Acórdão nº 01552/08.2BEVIS de Tribunal Central Administrativo Norte, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelAna Patrocínio
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I. Relatório A..., S.A., contribuinte fiscal n.º (…), com sede na Rua (…), interpôs recurso jurisdicional da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 27/05/2014, que julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra a liquidação oficiosa do IRC e juros compensatórios do ano 2000, no montante de €580.819,55.

A Recorrente terminou as suas alegações de recurso formulando as conclusões que se reproduzem de seguida: “1ª A douta sentença está ferida de nulidade e padece de vícios formais e substanciais por violação de normas de direito adjectivo, por erro de julgamento em matéria de facto e em matéria de direito, nos termos que melhor se explicitarão infra, não podendo, assim, manter-se na ordem jurídica.

2ª A douta sentença não procedeu autonomamente à sintetização da pretensão da recorrente e dos respectivos fundamentos, e à fixação das questões que ao tribunal cumpria solucionar, socorrendo-se do que, nesse domínio, fora assumido, em termos não exaustivos, nem vinculativos, pelo douto Acórdão do TCA Norte de 09.02.2010, proferido nos autos, pelo que violou o disposto no art. 123º, nº 1, do CPPT.

3ª A sentença não conheceu de todas as questões suscitadas na p. i., v. g. nos seus artigos 19, 20, 21, 27, 64 e 80, cuja matéria carecia de pronúncia do tribunal por a respectiva decisão não se mostrar prejudicada pela solução dada a outras, violando, desde modo, o disposto no art. 608º nº 2, do Novo CPC, e incorrendo, em qualquer daquelas omissões, na nulidade cominada no art. 125º, nº 1 do CPPT.

4ª Do mesmo modo, não conheceu da matéria alegada no artigo 15º da p. i., que constitui questão autónoma, cuja decisão não se mostra prejudicada pela solução dada a outras, ficando também incursa na previsão contida nos preceitos referidos na conclusão anterior.

5ª Idêntica omissão de pronúncia praticou a sentença relativamente à questão configurada na primeira parte do artigo 16 da p. i., onde se alega o vício de fundamentação ocorrido na decisão de fixação da matéria tributável de IRC, por silenciar qualquer menção ao Relatório da IGF, datado de 11.09.2003 e considerado naquela o fundamento determinante da prática do acto tributário, ficando, por isso, e também desta feita, incursa no preceituado nos artigos referidos na conclusão 3ª.

Sem prescindir, 6ª E posto que houvesse de entender-se – o que se recusa – que o acto tributário ter-se-ia fundado no conteúdo do referido Relatório, uma vez que a decisão de fixação da matéria tributável não o invoca nem remete para ele, a recorrente ficou impedida de conhecer o iter cognoscitivo e valorativo seguido pela entidade decidente na formação da vontade ínsita ao acto em causa, tudo em violação do disposto nos arts. 77º, nº 1, da LGT, e 125º, nºs 1 e 2, do CPA.

De novo sem prescindir, 7ª Também em sede de julgamento da matéria de facto são múltiplos e de largo espectro os vícios evidenciados na sentença.

8ª Desde logo, por ter desconsiderado na decisão da matéria de facto o documento junto ao Processo Administrativo constituído por uma informação prestada pelos Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Aveiro, em 2 folhas, com data de 26.09.2003, sobre o qual recaiu despacho do Director de Finanças datado de 03.10.2003, contendo elementos relevantes para a decisão da causa, atentos, entre o mais, quer o seu conteúdo, quer a matéria conexa alegada nos artigos 15, 16 e 20 da p. i. Por outro lado, 9ª Em sentido inverso, a douta sentença relevou no probatório o Relatório da IGF, reproduzindo o respectivo teor da parte respeitante ao IRC – e referiu-se-lhe exuberantemente na motivação da matéria de facto – conquanto a decisão de fixação da matéria tributável nenhuma referência específica lhe fizesse, conforme se alegou no artigo 16 da p. i.

Todavia, 10ª Não releva na sua motivação o documento ou documentos em que se baseou especificamente a decisão de fixação da matéria tributável de IRC.

11ª Seja por insuficiência da matéria dada por provada, seja por não permitir estabelecer uma relação de pertinência e de necessidade lógica entre os aludidos factos dados como provados e a decisão impugnada, a douta sentença violou o disposto no art. 607º, nº 4, do Novo CPC, e incorreu em ilegalidade ao julgar improcedente a impugnação.

12ª Ainda em sede de julgamento da matéria da prova, na sua vertente testemunhal, quer do conteúdo dos depoimentos, quer da sua valoração à luz do quadro considerado normal do agir humano em circunstancialismo idêntico ao dos intervenientes nas facturas ditas falsas, conjugada com as regras da experiência comum, não se extrai, salvo melhor opinião, a convicção do tribunal objectivada na respectiva motivação, mas, sim, a oposta que respondesse afirmativamente em matéria de prova da veracidade daqueles documentos.

13ª O que se justifica e impõe tanto mais quanto é certo que é a própria sentença a reconhecer e assumir que na convicção do tribunal foram relevados “... os depoimentos das testemunhas inquiridas, que, no essencial se mostraram seguros, coerentes e credíveis...” 14ª Sendo de atender na valoração dos referidos depoimentos – o que a sentença não fez – o longo do tempo (cerca de 12 anos) decorrido entre as datas da verificação dos factos provados e da inquirição das testemunhas, e à natural e erosão da memória desses factos, mais compreensível por não respeitarem a interesses pessoais e directos dos depoentes.

E atender também a que, 15ª A demora excessiva e injustificável (e não imputável a qualquer título à recorrente) na realização da prova testemunhal, não só acarretou a impossibilidade de obter uma decisão em prazo razoável, como também ameaça tornar o processo não equitativo (e culminar numa decisão final iníqua), por se ter criado objectivamente pelo atraso na inquirição das testemunhas um obstáculo irremovível à defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos.

16ª Caso viesse a manter-se a decisão do tribunal a quo — o que de todo em todo se não concede — consagrar-se-ia uma intolerável iniquidade, porquanto o Estado, único responsável pela falta de inquirição das testemunhas em tempo razoável, seria o beneficiário directo do mau funcionamento a si imputável dos seus serviços administrativos e judiciais.

17ª O argumento vertido na sentença — cfr. fls. 33 — de que “As testemunhas não afirmam que (...) todos os serviços facturados ao Sr. AA... foram efectivamente prestados pelo valor que consta da facturação”, a ser aceite como pertinente e válido, tem subjacente a premissa ou ideia de que tal facto é insusceptível de prova testemunhal, já que, salvo melhor opinião, exceptuados os intervenientes directos na prestação e facturação dos serviços — e mesmo estes só se acompanhassem todas as fases e operações materiais da respectiva execução — ninguém mais teria conhecimento pessoal da matéria em causa.

18ª Sendo que, os factos em causa reconduzir-nos-iam a uma situação em que a única pessoa que estaria em condições de fazer tal afirmação — por ser a que prestou e efectuou os serviços — seria precisamente a que não poderia ser inquirida como testemunha, por tal lhe ser legalmente vedado (cfr. artigo 617º do CPC, na redacção ao tempo em vigor) nem sequer mediante “declarações de parte”, meio de prova previsto no art. 466º do Novo CPC, mas inexistente no CPC de 1961, aplicável ao tempo) – o AA... — quer quanto aos factos a si directamente respeitantes, quer, enquanto gerente, quanto aos respeitantes à sociedade B... Lda---.

19ª Tratando-se de factos cuja prova não só não era exigível, como, pelo contrário, era legalmente inadmissível, não poderia a mesma ter sido...

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