Acórdão nº 01104/07.4BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelCatarina Almeida e Sousa
Data da Resolução14 de Junho de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte 1- RELATÓRIO E…, inconformada com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) do ano de 2002, dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: “1.- Importa apurar se o suplemento de residência auferido pela aqui recorrente, em 2003, está ou não sujeito a IRS, ou então, ao invés, se beneficia da isenção prevista no artigo 37º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.

  1. - Em 12 de Junho de 1970, em Lisboa, foi assinado o Acordo de Cooperação Cultural, Científica e Técnica entre o Governo da República Portuguesa e o Governo da República Francesa, tendo sido tal Acordo publicado no Diário do Governo n.º 31, I Série, datado de 6 de Fevereiro de 1971 (DL 28/71, de 6 de Fevereiro).

  2. - O referido Acordo tem por base o desejo de facilitar e desenvolver as trocas e a cooperação entre Portugal e França nos domínios do ensino, da cultura, da ciência e da técnica e de reforçar, assim, os laços de amizade entre os dois países, favorecendo o seu ensino e difusão dos respectivos territórios.

  3. - No âmbito deste Acordo foi estabelecido um intercâmbio, que se iniciou em 1974, visando a colocação de Assistentes de Português em França e de Assistentes Franceses em Portugal, regulamentado pelo DL n.º 8/91, de 8 de Janeiro, designado por Estatuto dos Assistentes Estrangeiros em Estabelecimentos Oficiais dos Ensinos Básicos e Secundário.

  4. - Este diploma legal estabelece um conjunto de orientações que visam garantir as condições de recrutamento, selecção e colocação em estabelecimentos de diferentes níveis de ensino dos assistentes propostos pelas entidades competentes dos respectivos países, sua contratação, acompanhamento pedagógico e apoio administrativo.

  5. - A entidade competente no nosso País para fazer cumprir as condições acima identificadas é o Gabinete de Assuntos Europeus e Relações Internacionais (GAERI), o qual é um serviço central do Ministério da Educação (ME), equiparado a Direcção-Geral e dotado de autonomia administrativa, com funções de planeamento, coordenação, informação e apoio técnico em matéria de educação, no âmbito de assuntos da União Europeia e das relações internacionais.

  6. - Na verdade, a ora recorrente sempre esteve em França ao abrigo de acordos de cooperação, pois se assim não fosse não aceitava ir leccionar para aquele país.

  7. - Tal facto ainda é corroborado pelo facto da mesma se encontrar em regime de destacamento, ou seja, apesar da docente estar a exercer as suas funções num outro estabelecimento de ensino, a mesma está afecta à escola onde efectivou (em Viana do Castelo), o que significa que se quiser voltar a ocupar o seu lugar, o mesmo estará ao seu dispor.

  8. - A ora recorrente candidatou-se ao concurso para preenchimento de lugares de docentes de ensino português no estrangeiro – 2002/2006, estando na altura afecta à Escola Básica do 1º Ciclo da Avenida, sita em Viana do Castelo.

  9. - Acresce ainda o facto de os recibos terem sido sempre emitidos pela Embaixada de Portugal – Coordenação Geral do Ensino Português em França, o que só demonstra que a recorrente estava efectivamente ao abrigo de acordos de cooperação, porque se assim não fosse, a mesma, para leccionar em França, sempre teria que se sujeitar a concursos internos daquele País, sendo que a entidade que lhe teria que processar o respectivo vencimento seria o Ministério da Educação do País em causa.

  10. - Ora não é isso que acontece no presente caso.

  11. - No decurso de todo o período em que a recorrente se encontrou a leccionar em França, os seus vencimentos sempre foram processados pelo Estado Português, o que só vem corroborar a posição assumida pela recorrente no sentido da mesma ainda se encontrar afecta ao nosso País, estando apenas a exercer as suas funções num país estrangeiro.

  12. - E tais funções só se podem enquadrar ao abrigo do Acordo de Cooperação celebrado porque se assim não fosse não era justificável o recrutamento dos professores feito pelo Gabinete de Assuntos Europeus e Relações Internacionais (GAERI). Se a actuação do GAERI não tivesse uma base sustentável, o mesmo não teria legitimidade para agir. Tal base sustentável só se pode buscar no Acordo de Cooperação ao abrigo do qual toda a actuação do GAERI está justificada.

  13. - Deste modo, somos levados a concluir que a ora recorrente encontrava-se efectivamente a leccionar em França ao abrigo do Acordo de Cooperação existente entre Portugal e aquele país.

  14. - Nos termos e para os efeitos do n.º 1 do artigo 2º do DL 13/2004, de 14.04, o qual estabelece o regime jurídico do agente da cooperação portuguesa, considera-se “agente de cooperação o cidadão que ao abrigo de acordo escrito participe na execução de uma acção de cooperação financiada pelo Estado Português, promovida ou executada por uma entidade de direito público ou por uma entidade de direito privado para fins não lucrativos em países beneficiários”.

  15. - Por outro lado, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 37º do Estatuto dos Benefícios Fiscais, “Ficam isentas de IRS as pessoas deslocadas no estrangeiro ao abrigo de acordos de cooperação, relativamente aos rendimentos auferidos no âmbito do respectivo acordo”.

  16. - Relativamente a este artigo e para clarificá-lo foi emitido o Ofício-Circulado n.º 20107/2005, de 30 de Agosto, no qual é referido que “Enquadram-se neste benefício automático os rendimentos auferidos por cidadãos portugueses ou com residência fiscal em território português que, ao abrigo de um contrato escrito, participem na execução de uma acção de cooperação que obedeça a um dos seguintes requisitos: - Seja financiada pelo Estado Português, promovida ou executada por uma entidade portuguesa de direito público ou por uma entidade de direito privado de fins não lucrativos em países beneficiários.” 18.- Ora, a recorrente é uma cidadã portuguesa, a qual tem a sua residência fiscal na Rua Henrique Lopes, n.º 152, 3º andar, trás, freguesia da Meadela, concelho de Viana do Castelo.

  17. - A recorrente encontrava-se destacada, em Missão Oficial ou Professor de Português no Estrangeiro, por concurso aberto através do Aviso n.º 4365/2002, de 28 de Março, ao abrigo do DL n.º 13/98, de 24.01 e do Decreto Regulamentar n.º 4-A/98, de 6.04.

  18. - Nas áreas do ensino, da cultura, da ciência e da técnica, os Acordos de Cooperação entre Portugal e França remontam a 1971, publicados no Diário do Governo, I Série, Número 31, datado de 6 de Fevereiro de 1971.

  19. - No âmbito deste Acordo, o artigo 17º previa a criação de uma Comissão Mista Permanente encarregada de fixar as modalidades de aplicação do Acordo, de acompanhar a sua execução, de preparar os programas das iniciativas a tomar e de apresentar recomendações às duas Partes.

  20. - Por sua vez, no Acordo Franco-Português, datado de 11 de Janeiro de 1977, no seu artigo 37º é estabelecido que o “ensino será ministrado por professores portugueses. Para o efeito as autoridades portuguesas esforçar-se-ão por recrutar e remunerar os professores necessários. As duas partes cooperam, com vista a assegurar a integração adequada dos professores portugueses no sistema escolar francês…”.

  21. - Existem vários acordos de cooperação bilateral no âmbito do ensino não superior, como é o caso do Ensino de Português no Estrangeiro, sendo certo que a cooperação na área da educação, no âmbito da União Europeia, existe desde a adesão de Portugal às Comunidades Europeias em 1986.

  22. - No Relatório supra referido é estabelecido no seu nº 1, intitulado sob a epígrafe “Organização Material” é referido que “Os cursos de língua e cultura de origem, quer sejam integrados quer diferidos, constituem actividades de ensino, necessitando da utilização de locais escolares, postos à disposição gratuitamente, sob a única autoridade da administração escolar (…). Nenhuma convenção financeira deve ser elaborada, dado que são regidas por acordos bilaterais de cooperação. As aulas devem decorrer em locais correctamente aquecidos e equipados. (…) Os professores estrangeiros devem poder utilizar o material pedagógico posto à disposição dos outros professores. Convém estar atento ao respeito pelas normas de segurança e permitir aos professores o acesso ao telefone se necessário.” 25.- Pelo que, entendemos não poder restar dúvidas de que a recorrente participava numa acção de cooperação entre dois estados.

  23. - Em França, o Ensino de Português está organizado em cursos de LCP, no âmbito da rede oficial, sob responsabilidade do Estado Português, competindo ao Gabinete dos Assuntos Europeus e Relações Internacionais (GAERI) assegurar a representação do Ministério da Educação no quadro das relações bilaterais.

  24. -A acção de cooperação em que a ora recorrente esteve integrada era promovida pelo Departamento da Educação Básica/Núcleo de Ensino de Português no Estrangeiro (DEB/NEPE).

  25. - O país beneficiário, no caso sub judice, é a França.

  26. - Assim, do supra exposto, forçoso será concluir que a recorrente foi para França ao abrigo dos vários Acordos de Cooperação existentes entre Portugal e França, na área da educação.

  27. - Deste modo, entendemos que a recorrente não pode deixar de ser abrangida pelo artigo 37º nº1 dos Estatutos dos Benefícios Fiscais, e, em consequência não podem os rendimentos em causa estarem sujeitos a IRS.

  28. - Se assim se não entender o que só por mera cautela se encara, importa referir que o rendimento em causa destina-se a compensar as diferenças de custos de vida entre Portugal e os países de acolhimento e a necessidade de residir temporariamente no estrangeiro de acordo com o disposto no artigo 8º, nº1 do DL n.º 13/98 de...

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