Acórdão nº 00528/08.4BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelRosário Pais
Data da Resolução15 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Exm.º Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro em 21.010.2016, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial que a sociedade “A..., Lda.

” deduziu contra as liquidações adicionais de IRC e juros compensatórios dos anos de 2003, 2004 e 2005, bem como o agravamento da coleta dos mesmos anos, no montante global de €118.051,36, cuja matéria coletável foi apurada através de métodos indiretos.

1.2. A Recorrente Fazenda Pública terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: «I – O objecto do recurso I.

Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença proferida nos autos em epígrafe, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A..., Lda. contra as liquidações de IRC dos exercícios de 2003 a 2005.

II.

As questões decidendas a submeter ao julgamento do Tribunal ad quem consistem em saber se o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento por ter a) realizado incorrecta apreciação e valoração da factualidade dada como assente e em deficiente selecção da matéria de facto relevante para a decisão da causa; b) considerado que a AT violou o disposto no n.º 3 do artigo 63.º da LGT e por ter extraído indevidamente consequências dessa alegada violação; c) considerado que não se verificaram os necessários pressupostos para a aplicação de métodos indirectos relativamente ao sector da discoteca; d) considerado que a impugnante logrou demonstrar excesso de quantificação na determinação da matéria tributável.

II – A factualidade dada como provada III.

O Tribunal a quo, atenta a prova documental e testemunhal, incorreu em erro de julgamento dado que: não poderia dar como provados determinados factos nem poderia tirar as ilações que tirou dos mesmos; conferiu a outros factos uma redacção diversa da que se impunha; considerou como não provada factualidade que o deveria ter sido.

IV.

Este erro de exame verificou-se quanto aos factos 33, 34, 36, 37, 38 dos provados (pontos 4 a 8 da motivação) e factos 1 e 2 dos não provados (pontos 9 e 10 da motivação).

III – O vício procedimental V.

O Tribunal recorrido anulou a liquidação de IRC referente ao exercício de 2005 por força da violação do princípio da irrepetibilidade dos procedimentos inspectivos.

VI.

Porém, incorreu em erro de julgamento quer por ter acolhido a alegação de vício procedimental, quer por ter extraído indevidas consequências jurídicas de tal alegada violação.

VII.

O n.º 3 do artigo 63.º da LGT tem sido alvo de uma mutação hermenêutica quanto aos seus propósitos, visando dar cobertura ao direito do contribuinte à segurança jurídica e à estabilidade da relação fiscal (pontos 13 e 14), não tendo a conduta da AT vilipendiado este direito (ponto 15).

VIII.

O n.º 3 do artigo 63.º da LGT consagra a proibição da repetibilidade de procedimentos de inspecção e não de actos de inspecção, desde logo por força da estabilidade e segurança jurídicas que aquela norma visa proporcionar (ponto 16).

IX.

Ainda que assim não fosse, a consequência que o Tribunal poderia extrair de tal circunstancialismo seria apenas a anulação da liquidação de IRC daquele exercício e não a desconsideração dos elementos apurados em procedimentos (alegadamente) ilegais, mormente para efeitos de apuramento de omissão de proveitos (pontos 17 e 18).

IV – Os pressupostos para a aplicação de métodos indirectos X.

O Tribunal considerou que a AT, quanto aos sectores restaurante/motel, logrou demonstrar indícios sérios da ocorrência de factos que justificam o recurso a métodos indirectos, não o tendo conseguido realizar no sector discoteca (pontos 19).

XI.

Porém, os SIT não se bastaram com a verificação de apenas um elemento ou pressuposto, tendo recolhido uma panóplia de factos-índice que, devidamente concatenados, não deixam quaisquer dúvidas quanto à existência de omissões de proveitos e à impossibilidade da sua determinação directa e exacta (ponto 20).

XII.

No que concerne à determinação do valor do consumo médio por cartão, entendeu o Tribunal que se trata de meras “considerações estatísticas”, as quais “têm valor relativo”, carecendo este indício de “sustentação de outros que apontem no mesmo sentido”, laborando assim em erro de julgamento (ponto 21).

XIII.

Relativamente às divergências entre a “receita do caixa” apurada no dia 27/AGO/2005 e a declarada nos fins-de-semana anteriores, considerou o Tribunal que, para além de esse indício convocar elementos recolhidos em violação do princípio da irrepetibilidade, a AT não logrou confirmar a existência de tais divergências, “restando apenas uma suspeita”, incorrendo também em erro de julgamento (ponto 22).

XIV.

Quanto às discrepâncias em termos de valor dos pagamentos mediante TPA, considerou o Tribunal a quo que, para além de estarem em causa elementos recolhidos em violação do princípio da irrepetibilidade, a AT se limita a “verificar essa divergência sem juntar qualquer prova” de que o valor real das receitas difere do declarado, laborando assim em erro de julgamento (ponto 23).

XV.

No que concerne ao indício da proporção de cartões com consumo inferior ao mínimo, para além de invocar novamente a ilegalidade decorrente da irrepetibilidade das inspecções, o Tribunal considera que aqui se está perante uma consideração estatística e, como tal, despida de efectivo valor probatório, incorrendo em erro de julgamento (ponto 24).

XVI.

Perfilhando o entendimento vertido na sentença quanto à (in)suficiência e i(ni)doneidade de cada um dos indícios carreados pela IT para que se pudesse concluir pela omissão de proveitos, a AT teria, para que um determinado indício fosse válido, de fazer prova do comportamento omissivo que, precisamente com base nesse indício, se pretende demonstrar (ponto 25).

V – O erro na determinação e quantificação da matéria colectável XVII.

No que respeita à discoteca, verteu-se na douta decisão que não poderia haver lugar a correcção por métodos indirectos, ficando prejudicado o conhecimento do vício de excesso de quantificação.

XVIII.

O Tribunal incorreu aqui em erro de julgamento, na medida em que a AT demonstrou a omissão de proveitos por parte da impugnante neste sector e explicitou os motivos pelos quais não seria possível a quantificação directa e exacta de tais omissões.

XIX.

Quanto aos sectores do motel e restaurante, o Tribunal abordou os diversos vícios que a impugnante entendeu invocar no âmbito da quantificação, acabando por reconhecer o alegado excesso com base no argumento das margens de lucro bruto resultantes dos valores presumidos pela IT.

XX.

O Tribunal incorreu em erro de julgamento quanto à questão da correspondência (ou não) entre os comprovantes emitidos e a emissão de facturas ou facturas-recibo, verificando-se uma desconformidade entre a factualidade dada por assente e a subsequente motivação (ponto 29).

XXI.

O Tribunal incorreu também em erro de julgamento ao atribuir valor e força probatória à amostragem apresentada pela impugnante a juízo, dando acriticamente como assente que aquela seria a margem de lucro bruto da discoteca (ponto 30.1).

XXII.

A impugnante não alegou nem demonstrou a inalterabilidade do preço de custo e do preço de venda de tais mercadorias ao longo dos 3 anos em que aplicou aquela margem (ponto 30.2).

XXIII.

A partir do momento em que existe omissão de proveitos por parte de um contribuinte, e essa omissão é corrigida pela AT, a margem de lucro apurada na sequência de tal correcção tem de ser forçosamente superior à declarada pelo contribuinte incumpridor (ponto 30.3).

XXIV.

O Tribunal incorreu em erro de julgamento ao considerar que se verificou excesso na quantificação por a AT não ter quantificado os erros que apontou ao estabelecimento daquela margem média por parte da impugnante (ponto 31).

XXV.

O Tribunal laborou ainda em erro de julgamento ao considerar que, como não se provou a existência de omissões na discoteca, não haveria justificação para corrigir a margem avançada pela impugnante e que, por outro lado, a AT não fez prova das condições para aplicar a tal margem de 800% que seria a praticada por outras discotecas situadas na mesma zona geográfica (ponto 32).

XXVI.

Constata-se ainda a existência de erro de julgamento por se ter entendido na sentença que a AT “não logrou retirar credibilidade ao argumento da Impugnante, que aponta decididamente no sentido de existir manifesto excesso na quantificação efectuada”, na medida em que, para além de a AT não se encontrar obrigada a fazer prova em contrário da alegação de excesso (ponto 33.1), para que se possa falar em excesso de quantificação é necessário que a divergência entre o resultado da quantificação efectuada e a realidade seja de tal modo grosseira que ofenda insuportavelmente os direitos do contribuinte, cabendo a este comprovar, sem reticências ou necessários reparos, a verificação de tal excesso manifesto (ponto 33.2).

XXVII.

A impugnante não se desobrigou do ónus que sobre si impendia, não lhe bastando suscitar dúvida sobre a quantificação do facto tributário (pontos 33.3 e 33.4).

XXVIII.

Incorreu, por fim, o Tribunal em erro de julgamento por ter entendido que a esta incapacidade da AT em descredibilizar o argumento da impugnante, ter-se-ia de acrescentar a “dúvida resultante de o critério usado pela AT assentar no pressuposto, que possivelmente poderá estar errado, de que todos os comprovantes de quarto correspondem a alguma receita da Impugnante”, visto que se funda em factos que foram indevidamente dados como provados e não provados (ponto 34.1), para além de que a sua exígua relevância (assumida pelo próprio Tribunal) jamais poderia servir de alicerce para qualquer dúvida fundada em termos de quantificação da matéria tributável (ponto 34.2).

XXIX.

EM CONCLUSÃO, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento por: a) ter realizado incorrecta apreciação e valoração da...

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