Acórdão nº 00345/06.6BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 12 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelPedro Nuno Pinto Vergueiro
Data da Resolução12 de Junho de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO A Excelentíssima Representante da Fazenda Pública, devidamente identificada nos autos, inconformada veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, datada de 28-05-2010, que julgou procedente a pretensão deduzida por J… na presente instância de IMPUGNAÇÃO, relacionada com as liquidações adicionais de IVA nºs: 0523522, no valor de € 3.894,24; 05235224, no valor de € 12.804,14; 05235226, no valor de € 11.320,20; 05235230, no valor de € 16.766,49; 05235232, no valor de € 14.741,04; 05235234, no valor de € 4.097,00; 05235238, no valor de € 5.637,30; 05235240, no valor de € 12.264,50; e correspondentes liquidações de juros compensatórios.

Formulou nas respectivas alegações (cfr. fls. 267-279), as seguintes conclusões que se reproduzem: “ (…) 1) As liquidações de IVA impugnadas provêm do facto de não ter sido considerado pela inspecção tributária, o IVA suportado por facturas emitidas por C…, Lda e por E…, Lda.

2) Na sentença recorrida considera-se que a Administração tributária não fez constar do seu Relatório de inspecção Tributária indícios suficientes de que as operações referidas nas facturas cujo IVA foi deduzido são simuladas.

3) A convicção do tribunal baseou-se nos documentos e informações constantes do processo, mas foi desvalorizada totalmente a prova documental constituída pelo anexo 3 que integra o relatório de inspecção tributária, onde se concluía que as facturas dos emitentes aqui em causa eram fictícias.

4) Na prova documental junta aos autos, concretamente o relatório de Inspecção Tributária elaborado em 31/05/2004 e relativo às empresas C…, Lda e E…, Lda, e que se encontra no anexo 3 do relatório de inspecção da impugnante enunciam-se expressamente os indícios que levaram á conclusão de que as facturas em causa são fictícias.

5) A sentença não um fez correcto julgamento da matéria de facto, ao desconsiderar cada um desses factos- índice.

6) Não obstante a fundamentação das liquidações impugnadas não primar pela perfeição pois o relatório de inspecção não indica expressamente os indícios das operações fictícias, o que é certo é que remete para a informação elaborada aos emitentes das referidas facturas. (As empresas C…, Lda, E…, Lda) 7) E como a lei admite a fundamentação por referência, ao estatuir que ela pode consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anterior parecer, informação ou proposta, que neste caso constituirão parte integrante do respectivo acto. (v. artº 125º nº 1 do CPA) 8) Deve fazer-se uma análise ao relatório de inspecção efectuado aos 2 emitentes das facturas, e a fundamentação da conclusão de que as facturas são falsas, que é manifestada no relatório de fiscalização da recorrida, deve ser colmatada com o que nele consta.

9) E o que nele consta quanto aos emitentes E…/C… é que as facturas por estes emitidas são falsas: 10) Estas empresas, estão indiciadas pela prática de crimes de fraude fiscal, sendo-lhes imputado um comportamento contínuo e sistemático de utilização/emissão de facturas falsas.

11) As compras registadas nestas sociedades no período de 1999 a 2002, são na sua quase totalidade suportadas por facturas falsas.

12) Foi verificado existir uma incoerência entre a actividade reflectida nas contabilidades (compra e vendas) e a actividade efectiva das empresas E… e C…, os trabalhadores declararam que não eram feitas descargas de cortiça nem de rolhas nas instalações.

13) Durante a inspecção os inspectores puderam verificar que as empresas se encontravam quase inactivas.

14) Foi apurado pela inspecção tributária que existem divergências assinaláveis entre quantidades compradas e vendidas bem como entre a qualidade, uma vez que as compras, dizem respeito a qualidades inferiores ( 4º e 6º) e as vendas dizem respeito a qualidades (extra, superiores e 1ªs.) o indicia que as compras são falsas porque ninguém vende aquilo que não possui.

15) Quase inexistência de meios produtivos (mercadorias, matérias-primas, equipamento produtivo e pessoal) incompatíveis com as vendas facturadas.

16) Inexistência de movimentos bancários, ou recurso a letras ou outros meios de financiamento usuais na actividade comercial, o que é incompatível com os elevados montantes de facturação das vendas.

17) Ao contrário do invocado na douta sentença sob recurso, as diligências de prova, não recaíram unicamente sobre as firmas emitentes das facturas, pois que o impugnante foi notificado para apresentar os elementos demonstrativos das transacções com as firmas E…, Lda e C…, Lda, tendo este limitado a juntar cópias das facturas em causa e do registo contabilístico, e algumas guias de remessa.

18) Por conseguinte a decisão do Meritíssimo Juiz pode e deve ser alterada, porquanto tal é permitido pela aplicação subsidiária do artº 712º do CPC, pois do processo constam todos os elementos de prova da matéria de facto em causa.

19) Deve ser alterada a referida decisão e considerar-se que os indícios apontados pela administração fiscal são suficientes para suportar o seu juízo sobre a “falsidade” das respectivas facturas.

20) Na douta sentença o Meritíssimo Juiz incorre em erro quanto ás regras de distribuição do ónus da prova, quando entende que a Administração tributária não provou que as facturas em causa não titulam relações comerciais reais.

21) Pois que o ónus da prova que recaia sobre a AT consubstancia-se na prova de indícios sólidos e consistentes de que as transacções não representam transacções reais, mas não se lhe exige a prova plena de que as transacções não existiram.

22) Tal como tem sido reiteradamente afirmado pela Jurisprudência, em doutrina, e que aliás, foi acolhido pela sentença recorrida é que para que a Administração tributária proceda á liquidação com base em simulação de custos basta que existam indícios sérios de que as operações tituladas pelas facturas não são verdadeiras cabendo depois ao contribuinte demonstrar que o são. Ac. do TCA Sul de 30/05/2000, proc. 3108/00, Ac. do TCA Sul de 11/3/2003, proc. 7450/02.

Ac. do TCA –Norte de 11/03/2010 in proc. nº 2797/04) 23) Fica satisfeito o ónus da prova da Administração Tributária se esta colheu e provou indícios sérios e objectivos que traduzam uma probabilidade elevada de que as facturas não titulam operações. (veja-se Ac. do TCA Sul de 29/01/2002, in processo 565/01, e Ac. do TCA Sul de 2/3/2004, proc. 0333/00) 24) A fundamentação constante dos autos (relatório de inspecção da recorrida e informações elaboradas aos emitentes das facturas postas em questão) contêm “factos-índice”, mais do que suficientes para permitir à AT desconsiderar o IVA suportado que tem as facturas em causa como suporte documental, com o fundamento de que as operações referidas nessas facturas são simuladas.

25) Assim, a impugnação judicial nunca pode proceder com fundamento na ilegítima actuação da AT ao corrigir o IVA dedutível declarado.

26) A douta sentença sob recurso, fez uma incorrecta apreciação da prova e violou os artigos 19º nº 3 do CIVA e artº 125º nº 1 do CPA.

Nos termos expostos deve ordenar-se a revogação da douta sentença recorrida, como é de LEI E JUSTIÇA” O recorrido J… não apresentou contra-alegações.

O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu o parecer de fls. 292 dos autos, no sentido da improcedência do recurso.

Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Desembargadores Adjuntos, vem o processo submetido à Conferência para julgamento.

  1. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO –QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pela Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, impondo-se apreciar o descrito erro quanto ao enquadramento e pertinência da correcção à matéria colectável em sede de IVA com referência ao disposto no artigo 19º nº 3 do CIVA.

  2. FUNDAMENTOS 3.1 DE FACTO Neste domínio, consta da decisão recorrida o seguinte: “… 1. O impugnante J… foi alvo de uma inspecção, de âmbito parcial (IVA), abrangendo os exercícios de 2001 e 2002; 2. O impugnante tem por objecto a “indústria da cortiça” CAE 20522 e está enquadrado em termos de IRS, na categoria B; 3. O impugnante estava enquadrado no regime normal de periodicidade trimestral; 4. O impugnante realizou, nos anos de 2001 e 2002, transacções comerciais com “C…, Lda.” e “E…, Lda.”; 5. As sociedades referidas em 4), encontram-se indiciadas de emitirem “facturas falsas”; Factos não provados Para a decisão da causa, sem prejuízo das conclusões ou alegações de matéria de direito produzidas, de relevante, nada mais se provou, nomeadamente, não se provou que as facturas em causa não titulassem relações comerciais reais.

    Fundamentação da matéria de facto: A decisão da matéria de facto, consonante ao que acima ficou exposto, efectuou-se com base nos documentos e informações constantes do processo e no depoimento das testemunhas arroladas pelo impugnante.

    Em especial, não se provou minimamente que as poucas conclusões constantes do Relatório de Inspecção Tributária estivessem certas, ou pelo menos, que tivessem subjacentes aos factos alguma prova. Explicando: Do Relatório de Inspecção Tributária que consta do processo administrativo apenso aos presentes autos, verifica-se que nenhum facto consta do mesmo relativamente ao impugnante, pelo menos, com o mínimo de relevância para caracterizar as relações comerciais em causa como “fraudulentas”. Refere-se o âmbito da inspecção, o enquadramento fiscal, o domicílio fiscal e, partir daí, mais nenhum facto é referido, ou até, um mero indício, do qual se possa retirar que as facturas em causa são “falsas” no sentido de não titularem relações comerciais reais.

    Na verdade, conclui-se que a Administração Tributária parte do princípio de que por considerar que...

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