Acórdão nº 00290/09.3BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 23 de Março de 2012

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução23 de Março de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:I RELATÓRIO1 . A. …, identif. nos autos, inconformado, veio interpor o presente recurso jurisdicional do acórdão do TAF de Penafiel, datado de 25 de Outubro de 2010, que julgou improcedente a acção administrativa especial de impugnação de acto administrativo, instaurada contra o MUNICÍPIO de AMARANTE, onde impugnava as deliberações da Câmara Municipal de Amarante que lhe aplicaram a pena disciplinar de aposentação compulsiva.

*O recorrente formulou as seguintes alegações: "1ª – O relatório final deu como não provados os factos constantes dos artigos 5º e 6º da acusação, conforme resulta expressamente da alínea r) do ponto IV desse relatório final.

  1. – No mesmo relatório final deram-se como não provados os factos constantes dos artigos 8º e 9º da acusação, como também resulta das alíneas n) a q) do sobredito relatório final.

  2. – Não podem ser dados como provados os factos constantes do artigo 7º da acusação e que passaram a ser descritos nas alíneas i), j), k), l) e m) do ponto IV do relatório final.

  3. – Na verdade, as cópias de bilhetes enumeradas no artigo 7º da acusação já estão todas incluídas no artigo 5º da acusação, sobretudo nas suas alíneas o), p) e r).

  4. – Ora, tendo-se dado como não provados os factos constantes do artigo 5º da acusação, logicamente terão que ser dados como não provados os factos constantes do artigo 7º dessa peça processual, sob pena de, assim se não fazendo, haver uma nítida contradição entre as alíneas i) a m) do relatório e a alínea r) do mesmo relatório.

  5. – Acresce que o recorrente sempre negou a prática dos factos que lhe foram imputados na acusação e do processo instrutor não consta nenhuma prova directa de que tenha sido o recorrente o autor da emissão e venda das cópias de bilhetes e/ou que se tenha apropriado da quantia de € 135,80 (cento e trinta e cinco euros e oitenta cêntimos); 7ª – Vale dizer: o município recorrido não conseguiu fazer prova positiva que afastasse ou destruísse o princípio da presunção de inocência, também vigente no processo disciplinar por força do disposto no art.º 32º da CRP.

  6. – Deve também considerar-se como não provado o facto relatado na alínea g) do ponto IV do relatório final, por manifesta contradição com o alegado nos n.ºs 2 e 3 do artigo 9º da acusação.

  7. – Em face do exposto nas conclusões antecedentes, deve, pois, alterar-se a matéria de facto dada como provada no douto acórdão recorrido, retirando-se do elenco da matéria de facto provada os factos constantes do n.º 4 do probatório e fazendo aí incluir a menção de que se considera não provada a matéria de facto vertida nas alíneas g) e i) a m) do relatório final.

  8. – Os documentos constantes do processo instrutor, nomeadamente a acusação e o relatório final, bem como os depoimentos das testemunhas inquiridas impõem que a matéria de facto vertida na cláusula anterior seja dada como não provada.

  9. – Ao decidir como decidiu, o douto acórdão recorrido errou na apreciação da matéria de facto e violou o princípio da presunção de inocência consagrado no art.º 32º da CRP, bem como os princípios da legalidade e da justiça previstos nos art.ºs 3º e 6º do CPA, e da verdade material, previsto no art.º 87º do CPA e art.º 35º do antigo Estatuto Disciplinar.

    Sem prescindir: 12ª – O despacho transcrito no n.º 7 do ponto III do douto acórdão recorrido ao impedir o advogado constituído pelo arguido no processo disciplinar de acompanhar e controlar toda a produção de prova e exercer em plenitude o seu direito de defesa, que lhe é directa e imediatamente assegurado pela lei processual penal e disciplinar, de indicar os factos a que as testemunhas por si arroladas deviam ser inquiridas, de pedir esclarecimentos sobre os respectivos depoimentos, de, eventualmente, requerer quaisquer novos meios de prova sugeridos ou ocasionados pelos depoimentos das testemunhas, de intervir na respectiva inquirição, de genericamente exercer todos os seus direitos de uma defesa ampla, sem peias ou restrições e de nem sequer controlar ou aferir da fidedignidade da transcrição do depoimento das testemunhas para o auto, implicou, na prática, a indefesa do arguido; 13ª – E de tal despacho resultou necessariamente a omissão de diligência essencial à descoberta da verdade material.

  10. – Tal despacho está ferido de nulidade que inquina de nulidade as próprias deliberações impugnadas, nulidade que é insuprível.

  11. – Nos artigos 83º a 89º da petição inicial o recorrente invocou a nulidade de falta de audiência, por as circunstâncias agravantes especiais terem necessariamente que ser objectivadas em factos concretos.

  12. – Ora, as circunstâncias agravantes especiais imputadas ao recorrente constituem meras imputações vagas, genéricas, abstractas, não passando de juízos valorativos de estrutura conclusiva devendo ser consideradas como meras ilações e qualificações.

  13. – Certo é também que se invocou a nulidade descrita no ponto 4.3 das presentes alegações.

  14. – Todas essas nulidades são insupríveis por implicarem a indefesa do arguido.

  15. – O n.º 1 do art.º 65º do antigo Estatuto Disciplinar determina que, finda que seja a instrução, deve o instrutor elaborar um relatório completo e conciso donde conste a existência material das faltas, sua qualificação e gravidade, defendendo a doutrina que nesse relatório se exporão minuciosamente as provas contidas no processo.

  16. – O relatório final limita-se a indicar secamente quais os factos provados e não provados, mas não procede à indicação das provas por que considera provados certos factos e não outros, isto é, não procede à análise crítica dos meios de prova produzidos no processo, nem especifica os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do instrutor no sentido de propor a aplicação daquela concreta pena.

  17. – Ora, num processo sancionatório como o processo disciplinar – sobretudo no caso presente quando o instrutor propõe a aplicação de pena expulsiva tão drástica e de consequências tão gravosas na vida de um funcionário, sobretudo em sede de direito ao trabalho e ao consequente salário – considera-se absolutamente essencial que do relatório final conste a análise crítica e criteriosa comparativa dos diversos meios de prova produzidos no processo e a maturação e ponderação dos fundamentos e motivações essencialmente determinantes da formação da convicção do instrutor e da proposta da pena apresentada.

  18. – Só assim se permite ao titular do poder disciplinar decidir em consciência e com pleno conhecimento de causa do bom ou do mau fundamento da proposta e ao Tribunal indicar a justiça da pena, eventualmente, aplicada.

  19. – O relatório final é completamente omisso no tocante aos elementos indicados na conclusão 20ª, pelo que também aqui se cometeu nulidade insuprível, conforme art.º 42º, n.º 1, do antigo Estatuto Disciplinar.

  20. – Determina o n.º 7 do art.º 4º da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, que o processo disciplinar instrutor deveria ser reavaliado com vista à manutenção ou conversão da pena de aposentação compulsiva em pena de suspensão.

  21. – Determinada que foi a reavaliação, a instrutora, depois de suscitar a questão da sua incompetência para esse acto de reavaliação, limitou-se a reproduzir a sua proposta anterior, sem sequer ter procedido a uma comparação casuística, e não em abstracto, dos factos imputados ao recorrente à luz da lei antiga e à luz da lei nova, para apurar qual dos regimes jurídicos era mais favorável ao arguido.

  22. – A deliberação impugnada n.º 68/2009, de 19/01/2009, não cumpriu, por isso e em substância, o disposto no n.º 7 do art.º 4º da Lei n.º 58/2008, o que constitui também nulidade insuprível.

  23. – O douto acórdão recorrido ao considerar inverificadas todas as nulidades alegadas, não só cometeu erro de apreciação de facto – já que para assim concluir se louvou no conteúdo dos factos alegados nos artigos 5º a 9º da acusação que, como foi dito, se não provaram – como também cometeu erro de direito por violação do disposto no n.º 1 do art.º 42º do antigo Estatuto Disciplinar e do n.º 7 do art.º 4º da Lei n.º 58/2008.

  24. – O douto acórdão recorrido, além disso, ao interpretar e aplicar o n.º 1 do art.º 42º do antigo Estatuto Disciplinar com o sentido e o alcance de considerar conformes à lei e supríveis todas as nulidades invocadas fez dessa norma uma interpretação inconstitucional por violação do disposto do art.º 20º, n.ºs 2 e 5, do art.º 32º e do art.º 269º, n.º 7, todos da CRP, inconstitucionalidade que aqui se invoca.

  25. – Pelos motivos alegados, deve o douto acórdão recorrido ser revogado quer por ilegalidade, quer por inconstitucionalidade.

  26. – Do parecer n.º 11/GJ – 2009 constante do processo instrutor resulta que foi ordenado à instrutora que procedesse à reavaliação determinada pelo n.º 7 do art.º 4º da Lei n.º 58/2008, o que esta fez, depois de suscitar a sua incompetência para tal efeito.

  27. – A deliberação impugnada n.º 68/2009, assume in integrum a reavaliação que foi feita pela instrutora, constituindo o respectivo relatório de reapreciação o único elemento instrutor da decisão de reavaliação.

  28. – Mas tendo sito a instrutora que presidiu a toda a instrução do processo disciplinar, que elaborou a acusação e o relatório final – que culmina com a proposta de aplicação da pena de aposentação compulsiva – estava ela impedida de intervir novamente no processo para efectuar a reavaliação prevista no n.º 7 do art.º 4º da Lei n.º 58/2008, face ao disposto nas alíneas d) e g) do n.º 1 do art.º 44º do CPA.

  29. – O ensinamento que a este respeito emana do Ac. STA de 17/11/2004, AD 519, pp. 404 – 410 vale, por maioria de razão, para a reavaliação prevista no n.º 7 do art.º 4º da Lei n.º 58/2008, porque o instrutor/reavaliador pode ser influenciado nitidamente pelo processo disciplinar e pode ele próprio influenciar a...

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