Acórdão nº 03705/15.8BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 08 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelLuís Migueis Garcia
Data da Resolução08 de Abril de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo: Município de (...) (Praça Município, (…)), interpõe recurso jurisdicional, em acção administrativa intentada no TAF de Braga por AM...

(Rua (…)); o recorrente, solidariamente com a interveniente principal, foi condenado, a título de responsabilidade civil extracontratual “no pagamento da quantia de € 2.657,14 euros, acrescida de juros de mora desde a citação até efetivo e integral pagamento”.

O recorrente conclui: 1ª A sentença recorrida apreciou o facto provado 6 com base nas declarações de parte do autor e nos depoimentos das testemunhas, MC..., PT..., PC... e GA..., as quais não presenciaram o sinistro.

- MC... (depoimento prestado na primeira sessão da audiência de julgamento em 17.11.2020) - ficheiro “Gravacao Audiencias 17-11-2020 09-59-56.wma” (doravante “Gravações da Primeira Sessão”), a partir dos 00:32:35 e até aos 00:48:22; - PT... (Gravações da Primeira Sessão dos 01:28:25 até aos 01:38:39); - Paulo Oliveira Costa (Gravações da Primeira Sessão dos 01:39:30 até aos 01:44:35) - GA... (Gravações da Primeira Sessão dos 01:46:04 até aos 02:10:11).

  1. Sobre o mesmo ponto da matéria de facto, declarou o autor (Gravações da Primeira Sessão dos 00:00:00 até aos 00:32:35) que não se deu um desnível abrupto, mas paulatino – “o carro foi descendo” de modo paulatino e não abrupto [cfr gravação dos 00:18:50 - 00:20:38].

  2. As declarações desse modo produzidas têm natureza confessória nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 3 do art.º 466.º do CPC, devendo por si só infirmar o facto dado por provado no ponto 6, na parte em que refere que o veículo ficou rodeado de água até a uma altura de 80cm “de forma abrupta e repentina”, pelo que deverá dar-se por não provado o facto assente com o n.º6, por ter ficado provado que a submersão se deu de modo progressivo e paulatino, por força da marcha do veículo ao longo de 10 a 15 metros, como abaixo se verá.

  3. O autor declarou que “ao chegar à rua” se deparou com “uma situação com água” [00:02:50 - 00:03:45], que “viu o lancil e tinha água pelo lancil, sensivelmente” [00:04:42 -00:05:20], que o “o campo de visão estava livre”, mas que a certa altura “deixou de se ver” o lancil [00:18:50 - 00:20:38], tendo andado dentro da água até ficar imobilizado durante “10, 15 metros” [00:27:03 - 00:27:28].

  4. As declarações do autor, de natureza confessória, infirmam o ponto 3 dos factos dados por provados, uma vez que das mesmas decorre que o autor se apercebeu que a rua estava alagada, e não apenas que “havia alguma água acumulada na estrada”, e infirmam o ponto 4 dos factos dados por provados, uma vez que das mesmas decorre que havia fortes indícios de que a água acumulada podia ser impeditiva da passagem do seu veículo.

  5. Assim, com base nas declarações de parte do autor, deverão dar-se por não provados os factos enunciados nos pontos 3, 4 e 6 da matéria de facto provada, e substituir-se esses enunciados por outros consentâneos com a prova gravada acima transcrita a saber: 3 - “Ao iniciar a marcha na rua referida em 1., o autor deparou-se com a mesma alagada, encontrando-se a água sensivelmente ao nível do respectivo lancil.” 4 - “Apesar de observar a água que cobria a rua, o autor prosseguiu a sua marcha durante cerca de 10 a 15 metros.” 6 – “Após circular durante 10 a 15 metros na rua alagada referida em 1., o autor imobilizou o veículo, que estava parcialmente submerso, com água até cerca de 80cm de altura.” 6-A – “O afundamento do carro deu-se, progressivamente, por força do prosseguimento da marcha do veículo referido em 6.” 7ª Ao não valorar as declarações do autor de natureza confessória a sentença a quo violou o disposto no n.º 3 do art.º 466.º do CPC.

  6. Com os expostos fundamentos, e em coerência com as alterações à matéria de facto supra requeridas, deverá dar-se por não provado o ponto 14. dos factos dados por assentes na sentença a quo, na parte em que refere que a rua faz “uma descida de repente”, uma vez que o autor confessa que a descida foi paulatina [00:18:50 - 00:20:38] e que o veículo adentrou na água ao longo de 10 a 15 metros até ficar imobilizado [00:27:03 - 00:27:28], conforme declarações de parte acima transcritas.

  7. Assim, deverá o ponto 14. dos factos assentes ser expurgado desse segmento, adoptando a seguinte redacção: 14 – A Rua (...) não é plana, fazendo uma descida que provoca uma bacia de água quando há inundações.

  8. A sentença extrai o facto 17. (“O Autor foi pagando aos poucos o valor da reparação que constava do orçamento referido em 15.”) da prova produzida através das declarações de parte do autor e do testemunho de RJ..., que era o gerente da oficina de reparação automóvel “Q----”, que o autor alega ter realizado a reparação (referida em 15 dos factos provados), a cujo ressarcimento o Réu foi condenado pela sentença ora recorrida.

  9. De acordo com as declarações da testemunha RJ... (Gravações da Primeira Sessão, dos 01:07:31 até aos 01:20:45), existe entre si e o autor/recorrido uma estreita e duradoura relação de amizade, tendo este afirmado quanto ao autor - “É meu amigo”, (...) “portanto conhece-me desde pequenino” [1:08:52 a 01:09:10]; o autor omitiu ostensivamente essa relação, ao referir a RJ... como “o primeiro senhor”, seu conhecido [dos 00:30:11 a 00:31:09].

  10. Essa relação de amizade demanda uma especial exigência do julgador na análise crítica das declarações produzidas em sede de julgamento pela testemunha RJ..., em especial as que favoreçam posição do autor, como é o caso.

  11. As declarações do autor e da testemunha RJ... (Gravações da Primeira Sessão, dos 01:07:31 até aos 01:20:45) são vagas, e não concretizadas, limitando-se a referir que o autor fraccionou o pagamento da reparação alegadamente realizada pela Q----, sem referir: i) o valor total pago, ii) quando começou a pagar e iii) quando completou o pagamento, nem iv) em quantas fracções dividiu o pagamento, nem v) o valor de cada prestação [01:15:43 a 01:16:01].

  12. Por outro lado, a testemunha RJ... – única a depor quanto a este facto (Gravações da Primeira Sessão, dos 01:07:31 até aos 01:20:45) – demonstrou não saber quais as concretas reparações que realizou no automóvel, o que lança fundada dúvida sobre se a reparação dada por provada foi executada em conformidade com o orçamento apresentado (referido no facto n.º 15), se foi realizada integralmente, se o foi com recurso às peças e material orçamentado, etc: Eu penso – não tenho a certeza - que teve de levar uma delas porque não tinha recuperação [01:12:43 a 01:12:56]; Penso que levou uma das centralinas, não sei qual [01:14:03 a 01:14:07]; “A centralina do ABS não me lembro se foi recuperada, ou seja, se foi reparada, recondicionada, neste caso, ou se foi uma usada que se comprou. Não me lembro; não tenho a certeza disso [01:14:25 a 01:15:35]; 15ª Não foram emitidas facturas referentes aos serviços prestados, conforme confessa o autor (Gravações da Primeira Sessão, dos 00:00:00 e até aos 00:32:35) e confirma a testemunha RJ... (Gravações da Primeira...

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