Acórdão nº 02615/11.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Janeiro de 2012

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução18 de Janeiro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I – A Fazenda Pública recorreu para este Tribunal Central Administrativo Norte da sentença proferida, em 17.11.2011, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou procedente a reclamação que a S…, SGPS, SA., com os demais sinais dos autos, deduzira do despacho do Chefe do Serviço de Finanças de Matosinhos - 1, que lhe havia indeferido a prestação de garantia através de fiança, proferido no âmbito do processo de execução fiscal n.° 1805201001157345 contra si instaurado.

Terminou a alegação de recurso com as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de actos do órgão de execução fiscal interposta, nos termos do disposto no art. 276° do CPPT, do despacho proferido em 2011/04/15, pela Ex.ma Sr.a Chefe do SF da Maia, no âmbito de processo de execução fiscal que corre termos naquele SF e que indeferiu a prestação de garantia para efeito de suspensão da execução através de fiança, por inidoneidade da mesma.

B.

No dito PEF encontra-se em cobrança coerciva dívida relativa ao IRC do ano de 2007, no valor total de € 3.210.655,63, tendo a executada sido notificada para prestar garantia, no montante de € 4.174.101,89, para os efeitos do disposto no art. 169º, n° 1 do CPPT.

C.

Perante tal notificação, veio a aqui reclamante, sociedade incorporante da executada, apresentar para garantia a fiança, ora controvertida, por via da qual outra SGPS do mesmo grupo económico se propôs constituir fiadora da executada.

D.

O despacho reclamado, proferido em 21.07.2011, concluiu pelo indeferimento de tal pedido, por considerar que a garantia oferecida (fiança) não tem idoneidade suficiente, designadamente porque não consubstancia uma garantia que proporcione o maior grau de liquidez, atendendo ao facto do valor monetário que lhe está subjacente não ser realizável de forma certa directa e imediata, em sede da respectiva execução, não pertencendo a fiança ao elenco das garantias prioritariamente aceites.

E. Vindo alegados como fundamento da presente reclamação o vício de violação de lei, por erro nos pressupostos de facto e de direito da decisão reclamada, a douta sentença recorrida julgou a reclamação procedente, com a consequente anulação do acto reclamado, por entender que o despacho reclamado padece de ilegalidade.

F. Para tal, a Mma juíza a quo considerou que “(...) o art. 199°, n° 1 do CPPT, dispõe que «deverá o executado oferecer garantia idónea», referindo a lei, deforma exemplificativa as garantias aceites, referindo que a garantia idónea «consistirá (1..) qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente».

Deste modo, o artigo 199º n° 1 do CPPT não confere à Administração Tributária uma escolha, pelo contrário, esta disposição determina que terão que ser aceites todas as garantias idóneas, definindo de seguida o que se deverá exactamente entender por garantia idónea.

Não se estando perante qualquer margem de escolha por parte da Administração Tributária, em que esta possa livremente optar por aceitar ou não determinada garantia idónea, tal aceitação está dependente apenas de estarmos perante uma garantia susceptível de assegurar os créditos exequentes”.

G.

E conclui que “é a própria Administração Tributária, veja-se o despacho emitido pelo Gabinete do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, que reconhece expressamente que deve ser aceite a título de garantia a fiança de pessoa singular ou colectiva, que releve capacidade financeira, dúvidas não temos que a S…, SGPS, SA, com cotação na bolsa de valores e uma das maiores empresas de Portugal, factos que são do conhecimento de qualquer homem de conhecimento médio, detém capacidade financeira para solver a obrigação que assumiu através da fiança que prestou”.

H.

Ressalvado o devido respeito com o que desta forma foi decidido, não se conforma a Fazenda Pública, sendo outro o seu entendimento, já que considera que a douta sentença sob recurso padece de erro de julgamento de facto e erro de julgamento de direito, como a seguir se argumentará e concluirá.

I. Contrariamente ao sentenciado, perfilha a Fazenda Pública o entendimento, já defendido na sua contestação, de que não é de proceder a pretensão formulada na presente reclamação, porquanto não padece o acto controvertido de qualquer ilegalidade.

J. Acontece que, a douta sentença sob recurso decidiu no sentido de que a fiança ora em apreço não podia deixar de ser considerada idónea, devendo, como tal, ser aceite como garantia da dívida exequenda.

K.

E, para dar como certa tal conclusão, baseia-se tão só o Tribunal a quo no facto de ser “do conhecimento de qualquer homem de conhecimento médio” que a SGPS proposta como fiadora, “com cotação na bolsa de valores e uma das maiores empresas de Portugal, “detém capacidade financeira para solver a obrigação que assumiu através da fiança que prestou”.

L. Entende, porém, a Fazenda Pública, salvo o devido respeito, que é muito, que as referidas ilações não poderão servir de base, como adiante se constatará, à conclusão da idoneidade da garantia, não sendo ainda suficientes para que delas se possa inferir pela idoneidade da garantia oferecida, porquanto, não só as mesmas não resultam provadas, como não explica o Tribunal a quo como e de onde as retirou.

M.

Ademais, afigura-se à Fazenda Pública, sempre com o devido respeito pelo Tribunal a quo, que ao afirmar que a SGPS proposta como fiadora é uma das maiores empresas de Portugal, parece estar a confundir aquela empresa com o grupo económico em que se integra, não resultando, porém da douta sentença sob recurso quais as premissas em que se baseou para retirar tal ilação.

N.

Acresce que, afirma a Mma Juíza a quo que não estamos “perante qualquer margem de escolha por parte da Administração Tributária, em que esta possa livremente optar por aceitar ou não determinada garantia idónea”, estando “tal aceitação (...) dependente apenas de estarmos perante uma garantia susceptível de assegurar os créditos exequentes».

O.

Efectivamente, do despacho controvertido, cuja fundamentação, aliás, não foi questionada pela douta sentença em análise, não resulta que a AT tenha optado, sem mais, por recusar a garantia oferecida, P. Antes resulta que a Sr.ª Chefe do SF considerou que a fiança em causa não consubstancia garantia idónea para a suspensão da execução, nos escassos termos em que foi proposta, dado o valor em dívida, o conhecimento que tem da executada e da fiadora - designadamente pela informação disponível no sistema informático da DGCI - e ponderado o objectivo e princípios que regem a cobrança coerciva da receita tributária, concluindo, a final, que a fiança em crise não é susceptível de assegurar os créditos exequentes.

Q.

O art. 52° da LGT permite a suspensão da cobrança da prestação tributária efectuada no processo de execução fiscal nos casos de pagamento em prestações ou reclamação, recurso, impugnação da liquidação e oposição à execução, que tenham por objecto a ilegalidade ou inexigibilidade da dívida exequenda, desde que acompanhada da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias.

R.

Tal suspensão da execução encontra-se, porém, condicionada pelo art. 169° do CPPT à constituição de garantia (em conformidade com o art. 195° do mesmo CPPT), à sua prestação (nos termos do art. 199° do mesmo diploma) ou quando a penhora efectuada nos autos incida sobre bens suficientes para garantir o pagamento da dívida exequenda e respectivo acrescido.

S. Especifica, no entanto, este último preceito, que a garantia a prestar deverá ser idónea, consistindo em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio susceptível de assegurar os créditos da Fazenda Pública.

T. Reporta-se, assim, a idoneidade da garantia à sua susceptibilidade para determinar o pagamento da dívida a curto prazo (em tempo útil), após citação para o efeito (n° 2 do art. 200º do CPPT), entendendo-se como pagamento da dívida a entrega do correspondente montante em dinheiro ou equivalente.

U.

Em suma, a exigência de garantia, nos termos previstos no art. 199° do CPPT, visa assegurar a boa cobrança dos créditos tributários, pelo que lhe é intrínseca uma exigência de liquidez num período de tempo limitado.

V. Os estritos termos e exigências reveladas pelo teor dos preceitos citados reflecte o princípio da vinculação à lei na actividade administrativa tributária, a indisponibilidade dos créditos fiscais e a proibição da concessão de moratórias no seu pagamento, mormente se estiverem vencidos, assumindo que a suspensão tem um carácter verdadeiramente excepcional, sendo que é proibida nos casos não previstos da lei (cfr. art. 56°, n° 5 da LGT).

W.

A arrecadação da receita fiscal, já em fase de cobrança coerciva, implica a realização, no processo de execução fiscal, do princípio da efectividade da tutela judicial do direito do credor do imposto, que preside àquele processo judicial tributário, e necessariamente aos meios admissíveis de garantir a cobrança coerciva da dívida tributária em vista da suspensão da execução.

X. Como tal, com a utilização da expressão “garantia idónea”, pretende-se significar que nem todas as garantias serão sempre adequadas e que a indicação exemplificativa dos meios de garantia bancária, caução ou seguro-caução, antes da alternativa “qualquer meio susceptível de assegurar os créditos do exequente”, tem de entender-se como uma restrição pretendida dos demais meios que poderão enquadrar-se no conceito de garantia idónea.

Y. O escopo do processo judicial tributário de execução é sempre de assegurar a efectiva cobrança da dívida, designadamente no que às garantias a prestar para suspensão da sua tramitação respeita, independentemente da qualidade do prestador.

Z. Isto é, a lei aponta preferencialmente para certos tipos de garantia, dos quais se evidencia a vinculação de um concreto bem ou valor à segura realização da dívida...

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