Acórdão nº 00169/13.4BECBR de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelIrene Isabel Gomes das Neves
Data da Resolução27 de Abril de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Recorrente (AA...), notificado da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, pela qual foi julgada improcedente a acção administrativa especial com vista à impugnação da decisão de declarar intempestivo o recurso hierárquico da reclamação graciosa deduzida contra a liquidação de IRS do ano de 2008 no valor de € 76.727,06, inconformado vem dela interpor o presente recurso jurisdicional.

Alegou, formulando as seguintes conclusões: «a) O Recorrente limita, nos termos do artigo 635º, nº 2 do Novo CPC, o presente recurso ao referido em 1. b) e c) supra.

b) O instituto da revisão do acto tributário é comummente entendido como uma válvula de escape do ordenamento jurídico de modo a permitir, no que aqui interessa, corrigir a liquidação e cobrança ilegal de impostos, isto mesmo depois de esgotados os prazos em que seda possível o recurso aos meios comuns (reclamação graciosa, impugnação judicial) ou seja, se um daqueles meios se afigura como intempestivo quando o contribuinte decide reagir a um qualquer acto tributário ainda assim o seu direito de “rebeldia” não se encontra caducado enquanto não se esgotar o tempo em que pode despoletar o pedido de revisão do acto tributário.

c) E assim sendo então mesmo que o meio usado pelo Recorrente tenha sido o adequado mas de forma intempestiva ainda assim a convolação num meio processual previsto na lei, que permite a apreciação da sua pretensão, é um dever que se imporia à Administração pois que a questão tempestividade terá de ser aferida em relação ao meio para que se convola e não em relação ao meio procedimental usado.

d) A intempestividade do recurso hierárquico acarretava a intempestividade da acção administrativa especial intentada, mas assim o sendo existiria uma questão de monta que obsta à declaração da caducidade do direito de acção nesta sede.

e) É que estamos perante uma acção administrativa especial com regulamentação no CPTA e o conhecimento da intempestividade só pode ser efectuado até ao despacho saneador, não podendo ser conhecida posteriormente, pelo que a sua não apreciação em sede de despacho saneador nos presente autos, com o necessário e inerente declarar da intempestividade da acção administrativa especial, acarreta que tal intempestividade não possa agora ser já apreciada.

f) Contra isto esbraceja a sentença com o argumento de que, a colher este argumento, seria o próprio Recorrente que ficaria impedido de se defender de uma decisão de intempestividade de qualquer petição mas Recorrente NUNCA ficaria impedido de fazer tal, com efeito bastaria respeitar o momento próprio para o fazer, ou seja, antes do saneamento dos autos e logo que tal questão fosse suscitada.

g) Pelo que violou a sentença recorrida os artigos 52º do CPPT, 97º da LGT, 87º e 89º do CPTA, não se podendo, em consequência, manter antes devendo ser revogada e substituída por uma decisão que dê provimento à pretensão do Recorrente.

Nestes termos e nos melhores de Direito deverá o presente recurso merecer provimento e, em consequência, ser revogada a sentença recorrida e substituída a mesma por uma decisão que dê provimento à pretensão do Recorrente, tudo o mais com as consequências legais.» 1.2. A Recorrida (Autoridade Tributária e Aduaneira), notificada da apresentação do presente recurso, apresentou contra-alegações com o seguinte teor: «1ª Independentemente de o Recorrido manter e dar por reproduzido tudo quanto alegou no recurso jurisdicional interposto em 02/09/2013 do saneador contra a apreciação e decisão da excepção invocada de erro na forma processual utilizada, sempre dirá que a sentença sob recurso não violou o art. 52º do CPPT, 97º da LGT e 87º e 89º do CPTA, ao contrário do que pretende o Recorrente.

  1. O art. 52º do CPPT refere que em caso de erro na forma de procedimento este será convolado na forma adequada.

  2. O Recorrente alega que a intempestividade do recurso hierárquico não preclude o dever de a AT convolar o procedimento na forma adequada.

  3. Ainda que se entenda que essa norma é aplicável aos recursos hierárquicos extemporâneos, a aplicação dessa norma legal dependeria sempre de estarem preenchidos os pressupostos de admissão do procedimento em que se pretende convolar o recurso hierárquico extemporâneo.

  4. Sem esses pressupostos estarem preenchidos, a convolação não é possível.

  5. Outra interpretação implicaria que o contribuinte pudesse utilizar meios de reacção contra os actos da administração fiscal cujo prazo estivesse precludido.

  6. A aplicação do art. 52º do CPPT não visa naturalmente contornar ou de algum modo suprir o não preenchimento dos pressupostos legais para a abertura do novo procedimento.

  7. Assim sendo, a convolação pretendida apenas poderia verificar-se se, aquando da apresentação do recurso hierárquico, estivessem reunidos os pressupostos de revisão oficiosa do acto tributário.

  8. Sucede que o pedido de revisão oficiosa do acto tributário apenas é admissível fora dos prazos da reclamação graciosa ou de impugnação com fundamento em erro imputável aos serviços.

  9. Está abundantemente provado nos autos que inexistem os pressupostos do pedido de revisão oficiosa com fundamento em erro imputável aos serviços.

  10. Só poderá haver erro imputável aos serviços nos casos em que a AT tenha efectuado a liquidação com base noutros elementos que não mi declarados pelo contribuinte.

  11. Não foi esse o caso dos presentes autos.

  12. A AT efectuou a liquidação com base nos elementos declarados pelo contribuinte, nos termos constantes da Informação no 223/2011, com data de 14/10/2011, emitida pela Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Coimbra que aqui se dá por integralmente reproduzida para todos os efeitos legais.

  13. Tão pouco existia qualquer orientação administrativa que induzisse o contribuinte a preencher a declaração de IRS conforme o fez.

  14. Também não é aplicável o nº 2 do art. 78º da LGT que equipara ao erro imputável dos serviços o erro na autoliquidação, uma vez que, como é sabido o IRS não é um imposto de autoliquidação.

  15. De igual modo não é aplicável o nº 4 do art. 78º da LGT quanto à verificação de injustiça grave e notória, uma vez que não está em causa qualquer questão de justiça ou injustiça na liquidação, mas de legalidade 17º O poder de revisão do art. 78º, nº 4, da Lei Geral Tributária deve considerar-se como excepcional na medida em que apenas é susceptível de aplicação a situações-limite de injustiça grave ou notária, a um conjunto limitado de ilegalidades – às ilegalidades que constituam simultaneamente “injustiças” (mesmo assim, apenas quando preencham os requisitos da gravidade ou notoriedade) e não a todas e quaisquer ilegalidades.

  16. Por seu turno, a impugnação hierárquica do apuramento da matéria tributável ou a reclamação graciosa do acto tributário de liquidação visam a reparação de toda e qualquer ilegalidade.

  17. Não se pode, pois, afirmar serem rigorosamente idênticos os pressupostos dos meios de impugnação hierárquica ou judicial do apuramento da matéria tributável, quando existam, e da reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto tributário de liquidação e os pressupostos da utilização do poder de revisão do art. 78º, nº 4, da Lei Geral Tributária.

  18. Sob pena de se fazer completa abstracção do sentido restritivo do termo “injustiça grave ou notária” do art. 78º, nº 3, da Lei Geral Tributária, os fundamentos da impugnação hierárquica ou judicial do apuramento da matéria tributável e da reclamação graciosa ou impugnação judicial do acto tributário de liquidação são muito mais amplos do que os do poder de revisão da matéria tributável conferido na referida norma legal.

  19. O âmbito dos referidos procedimentos não é, pois, igual.

  20. Se a injustiça grave ou notória cabe plenamente nos fundamentos da impugnação hierárquica do apuramento da matéria tributável ou da reclamação graciosa do acto tributário de liquidação (toda e qualquer ilegalidade, incluindo o erro na quantificação da matéria tributável originariamente encontrada), já o exercido do poder de revisão do art. 78º, nº 4, da Lei Geral Tributária não contém a totalidade dos fundamentos das referidas impugnação hierárquica ou reclamação graciosa.

  21. A excepcionalidade resultará igualmente de a referida norma pretender somente solucionar os casos mais escandalosos e gritantes de injustiça fiscal e não enviesadamente alargar os prazos normais de impugnação hierárquica do apuramento da matéria tributável, quando possa ser deduzida autonomamente, ou da reclamação graciosa do acto tributário de liquidação.

  22. Tal não significa que a administração fiscal, uma vez comprovado o requisito da revisão do acto tributário do art. 78º, nº 5, da injustiça grave ou notória na tributação, não esteja vinculada a proceder à revisão da matéria tributável, mas apenas a manifestamente exagerada e desproporcionada com a realidade, como também a de que tenha resultado elevado prejuízo para o contribuinte ou para a Fazenda Nacional.

  23. No caso dos autos, resulta da prova produzida que não estão preenchidos qualquer dos requisitos para se operar a convolação do procedimento de recurso hierárquico em...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT