além de fazer uma incorrecta interpretação e aplicação do Direito, não se pronunciou sobre questões suscitadas pelo ora recorrente.

3. Desde logo, não se conforma o recorrente com a douta decisão sub judice por esta negar a aplicação do nº 1 do artº 58º do CPTA, em virtude de entender que o vício imputado ao acto não ser a nulidade, mas a mera anulabilidade.

4. Na verdade, o A./Recorrente invoca a ofensa do conteúdo essencial de direitos fundamentais, pelo acto administrativo praticado pelo R..

5. A Constituição não só consagra, assim, o direito à segurança social como também impõe ao Estado a organização, coordenação e subsidiação de um sistema de segurança social unificado e descentralizado, definindo em parte o modelo de satisfação do direito fundamental em causa, mas não os seus precisos termos.

6. Como sustentou o Tribunal Constitucional, no acórdão n.º 3/2010, processo n.º 176/09: “Na verdade, naquelas circunstâncias típicas previstas no n.º 3, do artigo 63.º, quando esteja em causa a própria subsistência mínima e, portanto, a existência socialmente condigna, o direito à segurança social adquire uma urgência e uma força vinculante que o tornam directamente aplicável e o subtraem, em ampla medida, ao poder de legislar extrai-se do princípio da dignidade humana (artigo 1º da Constituição da República Portuguesa) um direito fundamental a um mínimo de existência condigna.”(…) 7. Resulta em suma deste acórdão – que traduz o mais recente entendimento deste Tribunal – que se extrai do princípio da dignidade humana (artigo 1º da Constituição da República Portuguesa) um direito fundamental a um mínimo de existência condigna.

8. Ora, com os presentes autos está aqui impugnado acto administrativo que anulou o período contributivo do mês de 2004/03 a 2005/11 e de 2009/06 a 2010/11.

9. Este acto está a impedir que o Recorrente, que entretanto atingiu os 65 anos de idade, possa usufruir do direito a uma pensão de reforma que lhe assiste, sendo certo que este não dispõe de quaisquer outros rendimentos! 10. Estamos, portanto, perante um acto que restringe de maneira insustentável, o direito social à assistência na velhice.

11. O acto é, pois, nulo, por ofensa do conteúdo essencial de um direito social, equiparável, neste caso, a um direito fundamental, não estando a respectiva impugnação sujeita a prazo – artigos133º, n.º 2, alínea d) e 134º n.º2, ambos do Código de Procedimento Administrativo.

12. Assim, impõe-se julgar procedente o recurso jurisdicional e se determine que os autos baixem ao Tribunal recorrido para aí prosseguir os seus termos com vista ao conhecimento de mérito.

13. Acresce que a sentença em mérito adopta um sentido para conjugar as disposições dos artigos 59º nº 4 do CPTA e 165º do CPA, é que a suspensão do prazo de impugnação contenciosa cessa com a notificação da decisão proferida sobre a impugnação administrativa ou com o decurso do respectivo prazo legal, conforme o facto que ocorrer em primeiro lugar.

14. Entende o Recorrente que o entendimento perfilhado viola de forma efectiva e clara os princípios constitucionais.

15. Efectivamente, deve entender-se a segunda parte do n.º 4 do art.º 59.º como determinando “sempre que venha a existir decisão expressa - mesmo para além do prazo legal de decisão do recurso administrativo somado com o retomado prazo de recurso da decisão impugnada na via graciosa - retoma-se o prazo da impugnação contenciosa”.

16. Esta interpretação não é afrontosa do princípio da estabilidade das decisões, porque foi a própria Administração ao voltar a pronunciar-se que criou essa instabilidade e não o uso dos meios contenciosos.

17. Para que melhor se entenda e interprete aquele nº 4 do artº 59º do CPTA, é absolutamente necessário entender por que linhas se conduz o pensamento legislativo, quanto à suspensão do prazo para impugnação contenciosa.

18. Parece-nos absolutamente clara a propensão do nosso legislador, para garantir uma maior proteção dos interesses dos particulares, nomeadamente com o disposto no artigo 268.º n.º 4 da Constituição, onde erige o direito fundamental de impugnação dos actos administrativos lesivos dos particulares, consagrando um modelo de justiça administrativa que tem por função a proteção dos direitos dos particulares.

19. O tribunal prendeu-se à interpretação literal do preceito, ao invés de se apoiar num elemento sistemático – que, como vimos, rapidamente nos mostraria que o nosso ordenamento jurídico na sua totalidade se inclina para garantir aos particulares um maior acesso à jurisdicionalidade administrativa – ou teleológico – que apontaria para a ratio da norma - o que se consubstanciou numa clara profanação no princípio da efetivação do direito de acesso à justiça, disposto no artigo 7.º do CPTA.

20. Assim, a aqui douta sentença em crise, optou pela interpretação do referido nº 4 do artº 59º que mais restringe o acesso dos particulares à justiça violando o princípio da prevalência da interpretação mais conforme aos direitos fundamentais – aqui o direito fundamental do impugnante de acesso à justiça administrativa.

21. Acresce que interpretar ente nº4 da forma que fez o tribunal, implica uma limitação ao acesso dos particulares à tutela jurisdicional e com isso pode-se consubstanciar numa violação do princípio constitucional da desconcentração administrativa (artigo 267.º, n.º2 da CRP), podendo apenas o particular recorrer para o mesmo órgão – sem prejuízo, evidentemente, da estrutura hierárquica da organização administrativa – já que caducando o prazo de impugnação contenciosa (lembre-se que a decisão é proferida depois vencido o prazo de impugnação contenciosa), resta apenas ao particular, recurso para o mesmo órgão.

22. E viola também o princípio constitucional da plenitude de tutela dos direitos dos particulares (há pois uma negação do direito fundamental ao recurso contencioso) e o princípio da efetividade da tutela (já que se preclude o prazo para impugnação contenciosa).

23. Assim, interpretando o disposto no n.º4 do artigo 59.º do CPTA em conformidade com o referido elemento sistemático, o seus espírito e com os ditames constitucionais, teremos que concluir que a impugnação judicial apresentada pelo ora recorrente cumpriu o prazo legal, não se verificando a caducidade do direito de acção.

24. Na realidade, tendo a notificação sido recebida em 4 de Abril de 2011 e sido a reclamação graciosa recebida pela R. em 21 de Abril de 2011, decorreram 12 dias do prazo de 90 (e não 16 como se refere na douta sentença), uma vez que de 17 de Abril até 25 de Abril de 2011 decorreram as férias da Páscoa de 2011.

25. E, tendo a decisão da reclamação sido recepcionada pelo Recorrente em 16 de Outubro de 2011 e sido a impugnação judicial apresentada em 4 de Janeiro de 2012, reiniciou-se a contagem do prazo, tendo decorrido mais 66 dias do prazo, uma vez que entre 22 de Dezembro de 2011 e 3 de Janeiro de 2012 decorreram as férias judiciais do Natal de 2011.

26. Assim, decorreram apenas 78 dias do prazo de 90 de que dispunha o recorrente para intentar a acção.

27. Como tal, também por este motivo terá de ser julgada improcedente a excepção de caducidade invocada pela R., o que se requer.

28. Mas ainda que assim se não entenda, teria de se considerar atempada a impugnação e improcedente a excepção da caducidade.

29. Na realidade, a R. não aproveitou a consolidação operada em relação ao que estava decidido e optou, depois de decorrido o prazo da impugnação (na sua interpretação!), por decidir a reclamação que tinha pendente.

30. E tal decisão da Reclamação, mesmo que reconstruída a partir de alguns elementos do acto primário, é uma nova definição da relação jurídica que não pode deixar de ser impugnável, ao que se não opõe aliás o art.º 59.º n.º 4 do CPTA que não prevê esta situação.

31. E, à impugnação dos actos de segundo grau que revoguem por substituição os actos primários, como sucede em relação a generalidade dos actos administrativos (os que caibam na definição do art. 120.º do CPA) serão aplicáveis as regras gerais de impugnação dos actos administrativos, designadamente os prazos previstos no art. 58.º do CPTA.

32. No caso em apreço, o acto que apreciou a reclamação alterou a fundamentação que constava do acto primário e, por isso, é revogatório por substituição. Como tal, o prazo para a respectiva impugnação apenas se iniciou com a respectiva notificação, em 16/10/2011, pelo que a presente acção, que entrou no TAF de Braga em 4/01/2012, é tempestiva, à face do preceituado nos arts. 58.º, n.º 2, alínea b), e 59.º, n.º 1, do CPTA, no que concerne aos vícios ainda que geradores de mera anulabilidade de que este acto de decisão da impugnação administrativa enferme.

33. De qualquer modo, sem prescindir do alegado, sempre se acrescentará que o R. ao invocar a excepção da caducidade age com manifesto abuso de direito.

34. Na realidade, como se referiu na petição, recebeu o A. uma notificação através da qual lhe era comunicado que “por despacho de 2011/03/25...

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