Acórdão nº 00055/18.1BEMDL de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução25 de Novembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1.

AA, residente em ...

, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF de Mirandela, datada de 22 de Abril de 2022, que julgou totalmente improcedente a acção administrativa que havia instaurado contra o FUNDO DE GARANTIA SALARIAL, na qual pedia a anulação do acto administrativo que lhe deferiu parcialmente o requerimento para pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho, o reconhecimento que a Recorrente é credora do Recorrido no montante de € 5.093.92, a não restituição ao R./Recorrido do valor total que aquele lhe pagou, no valor de € 6.235,18, mas sim e tão só a quantia recebida de € 1.141,26, por indevida.

* Nas suas Alegações, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: «A- Embora considerando não ter havido fundamentação, o Tribunal a quo B- entendeu que tal vício não implicava a anulação do despacho aqui em crise. Mas sem razão, salvo devido respeito.

C- Com efeito, a própria sentença do Tribunal a quo, considera que assiste razão à Autora, quando refere que o ato impugnado padece de falta de fundamentação.

D- Para além do exposto, existe também outro vício de que enferma o despacho do Senhor Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial de 30 de Outubro de 2017, “consubstanciado na violação do direito de audiência prévia, na medida em que a decisão em causa foi proferida no próprio dia em que a mesma exerceu o seu direito, sem que a sua pronúncia tenha sido considerada pela Entidade Demandada” (sublinhado nosso).

E- Aceita-se que “Decorre da factualidade provada (factos n.º 18 e 19) que a Autora se pronunciou sobre a intenção de deferimento parcial da sua pretensão em 20.11.2017, tendo remetido a sua pronúncia por carta registada com aviso de recepção, recebida no dia seguinte, bem como por correio electrónico, no próprio dia 20 ao final da tarde, tendo sido notificada da decisão impugnada por ofício do mesmo dia. Por outro lado, o teor do ato impugnado não evidencia, nem sequer sugere, que a pronúncia da Autora, tenha sido analisada, ponderada e refutada com argumentos válidos.” F- Ora o art. 121º, n.º 1 do CPA estatui que “Sem prejuízo do disposto no artigo 124.º, os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.” G- Não se verificando, no caso em apreço, quaisquer circunstâncias que permitiam dispensar a audiência prévia, tal como previsto no artigo 124.º do CPA, nem tal foi invocado na decisão final, tanto mais que a Autora foi notificada para esse efeito.

H- Sustenta a sentença a quo que “A razão de ser da audiência prévia é a de permitir a participação dos interessados nos processos de tomada das decisões que lhes dizem respeito (cfr. Artigo 12.º do CPA), bem como de evitar a emissão de decisões que colham de surpresa os seus destinatários.

I- O Princípio da Audiência Prévia deve aqui ser interpretado no sentido de que ao administrado deve ser-lhe concedida a efetiva possibilidade, não apenas de ter uma participação ativa, como os seus argumentos serem tidos em conta na ponderação que leva à decisão a proferir pela administração (a este propósito cf. por todos Manchete, Pedro. “A Audiência dos Interessados no Procedimento Administrativo”, p. 453.) J- Destarte, reconhece a douta sentença recorrida, “não há dúvida que ocorreu a violação do direito de audiência prévia da Autora, constituindo na mesma um vício de procedimento que importa a anulabilidade do ato (cfr. Artigo 163.º, n.º 1 do CPA).” K- Contraditoriamente, entendeu o Sr. Juiz que não deve ser de aplicar ao ato impugnado, o consequente efeito anulatório, recorrendo-se ao “subterfúgio” do Art. 163.º n.º 5 do CPA, que refere “(...) 5 - Não se produz o efeito anulatório quando: a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível”; (...) porquanto estamos perante “um ato de conteúdo vinculado, dado que a Entidade Demandada (FGS) não tinha margem de discricionariedade para tomar uma decisão acerca do requerido pela Autora, estando estritamente sujeita ao princípio da legalidade (cfr. Artigo 3.º, n.º 1 do CPA).

(sic) L- PORÉM, o entendimento do princípio da legalidade não é unívoco, neste caso, ao contrário do que entende o Sr. Juiz.

M- Entende a recorrente, estribada na Constituição e na Lei, como abaixo melhor se demonstrará, que, quer a Constituição quer a Lei, impõem uma decisão contrária à que foi tomada, a qual viola o princípio constitucional e legal do direito ao salário.

N- Reconhecendo-se na situação em concreto, estarmos perante um ato anulável, deve produzir-se o consequente efeito anulatório, com a destruição dos seus efeitos jurídicos, pois, efetivamente, o conteúdo do ato anulável, podia e devia ser outro.

O- Na verdade, à autora foi-lhe atribuído por sentença judicial do Tribunal de Trabalho de ..., de 02.10.2013, confirmada posteriormente em sede de recurso por acórdão do Tribunal da Relação do Porto, em 03.09.2014, o valor de €11.732,49, a título de créditos salariais sobre a sua Entidade Patronal, sociedade P... Lda. (factos provados n.ºs 2, 3 e 4).

P- Considerando que a Entidade Patronal não pagou a quantia em que foi condenada, a Autora reclamou o seu crédito, atualizado para € 12.947,53 (sublinhado nosso), no Processo de Insolvência n.º 2.../14...TBGMR, da ex Entidade Patronal, que correu os seus termos junto do Tribunal Judicial da Comarca de ... o qual foi certificado para efeitos de reclamação junto do FGS, por declaração emitida pelo Sr. Administrador de Insolvência, em 20.01.2015 (factos provados n.ºs 6, 7, 8).

Q- Analisando os factos provados de 9 a 17, conclui-se, do seu escrutínio que a Autora detinha créditos laborais a haver, no montante de € 12.947,53.

R- Tendo recebido da Massa Insolvente, o valor de € 7.853,61, conforme o mapa de rateio final e do FGS, o montante líquido de € 6.235,18, e o alegado valor bruto de € 8.730,00 (com retenção de IRS de 2.494,22), S- Para receber a totalidade do salário a que tinha direito a recorrente teria de receber da Massa Insolvente e do FGS o valor de 12.947,53 euros, devendo restituir apenas a quantia que recebeu e excedia este valor, 1.141,26 euros e não a totalidade da quantia recebida do FGS.

T- A não ser assim ficaria violado o princípio do direito ao salário como abaixo melhor se verá.

U- Não sendo a interpretação da Lei unívoca, bem pelo contrário, impondo a Lei uma interpretação contrária à que consta da douta sentença recorrida, não pode haver aproveitamento do ato em crise nesta ação, pelo que o mesmo deverá ser anulado.

V- Sucede até que o FGS incorre noutra violação da Lei. Isto porque não poderia o FGS efetuar a retenção do IRS pela taxa de 28%.

W- Na verdade, as quantias em causa referem-se a créditos laborais que não foram pagos mas que, mensalmente, não ultrapassavam o valor do salário mínimo nacional.

X- Sendo assim, quando a matéria tributável se reporta a quantias referentes ao valor do Salário Mínimo Mensal, que devia estar isento de IRS e de retenção na fonte, nos termos do Despacho n.º ...11, (IIª Serie DR), de 3 de Fevereiro.

Y- Por isso, mais uma razão para a interpretação da Lei não ser unívoca, ao contrário do que entendeu a douta sentença recorrida, reforçando os argumentos da recorrente para que o ato fosse anulado.

Z- Para além disso, como pode o Despacho do Senhor Presidente do Conselho do FGS, e o próprio Senhor Juiz a quo, não terem tido em conta na sua decisão, de que a Autora não recebeu a totalidade dos seus créditos laborais, no montante de € 12.947,53, por parte da Massa Insolvente, mas tão somente o montante de € 7.853,61, Sendo a Autora ainda credora do montante, a título de créditos laborais, de € 5093,92 (€ 12.947,53 - € 7.853,61), o qual deveria ser pago pelo FGS. E, nessa medida competia à Autora, devolver ao FGS, apenas o montante de € 1.141,26.

AA- Refira-se que foi a própria Autora que alertou o FGS, através de carta registada da sua Mandatária, de 31 de Agosto de 2017, de que já havia recebido parte do montante relativo aos créditos laborais em dívida, através de pagamento da quantia de € 7.853,61 pela Massa Insolvente, pelo que deveria o Fundo deveria ser recalculado o valor a atribuir à Recorrente, por parte da supramencionada entidade pública.

BB- Não obstante o FGS prosseguiu com o pagamento do valor líquido de €6.235,18, através de transferência bancária, datada de 22/09/2017, para a conta da Autora, ignorando os seus alertas.

CC- Prosseguindo com tal conduta, atentou o FGS contra o Princípio da Boa Administração, plasmado no art. 5.º do CPA que refere “1 - A Administração Pública deve pautar-se por critérios de eficiência, economicidade e celeridade. 2 - Para efeitos do disposto no número anterior, a Administração Pública deve ser organizada de modo a aproximar os serviços das populações e de forma não burocratizada.” DD- Alega-se na douta sentença recorrida o seguinte: “No entanto, como é bom de ver, neste caso a Entidade Demandada já não teria qualquer possibilidade de se reembolsar junto da massa insolvente, uma vez que a mesma já havia pago à Autora os créditos laborais que lhe correspondiam em função do mapa de rateio final, nada mais podendo ir buscar àquela, na exata medida em que o direito da sub-rogante já tinha sido satisfeito.” EE- Mas tal não é motivo para não pagar ou para reaver o que pagou como pretende.

Na verdade, até poderia suceder que a massa insolvente fosse insuficiente para pagar as custas do processo e ao administrador da insolvência. E, neste caso, embora tendo o direito de se sub-rogar ao trabalhador, o FGS nada poderia ir buscar à Massa Insolvente, e isso não constituía qualquer impedimento a que pagasse aquilo que o trabalhador peticionara ao FGS FF- Argumenta...

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