Acórdão nº 00383/19.9BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Novembro de 2022

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução25 de Novembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo do Norte: I – RELATÓRIO I..., LDA – INSPEÇÃO DE VEÍCULOS, LDA, melhor identificada nos autos à margem referenciados de AÇÃO ADMINISTRATIVA por esta intentados contra o MUNICÍPIO DE OLIVEIRA DE AZEMÉIS, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada nos autos, na parte que julgou improcedente os pedidos formulados sob as alíneas a), c), d) e e) do petitório inicial.

Em alegações, a Recorrente formulou as conclusões que ora se reproduzem, que delimitam o objeto do recurso: “(…) A. O presente recurso vem interposto da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, que julgou parcialmente procedente a ação administrativa de impugnação do ato administrativo de indeferimento do pedido de licenciamento de obras de construção, proferido pelo Réu no âmbito do processo n.° PI/6612/2015.

  1. O presente Recurso cinge-se ao segmento decisório improcedente.

  2. Por um lado, o Tribunal decidiu corretamente ao acolher - ainda que parcialmente - a tese da Recorrente, tendo considerado que “a informação constante da certidão emitida em 01.09.2021 constitui uma informação prévia, nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 14.° e seguintes do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação".

  3. Por outro, o Tribunal incorreu em erro de julgamento por errada aplicação do Direito ao não dar como procedentes os demais pedidos da Recorrente, não se lhe reconhecendo, como deveria, o direito ao deferimento do pedido de licenciamento da construção do CITV por, no douto entendimento do Tribunal a quo, este se situar em solo qualificado como Espaço Florestal, e não se enquadrar nos casos em que esses planos permitem a edificação.

  4. Na decisão ora recorrida, o Tribunal concluiu que a Autora não teria direito ao deferimento do pedido de licenciamento, uma vez que, segundo o mesmo, não foi reconhecido o interesse municipal do equipamento a licenciar.

    F.

    No entanto, a verdade é que o Réu reconheceu o interesse público do equipamento em causa, como resulta claramente da prova junta aos autos.

    G.

    Como resulta claramente da prova junta aos autos - e, aliás, conforme reconhecido pelo Tribunal à quo na Sentença, no ponto 17 dos factos dados como provados - o Réu reconheceu interesse municipal ao projeto em causa, por declaração de 22.04.2015 (cfr. Documento n.° 5 junto aos autos), na qual foi expressamente declarado que “A Câmara Municipal declara manter o interesse municipal na instalação do CITV no local pretendido" e que "A Câmara Municipal irá criar todas as condições para acolher e licenciar o referido equipamento” (sublinhados nossos), pelo que a análise que o tribunal faz não corresponde à realidade dos factos.

    H.

    Assim, ao dar como provado este facto (sob o ponto 17 da matéria de facto provada), o Tribunal a quo nunca poderia ter deixado de constatar que o Município reconheceu, objetiva e inegavelmente, o interesse municipal na construção e instalação do CITV.

    I. Coisa distinta - que não foi objeto da ação em primeira instância nem é objeto deste Recurso - é indagar se o ato de reconhecimento do interesse municipal na construção e instalação do CITV foi regularmente praticado e se houve, ou não, desvio das competências dos órgãos do Município.

    J.

    Porém, este é um problema estritamente interno do Réu, que não pode afetar a posição jurídica da Recorrente; além disso, a existir tal vício, o mesmo corresponderia a uma causa de mera anulabilidade, e já se teria sanado e consolidado na ordem jurídica pelo decurso do tempo, por nunca ter sido alegado nem invocado, não podendo mais ser atacado (cf. artigos 163.° n.° 1, n.° 3 e n.° 4 do CPA e artigo 58.° do CPTA).

  5. Por isso, tal vício não foi submetido - nem o poderia ser - à apreciação do Tribunal a quo nem é submetido - nem o poderia ser - à apreciação do Tribunal ad quem.

    L.

    Sem prejuízo disso, a verdade é que, já depois de apresentado o pedido de licenciamento da construção do CITV, no ano de 2015, foi apenas por sugestão e insistência dos serviços municipais (do Réu) que a Recorrente apresentou (novo) pedido de declaração de interesse municipal à Assembleia Municipal, de modo a assegurar o ágil andamento do processo de licenciamento, não querendo criar obstáculos à sua concretização, apesar de nunca ter tido dúvidas que o Réu havia já reconhecido, definitivamente, o interesse municipal na construção do CITV.

  6. Todavia, o lastro documental junto aos autos não deixa dúvidas que, nessa data, o Réu já havia reconhecido o interesse municipal do projeto em causa, sendo que o próprio requerimento apresentado pelo Autora, requerendo a declaração de interesse municipal à Assembleia Municipal (cfr. Documento n.° 8 junto à PI) não deixa margem para dúvidas que a Autora, nem por um momento, duvidava que tal interesse municipal já havia sido reconhecido.

  7. Acresce que Recorrente não foi notificada da decisão da Assembleia Municipal, tendo-lhe esta apenas chegado ao conhecimento como fundamento da decisão de indeferimento do pedido de licenciamento (cfr. Documento n.° 1 junto com a PI), ato esse que foi impugnado, juntamente com todos os seus fundamentos.

  8. Assim, como ficou demonstrado à saciedade, toda a conduta do Réu (em particular as garantias de viabilização do projeto por parte do Réu e a própria emissão do ato de reconhecimento do interesse municipal na concretização de tal projeto), criou na Autora, ora Recorrente, a legítima expetativa de que, de facto, se encontrava reconhecido o interesse municipal em tal projeto e de que o mesmo reuniria as condições para ser licenciado.

  9. Esta legítima expectativa merece tutela ao abrigo do Princípio da Proteção da Confiança, que é pacificamente dedutível do artigo 2.° da Constituição da República Portuguesa, enquanto elemento essencial do Estado de Direito.

  10. Durante 8 anos a Recorrente contou com os efeitos jurídicos de um ato administrativo que lhe permitiria a construção de um CITV, cujos efeitos foram afirmados e reafirmados pelo Recorrido, e que, inclusive, lhe permitiu ganhar o concurso aberto pelo IMT para a exploração do mesmo equipamento, pelo que é, agora, inadmissível que o Recorrido faça tábua rasa dos atos que praticou, dos comportamentos que adotou e dos compromissos que assumiu e frustre as legítimas expectativas que gerou na Recorrente, R. O que - conforme se deixou claro na PI - viola os princípios da proteção da confiança e da boa-fé, sendo, em consequência, anulável nos termos do n.° 1 do artigo 163.° do CPA, como tal devendo ser anulado, o que expressamente se requer e se invoca.

  11. Ao exposto acresce que a condição imposta na informação prévia favorável emitida pelo Réu (cfr. Documento n.° 3 junto com a PI), de a instalação do CITV se ter de enquadrar nalgumas das exceções do n.° 2 do artigo 23.° do Regulamento do PDM de Oliveira de Azeméis de 1995, não o foi em abstrato; sempre, pelas partes, se reconduziu esta questão a uma solução, que efetivamente, foi a adotada: a da declaração do interesse público municipal em tal projeto: tanto assim que só por isso se explica a declaração emitida pelo Senhor Vereador com o pelouro do Urbanismo, de 22.04.2015 (cfr. Documento n.° 5 junto aos autos), pela qual, recorde-se, se reconhece o interesse municipal na construção e instalação do CITV.

  12. Ora, sem prejuízo de tal declaração de interesse municipal ter ocorrido, sem prejuízo de ter sido criada, na Requerente, a legítima expectativa de que esse interesse foi declarado e que poderia construir o CITV, a verdade é que o Réu nunca poderia imputar a falta de verificação de uma condição à Autora, que só o Réu poderia cumprir (e que, de facto, cumpriu).

    U.

    Tratou-se de uma condição imposta pelo próprio Município, cujo cumprimento está na dependência do próprio Município, pelo que, mesmo que essa condição não se tivesse verificado - e verificou-se! - a mesma teria sempre de se dar por verificada - quer dizer, o interesse municipal na construção do ICTV teria de dar-se por declarado - atenta a conduta do Réu, que pretende impedir a sua verificação (cfr. artigo 275.°/2 do Código Civil).

    V.

    Assim sendo, conclui-se que (i) tendo o Réu assegurado, inclusive perante o IMT, o interesse na construção do projeto e garantido que o mesmo poderia ser executado, nunca poderia obstar ao reconhecimento de tal interesse e à viabilização do ICTV por falta desse interesse; e (ii) o Réu criou a legitima expectativa na Autora, ora Recorrente, de que, não só o interesse municipal existia, como havia sido declarado e como poderia levar a cabo a construção do CITV.

  13. Porém, sem prejuízo do que se vem de dizer, há uma verdade sólida e insofismável: o Réu declarou o interesse público municipal na construção do CITV, ato esse que produziu os seus efeitos e se consolidou na ordem jurídica.

    X.

    Assim, errou a douta Sentença do Tribunal a quo, ao julgar que o interesse municipal neste projeto não havia sido declarado e que, portanto, a mesma operação urbanística não se poderia enquadrar na exceção prevista na al. a) do n.° 2 do artigo 23.° do Regulamento do PDM de Oliveira de Azeméis de 1995 e que permite a edificação do CITV na área prevista, tal como, por informação prévia favorável condicionada, o Réu o esclareceu.

  14. Tudo isto deveria ter sido tido em consideração pelo Tribunal a quo e culminado na anulação do ato administrativo impugnado, e, bem assim, na condenação à prática do ato de licenciamento.

    Z.

    Prosseguindo, não tendo sido julgado que o interesse municipal na construção do CITV havia sido reconhecido, entendeu o Tribunal a quo que o conhecimento das demais questões a decidir se encontrava prejudicado - porém, decisão diferente impõe-se.

    AA. Desde logo, quanto ao prazo e efeitos do PIP, no ato ora impugnado, o Réu colocou um entrave adicional à pretensão da Recorrente: o de saber se na data em que foi requerido o licenciamento da construção do CITV (em 12.10.2015), o Réu continuava vinculado...

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